Acho que vai nevar. escrita por Lolla


Capítulo 3
Névoa.


Notas iniciais do capítulo

Obrigada por vir ler !



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Depois disso,fizemos todo o trajeto em silêncio. Eu não tive coragem de perguntar novamente, e nem ele de continuar a sua história. Apesar de todo o silêncio e vergonha, eu senti nele,algo diferente. Não era amor, nem atração física, era algo parecido com o que sinto pela Melinda. Eu curti cada passo que dávamos em silêncio, olhando para qualquer lugar, menos um para o outro. Geralmente os homens que conheço,são rudes e ou megalomaníacos, gostam de receber a atenção exacerbada de outras mulheres e até mesmo de outros homens, e eu geralmente alimento esse tipo de situação. Mas nele não, ele era apenas ele, aquele garoto magrelo e inseguro ao meu lado, unidos por um prédio no bloco de exatas.

Logo ele viu a ponte,ainda um pouco longe, mas entendi o seu recado, embora nenhuma palavra fosse dita, entendi que ele queria fazer isso sozinho, ou ficar sozinho.

–Bom,é logo ali, divirta-se.

Essa frase saiu da minha boca automaticamente, queria convidá-lo para tomar um café depois das provas, ou antes das aulas de amanhã, mas não sabia ao certo como agir, então o deixei ir. Ele foi sem ao menos me dizer o seu nome ou um agradecimento, eu não sei como, mas o irritei ou o envergonhei profundamente. Voltei a passos apressados para o meu bloco,minha prova havia começado a cinco minutos e eu ainda estava muito longe de lá.

Cheguei na sala descabelada e com o rosto vermelho,pois na metade do caminho comecei a correr, não exatamente pelo atraso, mas senti vergonha do que fiz o garoto passar. E foi nisso que pensei nos últimos trinta e cinco minutos de prova que ainda me restavam. Então, quando ja havia aceitado a derrota na prova, sai da sala, e comprei um refrigerante e um pão de queijo, e fui até o bloco de exatas. Era como se com aquilo tudo entre nós, estaria certo a partir da quela hora. Eu não podia aceitar que alguém ficaria mal por minha causa. Eu que sempre gostei de pessoas, de estar e conversar com elas, e que sentia falta de não ter companhia.

Com uma sacola branca balançando fui correndo até o bloco e procurei pela secretaria. Leila a senhora secretária,era muito minha amiga, apesar da diferença de quase cinquenta anos,conversávamos sobre amores,festas e decepção, e tudo que acontecia quando ela tinha a minha idade, acontecia ou aconteceria comigo, era como se os cinquenta anos não mudasse nada no mundo de hoje. Cheguei ainda muito esbaforida até a sua sala, e pela nossa batida secreta, ela soube que era eu e que era urgente.

– Ora,uma urgência, a quanto tempo ... Onde foi o incêndio ?

– Dona Leila, preciso de uma ajuda, urgente.

– Então diga logo menina! Na sua idade esperar é perder tempo !

– Preciso achar um cara. Ele é novo aqui, muito alto, muito pálido, com as mãos mais frias que a humanidade ja viu e estuda Engenharia Química.

– Hmm, deixei-me pensar.

Ela sentou em uma cadeira grande e acolchoada, toda de coro, em marrom envelhecido.

– Já sei !

Ela deu um tapa na mesa e sorriu pra mim.

– Ele é o novato daqui, está na sala 23 e você terá um surpresa !

Eu sai correndo e nem mesmo agradeci. A esta altura o pão de queijo já nem quente estava,mas ele não era importante, era só um pretexto. Mas me senti mal, e voltei, me senti mal, e muito curiosa.

– Surpresa ?

Falei, mostrando apenas a cabeça no batente da porta.

– Seja rápida a aula dele está no fim, e de nada também.

– Obrigada Leila, você é uma santa.

Gritei no meio do corredor, correndo em direção ao elevador. A sala dele ficava no terceiro andar do bloco. Apertei desesperadamente o botão, mas ele teimava em ficar parado no quinto andar. Resolvi que se eu quisesse resolver as coisas, teria de fazer sacrifícios,e este se chama subir escadas.

Eu subi quatro lances de escadas, com uma mochila e um saco de pães de queijo e um refrigerante, mas era por um bom motivo. No caminho encontrei muitos colegas, que me cumprimentavam e eu apesar dizia " Oi, ja volto", e subi cada degrau como nunca antes. E enfim cheguei. Aparentemente alguém em algum lugar conspirava a meu favor, a sala em que ele estava ficava logo ao lado do ultimo lance.

Esperei um pouco, até o sinal tocasse indicando a troca de professor, e tentando conter minha ansiedade e arrumar meus cabelos e voltar a respiração normal. Cinco minutos e então o sinal tocou,mas antes que qualquer aluno saísse da sala,olhei pelo vidro da porta, para verificar se ele estava lá. E ele estava. Aquela cena foi como um soco no meu estômago, e agora entendi o que Leila queria dizer com " Surpresa".

Minhas pernas amoleceram, e escorreguei devagar pela parede até sentar no chão ao lado da porta. Minhas mãos tremiam, e eu comecei a me perguntar se a minha atitude seria certa.Eu poderia causar muitos problemas ficando ali, e o esperando,eu causaria muitos outros problemas, nutrindo esse sentimento por ele.

– Olá ?

Meus olhos se fecharam lamentando a minha demora ao reconhecer a voz. Era ele. Ele estava de pé ao meu lado, me olhando curioso. E parecia muito mais sério do que antes. Talvez estivesse com raiva de mim.

– Oi.

Nunca dei um "oi" tão melancólico quanto aquele na vida. Mordi meu lábio superior, e levantei rapidamente.

– Escuta, eu só queria, me desculpar pelo constrangimento hoje mais cedo, então lhe trouxe isso. E que bom que conseguiu achar sua turma logo.

Era hora de usar minha segunda maior habilidade. Afastar. Era hora de me afastar dele, não fisicamente, psicologicamente. Era hora de esquecer dele, como me esqueci do garoto misterioso da festa. Eu me formaria, no final deste ano, e ele? Bom, ele era professor. Parecia ter a minha idade mas era professor. Isso explica todo o constrangimento nas minhas tentativas de saber mais sobre ele. Nosso amor, foi lindo, nas uma hora e meia em que durou.

Antes dele responder, eu desci as escadas, rápido, com a cabeça baixa. Eu agora experimentava o constrangimento que ele passou, e ele é estrangulador. Eu desci as escadas rezando para que ele não viesse atrás, ou me falasse alguma coisa, isso me obrigaria a ter que olha-lo e eu não estava em condições de encará-lo.


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