Enquanto o Sol Brilhar escrita por Gabriel Campos


Capítulo 15
Bob: Não está sendo fácil


Notas iniciais do capítulo

Música: Superman
Intérprete: Five for fighting
https://www.youtube.com/watch?v=uCdEuMk7C9E


Estou de volta com essa fic. :)



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Vasculhando os bolsos de um dos meus casacos jeans fedorentos, encontro um cartão com o número do telefone da veterinária, Dra. Jana, o mesmo que ela me deu naquela madrugada em que passamos no hospital. Ainda hesito antes de pegar meu telefone celular e ligar para ela mas, na minha cabeça, Janaína Bernardes é a única chance que tenho para me ajudar a convencer Tânia a fazer a cirurgia e remover o maldito tumor dos seu pulmão .

— Alô? – ouço sua voz, um pouco rouca, do outro lado da linha. Das duas uma: ou ela está chorando, ou ela está gripada. Pelo grau de toda a situação, fico com a primeira opção. Não tá fácil pra ninguém.

— Oi, Dra. Jana! Aqui é o Roberto... o Bob. O dono do Jack!

— Desculpa, não posso falar agora. Posso te ligar mais tarde? Se for alguma coisa com o Jack, pode ligar pra clínica, o Dr. Patrício e a minha amiga, Dra. Ana Paula, estão lá. Tudo bem?

— Não é nada com ele... bom, esquece. Obrigado mesmo assim.

Ela fica em silêncio, mas não desliga o telefone. De certa, ela espera que eu desligue. Ouço soluços mais fortes, ela está chorando com certeza.

— Dra. Jana, desculpa ser intrometido, mas está tudo bem? Eu posso te ajudar?

O choro dela aumenta, eu fico desesperado. Qualquer que seja o problema dela, ela precisa de minha ajuda. Dona Tânia pode esperar um pouquinho, não posso fazer desfeita com Jana hoje, não posso fazer o que fiz naquele dia, em que eu a vi chorando e não ofereci o meu ombro a ela. Ela ofereceu o seu, mesmo precisando de um.

— Eu não quero te preocupar, Bob.

— Por favor, me deixa te ajudar. Onde é que você está?

Coloco uma coleira azul no pescoço de Jack. Prefiro ir caminhando até o lugar onde Jana disse para eu a encontrar, assim meu amigo e eu fazemos um pouco de exercício. Estou muito nervoso, as guloseimas das vitrines das padarias do caminho estão parecendo mais apetitosas, teimo em tirar minha carteira e comprar um sonho bem gorduroso, mesmo sabendo que a propaganda enganosa virá à tona quando eu der a primeira mordida e tal sonho não é delicioso coisa nenhuma.

Dito e feito: nem mesmo Jack quis comer.

Não direi que quis comer aquilo porque eu estou nervoso. Eu como por qualquer motivo, mas neste momento em especial eu estou com os nervos à flor da pele. Jana aceitou meu pedido de ajuda, me disse onde ela está, mas não disse do que se trata. Não gosto de surpresas boas, quem dirá surpresas ruins.

Apresso meu passo, Jack não está nem um pouco cansado. Eu, em compensação, já acho que meus intestinos querem sair pela minha boca. Eu deveria ter apanhado um ônibus. Se eu colocasse um par de óculos escuros, todos achariam que Jack é meu cão-guia.

O cão começa a latir, como se fosse a própria D. Tânia me chamando de tapado e mandando eu me apressar. Ele abana o rabinho e tenta lamber meu rosto, enquanto estou encurvado, com as mãos no joelho, tentando respirar um pouco.

Ok, Jack, você venceu, penso e olho para ele. Às vezes acho que podemos conversar por telepatia. Eu sei e sinto quando Jack está com fome, quando ele quer fazer suas necessidades e coisa e tal. Acho que ele me entende também.

Reinicio a caminhada, sinto um vento diferente batendo no meu rosto, a dentada no sonho gorduroso, para mim, agora já não vale mais de nada. Faltam algumas quadras, mas estou mais perto do que longe. Já estive neste bairro antes, entregando garrafões de água para os clientes do mercadinho.

Espero o sinal fechar e Jack e eu atravessamos uma avenida esburacada,próximo ao ponto do ônibus onde eu deveria descer caso tivesse optado em vir pelo modo mais preguiçoso (e mais rápido, droga!). Desço uma alameda, parece a alameda dos sonhos despedaçados da música do Green Day¹, cheia de buracos e pessoas fofocando. Acompanho os números das residências, procurando por Jana e acabo me deparando com uma pequena multidão em frente a uma casa, carros de polícia e burburinhos. Há uma moça gritando com um policial. Jana. Jack late ao ouvir a vez dela de um jeito que nós nunca tínhamos visto antes: ela não está de jaleco, ou vindo de um jantar importante. Ela está tendo problemas e eu sou o único, talvez, que possa lhe ajudar e lhe retribuir o ombro amigo que outrora ela me dera.

— Moça, peço que se acalme, por favor. – o policial diz. Jana, por sua vez, nervosa, esmurra a porta daquela casa, chora, anda de um lado para o outro. As pessoas, curiosas, palpitam tentando adivinhar o problema que está havendo, como se fosse algo digno de uma aposta.

— Como é que eu posso ficar calma? Minha mãe está ferida, minha irmã foi sequestrada por um monstro, um verme, pedófilo! O senhor tem filha? Tem? Se não tem, não sabe o que eu estou passando!

O policial põe as mãos na cabeça, sem saber o que fazer. Eu conheço de vista a irmã de Jana, a Tati, lá do condomínio. Às vezes eu a via passando, vindo da escola. Eu a vejo. Não sei muito bem do que se trata, mas eu ouvi a palavra "sequestrada" e a palavra "pedófilo" saindo da boca da veterinária. Isso me deu um pouco de náuseas. Estou relutante, Jack também, quero atravessar esta pequena multidão e dar um abraço de conforto em Janaína o quanto antes. Ela me mostrou e sabe mais do que ninguém que um abraço apertado pode curar qualquer tipo de angústia.

Esquivo-me, passando com dificuldades entre alguns fofoqueiros curiosos. Jack, mesmo magrinho e tampinha, até que mete um pouco de medo nas pessoas:

— Sai do meio, gordão! Não tá vendo que não te cabe aqui? – Um careca alto com trajes de academia me insulta. Jack responde por mim, rosnando, mostrando seus brilhantes dentes para ele. O careca sai da frente, assustado, como se fosse um ratinho de laboratório.

Dou mais alguns passos e finalmente chego onde Jana está. Ela continua nervosa, gritando com os policiais, e com razão. Ela se cala quando Jack e eu nos aproximamos.

— Bob! Você... Você veio? – a moça enxuga as lágrimas com as costas da mão direita. Eu, um pouco desajeitado, dou-lhe um abraço.

— Obrigada. - ela diz. Sinto suas lágrimas molharem minha camiseta. Não importa, estou aqui, agora e quero ajudá-la.


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Notas finais do capítulo

¹ A música que Bob citou é Green Day - Boulevard of Broken Dreams. Era tema de outra história minha, Lorde Vampiro.



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