Ficaram algum tempo regurgitando o evento que ocorrera, Chihiro tentou se manter aparentemente calma, para que Harumi não tivesse a impressão tão obvia que ela, Chihiro, conhecesse Haku. Enquanto isso, a feiticeira, sentada na grama, pensava em algo indetectável, até que ela se levantou e murmurou para si mesma algumas palavras, então em volta dela um redemoinho de flores começou a se formar e dentro dele ela se transformou no dragão, de escamas cinzas como o grafite de um lápis e pelos brancos com a primeira neve do inverno, observando isso Chihiro se recordou que o dragão a assustara da primeira vez que o vira, ao lutar com Haku no mundo humano, mas agora era um sinal de proteção, depois de tudo o que ela fizera pela menina.

– O que quer fazer? – Perguntou Chihiro, mesmo que talvez ela não pudesse responder, estando na forma que estava.

– Suba em mim, seguiremos o garoto – Ela respondeu.

Confusa Chihiro olhou para o caminho que Haku seguira, apesar de Harumi estar observando a todo tempo o caminho, não era possível que ela se recordasse inteiramente a direção e ainda mais, soubesse a direção que ele seguiu após desaparecer no céu.

– Como vai encontrá-lo?

– Toda magia deixa rastro – Disse Harumi enquanto Chihiro montava em suas costas, a voz dele, como dragão era um pouco mais fria e forte, sendo que era muito autoritária.

Ela partiu em voo e na mesma hora Chihiro sentiu a diferença entre ela e Haku, Haku voava suavemente entre as nuvens no dia que dera a Chihiro uma “carona”, Harumi era veloz, mas tão composta quanto ele, seu porte era duro e firme e mesmo a velocidade fazia com que ela se mantivesse elegante ao voar, como um cavalo ao trotar para um campeonato de hipismo, mas bem melhor, por poder sentir o vento gélido do ar no alto. Ao chegarem em um ponto bem alto, já ultrapassadas as nuvens mais baixas, de sua boca Harumi soltou um brilho, como o fogo que dragões soltam em livros, só que não era fogo e sim uma luz azul e dessa luz, esferas brilhantes formaram um caminho, o mesmo que Haku seguira, tais esferas eram iguais as que as guardiãs usavam, sabia-se lá para que.

Chihiro soube na mesma hora que aquele era o caminho que Haku seguiu e sentiu que a feiticeira voava rapidamente naquela direção. Mesmo com a velocidade e a tensão, a sensação do vento em seu rosto, tal qual olhar para baixo e ver o mundo pequenino fazia a garota sentir-se livre e lembrar-se do dia em que Haku se lembrou, por causa dela, o seu verdadeiro nome, Nigihayami Kohaku Nushi, tão belo quanto o nome de um deus e tão memorável quanto o nome de uma verdadeira paixão, e por isso Chihiro se entristeceu.

O voo foi longo até que tivessem uma mudança drástica de ambiente, uma névoa negra ultrapassou os olhos da menina e ela começou a tossir, Harumi questionou se estava bem, mas antes a própria feiticeira começou a se sentir mal e tossir igualmente, a névoa tornou-se cada vez mais densa e elas foram adentrando naquilo, quando Harumi voltou a forma humana e elas se sentiram cair.

Chihiro gritou, com toda a força que seus pulmões permitiam, pois Harumi estava em transe, os olhos ficaram tais como os de Haku naquela hora, e ela estava paralisada. A garota começou a sacudir a feiticeira na tentativa de acordá-la, mas não funcionou em nenhum sentido. Quando estava começando a entrar em desespero, Chihiro olhou para o chão e viu um mar das sombras que correram atrás dela e de Harumi quando estavam indo para Hanabatake, mais uma vez a garota gritou e fechou os olhos apenas esperando a escuridão chegar, enquanto segurava Harumi com força, mas nesta hora a visão, a mesma que tivera com as sombras antes, lhe passou pela cabeça, os lírios, o rio, Kohako e tudo mais, quando sentiu uma pelugem entre seus dedos.

Abriu os olhos assustada, estava em cima do dragão prateado que era Haku, e ao mesmo tempo não era e por isso ela não se pronunciou, apenas deixou que fosse levada para onde ele queria que ela fosse levada. Ficaram algum tempo no ar, mas não tão alto quanto o que fora com Harumi, ela sentia as sombras chegando próximas de Haku e isso a assustava. Pode observar o que tinha em sua volta, mesmo com todo o mal-estar e a tosse. Era um lugar sombrio, todo projetado para se assemelhar á um cenário macabro, árvores de tronco cinza e sem flores, não havia grama no chão, apenas terra seca e fina, como uma areia preta, o mar das sombras e um frio congelante que o vento trazia.

Eles avançaram um pouco mais naquele mundo, e Haku pousou, as derrubando de suas costas e tornando-se humano novamente, Chihiro ficou o observando e como resposta ele a olhou, seus olhos se encontraram, estavam realmente brancos e sem emoção e isso fez um frio arrepio percorrer a espinha de Chihiro, no entanto, ele não era, nem de longe a coisa mais assustadora naquele lugar. Observando por cima do ombro de Haku, havia uma criatura, coberta de trapos pretos, murmurando em uma língua incomum, na sua frente havia um balcão de pedras e vários feitiços, aparentemente perigosos.

Chihiro sentiu uma mão tocar a sua e se arrepiou antes de olhar para trás e notar que era Harumi, esta estava tão assustada com a criatura quanto ela, e elas se espantaram ainda mais quando ele se virou. Seu rosto não existia, no lugar dele havia uma máscara de ossos, que não pareciam fictícios. Ele não tinha forma, não era humano, nem deus, nem espírito, era semelhante a uma sombra, mas diferente delas, ele causava dano onde quer que pisasse, pois a cada passo que dava a terra parecia morrer ainda mais.

– O que me trouxe, desta viagem para fora de Ankoku? – Disse a criatura, sua voz era grossa e clara, fria como o gelo ou a água do ártico, mas a Harumi notava-se algo, ele era cego - Yami no Minarai?

– Uma feiticeira, a guardiã de Hanabatake – Disse Haku – E uma humana...

– UMA HUMANA? – Disse a sombra – Nunca vi uma...nunca vi nada na verdade... Mas ela tem um cheiro bem diferente realmente.

– Quem é você? – A voz de Harumi surgiu de repente nos ouvidos de todos, a sombra parou de falar e Haku olhou espantado, talvez por ela estar viva.

A sombra não respondeu e apenas fugiu, Harumi correu atrás dela em tentando impedi-la, soltou, de sua mão um feitiço vermelho, tentando prendê-lo ali, mas antes que ele pudesse sair de perto dela, Haku se jogou em cima dela, em sua forma de dragão, a mordendo novamente no estômago, seu grito foi ensurdecedor e Chihiro colocou as mãos nas orelhas, enquanto Harumi lançava um feitiço para cima de Haku que o fez gritar e se afastar, a ponto da feiticeira tirar a mão da mordida e vê-la coberta de sangue.