Caçada escrita por Laís


Capítulo 3
Sobretudo e cachecol


Notas iniciais do capítulo

Eu deveria ter vergonha de mostrar as fuça aqui depois de quase um ano, né? Só queria me desculpar dizendo que realmente foi um ano bem barra pesada e eu não tive condições de escrever. Queria agradecer por alguns leitores que mandaram reviews maravilhosos me incentivando e tudo o mais, vocês são maravilhosos ♥
Capítulo curtinho só p testar a temperatura da água antes de mergulhar.



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—Will – a voz soava longínqua e etérea.

Às vezes, enquanto Will sonhava, um ruído do ambiente se intrometia em seu subconsciente. Como o barulho do despertador que, enquanto dormia, pensava ser uma música ou algo do tipo e só depois de alguns instantes percebia que se tratava do chamado da realidade. Um tiroteio que se transforma em batidas incessantes na porta, um grito que subitamente toma a forma dos latidos dos seus cachorros. Quando isso acontece, é difícil aceitar o que é fantasia e o que é vida real. Como separá-los se, de vez em quando, eles caminhavam tão juntos um do outro? Naquele momento, com o sol morno e pálido de Baltimore cegando sua vista, Will Graham sentia-se enjoado.

—É muito importante que você preste atenção no que eu vou dizer. Está me ouvindo? Como você veio parar aqui? Por favor, precisa me dizer. Nenhum órgão foi tirado das vítimas, com o que estamos lidando aqui, Will?

Depois de uns instantes, o panorama ao seu redor começou a tornar-se nítido e ele viu Jack Crawford, levemente abaixado para manter a cabeça na sua altura. Percebeu então que estava sentado de lado em uma viatura policial e que o toque da mão de Jack em seu ombro tornava-se cada vez mais firme, apreensivo.

—Jack, ele não tem condições de falar agora, por favor, dê um minuto a ele.

Will reconheceu a voz de Alana Bloom antes de enxergá-la.

—Me deixe tirá-lo daqui.

—Você sabe que não posso fazer isso. Ele estava na cena do crime!

—Will não matou aquelas pessoas – suplicou a doutora.

—Como posso convencer as outras pessoas disso se nem ao menos sei o que está acontecendo? – seguiu-se um silêncio desconfortável até que Jack suspirou, exaurido – A análise do local vai mostrar que ele não é assassino, ele terá que ser examinado também, mas não estou prendendo o Will. Pode ficar tranquila.

—O que me preocupa não é o que você vai fazer. É o que você já fez – retrucou peremptória, em um tom cortante.  

O agente do FBI não encontrou resposta para a provocação da Dra. Bloom. Ninguém o culpava mais pelo estado psicológico de Will Graham do que ele mesmo.

~x~

—Chefe. Boas notícias. As impressões digitais do Will não estavam em nenhum local da casa, nem nas vítimas.

Jack recostou-se na poltrona, aliviado. Massageou a fronte quase que inconscientemente.

—Mas isso também é estranho, senhor. Porque quando digo que elas não estavam em lugar nenhum, quero dizer literalmente. Nem na porta. Ele deve ter chegado lá com alguém. 

Mais uma vez, retesou-se.

—Will não estava sozinho? – perguntou debilmente, mas como um pensamento em voz alta. – Mas, se estava lá antes de todos, só uma pessoa poderia tê-lo levado...

O assassino, pensou, sem encontrar a voz para dizê-lo em voz alta.

~x~

—Como se sente?

A postura costumeira do Dr. Hannibal Lecter era reconfortante: as pernas cruzadas e um braço pendendo pelo encosto da poltrona enquanto outro descansava no colo, segurando um bloco de anotações.

—Como se tivesse sido jogado abruptamente na vida de outra pessoa – respondeu Will Graham.

—Em uma daquelas experiências em que nos tornamos uma terceira pessoa e nos observamos pela perspectiva de fora da caixa? – instigou Lecter.

—Não, não é bem assim. Eu literalmente sinto como se estivesse vivendo a vida de outra pessoa, ou melhor... Como se outra pessoa, ocasionalmente, vivesse a minha vida e eu acordasse só para ver tudo diferente ao meu redor.

—Apagões, quer dizer.

—Talvez, mas eu não sinto como se tivesse dormido – a expressão exaurida corroborava a privação de sono.

Hannibal perscrutou o paciente com uma expressão indecifrável no semblante.

—Me conte o que você lembra sobre a noite passada e de como amanheceu na cena de um crime.

—Eu estava aqui, no seu consultório e – respirou fundo, forçando sua memória ao máximo – acordei, no quarto de uma criança para ver, em seguida, um corredor sangrento e aquelas pessoas... Exibidas com troféus.

—Só isso? – insistiu.

—Sim, eu... – subitamente o sobrolho de Will pareceu iluminar-se – eu vi alguém.

—Dentro da casa? Havia alguém dentro da casa com você? – uma fagulha de algo que poderia ser facilmente confundindo com cobiça faiscou no olhar do Dr. Lecter.

—Não, do lado de fora, observando. Mas... Não consigo visualizar suas feições, só...

—Qualquer detalhe pode ser fundamental, Will. Alguma característica da vestimenta, qualquer coisa. Faça um esforço.

Pela silhueta que Will vislumbrara, o sujeito só poderia estar usando sobretudo e cachecol, no entanto, apesar de tê-lo visto durante o dia, em sua memória a imagem era repleta de escuridão.

—Não consigo me lembrar de nada.

—Então como pode ter certeza?

—Você está certo, eu não tenho – tentou encerrar o assunto porque, por algum motivo, não queria discutir sobre o que viu com Hannibal Lecter. – E a criança?

—Que criança, Will?

—Eu acordei em um quarto infantil e não havia criança nenhuma na casa.

—Ah sim, claro. Por sorte, estava na casa de uma amiga.

Will assentiu, aliviado.

—Alguma ideia sobre o assassino? – inquiriu o psiquiatra.

—Estou mais interessado em como eu posso tê-lo encontrado, claramente ele me levou até lá – deduziu Will – e poderia ter me matado, mas não o fez.

—Sim, situação perigosa. Talvez o assassino tenha se identificado com você.

—Talvez ele esteja preparando o terreno – conjecturou enquanto olhava profundamente para Hannibal. – Procurando um bode expiatório.

~x~

Sherlock Holmes era habituado a estar sozinho e também a ser solitário, porém aquele era um tipo totalmente diferente de solidão. Exceto por seu irmão, ninguém sabia onde ele estava e também não possuíam meios para contatá-lo. Via-se em uma situação onde era necessário reconstruir a rotina e acostumar-se a muitas coisas novas, isso o perturbava.

Estava profundamente entediado, sentia falta da pulsação acelerada causada por um jogo de presas e caçadores. Alguns que participaram da trama com ele tentaram atraí-lo para desafio, mas isso só acontecera – Jim Moriarty só acontecera – porque ele já havia apostado fichas antes.

Mycroft não poderia esperar que ele ficasse dócil naquele lugar como um animal adestrado. Não, isso não era do feitio de Sherlock Holmes de forma alguma.


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Notas finais do capítulo

Espero que ainda estejam por aqui e, se estiverem, me contem do que acharam (se precisarem de ajuda p refrescar a memória também, é o mínimo que posso fazer).
Milhões de beijos!