Todos nós temos dentro de nós mesmos, de uma forma ou de outra, algo de louco em potencial.

Bram Stoker.

Baltimore - Maryland

-Li o que aquela jornalista... Freddie Lounds? - fez um meneio de cabeça, aguardando confirmação e prosseguiu quando a teve - Enfim, li o que ela publicou sobre Will Graham. "Você não deveria irritar alguém cujo trabalho é pensar como um assassino". Sr. Crawford, preciso que entenda, algo muito similar já foi dito por mim para o ex-parceiro de investigações - proferiu o título com escárnio - de Sherlock Holmes. Eu o alertei de que um dia Sherlock não estaria satisfeito em meramente analisar os cadáveres deixados por um assassino qualquer... Não, ele precisa de adrenalina circulando em suas veias.

A mulher sentava-se na poltrona em frente a Jack Crawford com uma postura retesada. Somente a mesa meticulosamente organizada do escritório os separavam e ela encurtou essa distancia ao empertigar-se, inclinando-se para a frente, apoiando as mãos espalmadas na superfície da mesa.

-Eles são as duas facetas de um crime. Um é a caça, outro o caçador. No entanto, de onde os observamos agora, não podemos discernir qual é qual - argumentou com um tom cortante, colocando urgência em cada sílaba pronunciada.

-Sargento Donovan, o que está dizendo é que... - pigarreou, suspirou e reposicionou-se na cadeira antes de retomar a fala - Sr. Holmes e Will Graham estão trabalhando em conjunto?

Sally Donovan, com seus cabelos revoltosos caindo-lhe até os ombros, contorceu o sobrolho.

-Não, de forma alguma. O senhor não percebe? Duas mentes brilhantes ocasionalmente atraem-se. Para eles, todo o resto é simplório, ninguém é capaz de acompanhar o brilhante jogo de xadrez em suas cabeças. O que estou tentando lhe explicar é que um deles é o assassino que o senhor procura e o outro está somente intrigado pelo desafio de um adversário à altura - argumentou - Senhor, não voei de Londres até aqui para lhe trazer alarmes falsos.

O agente do FBI cruzou as mãos e apoiou levemente o rosto nelas, em posição refletiva. Como isso pode não ser minha culpa?, meditou com exaustão. Amaldiçoava o momento em que entrara na classe de Will Graham, porém o que mais deveria ter feito? Pessoas estavam morrendo! Sim, talvez tenha sacrificado a insanidade de Will por justiça aos mortos e prevenção mediante outros assassinatos, mas aquela segunda categoria não parecia estar indo muito bem. Jack sentia-se como alguém que comprara um produto em liquidação e agora via-se tendo gastos imensuráveis para consertá-lo.

Um silêncio taciturno encobria o recinto. Fora Sally quem, mais uma vez, rompera a quietude.

-Não posso dizer muita coisa sobre o Sr. Graham, mas pelo pouco que sei, compreendo que ele precisa de ajuda. E, caso seja nosso assassino, faz parte daqueles que são vítimas de suas próprias mentes. Contudo, quando se trata do grande detetive Sherlock Holmes lhe garanto algo... É puro tédio.

Sua voz possuía uma entonação funesta que quase fez Jack persignar-se.

-O que o senhor pretende fazer? - questionou beligerante.

-Como a senhorita mesmo disse, um está caçando o outro e não consigo pensar em alguém melhor que Will Graham ou Sherlock Holmes para descobrir um assassino, portanto, tudo que podemos fazer é... Observar e aguardar.