Céu & Mar escrita por Luh Castellan


Capítulo 10
Memórias


Notas iniciais do capítulo

Oii o/ Agradeço a Rhaizen, Leticia Braga, Anna e Carol Ferris, por todo o carinho de vocês *---* As vezes eu tô sem um pingo de criatividade, aí eu vou lá e leio seus comentários, é o que me motiva a escrever kkk Agradeço também a todos vocês que leem, acompanham e favoritam o/
Este capítulo foi inspirado na música "Memórias", da diva Pitty.
Bom, chega de enrolação e vamos ao capítulo.
Boa leitura :3



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/596795/chapter/10

Thalia

Enquanto as monitoras assistentes cuidavam dos meus machucados, Quíron e Sr. D alternavam nas broncas, afirmando sobre como aquilo foi uma atitude irresponsável, e que eu poderia ter me machucado feio, entre outras coisas típicas de adulto. Não prestei muita atenção, pois passei a maior parte do tempo revirando os olhos e trocando olhares de tédio com Percy. Acho que ele compartilhava os mesmo pensamentos que eu. No final, não ganhei nenhum castigo. Quíron achou que o tornozelo torcido e os vários cortes pelo meu corpo já serviram de lição suficiente.

Porém, à noite, quando estávamos na fila para pegar bolo de chocolate, o Sr. D apareceu e tomou o meu prato e o de Jackson.

– Sem sobremesa para esses dois - Deu uma risada sarcástica. - Jóqueis profissionais não podem comer muito doce, faz mal na hora das corridas.

E se retirou, nos deixando plantados com cara de paisagem. Cerrei os punhos. Eu odiava aquele velho.


***

Estávamos no meio do jantar, sentados na mesa de sempre. A minha grande proesa com o pinheiro no dia anterior, ainda era o assunto principal dos campistas. Meus amigos conversavam sobre algum assunto aleatório, enquanto eu atacava furiosamente meu filé com fritas e Annie me encarava tentando conter o riso.

– Eu já te contei? - Ela perguntou, depois de levar um guardanapo aos lábios.

Eu já encaminhava mais uma garfada de comida à boca, mas a interrompi na metade do caminho e encarei minha prima.

– O quê? Que você finalmente admitiu gostar de garotas e nutre uma paixão platônica por mim? - Brinquei, com um sorriso sarcástico. - Eu sei que sou irresistível, mas, infelizmente, não posso corresponder, priminha. Eu gosto de um membro que você não tem...

Ela me encarou séria por alguns segundos, depois explodiu em risadas, fazendo-me rir também. As outras pessoas da mesa ficaram nos encarando como se fôssemos doidas.

– Eu sei que você me ama, mas não, nunca vi você desse jeito - Ela torceu o nariz. - O que eu ia contar é que Luke me convidou para assistir aos fogos - Revelou, com uma expressão sonhadora e seus olhos desviaram-se imediatamente para a mesa do rapaz em questão.

– Assistir o quê?? - Indaguei, confusa.

– Os fogos de 4 de julho - Ela revirou os olhos, como se isso explicasse tudo. - Todo ano, eles soltam fogos de artifício na praia para comemorar o feriado. É super lindo e romântico.

– Ah - Voltei a comer, não dando muita importância ao assunto.

– Você vai?

Dei de ombros.

– Você deveria ir com Percy - Ela sugeriu, enquanto remexia na própria comida.

– Não vou com Percy, não tenho nenhum motivo para ir com Percy - Rebati, meio nervosa. - Por que eu iria com Percy?

Annie riu do meu nervosismo.

– Sei lá, calma.

– Estou super calma - Retruquei, escondendo o rosto para ela não notar que eu tinha corado furiosamente.

Ela riu novamente, não acreditando em uma só palavra do que eu disse. Nem eu acreditava.

– Então... Mudando de assunto, você já decidiu como vai se vingar de Clarisse? - Desconversei rapidamente.

– Não... - Ela respondeu, mordendo o lábio. - Você não tinha ficado de ir falar com os Stoll? Conseguiu falar com eles naquele dia?

Minha mente vagueou para os acontecimentos que rolaram no chalé 6 entre eu e Percy, me fazendo ficar escarlate novamente.

– Er... Não - Desviei o olhar para minhas batatas fritas. Elas já não pareciam tão apetitosas.

– Então aonde você se meteu por todo aquele tempo? - Arqueou uma das sobrancelhas.

– Em lugar nenhum - Afirmei, nem um pouco convincente. Sou péssima com mentiras.

– Sei... - Ela me analisou com seus olhos cinzentos, como se fosse capaz de ler até meus segredos mais obscuros.

– Mas eu tenho uma coisa pra te mostrar, vem - A arrastei pelo braço, abandonando o meu jantar remexido e ignorando seus protestos.

O resto dos nossos amigos ficou nos encarando de forma confusa, enquanto eu puxava Annabeth para fora do refeitório.

Depois que chagamos ao nosso chalé, comecei a revirar meu baú, em busca da coisa que eu havia ido procurar.

– O que é, sua maluca? - Ela perguntou.

– Achei! - Vibrei, estendendo-lhe uma mochila vermelha meio surrada. - Abra.

Ela fez uma cara de quem não estava entendendo nada, mas obedeceu à minha ordem.

A loira arregalou os olhos, enquanto analisava o conteúdo da bolsa.

– Uau! - Exclamou. - Aonde você conseguiu isso?

– Com os Stoll - Dei de ombros.

– Mas você disse que não conseguiu falar com eles... - Ela retrucou, ainda fascinada pela mochila.

– Eu disse que não consegui falar com eles naquele dia– Esclareci, de braços cruzados. - E digamos que eu sei barganhar.

Seus olhos brilharam quando ela retirou da bolsa um pequeno pote transparente com um pó dentro.

– Ela estragou a coisa que eu mais gostava - Falou com amargura, referindo-se ao seu livro. - Agora vou estragar algo que ela goste também.

– E isso seria..?

– Minhas fontes me informaram que a senhorita La Rue tá toda animadinha para um encontro com o Cris amanhã, na praia dos fogos - Ela observava o frasco com um sorriso malicioso. - Seria uma pena se esse encontro fosse arruinado misteriosamente...

Entendi aonde ela queria chegar.

– E o que você pretende fazer? - Peguei o pote das mãos dela e fiquei observando o seu conteúdo.

– Pode deixar comigo - Sorriu maliciosamente.

Seu olhar possuía um brilho vingativo nunca antes visto. Agradeci aos deuses por eu não ser o motivo da sua raiva, pois eu não gostaria de estar na pele de Clarisse.


***

– Vamos Thatá - Annabeth implorou pela milésima vez, fazendo beicinho.

– Já disse que não vou - Neguei, me jogando na cama e afundando no colchão macio. - E você sabe que eu odeio esse apelido.

Juníper, Calypso e Rachel já haviam saído para a praia. Estávamos sozinhas no quarto. Annie tentava sem sucesso me convencer a ir tambem, enquanto terminava de retocar a maquiagem. Ela usava uma blusa com os dizeres "I ❤ Books", ensacada numa saia rodada preta, com uma sapatilha de lacinho para completar. Seus cachos loiros estavam amarrados num rabo de cavalo alto e uma bolsinha de franjas pendia ao lado do seu corpo.

– É uma pena - Ela colocou a tampa no batom e virou-se para me encarar. - As cozinheiras fizeram cestas de piquenique especiais para essa ocasião. E tem aqueles docinhos... Como é mesmo o nome? Ah! Bem-casados.

Annabeth me atingiu justo no meu ponto fraco. Sou louca por bem-casados.

– Ei! Isso não vale! - Protestei, já com água na boca.

Ela ignorou meus protestos e continuou com a chantagem.

– Sim, aqueles bem-casados deliciosos que a tiazinha da cozinha faz... E os salgadinhos? Nem te conto dos salgadinhos...

Soltei um gemido de frustração.

– Okay, você venceu - Acabei cedendo.

– Eeeee! - Comemorou, me puxando da cama. - Agora vai se trocar, já!

Peguei uma camiseta qualquer dos Ramones, que combinei com shorts jeans, botas e um bracelete de spikes. Em cinco minutos, eu estava pronta.

Andamos até a praia, que estava apinhada de adolescentes. Muitos já sentados em suas toalhas de piquenique. A grande maioria era composta de casais.

Annie avistou seu loiro preferido, sentado à distância, e quase correu em sua direção, esquecendo-se completamente da minha existência.

Os monitores assistentes estavam distribuindo pequenos kits com uma toalha estampada com a bandeira dos EUA, uma cestinha de piquenique e uma mini bandeirinha. Peguei um e me dirigi para um local mais afastado, quase deserto. Assim, não havia riscos de ser importunada e eu poderia me deliciar com as minhas guloseimas em paz.

Um vento frio soprava do oceano e eu me arrependi de não ter trazido um casaco.

Estendi a toalha no chão, me sentando em seguida e fiquei olhando os movimentos das ondas do mar. Por algum motivo, aquilo me fez lembrar de Percy. Talvez fosse o cheiro de maresia, ou a cor dos seus olhos, ou... Ambos.

Por um raro momento, me permiti divagar sobre ele. Meus pensamentos relacionados a Percy ficavam trancafiados numa caixa na parte mais profunda da minha mente. Raramente, quando não havia ninguém por perto, eu deixava alguns deles escaparem, mas logo em seguida os enterrava de novo. Não sabia ao certo o porquê de agir assim. Mas lá no fundo, eu gostava dele. Não queria admitir para ninguém, nem para mim mesma, mas gostava. Não importava o quão irritante, lerdo, chato, idiota e convencido ele era.

Eu estava tão ocupada com meus devaneios que nem percebi a aproximação de uma pessoa.

– Posso sentar com você? - Uma voz grave indagou, fazendo-me dar um pulo.

O dono dela vestia uma camisa jeans um pouco desabotoada, com as mangas arregaçadas até os cotovelos, de maneira casual. Suas mãos estavam escondidas sob os bolsos da calça preta e vans azul-marinho cobriam seus pés. Um conhecido meio sorriso estampava o seu rosto.

Percy

Depois de um tempo me encarando em silêncio, Thalia enfim respondeu.

– Se eu disser que não, você vai sentar do mesmo jeito - Resmungou e fixou os olhos no horizonte.

Deixei escapar um pequeno riso enquanto me juntava a ela na toalha.

Ela abraçava os joelhos com uma das mãos e com a outra, atacava o que parecia ser docinhos.

O clima estava agradável. Um vento frio com cheiro de mar soprava em meu rosto, brincando com os meus cabelos. Fazia-me lembrar do meu pai e a saudade apertou no meu peito. A luz da lua cheia era suficiente para distinguir tudo com clareza. O céu estava limpo e lindamente estrelado.

Avistei vários casais sentados ao longe, também alguns grupos de amigos. Todos pareciam felizes, rindo, brincando ou se pegando. Não demoraria muito para a queima de fogos começar.

Virei-me para Thalia e a flagrei me observando, com seus intensos olhos da cor do céu. Ela ficou envergonhada e imediatamente tentou disfarçar, direcionando sua atenção para o bracelete de spikes no seu braço.

Um clima desconfortável pairava entre nós, com aquele silêncio constrangedor. Eu sabia que era minha obrigação de quebrá-lo.

– Então... - Comecei, e ela dirigiu sua atenção novamente para mim. - Você sempre foi assim? - Perguntei, gesticulando para o bracelete em seu braço, em seguida para seus cabelos rebeldes.

– Assim como? Uma rebelde sem causa metida a punk? - Ela riu. - A resposta é não. Já fui uma garota "normal", que brincava de Barbie e usava roupas cor-de-rosa - Torceu o nariz.

– Sério? - Indaguei, incrédulo.

Ela assentiu.

– Até os meus 10 anos. Meu pai sempre foi muito ausente, ocupado demais com o trabalho e não dava a mínima pra família - Falou com desgosto. - Já a minha mãe... Foi a pessoa mais maravilhosa que eu conheci. Era carinhosa, atenciosa e um amor de pessoa. Naquela época, eu tinha cabelos longos e lisos, que embaraçavam com facilidade e eu não tinha paciência de pentear. Aí mamãe me colocava no colo e desembaraçava os fios, um por um, enquanto cantava para mim - Sorriu, sonhadora com a lembrança. - Sua voz era tão linda... Até os pássaros paravam para ouvir.

– Como assim, "era"? - Eu não deveria perguntar, mas como sou idiota, perguntei.

Ela hesitou por um instante e eu me arrependi da pergunta imediatamente.

– Um dia, ela recebeu um telefonema anônimo, falando que meu pai a estava traindo - Continuou, meio relutante. - Ela já desconfiava. Zeus chegava muito tarde do trabalho, e tinha saídas misteriosas alegando problemas na empresa. Mas ela achou que era coisa da cabeça dela, até o dia que achou uma mancha de batom na camisa dele. Foi a gota d'água, ela só precisou juntar as peças. Eu era pequena, mas já entendia das coisas. Meu pai saiu para uma "reunião de emergência" e minha mãe seguiu ele. Foi parar numa casa no Brooklin, onde ela descobriu que ele tinha uma amante e um... Filho - Cuspiu a última palavra com nojo e tinha uma expressão de ódio no rosto. - Um tal de Jason, sei lá. Mamãe ficou completamente sem chão e horrorizada. Não deu ouvidos às desculpas esfarrapadas de Zeus e saiu de lá as pressas. Me jogou no banco de trás do seu Civic e disparou pela estrada a toda velocidade, enquanto me contava a história em meio a lágrimas. Não sei para onde ela pretendia ir. A noite estava chuvosa, mal dava para a ver a estrada e os pneus deslizavam no asfalto. Um caminhão surgiu a nossa frente, pela contramão. Na velocidade em que estávamos e com a pista molhada, não deu para desviar - Thalia suava frio e encarava o nada com os olhos arregalados, como se estivesse revivendo a cena. - Nos chocamos de frente com o veículo. O nosso carro virou um maracujá, de tão amassado. Foi um milagre eu ter sobrevivido. Os airbags traseiros me salvaram. Infelizmente, minha mãe não teve a mesma sorte.

Lágrimas surgiram em seus olhos e trilharam um caminho até seu queixo.

Instintivamente, passei meu braço ao redor dos seus ombros e a puxei para perto, consolando-a . Por incrível que pareça, Thalia não me deteve, nem se afastou. Ao invés disso, se aconchegou em meio peito, soluçando.

– Eu... Sinto muito, não deveria ter perguntado... - Me desculpei, acariciando seus cabelos.

– Não sinta - Enxugou as lágrimas, tentando parecer forte. - Eu já superei. O fato é que, depois disso, passei a me vestir de preto, em luto eterno por ela. Cortei meus cabelos bem curtos, em um gesto de "rebeldia". Como eu não tinha minha mãe para penteá-los, não os pentearia nunca mais. Meu pai ficou coberto pela choque e pela culpa. Aquele babaca - Ela retesou-se, cerrando os punhos - Se não fosse por ele, minha mãe não teria... Não teria...

Explodiu em soluços novamente e eu a abracei mais forte, pois não sabia outra forma de ajudá-la. Mas eu queria ajudá-la de todas as maneiras que estivessem em meu alcance, e as que não estivessem também. Eu seria capaz de arrebentar a cara desse tal de Zeus. E, se existisse um deus dos mortos, eu seria capaz de ir falar com ele pessoalmente para trazer de volta a mãe de Thalia.

– Depois do acidente, ele não tinha "condições psicológicas" pra cuidar de mim - Prosseguiu, depois de se acalmar um pouco. - Por isso, me enfiou num internato, ou melhor, inferno no Maine, onde estudo até hoje. E nossa relação tem sido turbulenta, desde então. Eu o visito nos verões, porque não tenho nenhuma outra opção. O meu ódio por ele apaziguou-se um pouco, mas só nos falamos o estritamente necessário. A música foi minha única companheira pra me ajudar a superar tudo isso.

Uma centelha de curiosidade pulsava em minha mente, e eu não me contentei.

– E quanto ao seu irmão? Você chegou a conhecê-lo?

– Zeus tentou fazer "jantares em família" muitas vezes, numa tentativa de nos aproximar, mas eu sempre dava um jeito de estragar tudo. Ao contrário do que eu pensei, meu pai não foi morar com a puta. Só ia visitar o filho as vezes. Quanto ao meu "irmão", nunca tive uma conversa de verdade com ele, só breves momentos de contato. Ele é só alguns meses mais novo que eu, o que leva a entender que esse caso com a amante era bastante antigo. Eu sei que Jason não pediu para nascer e não tem culpa de nada, mas eu passei a associar minha raiva a ele também, de certa forma.

– Ah...

Ela já havia parado de chorar, mas não se afastou de mim. O seu cheiro amadeirado e adocicado estava ali, tão próximo... Parecia um sonho. Meu braço direito envolvia sua cintura. Sua cabeça estava apoiada no meu peito, seus braços enlaçados ao redor do meu corpo.

A queima de fogos começou. Milhares de centelhas coloridas subiam em direção ao céu com um som estridente de apito, seguido por um estouro distante. Os campistas deixaram escapar um "Oh..." de admiração, enquanto pontinhos em tons de vermelho, azul e verde abriram-se num círculo acima do mar.

Thalia levantou a cabeça para me encarar. Eu me perdi na imensidão azulada dos seus olhos.

– Obrigada - Murmurou.

– Pelo quê? - Indaguei, confuso.

– Pelo abraço. E por me ouvir. Eu precisava desabafar... Tirar todo esse peso do meu peito.

– Sem problemas. Mas... Você encharcou toda a minha camisa - Brinquei, com um sorriso maroto.

Ela riu.

– Não acha que eu mereço uma agradecimento melhor? - Perguntei.

– Tipo o quê?

Estávamos tão próximos que nossas respirações se misturavam.

– Tipo isso - Minha mão deslizou por trás da sua nuca, aproximando-nos.

Meus olhos se fecharam quando seus lábios roçaram nos meus. Sua boca tinha um gosto doce, nossas línguas se embalavam em movimentos suaves e ritmados.

Nos beijamos sob um céu multicolorido pelos fogos. Ao som do mar chocando-se contra a praia, misturado às explosões distantes. E o que antes era incerto, agora pulsava com total clareza no meu peito.

Eu a queria. Muito.

Eu a amava. Muito.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí, meu povo? O que acharam?
Por hoje é só...
Até semana que vem o/