Para que toda essa história não pareça completamente estúpida e confusa, é importante que você entenda o contexto. Durante toda a minha vida, nunca precisei fazer muito esforço para conseguir o que queria. Sou filho de um casal de magnatas renomados de New York, mas não é por isso que minha vida sempre foi um mar de rosas. Apesar do luxo, quando em público, eu e minha irmã deveríamos agir como os filhos perfeitos. Inteligentes, gentis, simpáticos. Fazer tudo certo na hora certa, como se tivéssemos um roteiro de conduta. Era sempre assim quando íamos a bailes e festas da alta sociedade nova iorquina. Todos os mínimos detalhes eram calculados e cumpridos com perfeição, dando-nos a imagem de uma família perfeita. Bom, tudo isso até a minha irmã começar a namorar.

No início, ninguém questionava ou ao menos se importava com o fato da pequena Savannah Van der Bilt sempre estar acompanhada. Com o tempo, a relação deles foi ficando mais séria, e eu, quando trazia alguém comigo, era sempre alguma garota diferente. Mas tudo bem, até porque eu sou jovem e só quero me divertir, não é? Noitadas, bebidas e mulheres, tudo o que um herdeiro despreocupado precisa, certo? Errado. Segundo os parâmetros da nossa fofoqueira e intrometida sociedade, eu estava levando a minha vida para um caminho que terminava no fracasso. É claro que os comentários começaram a circular, até que os supostos amigos dos meus pais sussurravam a meu respeito.

— Jude, você precisa começar a pensar no seu futuro. Não apenas na empresa, mas na sua vida pessoal. – Disse meu pai. – Savannah já está começando a traçar seus próprios passos, e está na hora de você começar a fazê-lo. Joseph é uma ótima companhia para sua irmã, de boa família. – Ele piscou para mim. – E, não pensando apenas nas finanças, é claro, mas no seu bem-estar, eu gostaria de... Quero dizer, lembra-se da filha do nosso sócio, Melissa? Bem, ela está solteira e...

Não posso negar que tal oferta foi um choque. Quero dizer, lembro-me muito bem de Melissa Houston, e ela não era nada atraente. Para ser sincero, era a garota mais feia que já tive a infelicidade de conhecer, e eu – modéstia bem a parte – sou praticamente um deus grego.

— Escute, pai, entendo toda a sua preocupação com a imagem que temos, mas não existe nem uma pequena probabilidade, nem mesmo catastrófica ou irregular, que eu, bem, me relacione com ela.

— E posso saber por que não? – Ele se ajeitou em sua cadeira giratória, reclinando um pouco as costas e cruzando os braços.

Juro que congelei por alguns instantes. Não fazia ideia do que responder, afinal “Simplesmente não estou afim” não agradaria a ele. Então, só precisei colocar a minha brilhante mente para funcionar e dar uma resposta que, a primeira vista, seria a solução dessa furada.

— Porque eu estou namorando. – Sorri orgulhoso, esperando que essa conversa tivesse finalmente chegado ao fim.

Ao contrário do que eu pensava, foi com essa frase que eu ferrei com a minha vida.

— Bom, já que é assim. – Ele se mexeu desconfortavelmente. – Quero conhece-la.

Não tive tempo de pensar em uma boa mentira, logo que a porta do escritório de meu pai rangeu ao abrir-se. Por ela, passou uma garota alta, com cabelos castanhos claros e olhos extremamente verdes (devo admitir: incrivelmente gostosa). Ela olhou para mim e sorriu um tanto astuta. Desculpou-se pelo atraso e parou atrás da cadeira que estava ao meu lado. Meu pai fez sinal para que ela sentasse e, depois de passar as mãos nos cabelos e ajeitar a saia, obedeceu-o.

— Não se preocupe, Melissa. Creio que você se lembra do Jude, não é?

Ela sorriu e acenou com a cabeça, colocando uma madeixa de cabelo atrás da orelha. Queria falar com ela, perguntar quando diabos a metamorfose de patinho feio para cisne acontecera e perguntar por que eu não estava por perto, mas tudo o que consegui fazer foi dar um meio sorriso em meio a meus olhos extremamente arregalados.

Fui rudemente tirado de meus devaneios pelo pigarrear de meu pai, que logo soltou seu comentário mordaz.

— Continuando, filho, agora que sei, quando poderei conhecer sua namorada?
Não sei se ainda estava sob o efeito da tontura causada pela mudança de Melissa ou se sou idiota assim mesmo, mas decidi alfinetá-lo também, fodendo mais ainda comigo mesmo:

— Escolha uma data, que ela comparecerá. – Sorri, tentando parecer o mais confiante possível.

#####

Não imaginava que seria tão difícil achar alguém para ser minha falsa amante por uma noite. Bem, não podia sair perguntando por aí ou fazer um leilão, tinha que ser uma garota que se encaixasse, ou melhor, quebrasse o queixo de meus pais. Que eles não a conhecessem, de preferência. Alguém facilmente comprável (não que eu fosse me prostituir, para deixar claro). Dinheiro não é problema, mas tenho mais planos que exigem uma boa grana do que pagar uma vagabunda qualquer para sentar ao meu lado na mesa e segurar minha mão. Mas, caso não pagasse, seria um tipo de favor, não é? E um dos grandes. A não ser que alguém esteja me devendo um. Foi aí que a realidade apareceu e me estapeou, deixando a minha ficha cair. Como é que eu não tinha pensado nisso antes?

Dominique DiNozzo se enquadraria perfeitamente na situação: desconhecida pela minha família e, não sejamos hipócritas, com certeza os impressionaria. O difícil seria convencê-la, mas darei um jeito nisso. Se bem que esse não é o nosso maior problema. Mesmo que ela fosse a minha melhor chance no momento, Dominique é pateticamente insuportável. Desde que nos conhecemos, o ódio é mútuo (e nos conhecemos há um bom tempo). Ela é muito próxima de Megan, uma grande amiga minha. Por isso, sempre que saímos, aquela praga loira está por perto. Porém, como diz o ditado, quem não tem cão, caça com gato.

— Deixe-me ver se eu entendi. Você fez a burrada de fingir que tem uma namorada, e agora precisa de alguém para preencher o papel? – Dominique tomou um gole de seu café e dirigiu o olhar para mim. – Sinceramente, Van der Bilt, não sei o que diabos se passa na sua cabeça, mas você deveria consultar um psiquiatra.

— Exatamente, DiNozzo. Ah, mais um detalhe: você será a minha falsa namorada.

Creio que deveria ter introduzido a minha proposta de uma maneira mais singela, talvez contextualizado, não sei. Só tenho certeza de que, se o fizesse, não teria levado um belo banho de café. Alertei Dominique que ela seria minha acompanhante no exato momento em que ela levava um gole da bebida à boca, cuspindo o conteúdo logo em seguida. Ela tossiu um pouco antes de dirigir a palavra a mim.

— O que?! – Os olhos da loira estavam tão arregalados que, com medo que eles caíssem no meu copo, achei mais prudente afastá-lo. – Por que eu te ajudaria nisso? Não é problema meu, lembra?

— É bem simples. Você me deve um favor. – Assim que a testa dela se franziu, expliquei. – Eu te ajudei quando seu pai e sua madrasta estavam atrás de você, consequentemente você me deve uma. E mais, poderá passar um tempo bem pertinho de mim, e isso já é muito mais do que você merece.

Dominique avaliou a situação, revirando os olhos logo em seguida. Parecia se repreender por estar prestes a aceitar a minha proposta, porém respirou fundo e olhou diretamente nos meus olhos.

— Está bem, eu topo. – Seu rosto mostrava uma carranca amuada, e dava para ouvir seus dentes rangendo.

— Ótimo. – Respondi, apoiando meus cotovelos na mesa. – É o seguinte, meu pai dará uma festa esta noite, para comemorar o aniversário da empresa, e é aí que você entra. Será um jantar extremamente formal, então pelo amor de tudo o que é sagrado, se vista de acordo. – Ela abriu a boca para argumentar, mas ignorei e continuei minha sentença. – Me chame pelo primeiro nome, ok?

— Relaxe, Van der Bilt. Eu sei o que fazer.

— Passo te buscar às 20h. Não se atrase.