Começo do Fim escrita por Portila


Capítulo 4
Capítulo 4 - A Roda Gigante




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Hamon e eu nos entreolhávamos. Buscava direcionar minha visão para qualquer outro lugar que não fosse aqueles olhos cinzas, mas era impossível. O silêncio já estava me incomodando, mas parecia ser a única. Hamon mostrava-se calmo e sereno. Quando eu precisava que Cookie latisse, ele me deixava na mão. Cachorro idiota.

Abri a boca para dizer algo mas vacilei, voltei a fecha-la. Ouvi a porta sendo destrancada. Será que eram aqueles seres destinados a me matar?

Não

Era apenas minha mãe, que agora nos olhava com um ar de braveza e desconfiança.

– Ora, ora, ora. Então é isso que a senhorita fica fazendo quando eu vou ao trabalho? – minha mãe se aproximava empinando o nariz.

Dei um passo para trás e tentei fazer meu coração se acalmar. Mas a vontade de calar minha mãe era maior.

– O que você esta fazendo aqui?

– Eu é quem faço as perguntas aqui, mocinha – ela se aproximou de Hamon com a mão no queixo, o fitando dos pés a cabeça – E quem é você, cabelo de neve?

– Eu sou o guardi... – antes que Hamon falasse bobagem, empurrei-o de leve e me posicionei no meio dos dois.

– Amigo. Digo, Hamon. Meu amigo, mamãe.

– Sei. Aria, você não tem amigos.

Poxa, valeu mãe.

De fato, ela tinha razão. Desde o término dos meus pais deixei de me importar com a escola e, consequentemente, os amigos. Isso nunca fora algo ruim para mim, eu amava ficar sozinha. Sempre lendo um livro ou vendo filmes antigos. A única pessoa para quem eu me abria era... Minha mãe. Ahá! Então era isso: ela estava com ciúmes.

Hamon e ela não paravam de se encarar. Era como se estivessem se desafiando.

– Respondendo sua pergunta, filha – ela voltou os olhares para mim – Hoje eu sai mais cedo do trabalho. Mas, quando o seu amiguinho for embora, eu te explico melhor.

Uau. Rude. Minha mãe nunca fora daquele jeito, talvez algo ruim aconteceu no trabalho, a crise que rolava no país e no mundo estava deixando-a cada vez mais estressada.

– Esta bem, mas eu e Hamon estávamos de saída, não é mesmo? – apertei sua mão e fiz um sinal.

– Por que esta piscando, Aria?

Cristo, precisava ensinar esse anjo a mentir...

Apanhei um casaco e o puxei para fora do apartamento. Não sabia muito bem onde o levaria, mas como aquele era o seu primeiro dia como humano ele teria de vivenciar algumas coisinhas....

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– Pronto! Aqui estamos – eu anunciei sorridente apontando para placa grande com luzes piscantes.

– O que é esse lugar?

– Qual é, Hamon. É um parque de diversões, eu vinha aqui quando tinha uns doze anos.

Agarrei seu braço e o conduzi mostrando todo o local. Ele não parava de perguntar sobre as coisas e cumprimentar estranhos que passavam. Tudo era uma novidade e tudo era maravilhoso. Seus olhos brilhavam a cada passo que dávamos e ao ouvir minhas explicações.

Aquele parque havia sido uma grande parte da minha vida. Lembro que quando me mudei para uma escola nova, todos os dias depois da aula, eu vinha para cá, ansiando comer pipoca e algodão-doce. As vezes, eu encontrava meninas que estudavam na minha sala se divertindo nos brinquedos, mas fingia que não as conheciam. Caso contrário, eu teria de conversar com elas. E como eu detestava qualquer tipo de ser vivo, isso estava fora de cogitação.

– Certo, venha. Vamos neste aqui!

Sentamos no banquinho verde do brinquedo, prendemos o cinto de segurança e nos preparamos. A roda gigante era o meu lugar favorito do parque, era possível observar toda a cidade de Arizona. Se eu não contei até agora, era onde eu vivia.

Quando começamos a subir, Hamon não se mostrou muito impressionado. Foi então que eu lembrei. Ele havia sido um anjo. Estava acostumado com a altura.

– Nossa! Isso aqui vai muito alto. Não é perigoso? – ele perguntou me observando – Digo, pessoas podem morrer. Você pode morrer

– Relaxa, bobo. Não vai acontecer nada – dei um tampinha em seu ombro rígido – Olha só – para provocá-lo destravei o sinto e levantei a barra que nos prendia – Viu só?! Está tudo bem.

Hamon agarrou meus dois punhos com força, porém sem machucar. Abaixou a barra e prendeu o sinto. Me olhou com olhos de raiva e falou extremamente serio.

– Você. Nunca. Mais. Faça. Isso – ele soltou meus braços – Entendeu?!

Senti um formigamento na boca, aquilo havia sido tão... sexy. Mas como eu, Aria, não conseguia manter um clima romântico, abri a boca e comecei a gargalhar.

– Você nunca mais faça isso – repeti zombando

Naquele momento, eu não sei direito explicar o que aconteceu. Hamon empurrou a barra de cima e balançou o banquinho, fazendo-nos girar, e assim, nos deixando de cabeça para baixo. Sentia o sangue escorrendo para cabeça, meus braços tremiam de medo.

– Tá bom, tá bom. M-me desculpa. Eu nunca mais faço isso. Hamon – gritei – Coloca a gente de volta. Agora mesmo.

Dito feito. Voltamos para a posição certa. Agora quem se encontrava rindo era ele. Rindo até demais. Eu queria socá-lo em todos os lugares, e fazê-lo chorar. Eu nunca pedia desculpas, nunca.

Idiota.

Depois da roda gigante, levei Hamon para conhecer a casa dos espelhos. Ele parecia uma criancinha perdida dos pais. Seu sorriso era doce mas seus olhos tinham um certo receio de tudo novo que experimentava.

Na barraquinha de tiro ao alvo, estava afim de mostrar o que sabia fazer. Entretanto, Hamon – que se achava o tal – arrancou de minhas mãos a espingarda e posicionou em seus ombros largos. De lado, espreitou os olhos no buraco da arma, e atirou.

Haviam cinco balas, e todas elas encontraram o centro do alvo.

Idiota.

– Parabéns, senhor! Você pode escolher entre os prêmios acima – anunciou o funcionário da barraca.

– Quero aquele ali – Hamon apontou para um pinguim de pelúcia, e então deu para mim. Naquela hora, toda a raiva que sentia fora embora – Aqui, Aria.

– Ai, isso é tão clichê e meloso – meu rosto ficara vermelho e eu havia gostado, mas meu orgulho era grande, me impossibilitando de admitir que havia achado o pinguim extremamente fofo – Mas, valeu.

– Não! Aria, para de ser tonta. Eu ia falar para você dar pro seu cachorro. Ele não parava de morder o travesseiro – ele saiu sorridente.

Tonta? Aquele anjo/humano havia me chamado de tonta? O que tinha acontecido com sua ama?!

– Ei, escuta aqui. Quem você pensa que é para me chamar assim?!

– O seu guardião – Hamon sorriu sem nem perceber minha braveza – Aria, sinto uma dor na barriga. Está fazendo barulho.

– Isso é fome – revirei os olhos para ele – Vem, vamos ali – o puxei ate a barraca de cachorro-quente.

Durante o lanche, Hamon me contava de como era rigoroso as ordens do céu, e explicava as teorias sobre os quatro cavaleiros que apareceriam no apocalipse: conquista, guerra, fome e morte.

Ele ficara maravilhado com o gosto da comida e de como era quente.

Depois o levei para experimentar algodão-doce e me veio uma frase idiota na cabeça:

– As nuvens devem ser fofas assim

Esta bem. A frase era muito idiota.

Ele me fitou confuso por um momento mas depois caiu na gargalhada.

– Sim, minha ama. É exatamente assim – ele ria segurando a barriga. Saí rancorosa batendo os pés no chão, mas ouvia seus risos atrás de mim.

Anjo idiota. Primeiro dia na terra e já sabia ser irônico.

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– Aria, já são seis horas. Não deveria voltar?

– Mas antes, gostaria de te mostrar um lugar – agora ele iria pagar pelo que fez – Entra comigo. É a mansão mal assombrada, é uma casa de sustos. Você não tem medo, não é mesmo?!

Hamon sorriu desafiador e entrou na frente. Havia um corredor longo e escuro repleto de portas e curvas, essas davam para outros corredores e quartos. Era tudo muito confuso e bagunçado, haviam luzes e gritos fantasmagóricos em todos os cantos. Sentia braços de bonecos e teias falsas de aranhas vindo de encontro com minha pele.

No meio do caminho tentei olhar para trás afim de vislumbrar a reação de Hamon, mas para o meu espanto ele não estava mais lá.

Saí correndo atrás de Hamon. Era sua primeira vez ali, ele poderia ter se perdido ou algo do tipo. Entrei em diversos quartos e virei em todas as curvas. Abri uma porta e dei de cara com vários espelhos. Fitas e cordas caíam nos rostos para dificultar a visão.

Ouvi um estrondo atrás de mim, a porta do cômodo havia se fechado. Fui ate ela e tentei abrir. Trancada. A adrenalina e medo corria por minhas veias. Esbofeteei com força para que alguém escutasse.

– Socorro! Alguém me ajuda.. – uma mão que viera por trás me calou, tapando minha boca. Me debati para me soltar dos braços que me prendiam.

– Sentiu minha falta, Aria?

Chutei as pernas e pude então me pôr à sua frente. Era um homem moreno, careca e na casa dos cinquenta anos. Eu nunca o havia visto em toda a minha vida.

– Esqueceu de mim? – ele fez uma cara triste mas então sorriu perversamente – Talvez se eu beija-la, você se lembre de mim.

O homem se aproximava e suas mãos miravam meu pescoço. Ele tinha os olhos inteiramente pretos, do mesmo jeito que os de David haviam ficado.

– Eu nunca te beijei! Do que está falando?!

– Era eu no restaurante a um mês atrás, Aria! – ele ria e podia sentir seus olhos mirando minha alma – Você parecia estar gostando, até me puxou para mais perto.

Era ele! No corpo de David! Senti nojo e raiva de mim mesma.

Ele situava-se mais perto e não tinha como eu fugir, minhas costas haviam encontrado, fortemente, a parede. Seu rosto agora preso ao meu. Pude sentir a umidade de seus lábios. Queria gritar e pedir ajuda, mas não conseguia. Então, ele parou.

Seus olhos brilharam, uma luz preta forte saía de dentro para fora, como se queimasse sua vista. Ele desabou em cima de mim. Com as mãos em sua barriga o empurrei para o chão.

Os olhos do homem se encontravam queimados, sem os glóbulos oculares, apenas dois buracos negros no rosto. Sua barriga, cheia de sangue, foi o motivo de sujar as minhas mãos.

Olhei para frente, havia outro homem – ofegante – e com uma espada de vidro ensanguentada. Seu rosto mostrava raiva e medo. Vi suor escorrer por suas têmporas. Ele se aproximou de mim e me abraçou.

Meus olhos se encheram de lagrimas.

– Hamon... eu senti tanto medo.

– Calma. Estou aqui agora.


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Notas finais do capítulo

E então?? O que acharam?? Por favor, não esquece de comentar, favoritar e é claro, acompanhar. Agradeço muito, e gostaria de saber a opinião de todos vocês!! bjssss



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