Os dragões existiam quando eu era menino.

Havia os grandes e austeros dragões celestes, que se aninhavam no alto dos rochedos de nossa Ilha como se fossem pássaros gigantescos e assustadores. Havia os dragões pequeninos, marrons, de cauda curta, que perseguiam os ratos e camundongos em bandos bem organizados. Havia os dragões do mar, absurdamente imensos. Mas todos eram incríveis. E todos vivam conosco em paz.

Havia heróis quando eu era garoto. E eu era um deles de alguma forma. Eu era um Encantador de Dragões. Era uma daquelas pessoas que podiam até falar com eles...

E um dia chegará a hora em que heróis voltarão a ser necessários. Porque um herói é eterno. Um dia chegará a hora em que os dragões voltarão a viver conosco. Porque eles estarão sempre em nossos corações.

Eu sei que isso vai acontecer. Pois há uma lenda e uma profecia. E eu poderei cumpri-la um dia.

E só porque você, caro leitor, nunca viu um dragão, um herói ou vikings loucos e destemidos, não significa necessariamente que eles não existiram. Tenho os meus relatos. Acredite, essa é a verdade.

Coragem.

Você, caro leitor, precisará de muita coragem para continuar lendo essa história. Não culpe a história. Ela deve acontecer. Deve seguir.

Não culpe a história.

Coragem.

Houve sim a Era dos Dragões e eu tive o prazer de tê-la iniciado. Eu um dia mudei o pensamento de todos. Eu treinei um dos dragões mais temidos do mundo. Eu treinei, cuidei e simplesmente virei o melhor amigo (e ele virou o meu irmão) do primeiro e do último Fúria da Noite que já existiu.

Eu sou Soluço Spansitocus Strondus III. Eu sou o líder de Berk.

Berk.

Uma ilha tão guerreira, tão bonita e tão encantadora... A Ilha dos Dragões. Durante anos, desde que eu tinha 15 anos de idade e derrotei o Morte Rubra, a maioria dos dragões veio para Berk.

E a cada ano, mais e mais dragões passaram a morar em Berk e a Ilha transbordava alegria por todos os cantos. Dragões pequenos, grandes, marinhos... As outras tribos e suas ilhas conviviam com o mínimo de dragões possível (mas ainda sim conviviam). Porém nossa ilha era a morada deles...

Berk.

Uma pilha de rochas molhadas onde suas roupas nunca secam (elas estão sempre úmidas: úmidas e secas ou úmidas e molhadas). Ela é tão fria e tão congelante e ao mesmo tempo tão quente e aconchegante...

E a nossa tribo, a Tribo Hooligan é muito mais que um conjunto de clãs vikings. É uma grande e sólida família. E há gerações os Hooligans permanecem firmes e unidos.

Já enfrentamos muitas guerras em nossos caminhos. E em cada uma delas saímos vitoriosos.

Lutamos contra o Morte Rubra pela liberdade dos dragões e também pela união entre os vikings e os dragões. Lutamos contra o Drago (duas vezes!) pela paz no mundo. E já defendemos muitas vezes a nossa Ilha de diversos invasores. E nessas guerras houve reencontros, perdas e pedidos.

Eu reencontrei, após 20 anos, a minha mãe. Valka. Uma bela e doce ruiva. A amante e protetora dos dragões. A minha mãe. E junto com ela descobrimos uma Ilha cheia de curiosos e desconhecidos dragões.

A Ilha do Santuário de Dragões. Era onde ela cuidava deles e onde ela viveu com eles (inclusive com o ex dragão Alpha) durante os 20 anos que se passaram. E esses mesmos dragões também passaram a viver conosco em Berk (com exceção do ex Alpha, que infelizmente morreu em batalha, defendendo a todos nós) com o fim da primeira guerra contra o Drago.

Eu perdi o meu pai, mas logo o reencontrei novamente. Está certo que aparentemente Stoico, o Imenso havia sido morto (pelo Drago, que havia controlado o dócil Banguela). Mas como vocês sabem, ele conseguiu salvar-se: o tiro de plasma (infelizmente do Banguela) atingiu apenas a sua perna, mas com intensidade para diminuir consideravelmente os seus batimentos cardíacos. Além disso, o pano que o cobriu no barco, na cerimônia das flechas, era a prova de fogo.

E houve mais reencontros. O reencontro de Stoico e Valka, os eternos apaixonados, os eternos guerreiros. O reencontro dos meus pais foi realmente um momento mágico. Ficou marcado para sempre em minha memória, as duas vezes que eles olharam nos olhos um do outro e simplesmente sabiam que se amavam.

Pedidos.

Em meio a transformações, amadurecimento e ao tempo que se passou eu devia encontrar um amor. E como dizia o meu pai, um viking deve amar.

Astrid Hofferson. A minha Astrid. A minha loirinha que continua com uma mira incrível com machados. Eu já fiz vários pedidos para ela.

Não sei se sabem, mas o aniversário de 18 anos de alguém é a data mais importante na vida de um viking (pelo menos é há gerações em nossa tribo). Significa que você cresceu, que já é responsável e que também já é um adulto.

Mas eu sinceramente não concordo com isso. O Melequento e os gêmeos continuam os mesmo sem noção, não mudaram nada (quem disse que eles são responsáveis? Eles ainda podem destruir a vila em segundos) desde os seus dez anos de idade, fazer o quê?

Bom, eu pedi a Astrid em namoro em seu aniversário de 18 anos, no banquete de comemoração. Está certo que em todos os aniversários, de cada um, há um banquete para comemorar. Mas o de 18 anos é realmente especial.

Foi um momento mágico quando a pedi em namoro. A Astrid ficou bem surpresa com o pedido, mas também muito feliz. E eu mais ainda. Nós namoramos durante muito tempo e cada vez nos amávamos mais.

E então, finalmente, quando tínhamos 21 anos eu a pedi em casamento (ou melhor: foi quando eu tomei coragem para fazer o pedido de casamento).

Mas é claro que não poderia ser um pedido qualquer... Eu sou um viking aventureiro, louco e um treinador de dragões (naquela época só treinador). O meu pedido foi nas nuvens... Com direito ao mais bonito pôr do sol do mundo inteiro. E uma guerra iminente. E ela aceitou...

E como vencemos aquela guerra, como conquistamos a paz, eu e a Astrid nos casamos. Tínhamos 22 anos. Eu pedi a ela que ficasse comigo para sempre e que me amasse pela eternidade. E ela aceitou e faz isso de bom grado...

Nós dois tivemos quatro filhos. Mas apenas os mais velhos (Einar e Ágda) conviveram com os dragões. Treinaram dragões. Amaram os dragões. Kaira e Erick, que hoje são tão pequenos ainda, nunca viram um dragão em sua vida.

Apenas escutaram as histórias contadas em volta da fogueira ou no Snoggeltog e viram figuras em livros da nossa Biblioteca.

Felizmente hoje temos Bibliotecas na nossa vila. Quando meu pai ainda era apenas uma criança, os vikings eram muito radicais. Eles achavam que deviam manter a sua “vikindade” natural. E que essa vikindade era nunca tomar banho, ser rudes com os outros, gritar seis de cinco palavras ditas e ser totalmente sem nenhuma cultura (em outras palavras, serem burros. Isso é sério: havia aulas de desalfabetização e descortesia avançada. Aula para desaprender a ler e escrever e de como gritar e ser rudes com os outros... Vai entender...).

Mas felizmente os vikings enxergaram que gritar com os outros e não saber ler ou escrever o próprio nome não era um jeito muito agradável de viver.

Então, houve uma mudança drástica na nossa vikindade, no jeito de pensar de todos. Passamos a aprender a ler e escrever e falar educadamente com as pessoas (na maioria das vezes...).

E pelo menos isso nós pudemos deixar para a geração futura... O Livro dos Dragões que eu completei com os pilotos que continham a maneira de treiná-los e com a característica de cada dragão que já pudemos ver e estudar. Tudo que vivemos com os dragões estavam em palavras que todos podem hoje buscar...

Até hoje vemos pessoas olhando para o céu e esperando a volta dos dragões. Olhando pássaros na esperança de ser o seu “animal de estimação” voltando ao seu lar.

Eu também espero o meu dragão voltar. O doce Banguela. O meu Fúria da Noite. Éramos tão apegados um ao outro e tão loucos juntos. Queria ter a oportunidade de dizer a ele tudo o que eu sinto até hoje pelo meu dragão Alpha. Eu espero que onde ele esteja se lembre de mim ainda e sinta vontade de voltar para o seu mestre...

E agora eu volto ao tempo... E você pode acompanhar-me se quiser.

Volto a quando eu tinha 34 anos, há dez anos. Quando ainda tínhamos os dragões nos mares e colinas de Berk. As Ilhas vizinhas eram repletas de dragões de variadas espécies e eu me aventurava pelos céus do Arquipélago Barbárico.

Volto ao tempo dos heróis vikings e quando Berk era ainda mais feliz. No tempo das corridas de dragões, das ovelhas voadoras e da busca pela ovelha negra.

Eu queria apenas voltar a Era dos Dragões...

Olho para trás, para o menino-que-eu-era e que não sabia o que ainda estava por vir.

Será que ele conseguirá salvar os dragões no fim? Anseio poder ajuda-lo.

Quero ultrapassar o abismo do espaço, das estrelas e do tempo e segurar sua mão para ajuda-lo a enfrentar tudo isso.

Mas por mais alto que eu grite o garoto-que-eu-fui-um-dia não conseguirá ouvir-me...