Oceano escrita por Mateu Jordan


Capítulo 5
Humanos não tem asas




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Depois do sorvete nós fomos em direção a nosso hotel, e finalmente dormimos. Dormimos os quatro por horas até que acordamos, nos arrumamos e fomos jantar em um restaurante em frente à praia de Santa Monica, na orla. O jantar foi ótimo e depois caminhamos na areia, meu pai e minha mãe em um momento bem romântico e eu disse para Logan deixá-los aproveitarem o momento.

Já era de madrugada quando fomos para a casa e dormimos novamente. Meu pai, minha mãe e Logan dormiram pelo menos. Eu não. Eu fiquei pensando naquela silhueta das asas que vi ontem no bosque do parque. Eu ainda conseguia sentir resquício da excitação que senti quando vi-las. Eu precisava procurar novamente. Eu precisava dessa aventura.

Sei que dormi depois de algum tempo e acordei com o barulho de Logan rindo. Olhei-o com mal humor, pois não existe coisa pior que ser acordada por gritos ou risadas súbitas. Mas depois olhei-o novamente e percebi o quando eu gostava de vê-lo rindo. Meu pai entrou no nosso quarto e percebi o porquê das risadas de Logan. Meu pai estava vestindo sua camiseta florida e com o rosto todo vermelho devido ao sol de ontem, e hoje estava pior, ele estava com partes brancas no rosto por causa do protetor solar.

Eu me virei de rir por caso daquilo, e eu e Logan agora riamos juntos. Minha mãe veio para ver o que havia acontecido. Ao ver o rosto do meu pai, ela também riu e colocou protetor solar no nariz do papai. Rimos mais ainda, e depois de tanto barulho, levantei e fui me arrumar.

Hoje coloquei uma roupa bem mais fresca do que eu estava ontem, uma blusa branca sem mangas e com um tecido gostoso e fino e um short azul claro desfiado nas pontas, com meus óculos pretos nos olhos. Eu estava feliz, hoje eu sorria bastante. Tinha certeza de que veria algo sobre as asas de ontem hoje de novo, e voltaria mais feliz ainda.

Fomos para a praia, e chegando lá peguei meu livro e fui para aquele parque pouco movimentado. Mamãe havia concordado em me deixar ler lá e papai adorou a ideia. Eu fiquei muito feliz por eles terem confiado em mim também.

Chegando lá fui para a mesma árvore em que fiquei ontem. Encostei e abri o livro. Logo de cara já fiquei interessada na história e deixei que os fatos ao redor de mim ocorressem no tempo certo. Se eu ouvisse alguma coisa farfalhar, quer dizer que eu não estava louca ontem...

E então eu ouvi o mesmo barulho de braços batendo nas folhas das árvores. Sorri, mas não tirei os olhos do livro. Eu queria que a coisa – ou pessoa, ou qualquer ser da Terra – que fosse aquilo se aproximasse de mim, então fingi que não escutei nada.

Quando ouvi o mesmo barulho de novo ele parecia mais próximo, mas ainda assim eu não virei para ver. Depois ouvi de novo e de novo e só na quarta vez eu virei para o lado direito, que foi onde eu ouvi nitidamente o som das asas.

Nada. Absolutamente nada.

Me perguntei porque achava aquilo tão interessante, e porque eu não tinha nem um pouco de medo. Não sei responder o porquê, mas algo dentro de mim me disse para seguir aquele som e tentar descobrir o que quer que seja.

Quando me cansei de ler, virei ao redor e andei um pouco por entre as árvores tentando descobrir de onde vem, ou quem fez aqueles sons e de quem eram as asas. Me decepcionei também. Não descobri nada. Nada mesmo.

Voltei para a praia, onde passei o dia todo olhando para o mar cristalino à luz do sol. Fiquei vendo o pôr do sol da cadeira de praia e fiquei ainda mais maravilhada. Meu coração agradecia tanto por aquele momento de paz e beleza que eu seria eternamente grata ao gerente do meu pai, por ter nos dado essa viagem. E por um momento eu percebi: nem mesmo a água poderia me molhar.

O outro dia foi a mesma coisa. Peguei meu habitual Orgulho e Preconceito e segui para o bosque. Sentei no mesmo local onde sentei nos dois últimos dias e ouvi os mesmos barulhos de asas batendo nas folhas, mas sempre que eu virava para ver, não havia nada. Nem mesmo a silhueta das asas como na primeira vez. Cada dia que ia passando, minha decepção aumentava, e o entusiasmo diminuía.

No quarto dia fiz as mesmas coisas. Fui seguindo o mesmo procedimento, mas não sabia se ainda tinha alguma esperança de encontrar algum anjo ou coisa parecida. Eu estava viajando.

Agora no quarto dia, já estava com a ideia de que eu vira algum bicho que no escuro parecia ter asas e que eu estava nutrindo algo que não existia. Como se um anjo fosse aparecer para mim e dizer que eu estava curada do trauma. É quase a mesma coisa que querer fazer uma negociação com tubarões. Uma perna para cada um.

Segui lendo meu livro que já estava na reta final. Sorri ao perceber isso. E sorri ainda mais pois amanhã iria ser meu aniversário e eu poderia escolher o presente que quisesse.

As letras pareciam correr pela página em direção aos meus olhos, pois cada vez que eu lia mais, mais rápido o livro parecia estar acabando acabar. A história depois que você começa a entrar e conhecer os personagens, se torna tão legal e interessante...

Ouço o farfalhar comum, que agora já estou me acostumando. Sorrio pensando em o que deve ser. Um esquilo? Um coelho? Ou um anjo curador de traumas? A última opção com certeza estava fora de cogitação.

Mais uma vez ouvi o barulho. Dessa vez muito mais rápido que nos dias anteriores. E mais uma vez.

Meu coração agora está palpitando fortemente. Acho que ele estava reconhecendo algo...

Ouvi pela terceira vez e dessa vez ouvi passos correndo em minha direção do lado esquerdo. Os passos aumentaram, e aumentaram e eu precisava virar o rosto antes do meu fraco coração corajoso sair pela boca, e quando eu olho na direção dos passos... nada. Não consigo ver nada.

Olho para o livro novamente e agora sei que preciso ir embora dali. Não vou mais voltar para aquele lugar. Com certeza os animais daqui são algum tipo de mini demônios que gostam de acabar com o nosso curto tempo de descanso.

Psiu.

Ouço isso pela primeira vez, e parece ter vindo do bosque adentro.

Olho para frente e tenho certeza de que não foi nenhuma pessoa que está lá no parque, perto do lago dando comida para os gansos e derretendo na forte luz solar.

Não há ninguém caminhando aqui.

Psiu.

De novo. Com certeza isso não foi um esquilo ou um coelho.

Psiu.

Dessa vez viro para o mesmo lado em que ouvi os passos e ao longe vejo a silhueta de alguém. Quem quer que seja está com o corpo escondido atrás de alguma árvore e só uma mão para fora. Só uma mão para a luz do sol.

E essa mão me chama. Ela está fazendo movimentos indicando que eu me aproxime.

Psiu.

Tenho certeza que foi a mesma coisa de antes.

Por um momento acho que meu coração já se foi e só tenho um martelo batendo fortemente no meu tórax. Mas quando coloco a mão para fazê-lo silenciar, sinto que parece muito com um coração normal. Isso é adrenalina pura, para mim.

Começo a caminhar na direção da mão e por algum motivo não sinto medo de novo. Só excitação e eu lanço um meio sorriso para mim mesmo. É hoje que volto para a casa com uma aventura na ponta da língua.

Chego a menos de um metro da coisa que está ali escondida e ela parece não querer se relevar. Eu tento semicerrar os olhos, ou aproximar mais a cabeça para tentar ver nitidamente, ou distinguir quem é, ou o que é, mas tudo o que eu vejo é uma silhueta escura se escondendo atrás de uma árvore.

Ouço o mesmo farfalhar de antes, mas agora muito mais próximo e nítido. Sei que aquele na minha frente era a mesma coisa que estava me observando esses quatro dias. Não faço ideia do que seja. Ou de quem seja.

– Olá Leona – Uma voz vinda da direção da coisa fala. Se parece tanto com um humano que uma parte da tensão se esvai de mim – Me acompanhe, por favor – Mas então algo volta à tona em minha mente, junto com a tensão. Humanos não tem asas.


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Notas finais do capítulo

[LEIAM DEPOIS QUE TERMINAREM O CAPÍTULO]

Olá leitores, não quero que formem opiniões ainda sobre qual o tema principal da história. O tema principal não é sobre anjos, mas colocar "algo que se pareça com um" nessa parte da história foi essencial. A história ainda tem como tema principal seres aquáticos. Obrigado.



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