No final da estrada escrita por Carolina Carvalho


Capítulo 2
Dois




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Lauren gelou. Não podia ser verdade. Ela era jovem, tinha a vida inteira pela frente. Pelo menos, era o que pensava. Com dificuldade, conseguiu abrir a boca:

– E-eu tô com câncer? – gaguejou.

– Não dá pra saber se é câncer ainda – o médico disse. – É necessário fazer uma biopsia pra confirmar. Por isso, você precisa voltar aqui na segunda à tarde. – Ele começou a mexer em algumas fichas. – Três horas é um bom horário pra você?

A loira quase confirmou quando rapidamente se lembrou do seu estágio.

– Não dá. Quer dizer, eu trabalho...

– Peça um dia de folga. Tenho certeza que seu chefe vai entender. Lauren – ele olhou no fundo dos olhos da moça -, agora é a hora de colocar a sua saúde acima de qualquer coisa.

Ela assentiu com a cabeça, incapaz de pronunciar qualquer palavra.

– Ah, é – o médico disse de repente. – Você precisa vir com um guardião.

– Guardião?

– É. Alguém de sua confiança, pode ser alguém da sua família. Você tem algum parente aqui na França? – ele perguntou pois já tinha notado seu sotaque.

– Não. Minha família toda mora na Inglaterra. – Ela pensou um pouco. – Posso trazer a minha amiga que está aí fora?

– Você confia nela? Contaria pra ela sobre isso?

– Sim.

– Então estejam aqui na segunda às três da tarde. Tente não se atrasar, Lauren, é importante.

A loira assentiu e saiu da sala. O médico a acompanhou até a outra sala em que Leigh se encontrava, se despediu e deixou os dois a sós.

– Tá tudo bem? – Leigh perguntou percebendo a tensão de Lauren.

– Tá sim – mentiu a loira. – Só estou cansada, quero ir pra casa logo. Cadê a Rosa?

– Vomitando de novo – ele disse rindo de leve. – O que o médico queria com você?

– Ah – ela tentou pensar em uma resposta rápida. – Não era nada. Ele me confundiu com outra paciente, só isso.

– Ah.

Logo, um silêncio constrangedor se instalou entre eles. Pouco se conheciam para falar de algo. Mesmo assim, Leigh, se sentindo desconfortável com a situação, resolveu quebrar o gelo:

– Então... Você gosta de Oasis, né?

– É – ela respondeu sem entusiasmo. Não estava com vontade de conversar.

– Wonderwall é uma clássica – ele insistiu. – Mas gosto mais de Don’t Go Away.

– Também gosto dessa.

– Você parece ter bom gosto pra música. Já ouviu falar de uma banda chamada Thriving Ivory?

– Não.

Leigh pegou o celular do bolso, os fones de ouvido e os conectou. Começou a mexer no aparelho e depois ofereceu um dos fones a Lauren. Ela o pegou enquanto Leigh colocava o outro. A música tinha uma melodia gostosa e uma letra bonita. Entretanto, quando chegou o refrão, ela ficou um pouco mais agitada e a letra entristeceu um pouco a jovem.

– Não me diga se estou morrendo – cantarolou Leigh baixinho – porque eu não quero saber. Se eu não posso ver o Sol, talvez eu deva ir embora. Não me acorde porque estou sonhando com anjos na Lua, onde todos que você conhece nunca vão embora muito cedo...

Lauren parou pra pensar em toda a sua vida enquanto ouvia a música. Sua infância, sua adolescência e, agora, o início da sua fase adulta. Talvez ela ainda fosse viver muito mais. Talvez não. Talvez aquilo fosse um aviso de que ela deveria aproveitar mais os momentos. Sempre viveu planejando o futuro, deixando as coisas pra depois, para quando ela tivesse “mais tempo”. Esse “mais tempo” poderia não chegar.

– Gostou? – Leigh perguntou quando a música acabou.

– Gostei – ela respondeu. – Como é mesmo o nome da banda?

– Thriving Ivory. A música se chama Angels on the Moon.

O rapaz mostrou mais algumas bandas que ele gostava e ambos descobriram que tinham um gosto musical muito parecido. A conversa só foi interrompida com a chegada de Rosalya que parecia um zumbi.

– É sério, eu nunca mais vou beber.

– Vai morder a língua – disse Leigh.

– Podemos ir? – perguntou Lauren.

– Sim, mas vamos ter que ir de táxi – respondeu Leigh. – Já liguei pro seguro e eles já rebocaram meu carro. Foi uma batida de nada mas prefiro levar ele na oficina amanhã.

As garotas assentiram e logo Lauren chamou um táxi. Por causa do horário, ele acabou demorando. Quando a loira chegou em casa, tomou um banho rápido, colocou seu pijama, deitou mas não conseguiu dormir. Não tinha condições de relaxar. Ainda teria o final de semana inteiro para saber se realmente estava doente ou não. E precisava falar com Rosalya sobre isso. Precisava estudar. Precisava terminar o trabalho pra segunda. Precisava falar com seu chefe sobre o dia de folga. Precisava fazer tanta coisa e estava tão preocupada que demorou pelos menos uma hora para pegar no sono.

#

Lauren dormiu praticamente o sábado inteiro. Só conseguiu terminar o trabalho que deveria entregar segunda. Quando recebeu uma mensagem de Castiel convidando-a para assistir um show de sua banda, ela se desanimou. Não estava com vontade de sair. Queria se trancar em casa para sempre.

O domingo logo chegou e a loira resolveu estudar. No entanto, não conseguia se concentrar. Ficou olhando para o celular um tempinho antes de tomar coragem de mandar uma mensagem para Rosalya pedindo para ela ir até a sua casa. “n da. tenho q estudar” foi a resposta que Lauren obteve. Insistiu: “eu to estudando, vem aqui pra casa. preciso falar cntg”

Em menos de meia hora a loira ouviu a porta se abrir. Era Rosalya. A platinada tinha uma cópia da chave da casa de Lauren uma vez que as duas eram tão próximas.

– Então – Rosalya disse ao entrar no quarto em que se encontrava Lauren. -, o que você tem de falar que seja tão sério assim?

– Como você sabe que é sério?

– Se não fosse, você teria me dito por mensagem e não pedido pra eu vir aqui. – Ela olhou as apostilas da outra em cima da escrivaninha. – Você tá realmente estudando? Achei que tivesse dito aquilo só pra me encorajar a vir aqui. De qualquer forma, eu trouxe minhas apostilas também.

Rosalya se sentou na cama e começou a pegar um monte de livros e cadernos e a colocá-los em um canto. Depois disso, encarou Lauren.

– Desembucha.

A outra respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas para dizer.

– Você se lembra de quando a gente tava no hospital e aquele médico veio me chamar?

– Leigh disse que ele tinha te chamado por engano.

– Bom, não, não chamou. Eu disse aquilo porque eu não queria que ele soubesse.

Rosalya agora tinha uma expressão preocupada – Soubesse o que?

– Ele... Ele encontrou um tumor em mim.

A platinada arregalou os olhos. Piscou algumas vezes antes de falar:

– Um tumor? Como assim, um tumor?

– Eu não sei. Quer dizer, ele disse que eu teria que voltar lá amanhã pra fazer um outro exame pra confirmar se é câncer ou não. E pediu, também, pra eu levar uma pessoa comigo. Daí eu pensei em você.

Rosalya estava choque. Não conseguia pronunciar uma palavra sequer. Apenas encarava a amiga à sua frente.

– Rosa, – a outra chegou mais perto - você vai comigo, não é? Por favor.

– Claro – ela finalmente conseguiu dizer. – Mas... Não, não é nada. Você é nova, deve ser outra coisa.

– Pode ser. Mas e se não for? – Lauren disse apreensiva com a possibilidade.

– Você tem que pensar positivo – Rosalya disse e se levantou da cama. – Vamos mudar de assunto, tá bem? Só... Que horas a gente tem que ir?

– Nós temos que estar lá às três.

– Três, tá... – a outra disse enquanto pensava. – Eu tenho estágio nesse horário mas posso pedir uma folga, não faz mal... É, vai dar.

Rosalya saiu do quarto e foi até a cozinha. Começou a abrir a geladeira e todos os armários.

– Lauren, você não tem comida nessa casa, não?

A loira não respondeu. Continuou sentada no quarto encarando o nada.

– Achei pipoca! – gritou a platinada da cozinha. – Eu trouxe uma barra de chocolate, a gente podia derretê-la e colocar em cima, que que você acha?

Lauren continuou calada. Não estava com fome. Preferiu ficar ali quieta ouvindo o silêncio do que fazer qualquer outra coisa. Quando se deu conta, já havia se passado uns cinco minutos desde que Rosalya falou sobre a tal pipoca. A loira viu a barra de chocolate dentro da bolsa aberta da outra e resolveu ir procurá-la. Ao chegar à cozinha, a encontrou sentada numa cadeira com uma das mãos tampando a boca. Os olhos estavam vermelhos de tanto chorar e ela soluçava baixinho.

– Rosa! – Lauren exclamou.

– D-desculpa, Lauren... – Rosalya disse entre o choro.

Lauren abraçou a amiga bem forte. As duas ficaram assim durante um bom tempo. Algumas lágrimas também rolaram pelo rosto de Lauren que rapidamente tentou escondê-las.

– E-eu não d-deveria estar chorando... – soluçou Rosalya. – P-pode dar negativo, não é?

Mesmo descrente, Lauren respondeu:

– Pode, pode sim.


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