Ore no Goshujin-sama escrita por Assa-chan


Capítulo 16
A festa de Natal


Notas iniciais do capítulo

Uma boa possibilidade para um acerto de contas.



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(Sakura's POV)

 

Aquela noite prometia ser uma das piores de minha vida.

 

A roupa que eu estava usando foi o presente de natal dado-me por meu pai especialmente para tal ocasião. O vestido impedia grande parte de meus movimentos, o cinto estava apertado e os sapatos além de machucarem meus pés de forma malditamente torturante, ainda eram tão altos que a cada passo eu tinha a impressão que acabaria caindo de cara no chão.

 

Minhas pernas tremeram quando meu pé tocou o carpete em cashmere do grande sagão de entrada da mansão Daidouji. Minha mente continuava a repetir que eu não deveria estar ali, no mesmo recinto em que contumávamos brincar quando pequenas, correndo como loucas até que algum dos mordomos não nos dissesse que era a hora do chá.

 

Olhei para Syaoran, procurando por um pouco de conforto. O rosto calmo e bonito dele parecia ter um brilho diferente sob a luz do lustre pendurado sobre nossas cabeças. Ele ficava muito bem com aquele terno negro e a gravata borboleta roxa. E pelo comportamento pólido - bem diferente do meu, que era tímido e desajeitado -, pude deduzir que nada daquilo era novidade pra ele. Observei à minha volta, notando que todos os nossos companheiros de escola também tinham vindo, com excessão de somente alguns deles. Acho que ao todo chegavam a 90 convidados. Suspirei pesadamente, sentindo a sensação de desconforto aumentar. Algo daria errado. Eu tinha absolutamente certeza.

 

- O que foi, Sakura? - meu acompanhante demandou. Voltei a fita-lo, sem me preocupar em mudar meu semblante desanimado para um mais alegre. Ele sabia que eu não queria estar ali, portanto não via razão alguma para fingir uma felicidade inexistente.

 

- Eu não gosto desse tipo de coisa. - respondi, sincera. - Acho que vou passar o resto da festa sentada perto da mesa de petiscos engordando.

 

- Eu li no panfleto que teremos muitas atrações e que cada um de nós vai receber uma lembrancinha. Fora que vamos receber um numero com a posição de nossas mesas. - tentou me animar, enquanto seguíamos o resto dos convidados através do majestoso corredor. - Nem se preocupe... Com certeza vai se divertir.

 

- Se você diz... - resmunguei, voltando minha atenção à primeira coisa que vi no caminho. Então, sem querer parei de andar. Incrivelmente, à minha direita, algo que eu acreditei nunca mais ver em minha vida estava ali, bem diante de meus olhos. Dei um passo para frente, levantando uma mão para que eu o pudesse tocar. Um livro - denominado 'A luz dos vagalumes'* -, estava apoiado sobre uma coluna de estilo romano cortada pelo meio, usando um apoio em mármore exatamente como esta última para segura-lo de pé. Toquei a capa e deslizei os dedos sobre as letras do titulo, enquanto sentia memorias inundarem minha mente repentinamente.

 

Eu e Tomoyo contumávamos ler aquele livro quase todos os dias, desde quando aprendemos a fazê-lo. A maioria das páginas possuia somente algumas linhas de palavras, completando o resto destas com belíssimos desenhos.

 

Inconscientemente me perguntei por que aquela amizade, tão bela e inocente, teve que acabar. Eu considerava Tomoyo não somente uma amiga e prima, mas também uma irmã e a única pessoa em que poderia confiar. E este foi meu erro, afinal de contas; eu confiei e acreditei em outra pessoa além de mim mesma.

 

Perdida em meus pensamentos, senti alguém tocar meu ombro e voltei-me imediatamente, assustada.

 

- Sakura? - Syaoran indagou surpreso. - O que houve?

 

- Por que?

 

- Seus olhos... Estão lúcidos. Parece até mesmo que vai chorar. - senti minhas pupilas se dilatarem. Olhei à minha volta, e um ou dois casais tinham parado para ver o que se passava. Respirei fundo. Somente lembrar daquilo fazia com que meu sub-cônscio quisesse jogar pra fora o pranto que eu evitei por anos. Não aquele de dor, que eu com o tempo acabei esgotando... Mas aquele de saudades, cujas lágrimas sempre estiveram ali, porém nunca tiveram a chance de sair.

 

- Impressão sua. - desviei o olhar, constrangida.

 

- Vamos. - Syaoran disse. Meus olhos deslizaram de volta para ele, e vi que me estava esponjado seu braço, com um sorriso amigável. - Assim não vai se perder. - Eu não tinha por que negar aquele gesto e rejeita-lo. E, voltando a fitar o olhar âmbar, no momento em que enlacei meu braço ao dele... Percebi que, muito provavelmente, estava cometendo o mesmo erro pela segunda vez. Mas de forma diferente... Talvez até mais pura. Aquele braço forte que me conduzia pelo corredor cheio de boas memorias parecia dissipar meus medos, lembrando-me que ele sempre estaria ali para o que eu precisasse. Sentia que estava me entregando. Entretanto, nem mesmo por um segundo, fui tentada a soltá-lo.

 

E, de certa forma, eu entendia o que aquilo queria dizer.

 

*****

 

- Sakura... Eu... - Syaoran sussurrou, olhando para a nossa mesa e depois para a pequena folha rosa que nos foi dada. Eu cruzei os braços, enquanto continuava a bater o pé contra o chão. - ...Não sei o que dizer.

 

Eu estava claramente irritada. Aquilo não podia ser coincidência. Quero dizer, qual Deus poderia ser tão ruim ao ponto de querer me fazer passar por isto? Por Buda, eu posso ter pecado, mas nunca matei ninguém!

 

- Tudo bem. - murmurei. - Vamos embora então. - estava por me virar e fazer exatamente o que tinha dito, quando a mão de meu acompanhante parou-me, agarrando com força meu pulso.

 

- Sakura, não seja descortês. - ele disse, franzindo o cenho e reprovando minha atitude com o olhar. - Não é como se você estivesse na mesma mesa que ela.

 

- Mas é quase! - exclamei. - "Vai estar comigo e vai ter muita gente. Além do mais, quais são as possibilidades de encontra-la?" - repeti suas palavras, abaixando o tom de voz ao notar que estava chamando atenção de todos novamente. - ...Né? Eu deveria ter previsto isso!

 

- Sakura, pare com essa infantilidade. - ele apertou meu pulso, e eu involuntariamente soltei um pequeno gemido de dor. - Eu não sei o que diabos foi que aconteceu entre vocês, mas se não for me contar nada não poderei medir a gravidade do problema, e também não saberei dizer se toda essa sua frescura é justificada. - eu não respondi nada, pois, por mais que odiasse admitir, Syaoran tinha razão. - Vejo pela sua carinha de criança arrependida e emburrada que entendeu. - comentou, soltando-me. - Venha. Tomoyo não é um bicho de sete cabeças.

 

Eu quis dizer 'eu sei disso', mas as palavras não saíram. Mais uma vez Syaoran estava me arrastando pela casa, mas com uma única diferença; não existiu contato de nenhuma das partes. Parecia que se, por um acaso eu não o seguisse, acabaria ficando sozinha eternamente.

 

O salão de festas, repleto de artigos natalícios por todas as partes - tendo como destaque uma colossal árvore de natal ao centro -, tinha a parte anterior reservada às mesas com 6 cadeiras cada e o bufe estava logo depois. Nossa mesa ficava na primeira fileira, bem de frente para o palco onde estavam alguns instrumentos e um microfone ao meio. Todos os assentos estavam ocupados, com excessão de dois - obviamente aqueles que nos perteciam. E, de costas para nós... Lá estava ela; Tomoyo Daidouji. Eu pude reconhecer os cabelos macios e sedosos a metros de distância. Estaríamos ali, de costas uma para a outra. Eu tinha medo que ela ainda possuísse aquele cheiro de íris que eu gostava, que ela ainda falasse docemente, que minha melhor amiga não tivesse mudado. Bem, este fato me amedrontava muito mais do que enfrenta-la.

 

Nos sentamos, eu algum tempo depois, receosa. Todos na mesa nos saldaram. Eu não conhecia nenhum deles, mas todos souberam dizer nossos nomes. Uma garota chegou a dizer 'Mas vocês não são o famoso casal sadomaso? Sim! A goshujin e o servo!'

 

Tentei levar na esportiva - ignorar e dar um leve sorriso bastaria. Mas eu odiava esses nomes. Nossa relação tinha mudado há tempo, não era nossa culpa se ninguém percebia e os rumores pioravam.

 

Mas... Espera. Qual é a nossa relação, afinal?

 

Olhei-o de esgueira, percebendo que tinha executado a mesma minha resposta, quase como se aquilo fosse automático para ambos. Mas, muito provavelmente, era.

 

Ao ver Tomoyo e Eriol saindo da mesa ao nosso lado e seguindo até o palco, me convenci que aquela não era nem a hora nem o lugar pra resolver tal questão. Os dilemas sobre minha relação com o chinês poderiam esperar.

 

- Boa noite a todos. - a bonita voz invadiu nossas orelhas, calando todas as pessoas que insistiam em conversar entre si. - Sejam bem-vindos à festa de natal do primeiro ano da escola Tsubasa. Eu e Hiiragizawa-san somos os anfitriões por termos idealizado e rendido possível esta noite tão agradável. Bem, passarei a palavra ao meu companheiro. - concluiu, dando um passo para trás, enquanto o rapaz pegava o microfone em mão, acenando levemente para Tomoyo com a cabeça.

 

- Antes de tudo quero agradecer por terem comparecido e principalmente pelo grande numero de pessoas que temos esta noite. - disse, sorrindo polidamente. Syaoran fez uma careta, como se achasse aquilo enjoativo. Soltei um risinho que não passou despercebido por ele, que não entendeu qual era a graça. Bem, não existia, realmente. O fato é que eu gostava daquela personalidade que Syaoran tinha. Ele era leal e respeitoso, mas quando não gostava de alguém simplesmente não conseguia esconder o próprio desgosto, o que chegava a ser hilário algumas vezes.

 

- Bem, este é o programa. Tudo bem? - concluiu Eriol.

 

Não, não está bem!

 

Eu acabei me concentrando tanto nas expressões de Syaoran que até mesmo me esqueci de ouvir o que ele estava dizendo. Olhei-me em volta, vendo as pessoas sentadas nas mesas em volta do salão e aplaudindo alegremente. Tentei seguir a corrente, batendo palmas também.

 

- Syaoran, o que vamos fazer agora? - perguntei, apesar de estar envergonhada.

 

- Hã? - ele franziu a testa, olhando-me de lado. - Não ouviu o que o quatro olhos disse?

 

- Eu estava pensando em outras coisas.

 

- Sei. - arqueou uma sobrancelha, logo suspirando e dando-se por vencido. - Agora vai tocar uma banda. Depois vamos ter uma espécie de karaokê e um jogo de confissões, e, enfim, um pequeno baile.

 

- Ah... - murmurei. Não tinha nem sequer por que responder. Tomoyo e Eriol voltaram aos seus lugares, e as luzes repentinamente se apagaram. Quatro garotos que eu acho que já tinha visto em algum lugar - bem, não sou de seguir tendências ou de assistir TV -, subiram no palco e começaram a tocar. As pessoas gritavam e se levantavam, mas tanto eu quanto Syaoran nos limitamos e nos entre-olhar e bufar.

 

Depois do show, um telão branco decaiu na parede atrás do palco e os instrumentos foram retirados. Era a ora do karaokê. Odeio cantar, principalmente por ter feito algumas aulas no coro com Tomoyo no passado. Me diziam que eu ia bem, mas sempre tive vergonha demais pra fazer algo do tipo.

 

Levantei-me, indo até o bufe. Ainda não tinha comido nada ainda, e meu estômago estava prestes a roncar. Me aproximei da mesa, vendo que tinham contratado algumas pessoas para preparar os pratos durante a festa.

 

- O que vai comer? - escutei a voz de Syaoran vir de trás de mim e me virei levemente.

 

- Eu quero Takoyaki. - respondi, voltando a olhar pro senhor à minha frente. O homem pareceu ter ouvido meu pedido e começou a cozinha-lo.

 

- Hmm. - resmungou, dando um passo para frente e levantando uma mão para que pudesse chamar atenção do funcionario. - Pra mim também, então.

 

- Syaoran, você sente saudades da China?

 

- Por que isso tão de repente?

 

- Não sei. Acho que talvez goste mais das comidas chinesas...

 

- Eu fui criado como um japonês, portanto não posso sentir falta de algo que não faz parte do meu passado.

 

Foi naquele instante que percebi que sabia pouco ou nada sobre Syaoran. Porque tudo sempre foi concentrado em mim. Meus problemas, minha felicidade, meus dilemas... Eu nem ao menos sabia os nomes de suas irmãs ou se tinha mais parentes aqui do que lá. Realmente eu nem ao menos conhecia seus gostos...

 

- Obrigada pela bela musica, Misaki-san! - a voz melodiosa de Tomoyo disse assim que aquela tortura terminou. Se vai cantar, ao menos tenha a descência de fazê-lo direito! - Agora podemos passar à nossa próxima atração: Quem vai ganhar o mais alto 'Quêee?'!? - peguei o meu espetinho de takoyaki e voltei a olhar pro palco, estranhando aquele jogo. - Bem, é muito fácil. Iremos passar o microfone pelo salão procurando pessoas com segredos absurdos - ou não! Quem receber como resposta do resto dos convidados o 'Quêee?' mais sonoro leva pra casa um grandíssimo prêmio surpresa!

 

Franzi a testa, começando a comer. Qual seria a graça?

 

Todos foram convidados a formar um grande circulo perto da árvore de natal, na parte vazia do salão, reservada ào baile que se teria posteriormente. Eu fui praticamente obrigada pelo Li a participar, que puxou meu braço dizendo que seria divertido.

 

O microfone começou a ser passado de mão em mão, e a quinta pessoa - uma garota de óculos vestindo um vestido preto -, o parou, pronta a dizer alguma coisa. Hesitou, apertando-o ainda mais.

 

- Eu... Não sei fazer a tabuada do 4 e do 7. - declarou. - Só consigo calculando-as.

 

- Quêee?! - boa parte das pessoas exclamou. Soltei um risinho. Bem, aquilo era realmente divertido. Quero dizer, não é hilário alguém com cara de nerd não saber a tabuada inteira?

 

O microfone continuou a passar, e os segredos eram bem estranhos e divertidos. Uma garota até mesmo confessou que gostava de um professor. E então, chegou a vez de Syaoran. Ele o pegou em mãos, e seu semblante repentinamente se tornou sério. O salão pareceu se calar, fitando-o. E, do nada, o vi olhando pra mim. Espiei à minha volta, percebendo que era pra mim mesmo que ele tinha se direcionado.

 

"O que diabos está olhando, idiota?", eu quis perguntar, mas acabou ficando somente em pensamento. Aquele olhar, que tinha se tornado dourado por conta da luz clara demais, tinha me paralizado.

 

- Eu... - minha apreensão simplesmente subia. Ele deu um passo para o meu lado, ficando de frente pra mim. Será possível que queria se confessar ali, no meio de todo mundo?! - ...Dei meu primeiro beijo aos 11 anos de idade. - declarou, e eu quase capotei. - Estava correndo para ir pra escola quando esbarrei em um homem de meia-idade e nossos lábios se encostaram.

 

- Quêeeeeeeee?! - todos gritaram, logo começando a rir. Suspirei aliviada, apoiando uma mão sobre o peito.

 

- Ah, mas era isso? Achei que fosse se declarar para a Kinomoto. - escutei alguém dizendo.

 

- Eu também! Deve ser verdade que eles estão saindo, então. - outra voz se intrometeu.

 

- Ehhh? - desta vez era alguém da minha classe. - Claro que não! Sakura-san o trata tão mal, como poderiam? Li-kun deve ter se declarado, mas ela nunca correspondeu e o maltrata!

 

Desviei o olhar, encolhendo-me em meus próprios braços. 'Parem com isso!' minha mente dizia. Mas, de certa forma, tudo aquilo foi culpa minha. Seria mais fácil ficar com o Syaoran do que me rastejar por Yukito. Mas eu não escolhi ama-lo. De repente, interrompendo meus pensamentos, ouvi uma espécie de estrondo vindo das caixas de som, que também silenciou o resto daqueles ali presentes.

 

Olhei para Li, que estava com uma mão apoiada na parte superior do microfone. Muito provavelmente a causa do barulho foi um soco dado por ele ào objeto, o qual foi levado até perto de sua boca. Continuei olhando-o, surpresa. Desta vez não me fitava; parecia reprovar com os olhos todos os convidados.

 

- Hoje é natal, sabem? - começou a falar, recebendo mais uma vez atenção de todos. - Um dia para se passar com a pessoa que ama. Mas... Tanto eu quanto Sakura, estamos aqui como "solteiros". Também porque esta é a nossa realidade. - deu um sorriso quase sincero, mas que muito provavelmente congelou aqueles que estavam falando sobre nós. - Não nos deixa feliz que vocês fiquem julgando. Desculpe por ser chato.

 

Ele me deu o microfone, e eu o passei a outra pessoa, pelo simples fato que não saberia o que dizer. A garota ao meu lado olhou-me como se estivesse desculpando-se, assim como todos os outros. Deus! Quantas vezes mais eu acabaria sendo salva por ele?

 

O jogo prosseguiu de forma alegre, apesar do inconveniente. Quando o giro estava por se cumprir, o microfone decaiu sobre as mãos de Tomoyo. Ela, em meio às conversas paralelas daquele lugar, começou a falar a voz baixa.

 

- Quando eu era pequena... - pouco a pouco todos se voltavam para ouvi-la. Eu sentia que aquilo teria a ver comigo. - Eu tinha uma amiga que eu gostava muito. - sua voz tremeu, mas não parou de sair. - O que eu estou dizendo? - riu tristemente, levantando a cabeça e fitando-me diretamente. Merda... Essa situação de novo. - Ainda gosto dela. Mas eu a machuquei, a fiz sofrer e perder todos seus amigos... Tanto ao ponto que ela chegou a ficar 5 meses sem ir para a escola. Não acham que eu sou horrível?

 

Não houve 'quê?' nenhum. Nada. Com um pouco de esforço seria possível escutar a neve chegando ao chão pro lado de fora.

 

- E... - alguém ousou interromper o silêncio. - Como... Ela se chamava?

 

- Sakura Kinomoto. - respondeu prontamente.

 

Estalei a língua, aborrecida. Saí do meu lugar, caminhando com passos apressados até ela. Segurei seu braço, puxando-a enquanto começava a seguir até a saída mais próxima. Por que começou com isso agora, na frente de todo mundo? Este é um problema meu!

 

Abri e fechei a porta bruscamente, sentindo os olhares sobre mim desaparecerem. Soltei seu braço assim que chegamos no corredor mal iluminado.

 

- Sakura-chan...? - a ouvi dizer. Estava de costas para ela, controlando minha raiva. Eu admirava-a tanto, eu confiei tanto nela...

 

- O que diabos é que quer de mim agora?! - gritei, serrando os punhos.

 

- Você se aborreceu?

 

- Não pode afirmar isso só de me olhar?! - demandei, virando-me para olha-la.

 

Estava chorando. As lágrimas caiam torrencialmente, estragando o rosto bonito. Me machucava a ver daquela forma.

 

- Tomoyo... - me apoiei à parede atrás de mim. - Eu pensei que tivesse dito que me odiava. Por que vem me dizer agora que gosta de mim? Não somos mais amigas!

 

- Eu errei, Sakura-chan... - sua voz estava sendo influenciada pelo choro, tornando-se incerta e fraca. - Eu não quis te machucar. Eu queria te proteger, nada mais...

 

- Fazendo com que todos me odiassem? Que boa amiga! - a raiva estava explodindo dentro de mim. "Droga, droga." eu repetia internamente. Minha previsão para aquela noite acabou se realizando, afinal.

 

- Sakura... Eu te escondi a verdade por todo esse tempo por que você nunca me escutaria!

 

- Pois bem, agora estou aqui, pronta para te escutar. Quero ver qual boa desculpa vai usar pra me persuadir. Perdeu seu brinquedo mais divertido, certo? Aposto que sente saudades.

 

- Não, não! - exclamou, agarrando meus ombros. Os olhos violetas se tornaram negros por conta da escuridão. - Todos que se diziam seus amigos... Eu quis afastá-los de você por que falavam pelas suas costas. Antes de te conhecer eu nunca tive amigos porque sabia que ninguém era verdadeiro. Então... Eu vi aquela garotinha de 5 anos que tinha acabado de perder a mãe. Lembra, em seu enterro, quando nos vimos pela primeiro vez? Sakura, eu quis tanto te proteger por todos aqueles anos que não vi outro meio a não ser garantir que todos ao seu redor não gostassem mais de ti!

 

- Por isso contou meu segredo sobre Yukito. - eu ri. Que desculpa era aquela? Quanto egoista ela podia ser? - Por este motivo mandou sua mãe despedir os pais das crianças que trabalhavam pra ela. E também, 'pra me proteger' disse que qualquer um que quisesse ser meu amigo sofreria. Certo, certo Tomoyo... E então, porque, quando eu achei que só tinha você, decidiu me abandonar também?

 

- Por que eu vi a besteira que tinha feito! - as gotas quentes chegavam até meus sapatos, molhando meu dedos descobertos. - Eu quis consertar... E acabei piorando tudo. Quando eu disse que te odiava, simplesmente desejava que sem mim tudo voltasse ao normal. Mas não funcionou, e você se isolou, não saindo do seu quarto por cinco meses. Sabe quantas vezes fui até sua casa e seu irmão me expulsou por te-la feito chorar?

 

- Por que, Tomoyo? - perguntei, sem saber se queria ouvir uma resposta concreta. - Não poderia ter simplesmente me dito para ficar atenta às pessoas falsas? Por que quis me fazer sofrer tanto?

 

- Por que eu não passava de uma criança possessiva... - ela me soltou, começando a limpar o próprio rosto de forma quase agressiva, esfrengando as costas das mãos contra os olhos humidos. - Eu gostava de te vestir, como uma boneca. Eu gostava de ficar contigo, como uma irmã. Eu gostava de te ver sorrindo, por que era a única amiga que eu tinha. Portanto, quando eu... Por engano ouvi algumas garotas dizendo que falavam com você porque queriam se aproximar de mim... Perdi a cabeça.

 

Não disse nada. Aquilo explicava tudo. Uma amizade arruinada por egoísmo. Abracei-a, vendo-me sem escolhas.

 

- Um dia vai poder me perdoar, Sakura-chan...? - demandou uma, duas... Acabei contando cinco vezes. Não sabia se um dia poderia, mas eu queria, sinceramente.

 

- Eu... Vou tentar. - respondi sinceramente, desfazendo o abraço. - Por que você foi a única amiga que já tive na vida.

 

- Desculpe, de novo. - sussurrou.

 

- Pare de se desculpar. - declarei, abrindo a porta e deixando-a sozinha no corredor escuro. Eu ainda podia escutar os soluços pesados dela do outro lado da porta.

 

Mas, de certa forma, um peso parecia ter deixado minha consciência. Quero dizer, ela fez tudo aquilo por que queria me proteger... Não é idiota?

 

- Syaoran! - exclamei. - Vamos embora. Agora.

 

Ele não fez perguntas, não quis me convencer a ficar. Segurou minha mão e começou a me levar até a porta do outro lado da sala, para que não precisassemos passar por Tomoyo.

 

Eu dependia tanto dele que me sentia em culpa. Mas eu me sentia destruída, desiludida, enganada. E quem mais, além da pessoa que te ama, poderia te confortar?

 

*Eu não sei se este livro existe. Eu tirei do anime "Kobato".


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Notas finais do capítulo

Gzuz, que longo. O maior até agora.



Antes que comecem a reclamar sobre a Tomoyo, o proximo capitulo vai ser um Extra contado por ela sobre o que aconteceu naquela época. E não, isso ainda não acabou. Vai ter ainda algumas coisas sobre a Tomoyo e a Sakura. Vou ver se posto cedo por que não é muito longo e o capitulo 17 está cheio de surpresas e com momentos cruciais!

Obrigada por lerem e acompanharem essa coisa sem pé nem cabeça. XD

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