Gostava tanto de você escrita por Daughter of Zeus


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Oi... espero que gostem ;)



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Júlia, é claro, estava nos esperando na entrada do Chaplin. Eles tinham ido de carro com um cara da nossa sala, que já tinha idade para dirigir. Ele repetiu um ano, era o que diziam.

Ela e Vítor tinham se combinado por telefone, e Júlia, com toda sua boa vontade, explicou para ele como chegar lá. Ela não estava vestida com nenhuma de suas roupas diferentes agora. Só um vestido que tinha decote demais e pano de menos. Não era nada a cara dela, mas a garota ostentava um sorriso gigantesco quando a encontramos, parada com quem eu achava ser o tal garoto do carro lá na frente.

— Mia - ela me abraçou assim que saí do carro - Você está linda - Agradeci e retribuí o elogio. Ela estava mesmo bonita, mas um tipo de bonita que teria feito Irmã Dora lhe dar um sermão sobre a exposição dos "atributos femininos". Até eu estava com menos roupa do que o usual. A saia que estava entre os presentes do meu irmão era a peça mais curta que eu usava desde que podia me lembrar, mas eu me sentia bem. Pela primeira vez sentia que estava vestida à altura das pessoas ao meu redor.

— Se comporte, Amélia - Gritou Vítor lá do carro, já ligando o motor novamente. Mas ele não contava com a astúcia de Júlia. A garota de abaixou antes que o vidro da janela se fechasse completamente, enfiando a cabeça para dentro. Me perguntei ela não tinha medo de ser decepada.

— Por que você não fica também, Vítor? Assim pode... cuidar melhor da Mia - Até eu sentia as segundas intenções em sua voz. Fiquei com medo de Vítor aceitar. Quer dizer, eu até gostava de sua presença, mas não queria ter uma sombra na primeiríssima vez que saía com colegas.

— Ah, não, ainda tenho que trabalhar - recusou ele, para meu alívio - Obrigada pelo convite, Júlia - Ela ficou toda feliz por ele ao menos saber o nome dela. Assim, meu irmão foi embora, e nós entramos no bar.

Eu nem sei o que estava esperando, mas não era aquilo também. Várias mesinhas dispostas em um semicírculo de frente para um palco improvisado, onde uma banda tocava. As pessoas com que estávamos estavam no ponto mais distante da música; bem de frente para o palco. Lá estavam Lucas, Luísa, e mais um tanto de gente cujo o nome não lembrava. Fiquei imaginando como teriam chegado ali, já que o cara do carro (André, Mia, André) era apenas um, e no carro do cara do carro não caberia nem a metade dos jovens ali.

Todos pareciam mais felizes fora da escola. Me cumprimentavam com mais entusiasmo, e estavam todos mais bonitos. Não sei se foi o resultado de algum tempinho se arrumando ou a falta das paredes (originalmente brancas) sujas da escola como paisagem, mas fosse o que fosse havia feito bem a eles. E todos estavam com um copo na mão. Eu nunca tinha bebido nada com álcool (também, de dentro de um orfanato católico, eu tiraria bebida de onde?), mas parecia bom, então pedi um coquetel para mim também. Vítor disse para eu me comportar, mas não disse nada sobre beber... disse?

Percebi que todo aquele pessoal era bem mais legal do que eu imaginava, quando me deixei levar pela conversa bobas e pelas brincadeiras. Depois de algum tempo, a maioria estava um pouco alterada. Não eu. Meu irmão viria me buscar em pouco tempo, não estaria bêbada no fim da minha primeira saída. Além de que, no fim do primeiro drink, meu estômago, desacostumado com essas coisas, já estava reclamando.

Luísa, a menina simpática com jeito de mãezona, estava se agarrando com (André) O Cara do Carro. Ali, em público, engolindo a cabeça um do outro, sem pudor algum.

— Se me permite dizer, o guitarrista está te secando - Disse Lucas, sentando-se ao meu lado.

— Está o que? - Me obriguei a tirar os do casal ao meu lado.

— Te encarando. Sabe, quando você acha uma garota bonita, e fica olhan...

— Ah - interrompi, meio sem jeito - Não acho que seja isso.

— Eu também não acho, não - ele riu, rodando a bebida em seu copo. Respingos caíram em suas mãos, mas ele não se moveu para secá-los - Eu tenho certeza.

Arrisquei um olhar para o cara no palco. Ele estava mesmo olhando. E, quando meu olhar encontrou o seu, em vez de ficar envergonhado e desviar os olhos, como eu faria, deu um sorrisinho, que retribui, apesar de sentir que estava vermelha dos pés a cabeça. Não gostava de chamar atenção. Sempre desejara ser olhada, sonhando dentro das paredes do orfanato, mas, na prática, é algo muito vergonhoso.

— Engano seu - sussurrei para Lucas. Com o barulho que ressoava naquele lugar, escuro e com as paredes de tijolos a vista, ele teve que se inclinar para me ouvir - Ele não deve estar me secando coisa nenhuma. Só deve... ter achado meu cabelo estranho, ou coisa assim.

— Por que diz isso? - Ele franziu as sobrancelhas.

— Porque as pessoas não olham para mim.

— Não sei se isso é desatenção ou inocência, Mia, mas todo mundo olha pra você - revirei os olhos, deixando claro o quanto não acreditava nas suas palavras - Estou falando sério - Mas ele não estava sério. Estava bêbado. Bem bêbado.

Depois disso Lucas ficou em silêncio, bebendo em algo que parecia uma caneca de vidro, balançando a cabeça no ritmo da música. Arrisquei mais alguns olhares para o guitarrista. Ele era até que bonitinho. Não parecia ser mais velho que Vítor, mas era três vezes maior. Não que fosse gordo; gordura era a última coisa que ele teria no corpo, mas era cheio de músculos e tudo mais. Típicos músculos consequentes de suplementos. O cabelo era raspado, e, mesmo daquela distância, pude ver que usava um brinco na orelha esquerda. Suas mãos davam a impressão de ser um tanto grandes e desajeitadas para tocar, mas pareciam estar dando conta do recado muito bem. Todas as vezes que eu o olhei, ele sorriu. Um sorrisinho pequeno, uma leve torcida de lábios, mas me fez questionar se Lucas não tinha razão.

Ele poderia ter me achado bonita... não poderia?

Logo a banda parou de tocar. Faltava menos de quinze minutos para a meia-noite, horário que Vítor prometeu me buscar. Estava me sentindo a Cinderela, mas achara tempo o suficiente na hora. Agora, via que o negócio estava apenas começando ali. Mais gente chegava a todos os momentos, já não havia mais mesas, e, agora que a banda havia parado, um som alto fora colocado para tocar. Corpos suados e sorrisos embriagados se moviam incansavelmente no centro do semicírculo de mesas. Até o ar parecia mais quente.

— Preciso sair - Falei para Lucas, o único, além de mim, que não estava rebolando ou se agarrando com alguém. O ambiente se tornara desagradável para mim. Não gostava se barulho, e, aquelas músicas que julgava sem um pingo de cultura estavam com certeza no volume máximo em todas as várias caixas de som.

— Eu vou com você - Ele se ofereceu.

— Não, não precisa. Meu irmão já está vindo.

— Certeza?

— Absoluta - Sorri.

Não me despedi de mais ninguém, sem querer interromper, e saí para a noite estranhamente fria. Os caras da banda estavam carregando seus instrumentos para uma van, velha e suja, e quando ia saindo do caminho, temendo atrapalhar em alguma coisa, o guitarrista me parou, com um teclado nos braços extremamente musculosos.

— Ei - ele sorriu, desta vez mostrando todos os dentes - Vi você lá dentro "Ô se viu" não parecia algo adequado para responder. "Eu também te vi" também não. Por isso, apenas fiquei quieta, e sorri do modo mais meigo possível. Não queria que interpretasse meu silêncio como falta de educação.

— Olha - o cara continuou - Vou guardar isso aqui e volto para conversarmos, tudo bem? - Ei ei ei, espera aí. Conversar? Que tipo de conversa? E eu colocava a timidez onde? Mas antes que eu pudesse pensar em algo para responder, ele já estava longe. Vi ele colocar o teclado na parte de trás da van atulhada, e, depois de trocar umas palavras com um outro integrante da banda, que deu um tapinha no seu ombro e depois entrou no veículo, voltou até onde eu estava.

Não havia nem mesmo me mexido. Quer dizer, oi?

— Meu nome é Júnior - Ele disse, conduzindo-me para um lugar perto da entrada, onde tinham uns bancos tristemente parecidos com os do jardim do lar. Todos estavam cheios, então acabamos encostados nas grades, no final do corredor, em um lugar meio mal iluminado.

— Amélia - Falei.

— Amélia - Júnior repetiu, lentamente.

— Mia. Me chame de Mia.

— Hein?

— É o meu apelido. Mia.

— Bom, Mia, prazer em conhecê-la - será que ele não se cansava de sorrir? Minhas bochechas estavam começando a doer só de tentar retribuir a simpatia - Quantos anos você tem, Mia?

— Dezessete. Você tem...? - Aquele papo estava estranho. Eu estava com vergonha dele e de puxar assunto. Vítor logo chegaria. Precisava esperar em algum lugar onde ele me encontrasse facilmente.

— Vinte e quatro. Bem mais velho, né?

— Nem tanto - Respondi, olhando em volta discretamente, tentando encontrar o carro brilhantemente preto de meu irmão.

— Talvez não tanto, mesmo - senti a ponta de seus dedos deslizando pelo meu braço direito, o que me fez pular. O que diabos ele...? - Você está com frio? - E me envolveu com seus braços enormes. Tentei me soltar, em vão. O cara era praticamente um urso. Ele tinha cheiro de colônia masculina, álcool e cigarro.

Estava assustada. Nem o conhecia e ele já estava... me agarrando. Empurrei-o novamente, mas, como da outra vez, ele não se moveu um centímetro. Estava presa. E seu rosto cada vez mais perto. Porcaria!, minha mente gritava. Por que as pessoas resolvem me beijar? Vítor, cara que toma bomba, eu não quero ser beijada! Mas lutar contra ele era inútil. Tentando acalmar as batidas do meu coração (que estava acelerado pelo choque, não por aquela coisa boa que aquece, como quando Lucas sorriu para mim no refeitório), resolvi esperar ele me largar. Quer dizer, ele tinha que me soltar, certo?

Minha inocência foi minha perdição, naquele momento. Ele não me soltou. Assimilou meu silêncio como aprovação, e quando vi, sua língua estava em minha boca e uma mão no meu peito. Não era gentil e calmo como Vítor. E eu não queria aquilo. Quanto mais me debatia, mais forte era segurada. Sua mão direita deslizou para dentro da minha blusa, e a outra mantinha minha cabeça imóvel, agarrando minha nuca com tanta força que quase me privava de ar.

Ele separou nossos lábios, por um segundo, respirando pesadamente na minha bochecha.

— Não, por favor... - Choraminguei, tentando sair debaixo de seu corpo enorme.

— Ah, qual é, Mia. Vamos lá - Júnior apertou meu seio direito com ainda mais força. Abafei um gemido de dor.

— Eu não quero, por favor, me solta...

— Vem toda cheia de sorrisos para dizer que não quer no final, vadia? - ele segurou meus cabelos. Soltei um gritinho - Não mesmo.

Sua mão estava na borda no meu sutiã. Agora, lágrimas corriam pelo meu rosto. Ele tentou me beijar novamente. Ninguém nos via naquele cantinho escuro com facilidade, e não estavam prestando atenção. Estava sozinha.

— Um anjo - murmurou, descendo beijos molhados pelo meu pescoço - Tão inocente, tão bonitinha. Vai ser tão divertido, não acha? - Me prensando contra as grades de proteção, passou as duas mãos pelas minhas costas, até o cós da saia jeans. Senti um arrepio de nojo.

— Não... para, por favor - Chorei, o volume da minha voz subindo gradativamente. Tapou minha boca com uma mão.

— Quietinha. Vai ser rápido. Não vou fazer doer - E desabotoou minha saia.

Fechei os olhos, esperando o pior, quase sem fôlego. Mas, de repente, todo seu peso esmagador foi tirado de cima de mim.

Nunca fiquei tão feliz em ver meu irmão. Toda mágoa que por ventura guardasse dele desapareceu naquele instante. Vítor acertou um soco na cara de Júnior, depois olhou para sua mão de um modo que imaginei que a dor maior fora sua. Ele o empurrou longe, e corri para seus braços.

— Vítor - Ainda estava chorando. Só então, quando ele me abraçava, vi que Júlia e todo o pessoal estava atrás dele. Júnior saiu correndo em direção à van, que ainda estava ali. Foi como se o aguardasse, assim que pulou para dentro, ela se colocou em movimento e partiu.

— Quer que eu chame a polícia? - Perguntou Luísa, já com o celular na mão.

— Não - disse Vítor, me apertando contra seu peito - Eu conheço os policiais daqui. Não quero envolver alguém como eles na situação.

— Eu quero ir para casa - Ele já me puxava até seu carro, falando em um tom que nunca vira-o usar.

— Como vocês a perderam na porcaria de um lugar minúsculo como esse?

— Ela disse que esperaria por você aqui, e que não precisava de companhia - explicou-se Lucas.

— Cale a boca, cão de guarda — Vítor estava furioso.

— Desculpe - Murmurou o garoto, parecendo mais pálido.

— Achei que vocês não fossem me encontrar - Estávamos na frente do carro, mas eu me recusava a soltar as roupas de meu irmão. Me sentia suja, e apavorada.

— E quase não encontramos. Cheguei e não te vi aqui na frente. Liguei para Júlia, para que ela pedisse para você sair, ma você não estava mais com eles. Entrei em desespero, Mia - ele beijou o topo da minha cabeça - Entre no carro, nós vamos para casa.

Sem uma palavra, fiz o que ele mandava.

Depois de alguns minutos, quando já não podíamos mais ver as luzes do letreiro do Chaplin, ele falou, em um tom sério:

— Acho que sabe que passará um bom tempo sem sair em casa.

Eu sabia. E nunca apoiei tanto uma decisão do meu irmão.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo!