Limpo na saia o suor que escorre pelas minhas palmas pelo que parece a vigésima vez na última hora. A roupa cinzenta, que já era sem graça, agora exibe marcas de mãos por todo o comprimento.

Onze anos. Eu não vejo Vítor ha onze anos. Ainda me lembro bem de quando nos separaram, no tribunal, quando o tio Jorge, primo de segundo grau da mamãe e nosso único parente vivo e localizável, se recusou a ficar conosco. Fui levada para um lar só para garotas; já Vítor, a última vez que o vi foi quando ele lutava contra uma assistente social, querendo seguir o carro em que me colocaram.

Assisti tudo do vidro traseiro do veículo sacolejante, chorando como só uma garotinha de seis anos cuja mãe a abandonara pouco após o nascimento, o pai morrera há duas semanas e a qual tivera seu irmão mais velho tirado de sua vida é capaz. Se não fosse por Rosalina, minha melhor e mais bonita boneca de pano (é a mais encardida também), eu teria desmoronado. Fiz do brinquedo uma grande amiga, chorando entre suas tranças na tentativa de suportar a solidão das noites frias do orfanato. A aguentar a falta que meus pais faziam. A saudade de Vítor, que sempre me ajudava na escola, roubava minhas bonecas e, depois de uma briga especialmente feia, sempre fazia pipoca e assistia os filmes da Barbie comigo.

Hoje ele tem cerca de vinte e dois ou vinte três anos. E está vindo me visitar.