Destino escrita por sayuri1468


Capítulo 3
Quinze Anos




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/575521/chapter/3

Apesar de as minhas aulas terem sido retomadas quando meus irmãos completaram dois anos, Jack e eu sempre arrumávamos tempo para nos encontrar; e apesar de eu ter doze anos, eu ainda era capaz de vê-lo.

Ele sempre assistia às aulas comigo, afinal, minha mãe não era capaz de vê-lo, e sempre que eu descia secretamente para treinar meu arco e flecha, ele criava alvos de gelo para mim. Nossas brincadeiras não consistiam mais em pega-pega, esconde-esconde ou patinar em um pequeno lago congelado. Nós lutávamos, realizávamos disputa de disparo – eu com meu arco, e ele com seu poder de gelo -, e quando finalmente cessávamos o dia, sentávamos e conversávamos sobre o futuro que teríamos. Essa conversa nunca o incomodou, até que um dia, eu com quatorze anos, comentei algo que não deveria.

– A sua vantagem, Jack, é que sempre terá um futuro!

– O que quer dizer com isso?! – suas sobrancelhas arquearam.

– Bom, você é um ser mitológico, ou qualquer coisa assim! Nunca vai morrer, não é?!

Ele ficou quieto por alguns instantes, até que me respondeu:

– Você acha isso uma vantagem?

A tonalidade pesada em sua voz, me fez repensar se eu poderia tê-lo magoado. Que mal poderia haver em nunca morrer? Sempre imaginei que seria fantástico, e exteriorizei esse pensamento.

– Oras, você vai poder ver o futuro, Jack! Por exemplo, como esse lugar estará daqui a cem anos! Já imaginou?! Se os saxões conseguirão dominar essa terra, ou se ainda conseguiremos mantê-la sob nosso domínio! Você vai sobreviver a todos nós...

Me calei. A expressão de Jack só piorava conforme eu falava, e eu consegui entender o motivo. Ele vai sobreviver a todos nós, ele vai sobreviver a mim, e eu nem sequer tinha me dado conta disso. Silenciosamente me aproximei, e recostei minha cabeça sob seu ombro. Apesar de nunca ter tomado esse tipo de atitude com ele antes, ele não me rejeitou. Nem eu mesma saberia dizer o que me levou a tomar essa atitude, mas me lembrava vagamente da minha mãe fazer isso, toda vez que meu pai parecia preocupado.

Jack tinha sido meu melhor e único amigo até agora, eu não conseguiria me imaginar sem ele, será que ele ficou triste por que se sentia da mesma forma?

– Jack, como fez para se tornar imortal?!

Ele virou para mim surpreso, e então seus olhos fitaram o chão.

– Eu não sei! – ele me disse após um breve silencio – Eu acordei dentro de um lago, um dia, e a luz da Lua me puxou para fora!

– Quer dizer que você não sabe como foi parar lá?!

– Não! Eu só me lembro da Lua ter dito que meu nome é Jack Frost, e depois disso, não disse mais nada!

Não que ele estivesse perturbado com isso, mas percebi que era algo que o incomodava. Lembro que no primeiro dia que o conheci, perguntei quem ele era, já que ele afirmava não ser uma fada, e ele também não soube me responder. “Quando eu descobrir, eu te conto!”, foi isso que ele respondeu. Talvez não saber quem ele era, também o incomodasse.

– Você ser Jack Frost, pra mim, já é suficiente! - Não era mentira. Eu sabia que para ele não bastava, mas eu queria que ele soubesse que para mim, sim.

Ele sorriu de volta, e eu senti que aquelas palavras tiveram o efeito desejado. Jack alçou voo em um pulo, e virou-se para mim com seu tom desafiador habitual.

– Pois pra mim, princesa, acho que você pode mudar algumas coisas, como por exemplo, melhorar sua pontaria!

Ele lançou um raio de gelo em direção ao céu, e eu, imediatamente, peguei meu arco e flecha e atirei. Errei por muito pouco.

– Viu! – ele respondeu.

– Mande o próximo! – pedi, e ele o fez.

Passamos o restante daquela tarde treinando a minha pontaria.

Quando Jack me deixou em casa, eu refleti, deitada na minha cama, o como aquela conversa havia mudado a imagem que eu tinha de Jack. A Merida de dez anos de idade, enxergava Jack como um mágico amigo-protetor, mas a Merida de quatroze não o via assim. Eu o via como meu melhor amigo, mas agora, ele não era um ser inatingível e mágico. Pela primeira vez, eu senti que Jack poderia ser um garoto normal, tanto quanto eu. Pensar assim, de alguma forma, aqueceu meu peito e fez um sorriso brotar em meu rosto. Jack era real, e ter essa conclusão, me deixava feliz.

A reflexão que fiz a respeito de Jack, fez com que, de alguma forma, nosso relacionamento também mudasse. Depois que deitei minha cabeça no ombro de Jack, passamos a ter mais contato físico. Ás vezes ele brincava com os cachos do meu cabelo, ás vezes deitava em meu colo, algumas vezes eu mesma bagunçava o cabelo dele. Não soube dizer o motivo, mas aparentemente, minha atitude impensada abriu uma porta que eu nunca havia pensado estar fechada.

Tudo parecia continuar como estava, se não fosse por um dia em que Jack não apareceu. Eu o esperei, mas ele não veio. Não veio para as aulas, para meu treino secreto, ou mesmo me visitar a noite. No dia seguinte, ele também não apareceu. Tentei me tranquilizar, pensando que talvez ele só tivesse que resolver algumas coisas, mas foram quase cinco anos vendo-o diariamente, e de repente, ele simplesmente não aparece mais.

Eu esperei, mas durante um mês, não soube nada de Jack Frost.

Meu aniversário de quinze anos se aproximava, e com isso, a promessa do meu casamento. Contra minha vontade, minha mãe aceitou as propostas de casamento, e armaria um duelo pela minha mão.

Eu sempre soube que ela faria isso, mas, e depois que eu casasse? Eu não poderia mais treinar arco e flecha? Não poderia mais correr pela floresta a hora que eu quisesse? E eu não poderia mais ver Jack?! Apesar de não estar mais o vendo, eu não queria perder essa liberdade.

Foi então que, tendo esse pensamento, durante a prova do meu vestido para o duelo, eu olhei para Mauddie. Eu pude ouvir a voz de Jack dizendo que, quando crescesse, deixaria de acreditar, e então, pararia de vê-lo.

Meu coração apertou. Eu acreditava em Jack! Eu acreditava sim! Eu não poderia deixar de vê-lo!

Sai de cima do banco, onde tinham me colocado para acertar o vestido, e sai em disparada até meu quarto, fingindo não escutar as vozes de minha mãe e Mauddie atrás de mim. Entrei e tranquei a porta. Se Jack estivesse certo, quando fizesse quinze anos, eu deixaria de vê-lo, assim como Mauddie, minha mãe e até mesmo meus irmãos, não eram capazes de vê-lo. Será que, na verdade, Jack nunca havia ido embora? Será que estava comigo o tempo todo, mas eu não era mais capaz de vê-lo? Isso explicaria o sumiço repentino, mas como eu poderia reverter isso?

– Eu acredito! – gritei, com a minha voz ecoando no cômodo - Eu acredito em você Jack! Por que você não está aqui?!

Não houve resposta.

– Jack, se você estiver aqui, jogue uma bola de neve, crie uma nevasca, faça qualquer coisa!

Minha voz ia se perdendo, conforme o silêncio predominava. Não fazia sentido! Será que eu nunca mais veria Jack?! Não quero! Não quero deixar isso acontecer!

– Merida!

Minha mãe havia conseguido entrar meu quarto, mas sua voz não estava austera como usual, estava preocupada. Foi então que percebi que eu estava no chão, abraçando a mim mesma e chorando. Minha mãe nunca havia me visto chorar antes.

– Merida, o que houve?! – ela perguntou enquanto passava a mão pelo meu cabelo.

O que eu poderia dizer? Que meu amigo mágico havia ido embora? Que eu chorava por medo de nunca mais o vê-lo? A única coisa que saiu da minha boca, foi algo que também me aterrorizava.

– Não quero me casar!

Minha mãe e Mauddie trocaram olhares. Eu sabia o que elas estavam pensando, sabia que nenhuma delas estava me levando a sério. Mas não me preocupei com isso na hora, a única coisa que estava na minha cabeça, era uma conversa tida há muito tempo com Jack.

“Com quinze anos, eu caso com você!”

A lembrança dessa frase, só fez com que eu insistisse de novo.

– Não quero me casar! – as lágrimas deram lugar à raiva. Me levantei decidida, e mesmo com o rosto vermelho e marcado, eu repeti – Não vou me casar, e ninguém vai me obrigar a isso!

Sai correndo do meu quarto, e fui até o estábulo. Peguei meu cavalo e parti com toda a velocidade que Angus conseguia, em direção à floresta. Eu precisava voltar para o lugar onde tudo começou, eu precisava ir até o local mágico das fadas. Talvez lá, onde vi Jack pela primeira vez, fizesse com que eu visse Jack novamente.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Destino" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.