As Mulheres de James Sirius Potter escrita por Lia Galvão, Miss Stilinski


Capítulo 26
Ruby Chang Park, o retorno


Notas iniciais do capítulo

FELIZ ANO NOVO PESSOAL!
Nós tentamos postar ele antes de 2022 acabar, mas acho que iniciar 2023 com capítulo fresquinho também é uma ótima ideia né? Um ano incrível para vocês, com muito James e todas aquelas coisas boas. Boa leitura! /Lia

Oii, gente! Capítulo novinho para comemorar o Ano Novo! Queríamos postar antes do ano terminar, mas até que esse presente agora foi bom, né? Não se preocupem! Esse ano creio que o próximo capítulo vai sair MUITO mais rápido! Não darei spoiler ;) espero que gostem e aproveitem a leitura! / Laís



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Após o pequeno inconveniente com o não solicitado pedido de casamento no meu grande dia, as coisas não demoraram a voltar aos trilhos. Apesar de ainda ter alguns burburinhos aqui e acolá sobre o acontecido, a grande maioria das pessoas estava concentrada em se divertir, comer e beber, exatamente do jeito que eu esperava que fosse.

Conforme o ponteiro do relógio se aproximava da meia noite, mais pessoas começavam a se despedir, me desejando felicitações novamente antes de justificarem suas rotinas agitadas para irem pra cama mais cedo, assim, quanto mais o tempo passava, mais íntima aquela grande festa se tornava, e eu tinha que admitir que estava adorando cada detalhe daquele dia.

— Ok, ok! — Victoire começou de uma ponta da tenda em voz alta, atraindo a atenção para si. — James, eu sei que é o seu mesversário e eu amo você, mas agora que o relógio passou da meia-noite noite eu não posso ignorar algo muito importante na minha vida. — Disse, o restante da família e amigos que ainda estavam por ali se aproximaram de Vic para ouvir melhor, ainda que ela estivesse projetando sua voz de forma sublime. — E como eu disse, eu amo você, e eu amo Teddy, mas foi no dia 18 de agosto que a minha verdadeira alma gêmea nasceu. — Um gritinho extremamente empolgado ecoou da plateia e eu identifiquei Jade Chang sendo a iniciadora da salva de palmas que se seguiu. — Feliz Aniversário, Rubs! — Desejou, largando tudo de lado para correr e abraçar a amiga de longa data.

Confesso que eu fiquei surpreso por um momento com aquele anúncio, mas o que me surpreendia era pura e simplesmente o fato de eu ter esquecido daquele pequeno detalhe. Afinal, era óbvio que eu sabia quando era o aniversário de Ruby Chang.

Como eu tenho tanta certeza disso?, vocês devem estar se perguntando. Bom, muito fácil. Eu lembro que quando descobri que Ruby fazia aniversário no dia seguinte ao meu eu tinha ficado em completo êxtase. Isso porque, com 11 anos, eu já tinha planejado um casamento que começaria no dia 16 e duraria por três dias seguidos, somando as celebrações de nossos aniversários de nascença ao do dia em que nosso amor tinha se tornado eterno e oficial.

Normalmente, eu não gostava de dividir muito a atenção e o dia específico do meu aniversário era na verdade, no mínimo, um final de semana completo. Entretanto, o fato de Ruby ter nascido tão próxima a mim nunca me incomodou, na verdade sempre foi usado por mim como uma justificativa de que estávamos destinados um para o outro e, claro, era uma ótima desculpa para negar quando ela destacava nossa diferença de idade de 4 anos, já que na verdade eu era apenas 3 anos e 364 dias mais jovem que ela.

Deixei que as felicitações à Ruby diminuíssem de intensidade antes de aproximar-me da verdadeira aniversariante daquele dia, esperando Dominique se afastar para poder ter a atenção exclusiva para mim. (Afinal, aquele ainda era, parcialmente, o meu aniversário)

— Tsc, um pedido de casamento no meu aniversário eu até consigo aceitar, mas outro aniversário? Simplesmente inaceitável! — Ruby revirou os olhos, mas sorria, ela sabia que eu estava brincando. — Serei obrigado a pedir para você se retirar, senhorita Chang.

— Ah, James, sinto muito, mas o aniversário agora é meu, então na verdade, eu quem estou pedindo para você deixar essa festa. — Ela entrou na brincadeira e então eu quem sorri, me aproximando para abraçá-la.

— Feliz aniversário. — Desejei e, antes de me afastar, alguém decidira por uma música mais lenta, o que me deu uma ideia.

— Pra você també… que isso? 

— Uma dança, ué. — Expliquei o óbvio enquanto colocava a mão de Ruby em meu ombro e a pegava pela cintura. — Ou aquele tal de Peter McMillan não sabia nem dançar a ponto de você não conseguir identificar o que é isso? — A memória que eu tentava puxar datava de muitos anos atrás, mas Ruby pareceu saber exatamente do que eu falava.

— Pelo que eu me lembro nós não tivemos a oportunidade de dançar naquela noite, já que Peter passou dias no hospital graças a um certo Potter. — Foi a resposta dela e eu alarguei meu sorriso enquanto a girava antes de puxá-la para perto novamente.

— Esse Albus é terrível. Eu bem tentei avisar, mas todo mundo fica maravilhado com aqueles olhos verdes e sempre cai no papinho dele.

— Albus nem mesmo estudava em Hogwarts naquela época, James. — Apesar da conversa, Ruby mantinha um tom leve, como se não guardasse nenhum ressentimento daquela noite, o que era bom.

— Certo, ok. Eu assumo a culpa. Mas eu era um jovem apaixonado, ok? — Ruby riu, a música aproximava-se de seu ponto mais alto e outra ideia brilhou em minha mente. — Permita-me, porém, desculpar-me apropriadamente por minhas inconsequências.

Ela arqueou uma única sobrancelha como se estivesse muito interessada em como eu faria uma coisa daquelas. E, então, quando a batida se intensificou e o cantor repetia a frase “oh I’m in love”, eu a puxei mais para perto e a inclinei para baixo, acompanhando-a antes de juntar meus lábios aos dela.

Eu aguardei cinco segundos contados. Esperando ela me empurrar para longe ou começar a gritar que eu era louco. Ou ambos.

Um.

Dois.

Três.

Quatro.

Cinco.

Ruby subiu a mão que estava em meu ombro para meu pescoço e, interrompendo um sorriso inesperado em meu rosto, segurei-a com mais firmeza aprofundando o beijo, sentindo o gosto de seu batom de cereja invadir a minha boca. Nossas línguas se encontraram ao mesmo tempo e eu pude sentir algo bem abaixo da minha barriga. As minhas mãos ainda seguravam sua cabeça, seus cabelos perfumados espalhados pelo ar. Aquilo poderia ser uma linda cena de cinema. E nem parecia que eu havia enxotado a mulher com quem eu havia tido alguma coisa apenas algumas horas antes.

A música já era aos poucos substituída pela seguinte, uma mais agitada dessa vez, quando ajeitei minha postura, puxando Ruby para cima comigo.

— Feliz aniversário. — Concluí e um sorriso presunçoso já tinha tomado conta de mim e nada no universo o tiraria dali.

— Achei que esse fosse um pedido de desculpas.

— Foi bom o bastante para os dois, não? — Desafiei.

— Bom… eu acho que apenas um beijo para duas situações extremamente importantes uma injustiça. Eu te dei um relógio muito legal, ok?

— Não que isso seja um problema. — Concluí, me aproximando para um segundo beijo, mas então percebi a chegada e presença de uma pessoa muito alta parada bem ao nosso lado.

Afastei-me de Ruby alguns centímetros e então virei o olhar para Victoire, que nos observava com muita atenção, sugando as bochechas para dentro.

— Okay. — Ela comentou antes de alternar o olhar entre Ruby e eu. Eu não tinha ideia do que estava passando na cabeça de minha prima, mas eu imaginava que se continuasse assim por muito mais tempo em breve sairia fumaça dos cabelos dourados.  — Ok. — Ela repetiu, começando a balançar a cabeça para cima e para baixo e então libertando as próprias bochechas. — É, ok. Feliz aniversário. Amo vocês. — Concluiu e então apenas saiu andando para longe.

— O que… — Comecei, voltando para Ruby. Ela riu e deu um passo para trás.

— Acho que eu deveria falar com ela. Você fica me devendo um presente decente, mas está perdoado, senhor Potter. — E, piscando na minha direção, Ruby Chang seguiu por onde minha prima tinha ido.

Eu vou refazer a frase caso vocês não tenham entendido. Depois de me beijar intensamente, Ruby Chang Park piscou em minha direção antes de sair rebolando para longe.

Melhor.

Aniversário.

De.

Todos.

Os.

Tempos.

 

(...)

Abrir os olhos não tinha sido a melhor das minhas escolhas nos últimos tempos. A claridade que invadia meu quarto me fez fechá-los imediatamente quando a pontada intensa de uma dor de cabeça que eu não sentia há muito tempo decidiu dar início ao meu dia.

Era sábado, dia 21. No dia anterior, Teresa tinha organizado uma noite de jogos com bebidas tipicamente brasileiras e, num ambiente controlado e sem o menor risco, os jogos escolhidos e minhas incríveis habilidades me fizeram passar bastante da conta. Ou, talvez, cinco doses de cachaça pura fosse apenas mais do que qualquer ser humano fosse capaz de suportar sem uma puta ressaca no dia seguinte.

A dor em minha cabeça não demorou a se espalhar por todo o corpo e em pouco tempo eu sentia como se não tivesse bebido nada líquido há pelo menos três semanas. A muito contragosto e guiado por resmungos de mim mesmo, forcei-me a levantar da cama e seguir em direção a cozinha em busca de água e algum remédio ou poção que pudesse me ajudar a recuperar minha alma.

— Por que vocês estão gritando uma hora dessas da manhã? — Choraminguei entrando na cozinha e percebendo Teddy e Lily, que conversavam em um tom bem controlado de voz.

— São uma da tarde. — Minha adorável irmãzinha fez questão de realmente gritar ao me informar aquilo, eu fiz uma careta enquanto me encurvava no caminho até a pia.

— Você não tem mais idade pra essas coisas, Jimmy. — Teddy parecia se divertir com a minha situação e eu percebi que ele estava se movendo pela cozinha, mas não conseguia acompanhar. — Mas bom que você acordou. Após muito pensar, eu decidi qual a melhor forma de comemorar seu mêsversário. — Ele bateu uma palma e eu soube que, assim como Lily, ele tinha feito de propósito.

— Não. Por favor, não. Eu não aguento mais. Eu realmente não tenho mais idade. Apenas façam todos parar. — Implorei, voltando a encher o copo já esvaziado de água. Teddy riu.

— Relaxe. É mais um presente do que uma festa de fato. Tome isso, vai te fazer sentir melhor. — E então ele me entregou um copo de coloração duvidosa. Eu o olhei com uma sobrancelha erguida, mas ele insistiu.

Vocês se lembram a poção que Viola costumava me dar para curar minhas surras? Então. O que quer que fosse aquela bebida de Teddy, era infinitamente pior. E ele sabia disso pois no momento em que eu engasguei, pronto pra cuspir tudo ali no chão, ele se apressou para fechar minha boca com certa força, não me dando outra opção a não ser engolir aquela lavagem líquida. Aquilo era uma certeza: minha poção para aparatar teria gosto de cereja.

— Eu vou vomitar. — Afirmei correndo para fora.

— Só respira fundo. — Teddy recomendou enquanto eu tentava botar meus órgãos para fora, mas logo a bebida parecia fazer efeito e as dores se dissipavam, assim como a ânsia súbita. — Receita exclusiva de Andrômeda Lupin. E também uma ótima forma de punir o neto adolescente irresponsável dela. Eu recomendo. — Agora com um copo de água em mãos Teddy me esperava de volta na cozinha e eu aceitei de bom grado, tomando rapidamente para tirar o gosto horrível da minha boca.

— Jesus… — Teddy riu.

— É assim que ela chama essa poção também.

Fazia sentido, aquele negócio era claramente capaz de operar milagres.

Agora realmente acordado e recuperado da ressaca, consegui me organizar e pegar algo para comer. Teddy aguardou até que eu sentasse enquanto, ainda ao lado de Lily, recortava papéis em pequenos coraçõezinhos.

— Então… — Chamei, decidindo não perguntar o objetivo daquela atividade.

Teddy olhou brevemente para Lily, que revirou os olhos e largou a tesoura na mesa antes de sair, deixando-nos sozinhos ali.

— Uh-oh. Eu tô encrencado?

Teddy tinha aquela aura de irmão mais velho natural. Quando éramos mais novos e Teddy ficava conosco sempre que ele dispensava meus irmãos para conversar apenas comigo significava que eu tinha aprontado algo. Eu sempre levava alguma bronca de forma muito educada daquele que era um dos caras que eu mais admirava. Teddy perdia apenas para meu pai, mas era certamente mais paciente que Harry quando eu acabava machucando Albus ou Lily no meio de brincadeiras.

— Não é essa a história da sua vida? — Ele estava brincando, mas eu pude perceber quando ele mudou a postura e ficou mais sério, o que automaticamente me deixou mais sério também. — Sabe, James, eu venho pensando bastante sobre muitas coisas.

— Isso é novo. — Certo, eu tentei ficar mais sério. Teddy ignorou.

— Lembro que quando você voltou e nós anunciamos o noivado você comentou que achava que já estivéssemos comemorando bodas. O que Vic e eu não chegamos a falar para você foi que um dos motivos de termos adiado tanto esse casamento foi, justamente, o fato de você não estar aqui. Você sabe o quanto ela ama você e, bem, você é meu irmãozinho, o primeiro que eu ganhei, a gente só… nós não podíamos fazer isso sem você. — Teddy não tinha falado muito, mas eu já estava precisando me segurar para não chorar. — E como você mesmo disse alguns dias atrás, você de fato esteve presente em alguns dos momentos mais importantes das nossas vidas, os mais constrangedores também, mas extremamente marcantes. — Eu sorri, lembrando-me da copa de quadribol e como os tinha colocado em evidência para a família toda ao denunciar o beijo na plataforma. — E foi pensando em tudo isso, nesse pequeno conjunto de coisas e em como ficamos tão felizes com seu retorno a tempo do casamento que eu preciso perguntar. Você gostaria de ser o meu padrinho?

E então o esforço que eu estava fazendo para conter o choro foi para o escambau enquanto eu começava a soluçar e pulava em Teddy em um abraço super masculino e emocionado de irmãos.

— Isso é um sim? — Ele perguntou quando eu o soltei, com certa expectativa.

— Claro que sim! Se alguém merece ser seu padrinho esse alguém, certamente, sou eu! Ou você tá esquecendo que fui eu quem achou aquela cartinha que você fez pra ela quando tinha dez anos? — As bochechas de Teddy, assim como o cabelo dele, instantaneamente ficaram muito vermelhas.

— Ah, não, eu lembro disso sim. E é justamente por isso que eu acho que você vai fazer o melhor brinde possível.

— Eu nem preciso escrever, já tenho tudo aqui de cabeça. — Disse, enxugando as lágrimas de emoção enquanto me sentia pura e simplesmente grato por tudo que tinha me levado até ali. Grato por Dulce ser meio maluquinha e não ter me avisado das preferências sexuais dela, grato por minha falta de noção em sair pelado pelas ruas da Espanha e tentar pegar um vestido emprestado de uma loja, grato por Juan ser um cuzão e ter ligado para o meu pai e grato por meu pai sempre ter me mantido por perto para me trazer de volta no momento certo, no momento ideal.

— Perfeito. Considerando tudo isso, e que você claramente precisa de uma folga das festanças, sua comemoração de hoje vai ser focada em catalogar os preços da nossa lista de presentes. — Ele sorria abertamente, como se tivesse conseguido me atrair para uma armadilha, enquanto me entregava um pergaminho longo. — Vic pediu para dizer que é pra você começar nessa loja aqui e… — Ele parou, verificando o relógio de pulso. — Você deveria sair tipo, imediatamente, a madrinha já deve estar lá te esperando. — E me olhou enquanto eu passava os olhos pela lista. — É sério, James! Vai vai vai!

 

Depois que Teddy me enxotou da cozinha eu só tive tempo de vestir uma roupa decente e escovar os dentes antes de desaparatar de casa com um pedaço de pão na boca para um beco escuro na lateral de uma das ruas comerciais mais agitadas de Londres. Me permiti terminar de mastigar meu café da manhã antes de virar a esquina em direção a uma loja de enxovais e fui surpreendido com a já conhecida figura de uma asiática virando-se para mim e conferindo o relógio no pulso.

— Agora tudo faz sentido. — Ruby comentou, cruzando os braços enquanto eu me aproximava.

— Hey, a culpa não é minha se me avisaram em cima da hora.

— Eu tô esperando há 40 minutos por uma tarefa que eu claramente podia ter feito sozinha, porque Vic me pediu pra esperar o padrinho e a lista estava com você! — Ela parecia estar impaciente, ou apenas irritada com a demora mesmo, então apressou-se para dentro da loja.

— Hey, a culpa não é minha se me avisaram em cima da hora. — Repeti, seguindo ela e revirando os bolsos para pegar o pergaminho que tinha me sido dado. — Tem lençóis no mundo bruxo, porque ela mandou a gente pra cá?

— É uma pesquisa de mercado, nós vamos em muitas lojas. Inclusive passaremos pela França também em algum momento. — Então ela parou e virou-se para me encarar. — A gente tem muita coisa pra fazer em pouco tempo, então vamos focar no que precisa ser feito, ok?

E antes que eu pudesse concordar, Ruby retirou uma prancheta, onde anexou a lista que eu estava até então segurando e diversas canetas, começando a fazer o trabalho que tínhamos sido enviados para fazer.

 

Ruby não tinha mentido quando falou que iríamos em várias lojas. Nós fomos. Meus pés estavam doendo e se eu fosse um neném chorão eu teria resmungando, mas estava tentando manter a pose por ali, então continuei a seguindo de loja em loja enquanto ela basicamente fazia o trabalho todo. Como ela tinha dito, aquele de fato era um trabalho que poderia ser feito exclusivamente por uma pessoa só. Em dado momento eu me ofereci de ir em outras lojas para otimizarmos os tempos, mas Ruby foi bem enfática na importância daquela tarefa e de que, caso eu fizesse algo errado, ela não queria lidar com os surtos de uma Victoire noiva histérica.

E então estávamos na França. A lista quase completa já tinha sido preenchida com aproximadamente 5 opções para a compra de cada um dos itens numerados organizados da opção mais barata à mais cara e com uma pequena descrição de qual era a melhor escolha e o porquê — nisso eu tinha ajudado.

Ruby passou os olhos pelo pergaminho completo, tocando cada seção com a ponta de sua caneta enquanto fazia contas mentais antes de, enfim, devolver a prancheta para a bolsa.

— Isso foi divertido. Eu estou exausta. — Declarou e eu ri.

Apesar de termos começado a tarefa às 2 da tarde, já se aproximava das 9 da noite e, em Paris, o Sol começava a se pôr no horizonte.

— Fizemos uma ótima dupla hoje. Agora me permita arrumar algo para você comer. — Ofereci, já escaneando os arredores em busca de um restaurante ou lanchonete próxima.

— Eu preciso de um banho e cama, James.

— Você não tem ideia do quanto eu estou me segurando nesse momento sobre o que você acabou de falar, então deixe eu apenas insistir que: estamos em Paris, você não comeu nada nas últimas sete horas, por favor, eu insisto.

Ruby me encarou como se soubesse exatamente o que eu estava evitando falar e suas bochechas coraram, ainda que levemente, antes de ela suspirar e concordar, me permitindo acompanhá-la em direção a um charmoso bistrô em uma esquina próxima que exalava um cheiro delicioso e que, felizmente, tinha uma staff que falava inglês.

Merci. — Agradeci ao garçom que saia com nosso pedido e não pareceu nem um pouco impressionado com a única palavra que eu sabia de francês além de salut. — Se Victoire nos mandar em mais uma dessas, eu peço demissão do cargo. — Comentei, tentando puxar assunto, Ruby riu.

— Os próximos acho que são mais simples. Cuidar de flores, organizar festas, coisas simples.

— Por falar em festa… — Comecei e Ruby se apressou.

— Olha, nós não precisamos fazer isso, ok? Você é... um homem agora. Não fizemos nada de errado, Vic não ficou brava e é isso. — Eu a observei por um momento, um sorriso surgindo em meu rosto.

— Eu ia apenas dizer que estava à disposição caso precisasse de ajuda com a organização do chá de panela, mas agora eu estou infinitamente interessado na sua perspectiva sobre eu ser um homem agora. — Ruby me fuzilou com o olhar, mas ela quem tinha falado demais.

— James… 

— Vamos lá, Ruby, você claramente quer falar sobre isso. — Ergui os ombros. — Prometo não te encher mais sobre o assunto depois.

Ela decidiu se distrair com um dos pãezinhos de entrada que estava sobre a mesa antes de balançar a cabeça e voltar a me encarar.

— Certo. Você não é mais aquela criança que eu conheci em Hogwarts e se metia em confusão apenas para me ver. Nós dois sabemos disso, James. Você é um adulto agora e… — Ela revirou os olhos antes de continuar. — Um adulto muito bem apessoado e, eu admito, que beija muito bem, mas não precisamos tornar isso em algum tipo de escândalo. — Explicou-se. Os elogios a mim direcionados tinham bastado para que meu ego já preenchesse todo aquele pequeno restaurante e eu não pude deixar de sorrir. — Ah, por Merlin, tire esse sorrisinho da cara. — Resmungou, me fazendo sorrir mais.

— Você acabou de falar para quem quisesse ouvir o quão bonito eu sou e como te dei o melhor beijo da sua vida, sinto muito, mas não tiro não.

— James…  — Ela pediu, já que eu claramente estava fazendo algo disso, eu seguia com um sorriso muito presunçoso na cara.

— Vamos fazer assim. Eu ainda não comprei nenhum presente de aniversário para você, então irei manter minha oferta inicial. Nós jantamos, depois podemos aproveitar um pouco da noite parisiense e então, antes de voltarmos para casa, eu te dou aquele já prometido presente. Se você não gostar então deixamos tudo isso pra trás, aqui em Paris, mas se você gostar, mesmo que só um pouquinho, bem… iremos passar muito tempo juntos nessa reta final do noivado, podemos tirar algum proveito da companhia um do outro.

Ruby me olhava como se não imaginasse que eu fosse capaz de fazer uma oferta daquelas, mas parecia também positivamente surpreendida. Antes que pudesse me responder, porém, o garçom nos interrompeu, servindo nossos pedidos à mesa.

— Então? — Insisti, ela balançou a cabeça e suspirou.

— Certo. Mas eu não irei subir a torre Eiffel. Ela é muito superestimada.

— Mas, querida, essa seria a melhor parte — eu retruquei, piscando um olho para ela.



Ruby segurou com ambas as mãos em um apoio de metal enquanto fechava os olhos e esperava a tontura se dissipar. Eu respirei fundo para conter a súbita vontade de vomitar. E, felizmente, após alguns segundos os efeitos colaterais da aparatação tinham disperssado.

— Ugh. — Ela revirou os olhos ao perceber onde estávamos e eu ri, percebendo que a Torre Eiffel por dentro não era lá grandes coisas, apesar da vista da cidade à nossa frente ser surpreendente.

As horas tinham passado sem que eu percebesse. Apesar do cansaço de um dia corrido e de dores nos pés, Ruby e eu fomos de um lado ao outro da cidade luz, invadindo pontos turísticos já fechados devido ao horário de funcionamento, degustando pratos típicos em restaurantes que ousavam ficar abertos para dentro da madrugada e conversando sobre a vida e os últimos anos.

Ruby contou sobre como tinha decidido tornar-se auror e como era trabalhar com meu pai — o que explicava o porquê ela tinha conseguido ficar até tão tarde no nosso aniversário — e eu expliquei sobre meus estudos e a vontade de tornar-me professor em Hogwarts.

A exaustão estava em algum lugar no fundo de ambas nossas mentes, mas a companhia era agradável o suficiente para que ignorássemos esse detalhe afim de continuarmos aproveitando a madrugada de Paris.

— Você simplesmente não pode vir a Paris se não vai na torre Eiffel, é quase uma heresia. Além do mais, você disse que não iria subir, você não subiu, nem um degrau sequer, apenas apareceu aqui. — Argumentei, oferecendo a mão para ajudá-la a sentar.

Estávamos no ponto mais alto da torre em que era possível estar, Ruby esticou as pernas para ficarem penduradas pela beirada, em uma tranquilidade que apenas alguém que poderia parar uma queda de 275m com magia tinha, e eu imitei o movimento, observando por um segundo enquanto a paisagem começava a perder o azul-escuro da madrugada para um tom misturado de cinza, rosa e laranja claro conforme o alvorecer começava a se aproximar. Já se passava das 6h da manhã e ninguém além de nós dois, e dos possíveis guardas que estavam alguns níveis abaixo de nós, estava por ali.

— Acho que com essa exclusividade fica mais bonito.

— Não mais bonito que você, porém. — Ruby revirou os olhos, mas sorriu.

— A gente devia ter entregado essa lista horas atrás.

— Eles provavelmente estão pensando que eu fugi de novo e dessa vez te levei junto.

Ela riu, desviando os olhos da paisagem por um momento para me observar.

— É uma possibilidade? Você fugir de novo, quero dizer. — Eu voltei o olhar para a cidade à frente, para como as construções começavam a ficar mais explícitas agora que a luz natural aumentava gradativamente e então suspirei.

— Não. O que me levou àquilo… eu estou bem agora, sabe? Curado e tudo mais. E também agora estou tão perto do fim da minha jornada. Posso até ter ficado bravo no começo com como tudo aconteceu, mas estou feliz de ter voltado, não pretendo largar tudo pra trás novamente. — Conclui, percebendo o quanto aquelas palavras eram sinceras.

Ao longo da noite tinha contado a Ruby sobre o intercâmbio e o que me levara a ficar longe de casa por tanto tempo, assim como o que tinha me trazido de volta, e, por mais que eu já tivesse afirmado diversas vezes à minha família que eu não fugiria novamente, ali, com o Sol apontando os primeiros raios sobre Paris, eu soube o quão verdadeira era minha vontade de ficar.

Virei-me para Ruby e percebi que ela me olhava com um leve sorriso nos lábios e, Merlin, era linda. Não estava usando o dom naquele instante e os belos olhos castanhos pareciam olhar para além de mim, para coisas guardadas no meu interior. O barulho de pássaros acordando ecoou ao longe enquanto eu me inclinava na direção dela e Ruby fechou os olhos para receber o beijo, lento, despreocupado, gentil. Um beijo que eu tinha aguardado por 12 anos e que demonstrava toda a paciência daquela década, um beijo que ignorava o coração partido de um adolescente e focava apenas na experiência de um primeiro amor que parecia, enfim, possível e disponível.

Ao me afastar a claridade já dominava a cidade e metade da silhueta solar já dominava o horizonte, Ruby suspirou, mantendo os olhos fechados enquanto balançava a cabeça brevemente, parecia repreender a si mesma pelo que estava prestes a falar, mas decidiu dizer mesmo assim:

— Okay James, acho que podemos tirar proveito da companhia um do outro.

(...)

Não consegui parar de pensar no encontro improvisado que eu tive com Ruby. Ela era incrível, engraçada e ria de todas as minhas piadas. Foi a mulher mais compreensível com quem eu havia saído em anos e tudo parecia tão… certo. Então, eu estava disposto a tentar com ela, porque tinha que ser um sinal de Merlin: a primeira pessoa por quem eu me senti verdadeiramente apaixonado finalmente havia me dado uma chance. Portanto, só podia ser ela.

E eu sei que eu tinha dito que não acreditava mais no amor e que tinha largado minha busca pela mulher da minha vida, mas, bem, não é assim que funciona? Quando você desiste de tentar, o universo te recompensa com aquilo que sempre estava definido para você? E talvez a coisa toda fosse simplesmente incrível. Ruby só tinha quebrado meu coração anos atrás para que pudéssemos viver, estar com outras pessoas, quebrar corações alheios e os nossos algumas vezes, antes, de, enfim, nos reencontrarmos para a eternidade. As coisas pareciam estar se ajeitando, os planetas se alinhando, as estrelas se organizando.

Sentado, comendo o meu café da manhã na casa dos meus avós, riscava algumas coisas feitas da lista de casamento de Teddy e Victoire. Tentando não ficar ansioso por mais um dia em que eu veria a Ruby. Mordi um pedaço da torrada, planejando o meu próximo passo como padrinho, que seria experimentar o cardápio. Quero dizer, eu e Ruby iríamos em vários buffets, experimentaríamos os cardápios para o jantar de ensaio e casamento, e, só então, escolheríamos os dois melhores para que Teddy e Victoire fossem escolher a opção final. A sorte deles é que eu gostava de fazer esse tipo de coisa. Cara, eu realmente não tinha defeitos!

— Hum... esse aqui vale a pena visitar — comentei comigo mesmo, colocando um traço de ok no pergaminho. — Esse aqui a Ruby vai gostar de ir...

— É o casamento do Teddy e da Vic ou o seu com a Ruby? — perguntou Fred, aparecendo do nada.

— Você não trabalha? — rebati, olhando para o meu primo. — Ou, sei lá... não devia estar fazendo uma cesta de guloseimas para o seu filho? Ou filha? — franzi a testa, parando por um segundo. — Qual é o sexo do bebê, falando nisso?

Fred parou com o copo que segurava perto da boca para me olhar feio e me responder de má vontade:

— É uma garota, está bem? E... depois do que você falou naquele dia, eu tenho mandado uma cesta apenas por semana para Freya, senão, você sabe, ela pode ter um lapso de memória, esquecer que eu existo e sumir.

Eu pisquei em sua direção, tentando não rir.

— Hum... compreendo... — disse, assentindo veementemente com a cabeça. Fred percebeu que eu queria soltar uma gargalhada, abriu a boca para me dar alguma resposta mal criada, mas foi interrompido pela voz de Vic entrando na cozinha com... Ruby.

Eu falei que era o destino.

— Mas por que eles não vão no jantar? — ia perguntando Ruby, enquanto ela anotava também alguma coisa.

— Rose e Scorpius estão viajando a trabalho, vão voltar depois do jantar oficial, mas chegam a tempo para o casamento. Se eles não vierem, irei até eles. — Respondeu a minha prima e Ruby riu, anotando novamente. Eu sabia que Vic e Teddy tinham mais padrinhos e madrinhas, mas Ruby e eu éramos claramente os mais importantes. 

A menção a Rose me fez reparar que eu realmente não a tinha visto desde meu retorno, e me envergonhava brevemente que eu não tivesse nem mesmo me dignado a perguntar sobre a prima faltante, porém, justificaria que eu estava tão ocupado nas últimas semanas que, quando pensava em fazer isso, aparecia outra coisa imediatamente que roubava minha atenção. Eu não via Rose desde o enterro e, mesmo antes disso, apesar de ter de certa forma me resolvido com minha prima, nossa relação tinha estado abalada por um tempo. Quem sabe agora comigo de volta a gente conseguisse voltar à amizade que tínhamos tantos anos antes?

— Eles trabalham em quê? — Me vi perguntando, aparentemente incluindo Scorpius na pergunta também. Ruby e Vic me olharam, parecendo perceber apenas naquele minuto que eu e Fred estávamos por ali.

— São arqueólogos — respondeu Victoire. 

— Legal — respondi. — Eles ainda tão juntos? Tipo… juntos? — O porquê da pergunta ter saído da minha boca eu não saberia dizer, Ruby concentrou-se na lista em sua mão, Vic me olhou profundamente, como se tentasse ver alguma coisa em mim, eu só a encarei de volta, esperando. Até que, por fim, ela suspirou.

— Sim, se casaram no começo do ano, foi uma cerimônia adorável e íntima.

Estalei a língua, percebendo que não esperava por aquilo, mas me surpreendi ainda mais ao perceber que o fato de minha prima estar feliz era tudo que importava pra mim. Nenhum ressentimento, nenhuma raiva, nem mesmo inveja pelo que um dia eu tinha perdido. Como eu tinha dito a Ruby em Paris, eu estava curado e, de certa forma, aquilo me permitia ser uma pessoa melhor.

— Bom, eles certamente vão ter que fazer uma renovação de votos com a minha presença para contar de verdade, do contrário esse casamento não valeu. — Disse após alguns instantes, Fred deu uma gargalhada e Vic pareceu aliviada, mas sorriu. Com o clima na cozinha suavizando novamente, virei-me para Ruby. — Já selecionei cinco buffets para irmos dos que esses dois aí listaram. Já está pronta?

— Claro — respondeu delicadamente, tirando a atenção da lista e me oferecendo um sorriso quase tímido, eu senti meus lábios se repuxarem em um sorriso. Quando ela me olhava daquele jeito era… não tinha palavras para descrever.

— Arrumem um quarto. — Disse Fred e eu desferi um pescotapa contra meu primo.

Então eu me levantei, mordendo o último pedaço do meu sanduíche e limpando a mão em um guardanapo.

— Pronta? — perguntei, passando agora o braço pela cintura de Ruby. Vic bufou ao meu lado e revirou os olhos, saindo de perto de nós dois. — Não fique assim, priminha. Estamos fazendo isso por você e pelo Teddy. — Pisquei um olho em sua direção e depois olhei para a bela mulher de olhos puxados ao meu lado. – Vamos?

Ruby sorriu.

— Agora — disse ela.

E, então, aparatei com ela para uma das ruas mais badaladas de Londres.

 

Caminhamos pelas ruas apinhadas de Londres. Rindo e nos divertindo, olhando para as vitrines de lojas, que também tinham bastante gente, tanto turistas quanto moradores locais. Continuamos de mãos dadas e eu me sentia leve. Não havia aquela coisa que tive com May, apenas carnal. Havia desejo, mas também havia leveza, como todo relacionamento deveria ter. E ok, vocês devem estar pensando, mas James, já? Ela apenas concordou em aproveitar com você até o casamento e, sim, eu sei, mas, como eu já disse, era o destino. E apesar de não termos conversado profundamente sobre nada ainda, eu estava completamente dedicado em fazer aquilo dar certo.

Andamos mais um pouco e chegamos ao primeiro buffet da lista. Eu a olhei com um sorriso maroto, sem desgrudar as nossas mãos.

— Pronta para um jantar, drinks e sobremesa praticamente de graça? — perguntei e Ruby deu uma risada. Uma risada gostosa e comedida.

— Tão romântico. — respondeu ela, fingindo estar afetada, colocando a mão no coração em um decote que, apesar de comportado, permitia uma bela visão mesmo assim. Meu olhar seguiu a sua mão e ela percebeu. O ar, de repente, pareceu aquecer. Meus olhos voltaram para os seus e peguei Ruby me encarando novamente. Então, me surpreendendo totalmente, ela piscou um olho, tirando a mão do coração, me deixando ver como a sua blusa marcava o sutiã.

Meu Merlin, eu tinha que segurar esse meu fogo! Tudo em mim esquentou. Não como era com May. Estava sendo... melhor.

— Depois — ela sussurrou, enquanto passava por mim e entrava no buffet. E eu estremeci.

Engoli em seco e fui atrás dela. O lugar era muito chique. E parecia ser uma fortuna. Tudo bem que nós pagamos uma pequena taxa para experimentarmos a comida, mas, pela disposição do buffet, com seus lustres baixos, uma grande ilha solitária no meio do salão e luzes claras e limpas... duvido que custasse pouco. Ruby seguiu para onde uma atendente estava e eu a segui, parando ao seu lado. 

A mulher assentiu e fez sinal para que a seguíssemos para dentro do local, que tinha ainda mais espaço para dentro. Passei para o lado de Ruby, segurando a sua mão na minha. Imediatamente, os dedos dela se enroscaram nos meus e, no momento, me senti satisfeito com a sua atitude. A mulher alta e de cabelos louros nos conduziu até uma mesa redonda, com uma toalha branca; logo depois pediu para que nos sentássemos e aguardássemos enquanto ela apresentava o menu de entrada. Ela não ficava tão perto enquanto experimentávamos a comida, portanto, eu e Ruby conversamos.

— Eu acho que esse foi o jantar mais inusitado que um cara pagou para mim — ela comentou, enquanto comia uma sopa leve de entrada com torradas temperadas. Pelo seu olhar, era um comentário divertido e não crítico.

— Cortesia do senhor Edward Remus Lupin. Pode esperar esses tipos de coisa enquanto estiver comigo, linda — disse eu, piscando um olho em sua direção, Ruby gargalhou. — Nunca ficará entediada.

Agora, os drinks que haveriam no jantar, caso escolhêssemos esse buffet, foram servidos e eu beberiquei apenas cada um deles. Eu preferia uma bela cerveja amanteigada, mas eles eram ótimos. Enquanto eu realmente apenas provava, Ruby bebia todos. Aos poucos, eu via a pele branca dela como a neve ficar com um leve tom rosado e a sua risada ficar um pouco mais solta.

— Hã... acho melhor a gente passar para os não alcoólicos, por favor — pedi para a moça baixinho e ela assentiu, saindo para buscar um copo de água. — Acho que não poderemos ir ao outro buffet.

Ruby deu uma risada que nada tinha a ver com a risada que dera mais cedo.

— Sabe, James... eu nunca pensei que você ficaria tão gato assim — admitiu ela e logo o meu ego inflou do tamanho de um balão. Sentei mais certo na cadeira, ouvindo as confissões de Ruby, tudo que eu precisava era isso. — Sério, quando você era pequeno, eu jamais pensei em você porque, claro, você era uma criança. E daí depois você sumiu por todos esses anos e tal, mas quando eu te vi... pensei: “uau.” Não tinha adjetivo melhor que isso. Onde você arranjou esses músculos? — perguntou, inclinando a cabeça e se aproximando o suficiente para apertar meu bíceps.

— Muitos anos de preparo, minha querida — respondi, com um sorriso. Ela mordeu o lábio inferior, tão corada pelo álcool, que eu só podia observar o desejo neles.

Mas eu nunca ficaria com ela assim. Bêbada.

A atendente voltou com dois copos de água, eu agradeci e ela anunciou que iria servir a sobremesa. Eu assenti e voltei a olhar para Ruby, que fez careta para a água, mas tomou o líquido do copo. Eu sabia que ela não estava completamente bêbada, mas dava para perceber que estava bem... animada. Ria de tudo e qualquer coisa. Fora o comentário que ela disse sobre mim, falamos sobre várias bobagens, enquanto saboreávamos os doces. Devo dizer que ela melhorou um pouco depois de comê-los.

Assim que terminamos de experimentar o buffet, eles explicaram como funcionavam e depois agradeci pelo serviço, que foi ótimo mesmo. Ruby ainda estava um pouco alta, mas não tanto quanto estava antes. Saímos para o ar um pouco fresco de Londres, o barulho de pessoas e carros invadiu os meus ouvidos. Ruby ficou ao meu lado, enquanto eu comentava que iríamos dar um pulo no Beco Diagonal, onde iria ter um buffet para visitarmos e, dessa vez, era um buffet bruxo. Eu queria que Vic e Ted pudessem escolher um que ficasse entre os dois mundos. Mas não sabia se Ruby ficaria tão bem com as bebidas alcoólicas bruxas. Não sei como, mas elas eram muito mais fortes do que as dos trouxas.

O buffet ficava em uma parte mais iluminada e muito mais, como eu posso dizer, chique?, do Beco Diagonal.  Era vivo e com bruxos cozinheiros a todo vapor. Taças voavam pelo local, pessoas experimentavam pedaços de bolos que tinham cerejas explosivas no topo, drinks com varinhas de alcaçuz eram servidos por ninguém específico. Por mais que eu fosse bruxo, não conseguia deixar de ficar surpreso com tudo aquilo. 

Novamente, fomos recepcionados por uma atendente, que nos guiou para uma mesa disposta perto da janela do Beco Diagonal. Ali nós podíamos ver uma loja de roupas caras, uma floricultura mágica e, se esticasse bem o pescoço, eu poderia ver a loja de logros do tio George. Me virei para Ruby e sorri para ela, pegando a sua mão. A mulher voltou e explicou como o serviço era realizado. Tudo por meio da magia e o buffet era feito na hora, em um lugar específico no lugar onde aconteceria o casamento.

A bruxa sorriu em nossa direção, já apresentando o primeiro prato. Um cordeiro assado com batatas coradas e cenouras salteadas. O prato era muito bonito e convidativo, e, ainda bem, em pouquíssima quantidade. Era realmente uma provinha. O meu estômago já estava meio cheio.

— Felicitações ao casal — ela saudou e se foi, nos deixando com a nossa comida. Mas eu mal pude registrar, pois a sua frase me deixou em êxtase.

Sério, sério mesmo. Tudo estava dando certo para mim pela primeira vez em muitos anos! E o melhor: as pessoas realmente viram o quanto eu e Ruby estávamos envolvidos um com o outro e, portanto, eu me poupei em corrigir a moça. E Ruby não pareceu se importar. 

Ruby olhou em volta e sorriu. Eu podia ver o brilho em seus olhos e não era por causa do álcool que ela tinha ingerido mais cedo. Era de alguém que estava gostando da companhia e da aventura que estávamos tendo.

— Eles acham que a gente vai casar — comentei, depois de provar o cordeiro que, aliás, estava maravilhoso.

Ruby riu, tendo ela mesma terminado de experimentar o prato.

— Bom, acho que para isso você precisa colocar um anel aqui — respondeu ela, balançando o anelar da mão esquerda.

— Você quer que eu coloque? — perguntei, dando um sorriso de lado.

— Muito cedo, James. Não comemos nem a sobremesa! — ela brincou, rindo, e eu a acompanhei, antes de seguirmos com a degustação e as provocações não-tão inocentes assim.

Após termos experimentado aqueles dois restaurantes, eu e Ruby andamos pelas ruas de Londres, aproveitando aquele tempo juntos sem dramas, sem maluquices, sem preocupação. Nunca havia levado uma mulher a um encontro daquele tipo, mas parecia ser uma experiência nova, que estava dando certo para nós dois. E eu não queria que acabasse.

Mas nós tivemos que retornar à Toca sem muita demora, pois no dia seguinte seria o dia das mulheres experimentarem vestidos, compartilharem fofocas — as quais eu sempre queria saber — e fazerem coisas que eu não poderia participar e Ruby, obviamente, estava responsável por aquela tarefa. O que, no meio do caminho, enquanto Ruby comentava sobre, havia me dado uma ideia fabulosa. 

Quando chegamos à porta da casa dos meus avôs, segurei a mão de Ruby, que estava prestes a abrir para entrar. Ela se virou para me olhar, mas meu rosto estava olhando para as nossas mãos entrelaçadas. Seus dedos eram macios contra a minha pele e o nível de endorfina estava elevado.

— Eu quero levá-la a um encontro de verdade — disse eu, finalmente levantando o meu olhar para o seu belo rosto. — Um encontro que a gente experimente coisas para nós mesmos. Um em que a nossa concentração seja um no outro. E, você sabe, um que não seja bancado pelo Teddy, mas pelo meu pai.

Ruby riu, mas ficou em silêncio por alguns segundos até que, por fim, um lento sorriso se formou em seus lábios. Aquilo foi o suficiente para me despertar. Ela desceu os degraus que levavam a porta e parou em minha frente, jogando os braços ao redor do meu pescoço. Ela era alguns consideráveis centímetros maior que eu, mas naquele momento não pareceu um problema, apenas… certo.

Ela inclinou a cabeça um pouco mais para frente e, quando falou, seus lábios roçaram nos meus. Tinha um leve hálito de vodka e menta.

— Eu adoraria ir a um encontro de verdade com você, James — ela respondeu e eu gostava de como Ruby falava o meu nome. — Mesmo me divertindo muito com esses encontros malucos que Vic e Teddy arranjam para nós.

Ruby me encarou por mais um tempo, enquanto eu ficava sem palavras, e me beijou. Senti como se tudo em mim derretesse. O gosto de seu batom junto com o álcool me deixava bêbado, querendo mais e mais dela. Meus braços foram para a sua cintura, apertando-a contra mim, sentindo cada pedaço dela colocado ao meu corpo. Nossas línguas roçavam uma na outra e minha pele se arrepiava com o contato. 

Eu poderia tê-la encostado na porta, eu poderia ter ido para a lateral da Toca e a prensar contra a parede de madeira, decorando cada curva ou nuance de seu corpo, mas a porta se abriu e ouvimos a voz esganiçada de minha irmã:

— Pelo amor de Merlin! Arrumem um quarto!

Nós nos sobressaltamos e nos separamos. Ruby olhou para mim e riu, mas piscou um olho e entrou n’A Toca, onde também estava hospedada, desaparecendo atrás da minha irmã, que me olhava de uma maneira desconfiada.

Meus olhos se voltaram para ela e ergui uma das sobrancelhas, enquanto esperava por explicação. E, então, eu reparei em suas roupas chiques e sua maquiagem bem feita. Os saltos bateram pelos degraus de madeira. Estreitei os olhos em sua direção, a pergunta já se formando em minha boca. Mas, antes que eu pudesse verbalizá-la, Lily respondeu:

— Não é da sua conta — ela passou por mim e eu virei em meus calcanhares, ainda com um olhar que Lily prontamente entendeu. Ela suspirou e voltou. — Não se preocupe, dessa vez é alguém que eu confio.

— Como eu posso ter tranquilidade? Se não quiser que eu te siga, é melhor que me diga quem é — respondi, realmente preocupado. Depois de tudo o que aconteceu naquele dia... sabia que Lily podia não se abrir totalmente para mim, mas esperava que, nesse tipo de caso, ela me contasse algo mais concreto.

Ela suspirou outra vez.

— Hugo — sussurrou por fim e se afastou, aparatando logo em seguida antes que eu pudesse sequer processar as palavras que ela tinha proferido.

Esse povo daqui não sabia se relacionar com alguém de fora?! Balancei a cabeça e entrei na Toca, entorpecido demais com o beijo em Ruby para sequer pensar em ameaçar a vida do meu primo.

(...)

Era o penúltimo dia de Agosto e minhas aulas começariam dali a dois dias, algo que eu certamente não tinha me atentado no último mês. Eu ainda não tinha feito minhas malas para a viagem a Paris, e estava seriamente considerando a possibilidade de voltar para casa diariamente. Devido à proximidade das cidades era algo possível de se fazer, mas certamente nada prático ou agradável e que me levaria a um estado constante de exaustão, além de provavelmente me ajudar a desenvolver problemas gastrointestinais severos.

Enquanto não decidia exatamente o que fazer — Iria ou ficaria? Se fosse, manteria o disfarce pedido ao coordenador anos atrás ou assumiria enfim minha verdadeira identidade? Voltaria a me enlouquecer com pequenos bicos e estudos ou aceitaria ajuda financeira dos meus pais? — decidi que uma ótima forma de começar era, finalmente, voltando a dar alguma atenção a minha poção, o que explicava o pequeno caos criado na bancada da cozinha, com diversos ingredientes espalhados por todos os cantos e ainda mais cadernos e folhas com anotações diversas em tantos outros.

Meus cabelos tinham virado um ninho de pássaros, meu nariz exibia uma fuligem preta de uma explosão de algumas horas mais cedo e eu não tinha mais nenhuma expectativa de arrumar a bagunça antes do restante da minha familia voltar de seus respectivos trabalhos, quando uma ave acinzentada entrou pela janela aberta da cozinha. A coruja era enorme e seu tamanho correspondia a sua falta de paciência pois, após largar a carta sobre a mesa — que só não caiu no caldeirão cheio de líquido devido a meus reflexos muito rápidos —, ela se foi sem nem mesmo esperar ou pedir por um pedaço de pão.

Diminui o fogo e enfeiticei a colher para que continuasse os movimentos anti-horários antes de me dedicar ao envelope em minhas mãos. O selo identificava o programa de intercâmbio e a assinatura que eu não conhecia aparentemente pertencia à coordenadora francesa.

Quebrando o lacre me apressei em ler o conteúdo da carta e eu não percebi o quão tenso estava com a volta às aulas até que eu comecei a respirar claramente aliviado conforme absorvia o conteúdo da correspondência.

Nele, a senhora Heloise Peltier me informava que devido ao status avançado de meus estudos e graças a grade escolhida para os últimos semestres, além de uma reestruturação na universidade local e nos horários das classes, minhas aulas só voltariam de fato na última semana de outubro, o que me dava mais alguns meses com minha família, me permitia permanecer disponível para o casamento de Teddy e Vic, e me dava tempo o suficiente para resolver minha vida.

Meu sorriso de alívio porém durou pouco, sendo logo substituído por puro desespero quando uma geleia arroxeada começou a transbordar do caldeirão. Àquela altura deveria ser um suave licor róseo, algo tinha dado incrivelmente errado.

— Está tentando destruir a casa? — escutei uma voz familiar preencher os estampidos que eu produzia com a minha varinha para que aquela gosma não arruinasse a bancada da minha mãe.

— Cadê o seu fiel escudeiro agora? — perguntei, levantando o meu olhar para Luna, que parou em frente onde eu estava. 

Ela se sentou à bancada, agitando os pés, enquanto eu limpava a bagunça que havia feito. Passei as mãos no rosto, retirando a fuligem que ainda restava ali, e apoiei as mãos logo depois na bancada. Luna me olhava de uma forma que havia muito ela não me olhava; na verdade, eu tinha quase me esquecido daquele olhar sábio dela, mais acostumado com o de Viola. Ambas eram diferentes, mas o olhar... aquele olhar que sabia de tudo, era o mesmo.

Inclinei a cabeça para ela, esperando. Luna ergueu uma das sobrancelhas para mim e eu continuei a encará-la, continuei esperando que ela começasse a falar. Por mais que estivesse crescida, eu ainda conseguia ver aquela garota alegre que conquistou o meu coração com a sua amizade inabalável e princesas da disney.

— Sabe... — disse ela, por fim. Um sorriso vitorioso chegou em meus lábios. — Ah, não me olhe assim! — reclamou e eu ri, cruzando os braços, ainda esperando o seu sermão. E, puxa!, eu estava com saudades disso. — Quero dizer, não pude falar muita coisa desde que você chegou, estive observando apenas como uma expectadora a incrível volta de James Sirius Potter...

— Claro, ao que tudo indica você estava muito ocupada enfiando a língua na boca do meu irmão — eu impliquei com ela, que tentou jogar alguma coisa em mim. Eu ri outra vez e depois estremeci, imaginando os dois, de repente, juntos. Mas isso me lembrou. — Pera, o que você tá fazendo aqui? — Perguntei, enfim percebendo que Albus não estava em casa. Luna revirou os olhos.

— Passei meu turno pra Alice e decidi visitar meu melhor amigo desocupado. — Ela resmungou, tentando jogar outra coisa em mim e, dessa vez, me acertando com um pano de prato. — Como eu ia dizendo... — Ela arqueou uma sobrancelha, desafiando-me a interromper de novo, eu permaneci quieto. — O incrível retorno de James Sirius Potter... já voltou engatilhando duas mulheres, uma atrás da outra. — Luna hesitou e eu esperei. Sabia que não havia julgamento em sua voz, mas sabia que tinha alguma coisa por trás. — Eu posso ver o quanto você mudou nesses anos longe James, mas uma coisa certamente não mudou. Eu vi... ainda vejo o seu desejo de amar. O seu desejo de ser amado novamente. — Fiquei em silêncio, prestando atenção no que ela dizia. — Essa coisa com a Ruby… quero dizer, você ficou bem destruído por um tempo e tudo o mais… — Luna mordeu o lábio, parecendo se conter, e percebi que ela sentia falta de me ajudar, de saber sobre o meu coração e me aconselhar sobre a vida.

Eu sorri para ela, dando a volta no balcão e parando a sua frente antes de puxá-la para um abraço apertado. Um abraço que traduzia o quão grato eu era por tê-la em minha vida e que finalmente e verdadeiramente se desculpava por ter desaparecido sem nem mesmo ter dado a oportunidade de deixá-la tentar. Luna superou o choque inicial e logo envolveu os braços ao meu redor, apertando ainda mais aquele abraço e, naquele ato, eu pude sentir toda a saudade dela, assim como o rancor que desaparecia a cada segundo dando lugar à felicidade pura ao simples ato de poder me abraçar novamente.

Quando me afastei percebi que diversas lágrimas inundavam os olhos de Luna e ao rir brevemente percebi que os meus também estavam segurando algumas. Ergui as mãos para secar-lhe os olhos e ela suspirou, me dando um breve soquinho no braço e, então, também rindo.

— Então…?? — Ela insistiu, me empurrando mais para o lado enquanto enxugava as novas lágrimas que tinham caído por ali. Eu me sentei ao lado dela e suspirei.

— É difícil dizer exatamente o que está acontecendo. Nós combinados de curtir um ao outro até o casamento, você sabe, porque estamos inevitavelmente passando muito tempo juntos e outro dia eu convidei ela para um encontro de verdade e ela aceitou e… — Ergui os ombros e balancei a cabeça, incapaz de conter um sorriso. — É tudo muito novo e recente, mas… você não acha que parece certo? — Olhei de lado para Luna, mas logo percebi que ela ainda esperava que eu dissesse mais antes de comentar sobre. — Quero dizer… ela foi o meu primeiro amor de verdade, Merlin, eu era meio obcecado com ela, o que totalmente explicaria o porquê dela ter me evitado tanto além da diferença de idade na época e tudo mais, mas, bem, eu de fato era uma criança e agora… não mais e então nós temos uma chance e ela é tão linda e interessante, engraçada, dedicada… — Suspirei novamente. — Além do que, um passarinho uma vez me disse que amor é sobre tentativas até encontrar a pessoa certa e que, às vezes, eu precisaria me arriscar se realmente quisesse encontrar aquilo que eu sempre quis e que se algo desse errado eu ficaria bem, porque eu sou James Sirius Potter. — Olhei completamente para Luna e pude ver uma sombra de tristeza passando por seus olhos azuis, provavelmente lembrando-se brevemente de que eu não tinha ficado exatamente bem após aquele conselho, mas ela suspirou e sorriu.

— Esse passarinho soa extremamente inteligente. — Eu ri, lhe cutucando com o ombro.

— Então…? — Perguntei e a observei com expectativa, Luna por sua vez tirou um tempo para me avaliar e eu senti quase como se ela conseguisse ver minha alma, o que era muito mais desconfortável do que se eu achasse que ela estava me vendo nu.

Por fim, ela puxou um breve sorriso.

— Eu acho… você lembra quando eu disse que tenho um tipo de clarividência, né? — Assenti. — Não é uma coisa muito exata, eu não posso forçar, raramente entendo o que está acontecendo e no geral é tudo muito confuso, mas… dia desses eu tive uma visão muito breve, muito rápida, mas foi uma visão sobre você e… você estava tão feliz que quando passou eu me senti feliz também. Você estava radiante e tinha algo nos seus olhos que… eu sabia que você finalmente tinha encontrado isso, James. E eu posso dizer, pelo corte do seu cabelo, que esse momento que eu vi está muito perto de acontecer. — Ela me observou novamente e eu soube que tinha algo mais, algum detalhe que ela estava propositalmente deixando de fora e que, naquele momento, tentava decidir se deveria ou não falar. Ela suspirou e alargou o sorriso. — E eu acho que eu quero estar presente nesses momentos felizes, James. Nesse que eu vi, nos que vierem antes dele e nos de depois. E eu também quero estar nos momentos tristes que podem estar no caminho para ajudar você a se recuperar dos venenos da vida e porque você é meu melhor amigo e eu amo você e eu sempre, sempre, vou estar do seu lado não importa o quê. Não me afaste mais, é tudo que eu te peço. — Luna disse, olhando com sinceridade.

Incapaz de qualquer outra coisa, a abracei novamente.

— Sempre vou fazer o impossível para te manter bem pertinho. — Garanti, apertando-a ainda mais. Luna riu e pela risada eu soube que ela chorava novamente. E, nessa hora, Albus entrou resmungando:

— James, que cheiro podre é esse?

— Deve ser esse seu sovaco suado, de quem acabou de sair do trabalho. — rebati, voltando para trás do balcão e recolhendo as coisas da minha poção.

— E por que minha namorada está chorando na sua presença? — Ele perguntou, se aproximando de Luna e lhe dando um beijo breve, eu revirei os olhos.

— Ela estava me dizendo agora mesmo do quanto se arrepende de ter escolhido o Potter errado.

— James! — Os dois gritaram e eu sorri, correndo com meus ingredientes para longe antes de Luna me alcançar e me bater novamente.

 

(...)

 

— Você sabia que eu tenho coisas para fazer? — Perguntei a Teddy que tinha me convocado com urgência alguns dias depois.

— Como…? — Ele desafiou, arqueando uma sobrancelha. Eu revirei os olhos.

— Você não tinha que estar em Hogwarts ou coisa assim? — Quando não tiver uma boa resposta, rebata com outra pergunta, infalível.

— Tirei o ano sabático para o casamento. E aí está ela. — Declarou, chamando a atenção para Ruby que cruzava a porta naquele exato momento.

— Você sabia que eu tenho coisas para fazer? — Ela perguntou e eu sorri porque aquela tinha sido minha exata pergunta segundos atrás.

— Sim, mas felizmente meu padrinho está muito dedicado em ajudar e você não é a única auror do mundo. Mas vamos ao negócio já que aparentemente vocês dois são extremamente ocupados. — Declarou com um bater de palmas e eu só tive tempo de piscar um olho para Ruby. — Então, vocês sabem como Vic não lida muito bem com tanta atenção em cima dela e ela também tem alguns traumas com toda a coisa do balé e tudo mais e, enfim, para que ela não fique mais nervosa além do comum no dia do casamento nós decidimos que na primeira valsa, quando chegar no primeiro refrão, os padrinhos vão se juntar à dança, assim ela não vai sentir tanta atenção exclusivamente nela e vai ficar mais tranquila.

— Você tá tentando dizer que… — Ruby começou, mas Teddy não a deixou concluir.

— E é por isso que vocês vão ter algumas aulas de dança ao longo do próximo mês. Sim, considerando que vocês são muitíssimo ocupados nós já organizamos as aulas de acordo com as agendas de vocês. Infelizmente, devido aos horários confusos de Ruby não conseguimos encaixá-los com os demais padrinhos então serão só vocês dois. E também a primeira aula será em 30 minutos porque não tinha outro horário disponível.  Alguma pergunta?

— Tantas. — Meu pensamento ecoou e Teddy riu, seguindo com as instruções.

Eu sabia que era literalmente impossível que eles realmente não conseguissem combinar os horários de Ruby aos dos demais padrinhos, principalmente com meu pai tão disposto a colaborar, o que significava que o fato de que nós dois faríamos as aulas com a companhia exclusiva da professora tinha sido um detalhe muito bem pensado e manipulado por Victoire. E, honestamente? Aquela era toda a permissão que eu precisava.

— Não reclame depois quando a gente ofuscar vocês dois completamente. — Disse por fim, interrompendo a explicação infinita de Teddy e ofereci uma mão à Ruby. — Milady… — Convidei como em uma dança, ela sorriu e, juntos, desaparatamos até o pequeno estúdio indicado por meu irmão.

 

Pelas colinas verdes que se espalhavam pela paisagem eu sabia que a Toca não estava muito distante dali, Tínhamos aparatado em uma planície em algum lugar de Ottery St. Catchpole, mesma vila em que meus avós e a família Lovegood-Scamander viviam quando estes estavam em casa. À nossa frente uma larga e antiga construção indicava com uma placa o estúdio de dança de Madame Bilmes e ao redor da propriedade nada além de algumas árvores isoladas e a grama seca do fim de verão.

Ruby abriu a boca para fazer algum comentário, mas naquele mesmo instante uma porta se abriu, revelando uma mulher corpulenta, os cabelos brancos cobrindo toda sua cabeça presos em um coque e uma postura impecável complementando a face rígida e emburrada.

— Vocês estão atrasados. — Ela disse somente, o sotaque forte das partes mais ao norte da Escócia quase tornando impossível entender o que ela tinha falado. Ruby ensaiou uma desculpa, ela apenas abanou a mão. — Andem logo.

Paciência certamente não era um traço marcante de Madame Bilmes, então tomei a sábia decisão em me manter calado enquanto acompanhava a mulher para dentro da casa. Após passarmos por um hall de entrada com alguns sofás nos cantos das paredes, seguimos em direção a uma enorme sala coberta por espelhos em uma das paredes, além de uma larga barra de apoio na parede ao lado.

— O que vocês sabem sobre dança? — Nenhum cumprimento, nenhuma apresentação, ela claramente não queria desperdiçar nem um segundo. Assim como eu, Ruby não parecia muito ansiosa para responder.

— Hã… o básico… dois passinhos para lá, dois passinhos para cá  e… — Ajeitei minha postura quando uma bengala cortou o ar à minha frente. De onde o objeto tinha saído eu não tinha a menor ideia.

— Isso parece uma piada para você rapaz? — Madame Bilmes rosnou e eu apenas pisquei.

— Não, senhor. Senhora. — Ruby evidentemente prendeu uma risada.

— Dança é um órgão que permite você viver. É um pulmão que dá sentido ao ar que você respira. Não é dois passinhos para lá e para cá. É movimento, é expressão, é um grito de liberdade. E a valsa… ah, a valsa é a mais bela forma de dança. É controle, é respeito, é devoção e dedicação ao seu parceiro. É altruísmo, entrega e confiança. É estar completamente ciente de si e, ao mesmo tempo, disposto a dar tudo para seu par, como também pronto para receber.

— Parece intenso. — Eu não tinha intenção de falar, mas quando vi as palavras já tinham escapado de minha boca.

A paixão que tinha crescido na expressão de Madame Bilmes desapareceu rapidamente conforme ela me olhava com fúria e a bengala mais uma vez cruzava o ar perto demais de mim.

— Mão esquerda na cintura dela, direitas unidas, você segure o ombro dele. — Ordenou e Ruby e eu nos apressamos em cumprir o pedido, acabando nos atrapalhando um pouco com as direções rígidas e ouvindo um grunhido de aviso de Bilmes antes de finalmente acertar a pose clássica de uma valsa.

A professora se aproximou, nos avaliando minuciosamente antes de torcer o nariz.

— Tire o salto, garota.

— Não estou de salto madame. — Ruby explicou e Bilmes abaixou o olhar, estalando a língua e me olhando de forma julgadora antes de sair. Como se eu tivesse culpa em ser alguns centímetros mais baixos que ela.

Madame Bilmes retornou algum tempo depois com tênis que pareciam ter sido construídos sobre tijolos e os jogou aos meus pés.

— Calce isso menino.

Eu a olhei indignado.

— Por quê? — Ela não pareceu gostar de ser questionada.

— Para ficar mais alto que ela oras.

— Mas por quê? Eu não vou usar isso no casamento e ela vai continuar mais alta que eu lá. — Se eu não estivesse concentrado em madame Bilmes eu teria visto as tentativas de Ruby em me informar que aquela guerra já estava perdida.

— Primeiro você aprende o básico como sempre foi, depois você conseguirá dançar com pessoas de qualquer tamanho. Mas se achar ruim demais não tem problema e podemos inverter as posições. Você, segure ele pela cintura. 

O que ela tinha dito era extremamente preconceituoso. Mas eu não demorei a entender que aquela era a forma dela de me punir por qualquer possível ofensa que ela tivesse sentido da minha parte. Quando Ruby se aproximou para de fato me segurar pela cintura eu resmunguei, me abaixando para calçar os sapatos.

— Você podia diminuir alguns centímetros! — Disse, lembrando-me daquilo de repente. Ruby arranhou uma risada.

— Sem a menor chance.

— Por que não?

— Porque parece que você vai ficar extremamente charmoso nesses sapatos. — Um sorriso brincava nos lábios de Ruby conforme ela esperava.

Eu calcei as plataformas resmungando e tive muita dificuldade em ficar em pé, mas finalmente consegui.

— Se você pisar no meu pé eu aumento de tamanho. — Declarou enquanto voltava a se aproximar para retomarmos a posição.

— Melhor. — Madame Bilmes definiu. — Agora vocês irão…

— Dar dois passinhos para cada lado? — Interrompi, mordendo minha boca no mesmo instante.

A rebeldia não era proposital, ela simplesmente transbordava por mim antes que eu conseguisse impedir e tinha sido isso que me colocara em muitos problemas ao longo dos anos.

— Ela vai acertar aquela bengala na sua cabeça. — Ruby disse baixo o suficiente para que apenas eu escutasse e eu sabia que era uma possibilidade muito real.

Outro barulho animalesco veio de Madame Bilmes e eu me comprometi na tarefa de ficar calado.

Provavelmente para me provar errado ela decidiu ensinar outro passo e assim passamos os minutos seguintes. Estar sobre aquelas plataformas não era nada confortável e tinha de fato gerado alguns acidentes com os pés de Ruby que ela, conforme tinha prometido, respondia ficando um centímetro mais alta a cada vez, até que eu precisasse parar novamente para colocar plataformas ainda mais altas.

Com exceção desse pequeno inconveniente e do fato de que eu duvidava muito que estava aprendendo qualquer coisa enquanto 20% da minha atenção estava em não esmagar os dedos de Ruby e me manter de pé, eu poderia afirmar que aquela aula tinha sido muito proveitosa, considerando que os 80% restantes da minha atenção estavam concentrados na mulher a minha frente, na pele macia de sua mão sobre a minha, na curva suave de cintura que eu não tive o menor problema em pressionar com um pouco mais de força ao puxá-la para mais perto de mim, deixando nossos rostos próximos o suficientes para que eu conseguisse sentir a respiração de Ruby misturando-se à minha.

— Agora você dê passos para trás, desenhando um semi-circulo pela sala, e você irá seguí-lo, dando um giro a cada novo passo. — Instruiu e assim eu fiz.

Mas, talvez, ter Ruby tão perto assim, perceber os sorrisos constantes dela para mim e os olhos atentos aos meus, mesmo quando ela ainda se dedicava mais do que eu em prestar atenção no que a professora dizia, tivesse me dado mais confiança do que eu deveria ter sobre aqueles saltos.

O passo para trás foi descuidado e a plataforma se inclinou para o lado. Em um momento estava graciosamente me afastando de Ruby, no seguinte o mundo desabou abaixo de mim e eu fui diretamente de encontro ao chão, sentindo uma pontada forte em meu tornozelo.

— James!

— Aula encerrada!

— James, você tá bem? — Ruby logo estava novamente ao alcance da minha visão, agachada ao meu lado conforme eu me sentava no chão e me apressava em me livrar daqueles sapatos, sentindo uma intensa dor no tornozelo esquerdo ao realizar aquela tarefa, fiz uma careta. — Onde dói? — Questionou e eu indiquei o tornozelo em questão antes de me livrar do segundo sapato.

— Andem crianças, tenho outra aula daqui a pouco, preciso preparar a sala.

Foi a minha vez de olhar com ódio para madame Bilmes, mas Ruby sabia que discutir com a velha não levaria a nada, então se concentrou em solucionar um problema de cada vez.

— Você consegue ficar de pé? — Questionou e eu concordei, aceitando o apoio dela e tentando concentrar todo meu peso no tornozelo saudável, enquanto Ruby passava um de meus braços sobre os ombros dela para me dar mais apoio ao outro lado.

Ela já tinha apanhado meus sapatos normais na outra mão e, mancando, acompanhei a metamorfa para fora do estúdio, em direção a um dos confortáveis sofás no hall, agradecendo aos céus ao sentar-me de volta, mas não sem antes sentir mais uma pontada aguda de dor, gerando outra careta. Ruby sentou-se próxima a mim.

— Deixa eu dar uma olhadinha. — Pediu, a preocupação evidente em seu tom de voz, e puxou minha perna para seu colo antes que eu sequer pudesse responder.

Eu, como o homem muito maduro, macho e que já tinha lidado com coisa muito pior na vida, segurei um gritinho afetado enquanto ela tocava com delicadeza minha pele, observando minha reação.

— Ok… isso vai doer um pouquinho. 

— Bom, já está doendo então o quão pior pode SEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEER. — Ela tinha sido muito rápida na tarefa de buscar a varinha e sussurrar o feitiço.

Eu ergui meu corpo do sofá, praticamente flutuando, seguro apenas pelo pé apoiado nas coxas de Ruby. A queimação que tomou conta da minha perna me forçou a olhar para baixo apenas para ter certeza de que ela não tinha de fato botado fogo em mim. Eu consegui ouvir meu osso estalando de volta para o lugar, e, então, passou. Eu respirava como se tivesse acabado de correr 100km sem pausas.

— Desculpa. Tá melhor agora?

Como ainda estava me recuperando do susto, me contentei em apenas girar o tornozelo, percebendo que não doía mais nada.

— Impressionante. — Elogiei, Ruby sorriu.

— Quando se trabalha em constante risco saber um ou dois feitiços para colocar os ossos de volta no lugar pode ser extremamente útil. — Explicou enquanto eu descia meu pé e me ajeitava no sofá. — Agora, a recompensa por ter se comportado tão bem durante o tratamento.

Ergui os olhos a tempo de sentir os lábios de Ruby sobre os meus e logo um sorriso tomou conta de mim, enquanto eu levava uma mão a sua nuca, aprofundando aquele toque e decidindo que, se aquela fosse a recompensa, eu poderia torcer meu tornozelo todos os dias.

— Eu sinto muito, vou diminuir de tamanho nas próximas vezes. — Prometeu ao se afastar e eu ri.

— Esta é a minha última preocupação no momento. — Garanti, observando-a por um momento. — O que você acha daquele encontro que conversamos sobre noutro dia?

— Eu acho que eu preciso muito de um banho agora. E que seu pai não me deu o dia de folga, apenas reorganizou meus horários. Mas sábado? — Sugeriu e meu sorriso se alargou.

— It’s a date.

(...)

Sábado demorou uma vida inteira, mas chegou em um piscar de olhos. Entre questões pontuais que precisei ajudar Teddy a resolver para o casamento, além das horas dedicadas à minha poção, que finalmente voltava a apresentar algum tipo de avanço, tive tempo de sobra para organizar o que eu decidi que precisava ser o encontro perfeito. Aquela era a minha chance de fazer as coisas darem certo. Era minha oportunidade de convencer Ruby a continuar com aquilo mesmo após o casamento. Eu precisava fazer aquilo dar certo e se o encontro não fosse perfeito então tudo seria em vão.

Ruby e eu nos encontramos no estúdio de madame Bilmes mais uma vez antes do final de semana, mas estávamos de fato tão ocupados com outros afazeres que, daquela vez, nos concentramos à aula e não perdemos muito tempo ao fim, o que não tinha problema já que no sábado teríamos todo tempo do mundo. Quero dizer, todo tempo do mundo para Ruby. Eu, por outro lado, tinha bastante coisa para fazer, se quisesse que tudo ficasse perfeito, sem margem para erros.

Na minha cabeça tudo já tinha sido planejado. Eu queria dar à Ruby algo que fosse... eu. E ela. Nossos gostos, nossas personalidades, queria experiências de encontros de verdade. Um que eu tivesse colocado todo o meu esforço para mostrar a ela que eu me importava, para que Ruby pudesse ver que eu sabia como preparar algo sem ajuda de ninguém.

Acordei junto com o Sol no sábado e passei o dia inteiro correndo de um lado para o outro. Quando retornei para minha casa, quase de noite, eu tinha conseguido deixar tudo pronto da forma que eu tinha planejado. Desde o lugar que jantaríamos, até o pós jantar.

Passei direto pelos meus velhos, enquanto dava instruções específicas à forma luminosa de um pavão para que informasse Ruby para se arrumar, pois em breve eu iria buscá-la. Meus pais aparentemente pretendiam fazer perguntas, mas eu não tinha tempo para aquilo e eu passei por eles como um raio, mais rápido que meu patrono quando eu o liberei para entregar a mensagem. Eu precisava me arrumar. Afinal, de nada adiantaria um encontro dos sonhos se eu não estivesse perfeito. Por isso, eu tinha que estar mais gato que o normal. Esse dia seria importante.

Assim que arrumado, de banho tomado, cabelos penteados — ou pelo menos o mais próximo de penteados que eu consegui —, cheiroso e totalmente gostoso, desci as escadas, encontrando meu pai sentado sozinho na sala. O cheiro de pipoca denunciava que a minha cara de pimenta estava na cozinha. Harry Potter me olhou e um sorriso dançou em seus lábios.

— Eu não sei porque isso ainda me surpreende — ele comentou, se levantando para ficar mais perto de mim.

— O quê? Eu ser lindo de morrer? — perguntei, enquanto conferia, mais uma vez, a situação do meu cabelo e o nó em minha gravata.

Eu o olhei de esguelha e vi que meu pai revirava os olhos. Eu ri.

— Nada — respondeu ele, desviando do que iria dizer, mas um sorriso lampejou em seus lábios. — Mas saiba que você ser lindo de morrer tem dois motivos: eu e sua mãe.

Eu soltei uma gargalhada. Ele parecia mais leve e eu também; acho que tudo aquilo pelo o que passamos era para ser e, agora, podíamos ser uma família que não estava mais quebrada, mas sim uma família inteira.

— Não me esperem acordados — pisquei um olho, seguindo para a porta, ouvindo barulhos vindo da cozinha e se aproximando da sala.

Eu já estava abrindo a porta quando ouvi a minha mãe reclamar:

Por que toda vez que ele sai eu não recebo uma explicação? 

Balancei a cabeça e fechei a porta, sorrindo comigo mesmo por minha cara de pimenta sempre estar preocupada com a minha pessoa. Como eu disse: eu estava leve e feliz. E não só porque eu tinha encontrado a minha cara metade.

 

Me ajeitei enquanto Ruby surgia à minha frente. Eu não sabia que alguém podia ser tão... linda. Ela usava um vestido comportado roxo, muito diferente do estilo selvagem de May. Ele era um tanto quanto colado em sua cintura e um pouco aberto no final, havia um decote ondulando à frente de seus seios, mas de um modo que eu podia ver aquele “V” entre eles. Um batom rosa que não era muito chamativo marcava sua boca, os saltos eram da mesma cor que o vestido e parte de seus cabelos estava preso no meio da cabeça, enquanto o resto estava solto em suaves ondas castanhas.

Ruby arrancou o ar que eu tinha em meus pulmões por algum tempo, e seu sorriso aberto estremeceu um pouco por conta da preocupação. Eu não tinha percebido que ela havia tirado totalmente o meu ar, até ouvir a sua voz.

— Bem, obrigada... eu acho — ela disse e eu soltei o ar que estava prendendo, um pouco confuso. Ruby deu uma risada, chegando mais perto de mim. — Você falou que eu tirei o seu ar.

Uma risada escapou de meus lábios, compreendendo o que ela havia dito. Eu, então, dei mais um passo para perto de Ruby; o perfume doce dela me atingiu em cheio. Parecia algo como... flor de cerejeira. 

— Eu tenho que aprender a guardar os meus pensamentos — respondi, já perto o suficiente dela. Ruby passou os braços em volta do meu pescoço e minhas mãos pousaram em sua cintura marcada.

— Eu acho encantador — Ruby ronronou em meu ouvido, fazendo a minha pele se arrepiar, e depois se afastou para me olhar. — Você até que não tá tão ruim. — ela riu, um som lindo de se ouvir, piscando um olho para mim e eu podia ter ido para o céu naquele momento. — Para onde vamos?

— Isso é surpresa, milady — respondi, abraçando sua cintura. Ainda bem que os seus saltos não eram tão altos, ainda assim, minha cabeça batia em seu queixo. — Tem algo contra aparatar? — perguntei e ela negou com a cabeça. 

Então eu aparatei com Ruby em meus braços para o local onde eu havia preparado tudo.

 

Já no local que eu havia escolhido a dedo, esperei que Ruby se recuperasse da aparatação. Quando ela esticou o corpo, dando sinal de que estava melhor, e olhou ao redor, seus olhos castanhos — os verdadeiros — se arregalaram. Eu sorri e esperei, enquanto Ruby absorvia cada detalhe do lugar em que estávamos.

Era um belo jardim iluminado por pequenas lanternas mágicas que flutuavam a poucos centímetros do chão, fazendo com que o caminho, com algumas curvas, ficasse em evidência. Mais acima das lanternas, em movimentos suaves, voavam o que poderia ser confundido com vaga-lumes, mas na verdade eram pequenas fadas que emitiam um brilho peculiar que iluminava os arbustos cheios de flores que decoravam todo o lugar. 

— É…

— Calma, aqui é só a entrada. — Eu continuei a sorrir e estendi o braço para ela. — Vamos? — Ruby, ainda sem palavras, aceitou o meu braço estendido, deixando de procurar o que dizer para exibir um sorriso largo enquanto eu a guiava pelo caminho de pedras até onde o jantar seria servido.

Eu olhava para Ruby admirar o caminho, olhando para todos os lados, parecendo não querer perder nenhum detalhe. Eu tinha colocado cada gota de criatividade naquele encontro, tentando fazer algo que fosse único. E, pelo assombro na expressão de Ruby, eu tinha acertado.

Não era um caminho difícil nem muito longo. A trilha de tijolos levava a apenas um lugar: um coreto no final da estradinha, todo iluminado com lâmpadas flutuantes. Os detalhes da madeira marrom e das grades pintadas de branco davam um charme com o contraste das lâmpadas. Bem no centro do coreto, uma mesa de jantar para dois estava posta. O clima estava ao nosso favor, portanto, dava para ver o céu estrelado acima de nossas cabeças, fazendo com que até mesmo a paisagem combinasse com o encontro. Se aquilo tudo não era um sinal, bem, eu realmente não sabia mais o que era.

Ao meu lado, ouvi Ruby ofegar. Um sorriso se espalhou pelos meus lábios, esperando exatamente aquele tipo de reação. Meu rosto se virou para encará-la, memorizando aquela expressão de admiração, incredulidade e também alegria pura. Os olhos de Ruby brilhavam ao absorver cada detalhe do lugar e da decoração; e isso, meus amigos, não tinha preço. Ela avançou, dessa vez deixando o meu braço e chegando mais perto do coreto. Eu fui logo atrás dela, deixando que aquilo se ajeitasse dentro de si.

Eu parei, observando-a tocar as luzes flutuantes e depois virar para mim com um sorriso meio de lado. Eu inclinei a cabeça, com um sorriso ainda em meus lábios.

— Está... perfeito. Tão perfeito que estou começando a achar que teve ajuda. — disse ela, erguendo uma das sobrancelhas. Eu coloquei a mão no coração, fingindo estar completamente ofendido.

— Assim me magoa, Ruby Chang — respondi, balançando a cabeça. — Você se esquece que eu... — dei um passo largo, porém devagar, em sua direção. — Sou tão perfeito em tudo, que sou completamente capaz de organizar o encontro dos seus sonhos em pouquíssimos dias, sem nenhum tipo de ajuda. — dei outro passo e dessa vez eu já estava a poucos centímetros dela, gesticulando com a mão para tudo aquilo. — Eu falei que iria levá-la a um encontro que fosse só nosso e eu não ia desperdiçar minha chance com qualquer coisa. — peguei sua mão com delicadeza e a levei aos meus lábios. — Pronta para o jantar, milady?

Ruby me encarou de um jeito que eu não soube decifrar, mas eu podia ver o brilho nos seus olhos se intensificarem com o que eu havia dito. Um sorriso largo cresceu em sua face ruborizada e Ruby assentiu. Retribui o sorriso e a guiei para dentro do coreto, puxando a cadeira para que ela pudesse se sentar. Logo depois eu me sentei, estrategicamente virado para onde se encontrava um restaurante, escondido entre as pequenas árvores, mas ainda ali, eu não queria me arriscar cozinhando e felizmente encontrar aquele lugar em um vilarejo bruxo vizinho não foi complicado. Difícil mesmo foi conseguir que cancelassem a reserva que estava feita há meses para me encaixar no lugar. Não tenho vergonha em admitir que essa foi a única vez que eu descaradamente usei os privilégios fornecidos pelo meu sobrenome e por quem meu pai é.

Ela se acomodou e continuou a observar o local. Enquanto ela fazia aquilo, eu acenei com a cabeça para o garçom que nos serviria aquela noite. Quando Ruby voltou a olhar para mim, o seu sorriso era lindo. 

— Obrigada, James — ela disse e eu pude sentir que cada palavra era verdadeira. — Ninguém pensou tão longe assim antes — Ruby crispou de leve os lábios, como se algo a tivesse irritado. Mas, antes que eu pudesse perguntar, o garçom chegou e se apresentou, dizendo que iria nos servir.

Eu sorri, esquecendo aquele pequeno episódio e me virei para Ruby. Ela ainda parecia encantada com o lugar, onde eu tinha gastado uma parte de minhas economias. Ok, talvez todas elas e uma parte de que precisei pegar emprestado com o meu pai — algo que ele ainda não tinha sido informado sobre —, mas eu não ligava, aquela expressão ganhava tudo e fazia valer cada esforço.

Assim que eu pedi duas taças e uma garrafa de vinho o garçom se foi e eu voltei a encarar Ruby.

— Bem, como em todos os restaurantes que nós fomos para ver o buffets já tinham um cardápio, dessa vez eu pedi para o chef nos surpreender — comentei, ainda a olhando, a animação tomando conta da minha voz. — Espero que goste que seja assim.

— James... achei a ideia incrível — Ruby não hesitou ao me responder quase na mesma hora. E aquilo me deixou feliz. Saber que eu não pisaria em ovos ao tentar agradá-la. — Tudo está incrível. — Ela olhou em volta e depois os olhos pousaram em meu rosto. — Está sendo uma noite ótima.

Aquela frase fez meu peito quase inflar de tanta emoção por Ruby realmente ter gostado de tudo. O garçom voltou com as taças e a garrafa de vinho, informando que as entradas logo seriam servidas. Nós assentimos e agradecemos antes do garçom se afastar.

Ruby levou a taça para a boca marcada levemente por um batom rosa e eu tirei uns segundos para olhá-la novamente. Me perdoem por eu ser um homem, mas meus olhos foram diretamente para aquele decote, onde a minha imaginação me levou para um lugar em que meu rosto se enterrava naqueles belos e pequenos seios. Um pigarreio me fez levantar os olhos e verificar que Ruby sorria por sobre a taça.

— Admirando a vista? — perguntou ela, colocando a taça de volta na mesa. Um sorriso de lado surgiu em meus lábios, enquanto eu apenas bebericava o vinho.

— Muito — respondi e Ruby mordeu os lábios, tentando esconder um sorriso. — É uma visão que deixa muito para a imaginação.

— Hum... — foi só o que Ruby disse, e eu sorri um pouco mais.

E então o encontro começou para valer. Ruby tinha diversas perguntas sobre o local e toda a preparação para aquele jantar e eu me permiti responder algumas delas, mas sem revelar todos os detalhes, afinal, eu só queria que tivéssemos um encontro romântico, sem estragar a magia, e meu objetivo era realmente conhecer mais a mulher a minha frente por quem eu tinha me apaixonado tantos anos atrás.

Aproveitamos a entrada e conversamos sobre coisas que nunca tínhamos tido a oportunidade, nem mesmo após a noite em Paris. Da nossa infância à grandes aspirações de vida, com Ruby rindo das minhas palhaçadas e tomando nossas taças de vinho, eu, obviamente, com moderação.

— Eu percebi que você nunca ficou bêbado de verdade — comentou Ruby, depois que o garçom retirou o prato onde as entradas estavam. Eu a olhei e ela dirigia o seu olhar para a minha taça ainda na metade.

— Bom, aprendi que é melhor desfrutar da vida sóbrio. — Pisquei um olho para ela, que ponderou manejando a cabeça. Ruby, para o seu crédito, não adicionou mais perguntas. — E você claramente não me viu no dia 9 de Agosto. — Brinquei e o assunto logo foi deixado de lado.

Depois de alguns minutos o prato principal chegou e eu fiquei maravilhado e um pouco confuso, nunca tinha visto aquela comida em toda minha vida. Ruby, por outro lado, certamente sabia o que era, pois eu via em seu olhar que, além do reconhecimento, ela estava maravilhada. Ruby ergueu a cabeça, com um sorriso no rosto.

— Você... não sabe o que é, certo? — perguntou ela, ainda animada, com um brilho no olhar.

— Eu pedi para o chefe me surpreender e ele certamente fez isso... — Confessei com uma risada breve — Mas esse prato está lindo. E eu sei que você sabe o que é.

— É comida coreana — respondeu ela, simplesmente. — Faz tanto tempo que eu não como um bibimbap! — ela exclamou, saudosa. — Minha avó sempre fazia para mim quando íamos visitá-la, mas com a vida adulta já tem um tempinho desde que fui para a Coreia.

O prato era basicamente carne, legumes, arroz e ovo com gema mole, servido em uma espécie de mini caldeirão super fumegante. Vinha com dois palitos de metal, que já estavam nas mãos de Ruby, que me olhou e apontou para os mesmos palitinhos que estavam do meu lado. Eu os peguei e senti como os mesmos são um tanto quanto pesados. Ao lado dos pratos foram postos folhas de alface e uns molhos.

— O caldeirão está quente por um motivo: cozinhar o ovo — explicou ela. — Tem gente que gosta assim, mas eu não sou fã de gema mole — Ruby deu de ombros e misturou o conteúdo, então eu a imitei, misturando o meu também, notando que o ovo realmente estava cozinhando com a comida super fumegante.

— Incrível! — exclamei, animado. — Acho que acertei no cardápio surpresa.

— James, você acertou em tudo — Ruby me corrigiu e eu parei, a olhando. — Não só hoje, mas como nos outros dias também. Eu nunca... acho que ninguém nunca fez esses tipos de coisa por mim. Se esforçando, sabe? — ela me olhou, com um sorriso que chegava aos seus olhos castanhos e puxados. Lindos. — Por isso... acho que tudo o que fizer, irá me agradar.

Ruby me lançou um olhar que, se eu não estivesse redondamente enganado, poderia significar outra coisa. Quase engasguei com a comida, que eu estava mastigando quando ela confessou aquilo.

— Bom... acho que irá gostar da sobremesa, então — respondi, com um sorriso maroto.

— Mas o menu não era surpresa? — Ruby perguntou, mas o seu sorriso era parecido com o meu.

— Esse em específico, eu faço questão de revelar — rebati, sentindo a tensão entre nós dois aumentar e o calor subir pelo meu corpo. De repente, eu não estava tão afim de ficar para o final do jantar.

 

Após uma sobremesa incrível, uma conversa muito agradável e uma companhia que me fazia crer que, finalmente, eu havia encontrado alguém que iria valer a pena, eu paguei a conta e a levei para um passeio pelos jardins do restaurante. Do lado de fora, ele era apenas uma casa grande, com um telhado de tijolos, que dava um ar caseiro para o local. Além do coreto, havia uma grande extensão de gramas e arbustos, com mesinhas espalhadas especificamente em locais estratégicos para os casais ficarem confortáveis e longe dos olhares curiosos, e um lago belo bem no meio. Naquela noite, felizmente, tínhamos o jardim todo só para nós dois.

A noite não estava fria, o céu estava limpo e com estrelas e eu segurei a mão de Ruby, enquanto andávamos pelo jardim do local. Ficamos em silêncio por alguns curtos minutos, até que eu parei perto do lago, mas longe do restaurante. Ela me olhou e eu sorri, pedindo um minuto para ela e me afastando alguns passos para onde, escondida em um arbusto, estava estrategicamente uma caixinha de som. Ruby esperava pacientemente, enquanto eu apertava o play e uma melodia preenchia apenas o local onde nós estávamos. Eu ergui meu olhar do aparelho, encontrando uma Ruby curiosa que parecia estar se divertindo com cada mínimo detalhe.. 

— Certa vez eu pedi a uma certa pessoa para que fosse ao baile comigo — expliquei e vi o sorriso crescer nos lábios dela. — Mas ela disse que eu era muito novo para estar com ela, é mole? — balancei a cabeça, fingindo incredulidade. A risada de Ruby chegou aos meus ouvidos.

— Mas que pessoa doida, não é mesmo? Onde já se viu, negar namorar com uma criança? — ela entrou na brincadeira e eu assenti, segurando meu próprio riso e mantendo meu script.

— Exatamente — concordei, ainda assentindo. — Mas ela me deu uma esperança. Disse que, se eu fosse mais velho, teria ido ao baile comigo e, bem, aqui estamos. — Dei de ombros, com um pequeno sorriso nos lábios. — Eu estou mais velho e você acredita que essa pessoa aceitou sair comigo várias vezes? Eu sou tão bonito que ela não resistiu, tenho certeza que ela passou os últimos anos se arrependendo amargamente daquele papo de conselho tutelar.

Ruby ria do que eu dizia, enquanto eu me aproximava dela sorrateiramente. Quando eu estava a centímetros de seu corpo, passei os braços em volta de sua cintura. Ela piscou, mas os próprios braços envolveram o meu pescoço.

— Acho que, agora, ela me deve uma dança — eu sussurrei, enquanto eu começava a nos balançar no ritmo da música. — E estou vendo que ela não se opõe.

— Não mesmo — Ruby negou com a cabeça e eu senti seu perfume doce chegar às minhas narinas. Inspirei aquele aroma e continuei a nos balançar.

Acho que a gente não precisava falar. O momento em si, o clima da noite, o céu estrelado, o lago brilhando a nossa frente, a música tocando e a cabeça de Ruby encostando em meus ombros, de uma maneira tanto quanto curva por causa de sua altura, era tudo o que nós precisávamos. Eu continuava a balançá-la, utilizando algumas das dicas da professora de dança que Vic e Ted haviam contratado.

Eu não sabia dizer por quanto tempo nós ficamos daquele jeito e eu não estava contando, não precisava contar. Aquele momento tinha sido incrível e o meu eu de onze anos de idade estava comemorando naquela hora. O beijo que trocamos antes de irmos embora tinha sido um dos melhores que nós havíamos trocado, pois estava cheio de significados e, talvez, algumas promessas.

 

Aparatamos em frente ao prédio de Ruby. Ela morava sozinha, em um vilarejo híbrido, mais próximo de Londres. Havia algumas luzes acesas e um pub ficava do outro lado da rua, eu conseguia escutar as vozes e a música abafadas do lado de dentro, mas estava concentrado em Ruby segurando minha mão enquanto caminhava em direção a portaria.

Paramos na entrada do prédio e ela virou-se em minha direção, soltando minha mão para ajeitar uma mecha que tinha escapado do penteado atrás da orelha.

— Eu amei esta noite, James — ela sorriu, com a mecha de volta ao lugar. — Foi... incrível.

— Eu sei, eu sou incrível — brinquei, chegando um pouco mais perto dela e ela deu uma risada, balançando a cabeça. 

Assim que eu estava bem próximo de seu rosto, me inclinei um pouco para frente, depositando um beijo em seus lábios com gosto de cereja. O meu ímpeto era de aprofundar o beijo, mas eu me segurei, deixando que Ruby decidisse o que queria fazer.

— Tenha uma boa noite, Ruby — falei, me afastando um pouco e dando um sorriso. Obviamente, eu queria mais. Queria sentir o corpo dela no meu, mas eu não gostaria que ela pensasse que eu tinha feito tudo aquilo apenas para chegar naquele ponto.

— Por que não entra, James? E toma um chá? — ela perguntou e eu pude ver suas bochechas corarem. Tentei impedir que meu peito se enchesse de ar e, então, eu dei um sorriso.

— Você sabia que eu adoro chá? Tem de pêssego? — continuei sorrindo para ela. Ruby riu novamente e se virou para abrir a porta, dando espaço para que eu entrasse.

Eu entrei no hall do prédio bem conservado e esperei que ela fechasse a porta. Pelo o que Ruby me informou, o apartamento dela ficava no segundo andar, mas eu aguardei que ela trancasse a porta do térreo e me guiasse para onde eu deveria ir. Assim que ela se virou, veio até mim e segurou a minha mão, que se fechou em volta da dela, me puxando para as escadas, sem tirar os olhos de mim.

Eu consegui sentir cada intenção que ela tinha e Ruby podia sentir as minhas. Eu era adulto o suficiente para entender que aquilo não era especial. O jantar tinha sido, mas o restante da noite certamente tomaria outros rumos que não estavam necessariamente focados no romance da coisa. Mas eu sempre tive certo cuidado quando se tratava de mulheres que eu realmente gostava. Ruby subiu as escadas ainda me olhando, ainda vendo cada reação minha; a nossa sorte era que o prédio era baixo, portanto, subimos apenas três lances de escadas, quando, ao final do último degrau, Ruby me prensou na parede e guiou uma das minhas mãos até a sua bunda. Preciso dizer que, quase instantaneamente, o meu amiguinho deu sinal de vida?

Ruby colou o corpo dela no meu e me beijou. Não foi como os beijos anteriores, que foram românticos e carinhosos. Não... foi um beijo cheio de calor e desejo e urgência. Minha mão, que estava pousada em sua bunda, a apertou de encontro com o meu membro que estava duro, eu a girei no degrau e a encostei na parede, fazendo com que a mão que apertava sua bunda escorregasse para sua coxa e a colocasse em volta de meu quadril, sentindo a sua parte mais íntima em contato com a minha.

A tensão sexual que estávamos segurando saiu de controle, Ruby interrompeu o beijo o suficiente para que puxasse minha mão e subisse o último degrau que faltava. Ela me guiou apressadamente pelo corredor, parando em uma porta no final do mesmo, abrindo rapidamente a tranca. Ruby abriu a porta, me puxando pelo colarinho, me fazendo soltar uma risada. Ainda com a porta um pouco aberta, ela me puxou para um beijo, me fazendo correspondê-la quase imediatamente, enquanto fechava a porta com um empurrão.

Eu a girei no mesmo lugar, a pegando no colo, sentindo-a encostar no lugar bem onde eu queria. E daí que Ruby era mais alta que eu? Havia um certo charme nisso. Não registrei muito o que tinha no apartamento dela, apenas que existia um sofá em alguma parte da sala, onde eu me sentei, de modo que Ruby ficasse em meu colo. Seus lábios doces não saíram dos meus em nenhum momento, com, agora, minhas mãos passando pelas suas coxas, subindo mais e mais o seu vestido lilás, deixando à mostra sua calcinha de renda que combinava com o vestido. E, Merlin, era uma visão extremamente estimulante.

As mãos de Ruby estavam em minha nuca, arranhando a minha pele e, vocês sabem, aquele era o meu ponto fraco. Eu soltei um grunhido em seus lábios, o que a levou a dar um sorriso entre o nosso beijo, percebendo o quanto aquilo me deixava louco. Minhas mãos subiram o seu vestido, fazendo com que o beijo parasse apenas para que a roupa fosse tirada. E eu estava certo. Ruby não usava nenhum sutiã por baixo daquele vestido, meu olhar varreu aqueles seios pequenos e rijos, com o bico totalmente frisado. Minha boca salivou e eu passei apenas a ponta da língua em um deles, ouvindo Ruby arquejar com o contato. Ouvir aquilo apenas me impulsionou a cobrir o seu seio com a minha boca, chupando-o, sentindo-o e apreciando sua pele em minha língua. Ruby gemia e rebolava em meu colo, esfregando a sua parte íntima em meu membro duro dentro das calças.

Ela, então, se afastou de mim e me ajudou a tirar a blusa, depois a calça e, ficando de joelhos no chão, tirou a minha cueca. Ruby encarou o meu membro ereto e depois olhou para mim, sua mão subiu pela minha perna direita e, logo depois, o envolveu. Sentir a sua palma macia, subindo e descendo, me deixou louco, fazendo com que eu gemesse alto, enquanto a safada me olhava com um sorriso muito sexy. Depois de um tempo me masturbando, eu a levantei do chão com delicadeza e fiquei em pé também; eu estava louco para sentir o gosto dela, para saber se ela estava tão molhada quanto eu imaginava. Por isso, eu a deitei no sofá e fiquei por cima, espalhando beijos pelos seus seios, depois na sua barriga, depois um pouco mais abaixo... até chegar onde eu queria. 

Mas, então, Ruby colocou a mão em meus cabelos e eu entendi que era um sinal para eu olhá-la.

— Aí não — disse ela, ofegante. Eu inclinei a cabeça para o lado, vendo que ela ficava um pouco mais corada. — Não gosto.

— Ah — e foi aí que eu entendi o que ela quis dizer. Nunca, em toda a minha vida, uma mulher recusou sexo oral... minha boca continou querendo saber o seu gosto, mas eu respeitei o seu pedido e voltei para cima, passando a minha atenção para a sua boca, e descendo a minha mão para o seu clitóris. — Posso? — perguntei e Ruby assentiu. E, quando eu a toquei lá embaixo... ah, ela estava muito molhada. De novo, quis descer e beijá-la lá, mas apenas a toquei, com movimentos leves e circulares, fazendo-a se contorcer debaixo de mim.

Ruby gemia com o meu contato, ambos nus um para o outro. A estranheza do fato que Ruby não gostava de sexo oral ficou enterrado em minha mente, pois, naquela hora, eu estava pensando com a cabeça de baixo. Portanto, cacei a minha calça e peguei a camisinha que estava na minha carteira, ficando de joelhos para colocá-la, enquanto ela me observava com o desejo brilhando nos olhos escuros.

Antes de senti-la completamente, tomei seus lábios nos meus outra vez e afastei suas pernas, ouvindo Ruby ofegar com a minha atitude. Eu sorri entre seus lábios, sugando o seu lábio inferior, enquanto eu roçava meu membro em sua entrada molhada. Pude sentir meu corpo todo se contrair apenas com aquela provocação. Então, lentamente, deslizei para dentro de Ruby, fazendo com que ela gemesse e arfasse ao mesmo tempo. Entrei e saí com cuidado, sentindo-a contra o meu membro, apertada e molhada; tão molhada, que eu entrava e saía sem nenhuma dificuldade, soltando gemidos junto com Ruby.

Ruby encaixou as pernas ao redor da minha cintura e me apertou ainda mais contra ela, o que me fez sentir tudo dela. Então, eu aumentei as estocadas, enquanto as mãos de Ruby arranhavam e fincavam em minha pele, soltando gemidos, me pedindo por mais. Estiquei a minha mão para baixo, olhando em seu rosto contorcido pelo prazer, e acariciei seu clitóris ao mesmo tempo que eu ia mais rápido e mais rápido, fazendo seus seios balançarem conforme eu me movimentava.

— Ah, James! — exclamou Ruby, fechando os olhos. Eu sorri, sem parar de entrar e sair. — Eu... vou gozar!

Se é que era possível, eu sorri ainda mais, continuando ir mais rápido. Eu queria senti-la gozar no meu membro. Então o seu corpo se retesou e Ruby apertou ainda mais as pernas ao meu redor e eu consegui sentir. Ela gemeu alto e aquilo apenas me estimulou ainda mais, me impelindo estocar mais rápido, enquanto Ruby erguia o corpo do sofá e eu sentia a sua parte íntima se contrair. Quando o seu clímax passou, o meu estava vindo. Ela pareceu notar e começou a levantar a pélvis. Me movimentei com mais e mais rapidez, até que eu mesmo gozei, sentindo aquela onda de prazer intenso se espalhando pelo meu corpo e o meu líquido encher a camisinha.

Assim que os espasmos passaram, saí de dentro dela e descartei o preservativo corretamente. Me deitei ao seu lado, sentindo ainda meu coração acelerado por conta do exercício. Me virei para encará-la e eu podia ver gotas brilhantes de suor em sua testa. Eu não estava tão diferente dela, com um sorriso preguiçoso nos lábios, cujos os dedos de Ruby contornavam naquele momento.

— Eu ouvi alguns rumores sobre você, mesmo quando saí de Hogwarts. — Comentou ela, concentrada em meus lábios. O sorriso aumentou e eu peguei a sua mão, espalhando beijos em seus dedos.

— De que eu era bom de cama? — indaguei, ainda beijando os seus dedos. Ruby me olhou, com as bochechas coradas; eu só não sabia se era por conta do sexo ou por conta do que eu perguntei.

— Sim — respondeu ela, sorrindo de um jeito constrangido.

— Então espera o segundo round — brinquei e ela riu. 

Ficamos em silêncio por alguns segundos, até que Ruby voltou a falar.

— A gente está namorando? — ela franziu a testa. Por um momento, eu esqueci que ela era mais velha, notando que Ruby era forte, forte demais (ainda mais sendo auror), mas que também era humana e mulher e tinha suas inseguranças.

Por isso, o meu sorriso alargou-se mais.

— Você quer namorar comigo? — perguntei e ela assentiu. — Então agora eu irei apresentá-la como minha namorada. — Afirmei e eu pude ver o sorriso dela nos lábios. Eu inclinei a minha cabeça para o lado e beijei seus lábios com mais intensidade, passando a língua pelo contorno de sua boca e segurando o osso de seu quadril.

Ruby enlaçou os braços em volta do meu pescoço e montou em mim. E foi assim que eu mostrei a ela como era o meu segundo round. 

(...)

O casamento se aproximava e ninguém ficou surpreso quando eu comecei a dizer para todo mundo que eu estava namorando Ruby e, agora, eu me encontrava com Fred e Dominique sentados no meu tapete, montando a cesta semanal de Freya. Fiquei surpreso quando vi que minha prima estava participando daquilo, pois nem um mês atrás ela queria esfaquear tanto Fred, quanto Freya. Ao questioná-la, Dominique apenas disse que ele era filho da pessoa que ela amava e que o bebê não tinha nada a ver com os pais. Fiquei impressionado com a maturidade, até ouvir baixinho que ela não queria que o bebê tivesse a educação de uma puro sangue Zabini.

Eu ri e continuei a preparar a cesta, quando Ruby entrou na sala, carregando alguns salgados pra gente. Entretanto, ela não sabia o que estávamos fazendo. Claro, óbvio que ela sabia que Fred ia ser pai fora do matrimônio dele com Domi, mas não sabia detalhes sobre as cestas.

— O que estão fazendo? — perguntou ela e eu ergui o olhar para vê-la.

— Uma cesta para o filho daquele que não sabe pensar com a cabeça de cima. — respondi, colocando a mão no ombro do meu primo, que a retirou com um tapa.

Ruby ergueu uma das sobrancelhas e riu, balançando a cabeça.

— Que trabalho... é por isso que eu não quero ter filhos — disse ela, colocando a bandeja com os salgados em cima da mesa e sentando-se ao meu lado no chão.

Aquela fala foi como um soco no meu estômago. Ninguém da minha família sabia que Saphira estava grávida quando morreu, apenas Scorpius, as garotas e a madame Pomfrey. E, desde aquela perda, pelo menos desde que me recuperei dela, eu tinha uma certeza na minha vida: quando eu achasse a mulher da minha vida, eu queria ter uma família com ela.

— Nem um filho adotivo? — perguntei, tentando deixar a minha voz estável e não magoada. Ruby negou com a cabeça, prendendo uma fitinha em uma das bugigangas que Fred tinha colocado na cesta. — Por quê? — Fingir desinteresse estava exigindo bastante de mim, e talvez eu estivesse falhando porque Ruby me olhou e me avaliou quando eu disse aquilo. Mas eu mantive a minha expressão neutra, colocando uma maçã na cesta.

Fred e Dominique estavam estranhamente quietos. Quando Ruby teve certeza de que não havia nada na minha expressão de que fosse causar uma “DR” ali mesmo, ela respondeu:

— Porque a minha profissão exige certos sacrifícios, não há tempo para cuidar de uma criança. Também porque eu não quero ter responsabilidade de criar outro ser humano, que vai precisar sempre de mim e eu quase nunca vou estar lá. E tem também o fato de que existem 8 bilhões de pessoas no mundo, que está morrendo aos pouquinhos, então não tem pra quê colocar mais um ser humano para sofrer por aí com o aquecimento global e, por fim, eu sou a mais velha de 7 irmãos então acho que já tive o suficiente da experiência materna.

Todo mundo na sala ficou em silêncio. Todo mundo queria dizer: Fred, Dominique e eu. A mulher que eu queria ter uma vida junto, não desejava ter filhos. Uma dúvida surgiu em meus olhos e acho que Ruby viu, pois acrescentou em seguida.

— Sim, eu tenho certeza... eu pensei muito nisso.

Eu assenti e voltei a terminar a cesta de Freya. Ruby encarou o silêncio de maneira encorajadora e também nos ajudou a finalizar o presente. Fred e Dominique começaram a falar de coisas banais, mas meu coração ainda parecia que tinha sido acertado por uma enorme flecha. O que me deixou ainda mais triste, foi que Ruby nem me considerou em seus planos.

Empurrei aquilo para o fundo do meu coração e tentei enxergar o que o futuro poderia nos trazer. Eu nem sempre fui otimista assim, vocês sabem, mas eu desejava de todo o meu coração que Ruby pudesse reconsiderar em não ter uma família. A ideia de não ter cópias minhas ou dela era assustadora para mim. Mas, como eu disse, eu esperaria o que o futuro iria nos trazer. Afinal, não tinha nem um mês que estávamos namorando, ainda tinha muito o que acontecer.

 

Fred e Dominique foram embora pouco após terminarem a cesta, papai e mamãe tinham planos para a noite, Albus tinha ido para o Caldeirão Furado e Lily tinha deixado um bilhete para que não a esperássemos acordados, o que significava que eu e Ruby tínhamos a casa toda para a gente. Mas, agora, sem Fred e Minnie para puxarem assuntos triviais, eu tinha retornado a um silêncio quase fúnebre, minha mente maquinando ideias e planos para tentar convencer Ruby do contrário daquilo que ela tinha tanta certeza.

Levantei para levar um prato sujo com farelos de biscoitos à pia e mal percebi que Ruby me avaliava com cautela até que ela me seguiu e disse, encostada no batente da porta.

— Você está bravo.

— Huh?

— Você tá bravo. Desde que eu falei sobre não querer filhos você mal olhou na minha direção. — Eu suspirei, colocando o prato na pia.

— Eu não tô bravo. — Disse ainda sem olhar para ela, ensaboando os farelos para longe da louça.

— Mas…? — Suspirei de novo, largado a tarefa e virando-me para olhá-la.

Ruby estava de braços cruzados com o quadril a apoiando no batente.Tudo na linguagem corporal dela gritava que ela estava na defensiva, mas que, se necessário fosse, ela iria atacar. Suspirei mais uma vez e limpei as mãos nas calças.

— Eu não tô bravo, só… surpreso. — Dei de ombros, abaixando o olhar. Ouvi uma risada que claramente não estava achando graça de nada.

— Por quê? Porque eu sou mulher então eu obrigatoriamente tenho que querer filhos?

Ergui os olhos de uma só vez, ligeiramente ofendido com aquela insinuação, mas mordi as bochechas ao perceber o quão mais ofendida Ruby estava. Dependendo da minha resposta, aquilo não terminaria nada bem. Então eu respirei fundo, passando as mãos nos meus cabelos.

— Eu não disse isso e eu nunca, jamais, iria insinuar coisa assim. É só que… — Nos cenários que eu tinha passado as últimas horas criando na minha cabeça aquela situação não tinha sido sequer uma ideia, então eu estava tendo alguma dificuldade para lidar com aquilo.

— Eu estou tentando resolver as coisas de forma comunicativa aqui, James. — Sua voz era afiada e direta, mas por baixo do ataque era quase como se eu pudesse ouvir o choro de um animal ferido. 

Por fim, puxei uma cadeira da mesa de jantar e apontei em frente para que ela se sentasse. Relutante, Ruby deixou sua posição, abaixando os braços e aproximando-se. O maxilar dela estava muito demarcado, o que me indicava que ela estava mordendo os próprios dentes em uma tentativa de se manter calma.

— Eu entendo o porquê de você estar se sentindo assim, mas não tem necessidade. Não tô tentando te forçar nenhuma crença patriarcal nem nada do tipo. É só que… ok. Olha, eu nunca falei disso com ninguém a não ser Viola. — Foi a minha vez de travar o maxilar. Respirei fundo de novo, contei até três e me lembrei das palavras que a garota de cabelos azuis me dissera tantos anos atrás e que me ajudaram a me curar, então me acalmei. — Quando a Saphira morreu… — Aquela certamente não era a parte difícil de dizer, eu estava com o olhar fixo na mesa, mas percebi que Ruby se mexeu de onde estava sentada. — Ela estava grávida. Eu não sabia até que foi tarde demais e, de qualquer maneira, não tinha nada que eu pudesse fazer. O negócio é que esse foi o verdadeiro motivo pelo qual… bem… tudo aconteceu. É só que, desde então, desde essa perda, eu só tive uma certeza que era a de que eu queria ser pai, eu queria, quero, construir uma família.

Eu não sabia muito mais o que dizer, como explicar, então me calei. Então por longos minutos o silêncio se arrastou entre nós. Eu sentia o olhar dela sobre mim, mas não o devolvi, até que ela, enfim, suspirou. E eu a olhei a tempo de vê-la passar as mãos pelo rosto.

— Eu não posso viver no reflexo do fantasma dela, James. — a dor agora estava mais explícita na voz de Ruby.

— Não… você nã… não é isso, não é nada como isso. — Me apressei em explicar, sem realmente explicar nada.

— Então o que é? Porque pra mim parece que você está só querendo encontrar uma substituta para o que você perdeu. — Balancei a cabeça em negativa, veementemente.

— Você não está entendendo. Ruby, eu sempre quis encontrar o amor verdadeiro, a mulher da minha vida, algo como o que meus pais tem. Sempre. E depois do… acidente, eu percebi que filhos faziam parte desse desejo também. Não tem nada a ver com ela ou com o que tivemos ou poderíamos ter tido. Sim, não vou negar que ter descoberto que eu seria pai e que eu perdi isso no mesmo minuto me abalou e me quebrou de formas profundas, mas eu estou bem com isso agora, eu de verdade estou, mas isso não anula o que eu descobri já querer minha vida inteira; É um crime tão grande assim? Querer ser pai? Ter alguém que dependa de mim? Pequenos melequentos correndo pela casa e nos levando a loucura ao mesmo tempo que nos fazem as pessoas mais felizes e amadas do mundo? — Ela pressionava os lábios um contra o outro quando negou de forma suave.

— Eu entendo, de verdade entendo. Mas querer é o suficiente para que tenhamos filhos?

A pergunta chegou até mim de forma lenta, serpenteando, envolvendo-se ao meu redor e me fazendo puxar uma longa lufada de ar, como se estivesse tentando me sufocar.

— Eu tive amnésia por um tempo, não sei se você chegou a ficar sabendo disso. — Ela disse então, voltando a cruzar os braços e olhando para a janela. — Provavelmente não, acho que você tava no seu último ano em Hogwarts, enfim. Foi no começo da minha carreira como auror, um dos meus primeiros grandes casos, eu tive um acidente… feio. Os curandeiros pareciam surpresos que eu sequer tivesse saído com vida, mas, quando eu acordei, era como se eu tivesse sete anos de novo. — Eu percebi que o aperto dela no próprio braço se intensificou um pouco. — Eu não lembrava onde eu estava, como eu tinha ido parar lá, o porquê. As únicas coisas que eu conseguia lembrar de fato eram dos meus pais e irmãos e as mais novas quase não. Eu esqueci da Vic, dos meus estudos, de tudo que eu conhecia e tinha feito e foi tudo tão desesperador. Eu não voltei de fato a ser uma criança, claro, eu conseguia me comunicar muito bem, mas eu estava assustada o tempo inteiro porque eu não conhecia nada do mundo ao meu redor e… — Ruby fechou os olhos e balançou a cabeça. — Foram meses nessa agonia, sabendo que eu estava decepcionando todos ao meu redor e sem conseguir fazer nada sobre isso. A expectativa que eu voltasse “ao normal” era sufocante e eu simplesmente não conseguia… nada. Não tínhamos como saber se minha memória ia voltar e eu não podia iniciar uma vida nova com todo mundo esperando que a velha Ruby voltasse. — Ela abriu os olhos e me encarou, eu me encolhi onde estava, sem saber o que dizer. — O que eu estou tentando falar é que… minha profissão é perigosa James, eu corro riscos todos os dias e é impossível saber ou antecipar as consequências do que me espera ao virar uma esquina. Eu espero nunca precisar passar por tudo aquilo de novo, mas absolutamente ninguém pode me prometer que isso não acontecerá e, se acontecer, por menor que seja a possibilidade, por mais ínfima a probabilidade, eu não quero precisar segurar um filho meu no colo sem ter ideia de quem é aquela criança. Não é justo, comigo, com você, com a criança, só não… E nem só de amnésia, se for o caso, são tantas coisas que podem dar errado que… parece errado.

Mordi minha própria língua antes de sugerir que ela trocasse de profissão. Eu sabia que Ruby amava o que ela fazia e sabia também que ela não estava sendo exagerada, as cicatrizes pelo rosto do meu pai eram prova o suficiente de que ela tinha sido sortudo muitas vezes ao longo dos anos. E eu entendia o ponto dela, eu realmente entendia e jamais poderia imaginar a agonia que ela sentiu quando tudo aconteceu e como isso ainda a afetava. Mas da mesma forma que ela já tinha tudo muito definido, eu também não conseguiria facilmente abrir mão do meu desejo de uma família, fosse como fosse.

O silêncio mais uma vez se prolongou. Ruby descruzou os braços e os jogou pela mesa. Eu alcancei a mão dela e a apertei de leve.

— Eu sinto muito que você tenha passado por tudo aquilo. — Foi o que eu consegui dizer e um sorriso minúsculo ergueu a lateral de seus lábios, ela assentiu, girando a mão para entrelaçar os dedos nos meus.

— Nós podemos adotar alguns animaizinhos… — Sua voz estava mais contida agora, mais sóbria, uma oferta de paz. Eu sorri, mas sentia-me exausto como se tivéssemos passado os últimos minutos em uma briga física.

— Sem chance! Eu consegui apodrecer um cacto por falta de água, e Marie me trocou por Lily, nunca mais quero um bicho por perto, muito arriscado.

— E você quer uma criança??? — Apesar da indignação em sua voz, o divertimento se sobrepunha, eu ergui os ombros.

— É diferente, ele vai ser obrigado a me amar. E eu sou rico sabe, a gente poderia contratar alguém pra mantê-los vivos enquanto nós apenas ficamos bonitos nas fotos. — Ruby riu, resignada.

— Tecnicamente você não é rico, seu pai que é.

— Bom… isso não é tão difícil de resolver, eu só preciso garantir que meu nome esteja como receptor da maior porcentagem da herança. — Rimos juntos e ela balançou a cabeça.

— Bom, senhor Potter, é do meu chefe que você está falando e sinto que irei precisar te prender como uma ameaça à segurança nacional.

— Huh, eu consigo pensar em muitos cenários divertidos para nós dois com algemas envolvidas. — Ruby jogou a cabeça para trás, gargalhando, e o clima na sala finalmente suavizou, eu sorria olhando para ela quando ela voltou a si.

— Daremos um jeito. — Garantiu e eu assenti.

— Isso significa que eu posso te fazer mudar de ideia? — Ela ergueu os ombros.

— Ou eu posso te fazer mudar de ideia.

— Aceito esse desafio.

— Okay, apenas saiba que aprendi a ser teimosa com a senhorita Victoire Weasley.

— Ouch. — Ruby sorriu mais e então recostou-se na cadeira, visivelmente mais relaxada.

— Agora… aquele papo sobre algemas… — Foi a minha vez de alargar meu sorriso e, sem perder mais nem um minuto, levantei-me da mesa e a puxei em direção ao meu quarto.

Daríamos um jeito quando a hora chegasse. Mas, agora, eu iria aproveitar minha namorada.

(...)

As semanas seguintes passaram sem que eu nem mesmo percebesse que elas estavam passando. Quanto mais perto do casamento mais tarefas precisavam ser organizadas com urgência, as aulas de dança tomavam muito do meu tempo e tudo o que restava eu preenchia passando com Ruby e nós estávamos evitando o assunto crianças de forma nada discreta. Como, por exemplo, em nosso último encontro na terça-feira um bebê deixou a chupeta cair na nossa frente e ao invés de devolvermos o objeto ao neném ele misteriosamente entrou em combustão. Ainda não sei dizer quem de nós dois lançou o feitiço, mas claramente estavamos varrendo os problemas para debaixo do tapete e apenas aproveitando o momento.

Quando dei por mim, apenas uma semana nos separava do casamento. O que significava que faltavam pouco mais de duas semanas para que eu me mudasse temporariamente para a França. Naquela tarde de sábado eu me sentava em frente a Victoire no chalé das conchas, ajudando minha prima a preencher algumas notas de agradecimento para os presentes que ela sequer tinha ganhado ainda.

Non, parlez-vous anglais? Como um ê.. englê.

— É isso que eu tô falando, anglass;

Mon Dieu

— Hey, eu sobrevivi muito bem na Grécia sem saber a língua local, acho que eu consigo me virar com francês.

Bonne chance. — Vic resmungou, me passando o próximo envelope.

— Querido James, acho que você está prestes a descobrir o motivo pelo qual chamam franceses de sem educação. — Dominique passou pelas minhas costas, roubando um cookie do meu prato antes de seguir para a praia.

— Eu só preciso encontrar alguém disposto a falar inglês comigo, qual é, somos a língua mais falada do mundo.

— Isso é exatamente o que eu estou tentando te ensinar e saiba que nós somos a língua oficial de todas as organizações importantes.

— Você é inglesa, Vitória.

— É Victoire, ktoár, e eu sou franco-inglesa.

— Você nasceu, cresceu e estudou aqui.

— Sim, mas sinto como se você estivesse me atacando pessoalmente.

— Nunca faria isso má cherry.

Chérie, o r é forte, da garganta, você não quer cerejas, quer constranger uma pobre garota.

— E se eu quiser cerejas?

Cerise, ainda com o R forte, viu?

— Cheguei! Desculpa pelo atraso, tivemos um problema com a papelada, o que estamos fazendo? — Ruby chegou, depositando um beijo na cabeça de Vic e tomando um assento ao lado dela, observando a pequena confusão na mesa.

— Eu estou tentando ensinar francês para um britânico muito orgulhoso, ele está preparando os envelopes e você pode checar quais presentes eu ainda não agradeci naquela listinha ali.

Pourquoi étudions-nous le français? — Ruby perguntou, trocando de um idioma para outro sem nenhuma dificuldade.

— Para que o bobinho aí não passe vergonha nem passe fome em Paris.

— Quantas línguas vocês falam? — Perguntei, só tendo entendido a pergunta de Ruby pela resposta de Vic. Elas responderam ao mesmo tempo, respectivamente:

— Seis.

— Sete.

— Ela tem a vantagem de ter ascendência de 4 países diferentes. — Resmungou Vic e Ruby riu.

— Hey, eu tentei te ensinar mandarim.

— Eram alfabetos demais. — Justificou-se e ambas riram enquanto Ruby buscava a prancheta com a lista de presentes.

— Huh, se eu aprender francês eu vou me igualar a Ruby. — Conclui sorrindo, Vic revirou os olhos.

— Nós somos avançadas ou fluentes James, você sabe os alfabetos ou contar até 10.

— E o alfabeto grego é muito difícil! — Não era.

— Mas então, por que ele passaria fome em Paris?

— Porque franceses são muito orgulhosos de sua língua e James estava achando uma boa ideia passar meses lá sem saber falar bonjour.

— Por que ele ficaria meses lá?

— O intercâmbio.

— Oh… — Ruby levantou os olhos da prancheta por apenas um segundo, lançando-os em minha direção e eu soube naquele minuto que tinha feito merda.

Entre as correrias intensas do último mês eu tinha completamente me esquecido de falar com ela que ficaria fora até o começo de julho e se a expressão completamente neutra dela era indício de qualquer coisa, eu estava com problemas.

— Achei que você tinha decidido voltar pra casa e ficar. — Quanto mais calma Ruby parecia estar, mais eu sabia que ela estava fingindo. Engoli em seco.

— Tinha tanta coisa acontecendo que eu esqueci… Eu decidi e eu vou ficar, mas conversei com minha mãe e só faltava mais esse ano para eu conseguir os certificados e concluímos que era melhor eu terminar. Vão ser só alguns meses, nove pra ser exato, uma gravidez, você nem vai notar que eu fui. — Ruby travou o maxilar e eu quis dar cabeçadas na parede. Por que caralhos eu tinha que mencionar gravidez?

— O quê? Um tubarão? Não morre Domi, eu tô indo! — Victoire gritou, mesmo que Dominique não tivesse falado nada, e saiu correndo pela porta em direção a praia.

— Eu pensei em ir e voltar todo dia, mas é muito exaustivo, eu posso visitar todos os finais de semana.

— Não é isso, James.

— Então o quê...? — Ruby então me olhou, seu olhar percorreu meu rosto por um prolongado segundo e então ela balançou a cabeça, suspirando.

— Nada, faz sentido, você se esforçou muito nesse curso, é claro que você precisa terminar. Quando você vai?

Eu olhei para cima, na expectativa que um raio me atingisse, mesmo que não estivesse chovendo. O teto cair sobre a minha cabeça também não era uma péssima ideia. Absolutamente qualquer evento extremo que pudesse me tirar daquela conversa que não teria nada de errado, se eu a tivesse tido três semanas atrás quando Ruby e eu definimos que estávamos namorando. Como nada aconteceu, suspirei.

— Duas semanas depois do casamento.

— Oh. — O arquear na sobrancelha dela fez um arrepio correr por minha espinha.

— Eu posso… ir depois. A coordenadora avisou que minha grade não era tão complexa, posso tentar reorganizar algumas coisas e deixar para o começo de dezembro, não deve ser impossível… — Ruby riu, sem nenhum humor em seu tom.

— Não vejo por que você está disposto a tantos sacrifícios já que nem mesmo se deu ao trabalho de me contar antes, mas faça o que te fizer sentir melhor.

— Eu não… eu esqueci Ruby. Com tanta coisa acontecendo, o casamento, o único tempo livre que tínhamos juntos eu… sinto muito. — Ela apenas deu de ombros. — Você tá brava, eu entendo, você tem motivos, mas me desculpa.

— Não tô brava. Eu certamente não tô feliz em descobrir poucas semanas antes que meu namorado vai sair do país por meses, mas não tô brava.

— Eu sinto muito mesmo, me desculpa, mas eu vou mesmo vir todos os finais de semana, prometo que você não vai nem dar falta e vai passar super rápido. — Me aproximei um pouco dela e Ruby me analisou por mais um longo minuto. Algo sobre o sorriso que ela me deu era  estranho, mas eu apenas aceitei a vitória.

— Tá tudo bem, não precisa se desculpar. Vamos terminar isso aqui e depois a gente dá um jeito nisso, ok?

Assenti, aliviado, jogando mais um possível problema para debaixo do tapete quando Ruby se levantou para buscar Victoire.

 

(...)

 

Com o rosto enfiado em uma sacola de papel e a boca amarrada em uma gravata, Teddy se contorcia e tentava gritar enquanto tinha as mãos amarradas à cadeira, pedindo por clemência e fazendo dezenas de promessas que vez ou outra terminavam em choramingos sobre como ele iria se casar na próxima semana.

Eu, obviamente, me divertia com toda a situação. Certo que talvez tudo aquilo tivesse sido um pouco exagerado, considerando que os planos para a despedida de solteiro do meu primo eram bem simples e juvenis, mas eu estava tentando ser criativo considerando a longa lista de restrições que ambos Teddy e Victoire tinham me dado para aquela data. E ele certamente não tinha esperado por aquilo, então o elemento surpresa já tinha sido um sucesso, mesmo que o fato dele ter acabado vomitando após a viagem de portal não tivesse nos nossos planejamentos, continuamos todos como se nada tivesse acontecido.

Cerca de três dezenas de homens se acumulavam por todos os lados da sala de estar em uma luxuosa casa de praia no leste da Bulgária, cortesia de Dimitri que tinha afirmado veementemente que Sófia era a melhor capital europeia para um final de semana como aqueles. Dentre os muitos homens ali se divertindo com o desespero de Teddy estavam meu pai, meus primos e amigos de longa data de Teddy, que estavam mais do que dispostos em deixar o noivo implorar por mais alguns minutos, mas aquilo já era o suficiente.

— Surpresa! — Dissemos todos ao tirar a sacola de Teddy, que parecia absolutamente apavorado e, ao começar a entender o que acontecia, logo foi de pavor à ódio em pouquíssimo tempo. Eu ri.

— Seja bem-vindo a sua despedida de solteiro, irmãozinho. — Como Teddy ainda parecia bravo, eu mantive a mordaça enquanto ele tentava proferir xingamentos, deixando Jason Borlaug, um dos melhores amigos de Teddy, assumir a fala para explicar como funcionariam os próximos dias.

Sem strippers, obviamente, o final de semana consistiria em bebidas diversas, jogos variados e a disposição de cada uma das pessoas ali presentes em fazer Edward passar vergonha. Quando ele finalmente se acalmou, eu finalmente tirei a mordaça, apesar de ainda mantê-lo preso a cadeira.

— Adoraria, porém, conversar sobre aquela recompensa que você prometeu caso o soltássemos. — Eu ri ao tempo em que os gêmeos Scamander adentravam a sala, com uma quantidade absurda de bebida os seguindo para o primeiro jogo.

— Você não vai ter nenhuma recompensa, James! — exclamou ele, fazendo com que seus cabelos passassem para um vermelho vivo, parecendo chamas. Eu continuei rindo de sua raiva e balancei a cabeça, indo até ele e passando as mãos pelos seus ombros.

— Ah, maninho... aproveite a vista! — falei, enquanto o guiava pela enorme sala, com porta de vidro chique, abrindo o outro braço que não estava envolta dele.

Teddy reparou, então, no local onde estávamos, absorvendo os detalhes em granito e outras bugigangas caras e chiques que continham naquela sala grande da “pequena” mansão da família de Dimitri. Teddy deixou escapar um assobio baixo, assentindo para si mesmo, totalmente impressionado. Por mais que meu pai também fosse bem rico ele não tinha uma mansão à toa, perto da praia... na Bulgária.

Quando Teddy se virou para mim, o meu sorriso estava de orelha a orelha. A expressão do meu irmão de consideração estava amena e ele tinha voltado com os cabelos normais. Meu pai não tinha chegado perto, mas se divertia no canto. Eu ainda sorria para Teddy, que balançava a cabeça.

— Puxa... você se esforçou, cara — disse ele. — De quem é?

— Tenho meus contatos — empertiguei-me, ouvindo barulhos de tilintar de copos de vidro. Ainda bem que nós somos bruxos, porque se quebrasse alguma coisa... Dimitri me esfolaria vivo e depois seria esfolado.

Aos poucos, as conversas foram aumentando, as risadas ficaram mais soltas e piadas obscenas também começaram a ser ditas. Um final de semana sem as meninas para celebrar os últimos dias de solteiro do meu irmão mais velho. E uma casa enorme para que não nos metessemos em encrenca, não importasse quanto álcool cada um de nós bebesse. Uma grande caixa de som reproduzia músicas diversas, das mais agitadas às de corno, enquanto as garrafas e copos de bebida se espalhavam por todos os cantos.

— OKAY! — Jason tinha subido em uma mesa e usava um talher para bater em um copo, tentando atrair a atenção de todos. Ele conseguiu isso ao quebrar o copo. Tio Ron, surpreendentemente o mais sóbrio naquele momento, correu para sumir com os cacos. — É hora do mural da vergonha do nosso querido Edward Remus Lupin. — Declarou e gritos ecoaram pela sala. — Nosso querido Teddy aqui irá se casar na próxima sexta com a adorável Victoire Weasley e o jogo desta noite é sobre todas as vezes nos últimos trinta anos que ele foi completamente gado da futura esposa.

Explicou e risadas se espalharam pela sala, com sussurros confidenciando momentos aleatórios, todos querendo contar uma parte de cada momento de Teddy com Vic ao mesmo tempo, até que Jason encontrou outro copo para quebrar.

— Um de cada vez! Queremos saber tudo!

— Ok, acho justo eu começar essa rodada. — Tio Bill ergueu a mão do centro da sala e uma rodinha se abriu ao redor dele. O rosto de Teddy imediatamente ficou vermelho e os cabelos um castanho-avermelhado. — Acho que foi um dos primeiros momentos que eu olhei para eles e pensei “é, esses dois vão acabar casando um dia”. — Tio Bill sabia prender uma audiência pois logo todos os olhos e ouvidos estavam a disposição dele. — Vic mal tinha 3 anos, Teddy acho que tinha acabado de fazer 5 e ela teve uma apresentação de balé.

— Uh, eu lembro desse dia! — Meu pai declarou com um largo sorriso no rosto.

— Então, era uma turminha de umas quinze crianças, acho que estavam dançando o lago dos cisnes e Victoire sempre foi mais tímida, então quando ela saiu e viu todos os pais e familiares que tinham ido ver a apresentação ela congelou. Nem um fio de cabelo se movia. Fleur tentou fazer ela dançar, mas a menina tinha virado uma estátua enquanto as coleguinhas seguiam a apresentação como ensaiado. E então, do nada, a gente só escuta Ginny gritando “Teddy, não!” Enquanto ele corria na direção do palco. Ninguém conseguiu impedir ele de chegar lá e, quando ele chegou, ninguém tentou tirar. Ele foi direto na Vic, conversou com ela por meio minuto e então segurou a mão dela e começou a dançar. A coreografia que ele tinha decorado completamente. E com ele ali do lado ela finalmente se mexeu e conseguiu terminar a apresentação.

— Foi adorável. — Meu pai concordou, o largo sorriso ainda em seu rosto e eu sorri também enquanto Teddy ficava ainda mais envergonhado.

— Eu tinha ido em alguns ensaios com ela… — Explicou e recebeu alguns tapinhas no ombro.

— Teve aquela vez também, quando ela caiu da vassoura. — Tio George gritou sobre as risadas. — Teddy se transformou em um curandeiro e tomou conta de cada machucado sem precisar chamar nenhum adulto porque ela tinha pedido para ele não contar pra ninguém. É claro que a gente descobriu quando começou a infeccionar, mas ele tentou.

— Não infeccionou, só era pior do que eu tinha visto!

— Ok ok. Quando esse mané foi pro intensivo de docência e passou meses se comunicando apenas com a Andrômeda, mas ainda assim conseguiu aparecer no primeiro dia do último ano de Victoire apenas pra dizer tchau. E me traumatizou pro resto da vida porque fui eu quem pegou ele tentando aspirar a língua da minha prima pra fora da boca. — Entrei na brincadeira e Teddy revirou os olhos.

— Eu estava indo pra Hogwarts também!

Os relatos continuaram. A vez que Teddy tinha dispensado um encontro porque Vic sorriu para ele, ou quando ele terminou um namoro só por achar que Victoire não gostava da garota, dentre diversos momentos adoráveis entre os dois que construíram o relacionamento deles até o momento em que agora estavam. Por fim, muitas histórias e ainda mais drinks depois, além das explicações de Teddy para cada um daqueles momentos, Leroy Agrippa fez a pergunta que silenciou todos e direcionou toda a atenção de mais de trinta homens, a maioria já casados ou comprometidos, para o noivo da vez.

— E, depois disso tudo, em que momento você soube que iria casar com ela? 

Teddy tomou um longo gole de cerveja, parecendo pensar no assunto, e então deu de ombros.

— Não sei se teve um momento específico em que a chavinha virou, sabe? Como já ficou bem claro aqui eu sempre amei ela, mas acho que foi quando meu coração começou a acelerar sempre que ela estava perto, quando olhar para ela, fosse arrumada ou quando tivesse acabado de acordar, tirava todo o ar do meu pulmão, quando um toque dela na minha mão fazia meu coração dar piruetas e … Ok, eu tô soando como uma garotinha apaixonada agora, mas é isso, esses pequenos momentos, essas reações incontroláveis, você apenas sabe quando é a pessoa certa pra você. E Vic sempre foi a pessoa certa pra mim. As outras garotas, quero dizer, elas eram legais e Vic não me dava bola, mas elas nunca me fizeram sentir do jeito que ela faz ou fazia.

O efeito do álcool foi aos poucos deixando meu corpo enquanto Teddy falava e meu sorriso permaneceu no rosto enquanto ele falava, talvez não tão evidente quanto antes, porque  quanto mais ele explicava a simplicidade do amor dele por Vic, com ecos de alguns amigos que sabiam do que ele estava falando, eu percebi que aqueles pequenos momentos, aqueles ínfimos detalhes que faziam toda a diferença, nunca tinham acontecido comigo. Nem mesmo agora com Ruby, e, talvez, nem mesmo da primeira vez em que eu tive tanta certeza em estar perdidamente apaixonado por ela. Claro, as borboletas no estômago, a felicidade, o coração quentinho, algumas dessas coisas aconteciam vez ou outra, mas a forma como Teddy falava, a construção de tudo e momentos únicos e especiais… Eu suspirei, erguendo o copo e gritando por outra rodada em celebração ao amor daqueles dois.

Mas mesmo restabelecendo o álcool no meu sistema, esquecer aquela falta de reações não foi tarefa fácil.

 

Se não fosse pelo resgate de Andrômeda Tonks e seu estoque infinito de uma poção milagrosa, mais de trinta homens não teriam conseguido deixar a Bulgária com vida. O final de semana foi intenso. Entre aparatações bêbados, corridas pelas ruas de Sófia, mergulhos no mar tarde da madrugada e muita, muita bebida, se Andrômeda não tivesse nos ido puxar pelas orelhas, um a um, na segunda de manhã, era muito provável que todos nós ainda estivessemos caídos na sala de estar da luxuosa casa dos Zkovsky. Felizmente tudo estava bem agora e a maioria deles só tinha vomitado um pouquinho.

Quarta-feira e era o dia do jantar de ensaio do casamento que aconteceria em apenas dois dias. Ginny ajeitou minha gravata enquanto meu pai gritava para que Lily e Ruby se apressassem e logo a ruiva apareceu na escada, resmungando que não se podia apressar a perfeição.

Ruby veio atrás dela e eu parei tudo para observá-la. Ela usava um vestido midi em um tom escuro de azul e um decote considerável ladeado por pequenas pedrinhas e bem marcado na cintura. A peça era simples, elegante e a deixava absolutamente deslumbrante. De tirar o fôlego de qualquer forma, mas não da maneira que vinha martelando na minha cabeça nos últimos dias. Sem ter o que dizer, eu apenas me aproximei e estendi uma mão para ela, alargando um sorriso. Ruby sorriu de volta enquanto aceitava o auxílio e ao aproximar-se de mim, beijou-me no canto da boca, mais para a bochecha que nos lábios em si.

— Eu sei. — Disse em um sussurro e o sorriso dela tinha um quê de tristeza. — Tá tudo bem.

Antes que eu pudesse perguntar o que ela queria dizer, Harry voltou a apressar todos. Aquela conversa ficaria para depois.

 

Apesar da estranha interação antes de deixarmos a casa a noite correu bem, Ruby ria de minhas piadas e quando a oportunidade surgia nós nos beijávamos, ainda que apenas selinhos devido aos muitos familiares que nos rodeavam e o fato de que aquela noite não era pra gente. O ensaio correu como planejado, Vic e Teddy não poderiam estar mais felizes, quase como se nenhuma preocupação os tivesse feito surtar ao longo de toda a semana, e tudo estava encantador.

Quando meu momento chegou usei uma pequena colher para dar batidinhas na taça e atrair a atenção de todos.

— Queria começar deixando bem claro que é uma alegria imensa estar aqui hoje celebrando esse casal que eu tanto amo e que eu acompanhei a relação desde o primeiro beijo. Bem, eu e o mundo bruxo inteiro, já que eles decidiram fazer isso no meio de uma copa mundial de quadribol na mira de Rita Skeeter. — Comecei e sorri junto às demais risadas e lembranças daquele dia. — Eu não irei me demorar hoje, porque o verdadeiro discurso virá no dia do casamento, mas eu apenas queria dizer que minha vida toda eu procurei ter o que meus pais tiveram. E nessas últimas semanas, passando tempo com vocês, ouvindo a história dessa paixão evoluir de amizade a um amor para toda vida, eu queria apenas dizer … Harry e Ginny que se fodam, eu quero o que vocês tem. Um brinde! — Saudei ao som de mais risadas e sorri para os noivos, sabendo que apesar da brincadeira eu realmente queria dizer aquilo e sabendo que, não importava o quanto eu tivesse tentado, o quanto eu tivesse buscado ou me dedicado, eu ainda não tinha sido capaz de encontrar. E talvez não fosse encontrar jamais, afinal.

 

Ruby chutou os saltos ainda na porta de entrada e se jogou no sofá.

— Deus, ainda bem que eu não vou passar por nada disso. — Disse, jogando os pés para cima.

— Isso o quê? — Perguntei, afrouxando a gravata e me aproximando para massagear-lhe os pés.

— Essa coisa de casamento. Eu sinceramente não tenho mais nenhuma energia para essa coisa de lista de presentes e buffets e vestidos e jantares de ensaio e argh. Definitivamente não.

— O que, tipo, você não pensa em se casar?

— Claro que não. Casamento é só uma forma do governo ganhar mais dinheiro com a gente e pra quê? Um pedaço de papel? No, thank you. — Eu parei a massagem que eu mal tinha começado, Ruby abriu os olhos e eu suspirei.

— Acho que a gente precisa conversar.

Ruby pressionou os lábios um no outro e respirou fundo. Ela se ajeitou no sofá, me dando mais espaço para sentar e cruzou as pernas, colocando o cabelo para trás da orelha, ela assentiu.

— Eu sei.

— A gente só… você… nós… eu não sei se consigo continuar assim. — Disse então, passando a mão pelo cabelo. Ruby apenas assentiu dessa vez. — Parece que a gente não consegue concordar em nada quanto ao futuro. Eu amo que você seja tão independente e essas trivialidades bobas não são uma grande questão para você, mas, Deus, é tudo que eu passei minha vida querendo, e não é apenas isso… — Ergui os ombros. — Eu…

— Eu sei. — Ruby disse. — Acho que soube quando falamos sobre filhos, mas não queria aceitar. E então o intercâmbio e, veja, eu jamais impediria você de ir, mas acho que ficou claro pra mim que mesmo que você seja um homem crescido agora você ainda tem tanto para viver, tanto para ver e…

— Talvez eu seja teimoso demais também. Ou um tanto quanto mimado. Eu entendo seus pontos de vista e seus desejos, mas tudo que eu consigo pensar é em como te fazer mudar de ideia sobre eles. — Ruby sorriu, mais uma vez aquele sorriso triste, e quando ela ergueu os olhos para mim eu pude ver que ela lutava contra lágrimas.

— Deus, acho que nossa guerra de egos seria capaz de causar uma cratera na grande Londres. — Disse e então eu sorri, brevemente.

— Eu tentei, Ruby. Eu juro que tentei. Eu queria tão desesperadamente fazer isso dar certo, mas quanto mais fundo a gente mexe, menos eu consigo enxergar um futuro para nós dois, não importa o quanto eu queira, o quanto eu me esforce, só parece que estamos nadando contra a maré.

Ruby assentiu mais uma vez e, sem vocalizar, disse mais uma vez que sabia. Ela se aproximou e tocou meu rosto.

— Foi uma aventura divertida, porém. — Disse, tentando alargar mais o sorriso, sem muito sucesso. — Você vai James, persiga seus sonhos, conquiste o mundo, ele está esperando por você. Viva tudo o que você tem para viver, aprenda todas as línguas que precisar ou quiser e, quem sabe. — Ela ergueu os ombros. — Nós nos reencontramos uma vez, não foi? Se for pra ser, se eu for a mulher certa pra você, então um dia, se o destino cruzar nossos caminhos de novo, então nada disso vai importar e, ah, nós vamos ter tanta história para contar. — Ela sorria, mas uma lágrima ganhou a briga e escorreu por sua bochecha, eu a afastei. — Se for pra ser será, mas até lá, e mesmo que não, eu sei. Eu entendo. Vai viver, James Sirius. — Ela fungou e se apressou a enxugar uma segunda lágrima que lhe escapava os olhos. — E viva sabendo que você conseguiu partir o coração da primeira garota que partiu o seu. — Ela sorriu, balançando a cabeça, e eu a beijei.

Ruby estava certa. Eu ainda tinha muito o que viver e descobrir. E, por mais que não me orgulhasse em ter partido o coração dela, principalmente considerando a forma como tudo chegou ao fim e os porquês, aquilo de fato tinha ajudado a me fazer sentir melhor. Mas, mesmo que a minha esperança em encontrar aquilo que eu sempre quis já estivesse acabando, mal sabia eu que o amor da minha vida chegaria como um furacão. De repente, sem convite e virando tudo que eu achava que sabia de cabeça pra baixo.


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Notas finais do capítulo

Nós estamos TÃO perto do fim que eu quase fico triste. Os próximos últimos capítulos já tem bastante coisa desenvolvida (desde 2014) e podem chegar bem mais rápidos que esse, é alta a probabilidade de que James finalmente encontre o amor da vida dele ainda em 2023 e vocês, fieis leitores, descubram o desfecho dessa história em breve. Mas me conta, o que acharam desse capítulo? E quais as expectativas de vocês para os próximos? Espero ver vocês em pouco tempo!



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