[AGNES]

(música do capítulo)

Oh, você tem esse sentimento que eu quero sentir

Oh, você tem esse sentimento que eu quero sentir

Myra me levou para um lugar mais afastado dos chalés, lá estavam alguns garotos jogando ping pong em total inércia.

Será que Tobias está aqui? Estou tão perto e mesmo assim tão longe de encontra-lo.

— Hi guys — diz a morena em um inglês convincente.

— Oras, olha quem está aqui — cumprimenta um garoto com um sotaque extremamente evidente. Ele falava com a boca quase fechada e se deliciava de cada sílaba como se recitasse um poema.

Apesar do modo estranho de falar era um garoto bonito. Alto de cor morena-viva, seu cabelo era cheio, um afro, com fios bastante desenhadinhos. Se não tivesse um sotaque tão engraçado eu gostaria que ele fosse meu Tobias.

— Olá Kazu — diz Myra.

A garota se distancia e cumprimenta os outros garotos da sala. O cômodo é bem extenso, com bordas feitas de madeira, mas paredes de vidro. Percebo então que estou em uma sala de jogos.

— Amiga tuya? — pergunta outro garoto. Este é pálido que o definiria como branco-papel. Pelo idioma, com certeza era da Espanha.

— Sí — diz Myra. — Kazu, Pietro e Carlo esta aqui é a Agnes, nova campista.

Percebo Carlo em um canto da sala deitado sobre a cadeira de descanso e jogando algo, mexendo freneticamente no controle wii branco que estava bem preso em seu braço gordinho, fazendo uma coloração meia rosada na pele apertada pelo tecido.

— Olá. — Carlo acena sem olhar.

— Hola, chica — diz o tal espanhol.

Nunca gostei de espanhol, não dos naturalizados, mas sim da língua.

— Agora que já conheceu alguns dos meninos eu vou procurar meu irmão, é a vez dele lhe mostrar as atividades chatas que envolvem suor e cositas más. — Myra me acompanha até a saída segurando meu ombro.

— Por favor, não vá, eu quero continuar o tour — Caso eu desejasse achar o Tobias seria com alguém que eu tivesse alguma intimidade.

— Isso soou estranho — diz.

— O quê?

— Esquece. — Myra abre um sorriso malicioso.

Pelo o que percebi, Myra cogitou a possibilidade d'eu estar cantando ela. Aposto que não houve um cheiro de "yuri" no ar.

— Esquecer do quê? — brinquei com ela.

Eu sabia que as prioridades começavam a se modificar. Eu não ligava mais para o acampamento ou para o quanto eu queria escrever algo. Sabe, eu queria viver. Ler minha própria história um dia percebida de um modo tangível.

E eu não sabia se realmente amava. Amar é uma palavra tão forte e saber parece tão complicado. Como se sabe de algo que não tem definição?

[TOBIAS]

Eu gosto de caminhar. Andar sem preocupações ou expectativas. Entretanto, olha eu aqui agora, andando com um preocupação e uma expectativa: Agnes.

Algo que se mescla e resta aquela mistura de querer e precisar; ter ou não ter; amar ou apaixonar. Sempre tudo tão confuso...

Eu nunca fui uma pessoa especial, nunca fui merecedor daquilo que tanto espero de alguém. Sou apenas um estudante de psicologia, o único homem da sala e, no meio de tantas mulheres bonitas e inteligentes, fui me apaixonar exatamente por aquela garota escritora e minha autora de quem nunca betei a história. De quem nunca arranquei um suspiro ou um primeiro beijo. De onde não houve caminho pode haver chegada?

Foi apenas uma garota querendo uma betagem, mas agora ela acaba com seu beta... e o beta sou eu.

Desço as escadas de madeira ornamentada com ramos de plantas, algumas folhas em espirais e odor cítrico do maracujá.

No campo de atividades não há nenhum campista, apenas os sócios dos meus pais aos altos bate-papos.

— Olá Tobias — cumprimentou um deles.

Eu correspondi com um sorriso e voltei a subir toda escadaria. Onde será que a Agnes está?

Vejo a silhueta da minha irmã desenhada ao longe. Os volumosos cabelos crespo-cacheados e sua pele morena, ao seu lado encontra-se uma garota alta, magra, sem muitas curvas. Sua pele não era pálida como a minha, mas bronzeada, como se passasse muito tempo sob o sol.

E ela era bonita. Não usava maquiagem e seu bronze se destacava no cenário verde. Eu desejava tanto que ela fosse a Agnes, na verdade eu sabia que era ela. Mesmo sem saber, eu sabia.

Isso era o que me confrontava: a certeza. A certeza de que ela gostaria de mim e a certeza de que isso era o errado a se fazer. Eu rotulei como certo o que eu faria: diria a verdade, mas negaria as chances de ficarmos juntos. Mas naquele momento tudo me desconcentrou.

Acalme-se, Tobias. Você é um estudante de psicologia e sabe muito bem o que é uma conduta temporária... A Agnes é temporária.

Dei dois passos à frente.

O cabelo liso e castanhos quase douradinho.

Me aproximo mais, três, quatro, cinco passos...E logo eu estava ali, elas não me viam ainda, conversavam entretidas.

Toco o ombro de Myra, sinto o perfume da garota ao seu lado, um odor Adocicado-Frutal.

— Já era hora, Tobias — diz Myra ao me ver. — Você tem sorte da Agnes ser boa gente.

— Agnes? — digo sem quaisquer filtro. — Você é linda!

E essa era minha Agnes.

O tempo não vai ser desperdiçado e apenas aprendemos

a ir mais devagar e esperar a nossa vez

Prendi a minha respiração, pois acredito

que você vai me encontrar

to be continued...