O ruivo da casa 813 escrita por Ally
– Mabel, está com olheiras terriveis o que houve?
– Não dormi direito.
– Pois devia, está horrivel. - Lily saiu da mesa acabando o seu mingau.
– Não liga pra ela, é insuportavel. - Shelby levava á colher a boca.
– Nunca liguei para garotas como ela.
Mexi a colher no mingau grudento de aveia. Meus olhos percorriam as paredes descascadas do orfanato, não conseguia comer, nem me concentrar, a casa oitocentos e treze não deixava meus pensamentos nem um segundo sequer.
– Senhoritas. - Os saltos de Madame Lapudia faziam um barulho estranho no solado. - As tarefas não vão se realizar sozinhas! Apressem-se.
Deixei o refeitório e segui até o meu dormitório, amarrei o cabelo numa trança longa e calcei minhas botas de chuva. Desci as escadas e as outras meninas já estavam fazendo os seus afazeres. Tratei de pegar a pá e tirar a neve da porta de entrada. Shelby usava um casaco rosa florido, não era o cinza e horrível que ganhavamos do orfanato, era mais um dos presentes de sua avó Hortélia. Ela lutava pela guarda de Shelby desde que ficará orfã, e vinha visitar a neta toda semana. Eu sabia que estava próximo de Shelby sair do orfanato, mesmo ficando feliz por ela, sentia que ia ficar sozinha todos os dias, e essa ideia me assustava um pouco.
– Está tão frio, e não tem ninguém na rua. - Shelby resmungava, chutando uma bola de neve que se formará em seus pés. Seu cabelo ruivo caia sobre os olhos.
– Só aquele garoto ali.
– Que garoto? - Shelby virou-se assustada para mim.
– Aquele dali, encostado na árvore do outro lado da rua. - Apontei o dedo e ela recuou.
– Não tem ninguém ali Mabel! Pare de querer me assustar. - Ela largou sua pá no chão e correu para dentro do orfanato. Garota medrosa.
Mas, tinha alguém ali. Ele não era muito alto. Não consegui enxergar o seu rosto, mas o cabelo era vermelho vivo, como sangue. Ele usava um casaco preto e botas da mesma cor.
– Ei, você!
Gritei, mas foi em vão. O silêncio permanecia.
– Estou falando com você, garoto de preto!
Bati o pé tão forte fazendo neve espirrar em meu rosto.
Me limpava distraída e quando olhei de novo, o garoto havia se virado. Estava de frente agora, me olhando. Céus, como seu rosto era branco. Os olhos tinham uma cor que não consegui definir, maldita miopia.
– Vem até aqui. - Gritei novamente, e ele se escondeu atrás da árvore.
Droga, quais eram as intenções desse idiota ?
Atravessei a rua com um certo temor, mas a curiosidade falava mais alto. Cheguei até a arvore e para minha surpresa, não havia ninguém lá.
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– Até quando ficará brava comigo? - Shelby me olhou torto.
– Você tentou me assustar! - Ela cruzou os braços.
– Mas tinha alguém lá, acredite em mim.
– Para Mabel! Sei que sou medrosa, mas não devia caçoar tanto de mim por isso, ainda sou sua amiga se é que você se lembra. - A garota estava com os olhos úmidos.
– Shelby, não chore por favor, eu não quis...
– O que está acontecendo aqui? - Cassiana invadiu o quarto.
Ela olhou para Shelby que chorava encolhida num canto.
– Céus, Mabel, o que fez a garota?
– Nada.
– Venha comigo agora. - A professora me puxou pelo pulso até a sala de madame Lapudia, que por Deus, não estava lá.
– Vou ser razoável dessa vez. - Cassiana puxou uns papéis no velho armário. - Está vendo isso? - Ela me estendeu um dos papéis.
Assenti com a cabeça.
– É uma lista dos afazeres de inverno que ainda faltam, além de tirar a neve da porta de entrada, você também vai limpar os fundos.
– Não por favor!
– Isso é para aprender a não contar mentiras, mocinha. - Cassiana fez uma careta e saiu da sala.
Droga.
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Já era quase noite, e lá estava eu. Sozinha nos fundos do orfanato. Usava aquelas botas horrendas e dois casacos. O frio congelava minhas mãos mesmo de luva. E eu podia jurar que meus dedinhos do pé tinham se tornado pedra de gelo. Enquanto isso, as outras orfãs estavam lá, sentadas em frente á lareira tomando seu chocolate quente.
– É frustrante quando não acreditam em nós não é mesmo?
Uma voz rouca e melodiosa ao mesmo tempo quebrou todo o silêncio que ali estava. Cai para trás de bunda na neve quando reconheci á quem pertencia a voz.
– Você! Garoto maldito! Estou aqui por sua causa.
Ele se encontrava em pé em meio a neve. Usava o mesmo casaco preto e as botas de ontem. O vento gelado atingia em cheio seu rosto, e eu conseguia ver claramente gotinhas de gelo se formando nas pontas de seu cabelo ruivo. Mas, o garoto não parecia sentir frio.
– Ei, não está vendo que está nevando? Vai pegar um resfriado se continuar ai. - Falei o encarando, sua expressão sombria me dava medo de me aproximar.
– Não sou eu que estou sentado no chão com a roupa coberta de neve.
Ele riu e então se virou.
– Quem é você? - Gritei enquanto me levantava.
– Não sei e você?
– Oras! E-Eu sei quem sou!
O garoto desviou o olhar.
– Qual seu nome pelo menos? - Cheguei mais perto, e ele deu dois passos para trás. Droga, seus olhos eram hipnotizantes.
– Meu nome? Não sei, não me lembro, talvez eu não tenha um nome.
– Está gozando com a minha cara? Todo mundo tem um nome.
Ele fez uma careta.
– Está vindo alguém. - Ele disse. - Te vejo por aí.
E então eu pisquei e ele tinha sumido.
Como uma gota no oceano.
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