O ruivo da casa 813 escrita por Ally


Capítulo 1
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Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.



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O cheiro de terra molhada invadia minhas narinas. Já era de manhã e chovia.

– Está acordada Mabel? - A voz melosa de Shelby invadia os meus ouvidos, odiava quando ela fazia aquilo.

– Estou.

– Está chovendo. A madame vai nos mandar limpar o lamaçal na porta de entrada.

– Ela que faça isso. - Fui até o criado me trocar. A mesma saia listrada com o casaco preto embrulhava meu estômago. A diferença era que hoje, usariamos as botas de chuva.

– Shelby, Mabel a porta de entrada está terrivelmente coberta pela lama, já sabem o que fazer certo? - Ordenava madame Lapudia, invadindo o quarto. Céus, como eu odiava aquela mulher.

– Certo madame Lapudia. - Shelby concordava trêmula, como se ela fosse um tenente ou algo do tipo.

– Não ouvi o seu "certo" Mabella. - Madame Lapudia cerrou os olhos.

– Certo madame Lapudia. - Cuspi as palavras, franzindo a testa enquanto ela saia do quarto.

Já morava nesse orfanato á quatorze anos. Eu tinha um mês de vida quando meus pais me abandonaram na porta de uma senhora, que me trouxe para cá. Orfanato Amoris Allameda em Startford, Canadá. Bom, isso era o que diziam. Mas, sem nenhum parente próximo ou conhecido, não tive muita escolha. Não era um lugar ruim, os quartos eram grandes e cada um deles possuía banheiro. A cozinha e o pátio de refeição eram agradáveis, mas o que eu mais gostava era a sessão de histórias em frente a laleira nos dias frios com a Sr. Matilde, que era totalmente o oposto de madame Lapudia. E ainda tinha a Shelby com quem eu dividia o quarto, ela tinha dois anos á mais que eu, porém agia como se tivesse menos, e isso me irritava.

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– Vamos Mabel, você nem tocou no seu mingau. - Cassiana me olhava preocupada.

– Não estou com fome professora.

Cassiana era uma das coordenadoras do orfanato, era uma baixinha ruiva com alguns quilos á mais. Eu gostava dela por ser compreensiva com todas as meninas, ela se importava. Além de Cassiana, tinha a Senhorita Matilde que era a minha preferida. Ela nos contava histórias, alem de ensinar literatura. Matilde era nova, e muito bonita. Me surpreendia ela querer trabalhar em um orfanato. As duas eram comandadas por Madame Lapudia, que ficava responsável pela ordem no local.

– Tudo bem, mas não venha sair de seu dormitório a noite em busca de comida. - Cassiana recolheu o meu prato.

– Isso não vai acontecer.

Depois da refeição eu e Shelby subimos para o nosso dormitório, era o quarto número duzentos e três, o último do corredor.

– Estou tão cansada. - Shelby jogou-se na cama fitando o teto.

– Eu não. - Debrucei-me no parapeito da janela observando a chuva que não tinha dado uma trégua a tarde toda. Estava frio, mas não o suficiente para a sessão de histórias em frente á laleira. Droga! Como eu queria que nevasse. Olhei para o lado e percebi que Shelby dormia, tratei de fazer o mesmo.

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– Garotas, acordem. - Uma voz suave invadia o ambiente.

– Senhorita Matilde, o que faz aqui? - Perguntou Shelby esfregando os olhos.

– Hora da sessão de histórias. Estou esperando vocês na sala. - Senhorita Matilde passou e fechou a porta.

– Não acredito, está nevando! - Fui até a janela não acreditando no que via. - Meu desejo se realizou.

– Vamos Mabel, não quero perder nenhuma história.

Peguei um casaco no velho armário e segui Shelby até a sala, todas as garotas estavam reunidas em um círculo em volta da lareira. O ambiente estava escuro, somente o fogo iluminava a sala. O relógio de madeira ácima da lareira marcavam onze horas da noite. Madame Lapudia não sabia dessa reunião secreta em dias frios, era um segredo nosso e da professora Matilde.

– Tudo bem meninas, vocês querem que história hoje? - Ela falava baixo, quase sussurrando.

– Conta de novo aquela da princesa que se casou com o princípe encantado. - Pedia Jollie, a mais nova.

– Não, ela já contou essa. - Cortou Ravenna, a orfã problematica, mais velha do orfanato. - Posso contar uma Professora Matilde?

– Claro Ravenna. - ela sorriu. - Não se preocupe Jollie, depois conto somente para você a história da princesa. - Matilde murmurou baixinho para Jollie que limpava com as mangas do casaco o nariz escorrendo.

"A muito tempo atrás, existia uma casa muito bonita e bem cuidada aqui mesmo, nessa rua. Todos que passavam admiravam-na, uns sentiam inveja outros queriam compra-lá, mas no final, sem sucesso. Sabia-se que habitavam na casa, uma mulher muito bonita e um homem extremamente elegante, o verdadeiro casal de capa de revista. Porém, o tempo foi passando e as pessoas começaram a criticar o fato deles não terem um filho para herdar a casa e toda a herança dos pais. O casal então decidiu ter o seu primeiro filho, ele seria a honra da familia. Assim que ele nasceu foi feita uma grande festa em comemoração, todos esperavam muito, do mais novo herdeiro da casa. Porém, a medida que ele ia crescendo, problemas iam surgindo, ele era um garoto solitário, timido e que sofria grande pressão dos pais. Uma certa madrugada de inverno, foram ouvidos gritos vindos da casa, acordando toda a vizinhança, todos saíram de seus aposentos em direção a casa, alguns desmaiaram com o que viram outros vomitaram. Mal podia-se enxergar a neve branca no gramado, ela estava coberta pelo sangue vermelho vivo que escorria até a rua. Além de marcas de mãos ensanguentadas na porta de entrada, a cena era horripilante. Nunca se soube ao certo o que aconteceu, dizem que o filho único matara os pais, esquartejando-os e guardando cada pedaço de seus corpos em um canto da casa, amaldiçoando-a assim, pela eternidade. O filho nunca foi encontrado, mas dizem que ele ainda vaga por aqueles corredores abandonados, que um dia já fizeram parte da casa mais admirada da rua."

Ravenna finalizara a história com um sorriso macabro no rosto. Percebi Shelby trêmula, e as demais alunas também. Olhando bem, até a Senhorita Matilde estava.

– R-Ravenna! Não deveria contar histórias assim. - Senhorita Madilte se pronunciou quebrando o clima de terror. - Não se preocupem meninas, é somente uma história.

– Mas, a casa... Existe não é?

– Sim. - Ravenna me olhou ainda com aquele sorriso. - Isso mesmo meninas, é a casa 813, aquela abandonada no fim da rua, que todos evitam passar perto.

As garotas se entreolhavam assustadas, achei que Shelby fosse desmaiar. Jollie chorava fungando o nariz.

– Chega Ravenna! - Senhorita Matilde levantou-se. - Chega de histórias por hoje, acalmem-se garotas, vou leva-lás ao dórmitorio de vocês.

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– Acha mesmo que é verdade?

– O que Shelby?

– Sobre a casa. - Ela se encolheu na coberta.

– Não se preocupe Shelby, sabe como Ravenna é, adora assustar as menores.

– Tem razão... - Sua voz ainda era trêmula.

– Vamos dormir. - Apaguei o abajur deixando o quarto iluminado somente pela fresta de luz que vinha da janela.

– Boa noite Mabel.

– Boa noite Shelby.

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– Mabel! Mabel! Acorde.

Abri os olhos pesadamente. O borrão do corpo de Shelby preenchia a minha visão.

– O que foi?! - Resmunguei.

– Venha.

Ela me puxou pelo braço até a janela.

– Está vendo?

– Não estou vendo nada Shelby, vou voltar a dormir.

Antes que pudesse fazer, a garota me impediu. Segurou firme o meu rosto apontando até á casa no fim da rua.

– Está acessa está vendo? Tem uma luz acessa naquela casa! - Lagrimas brotavam dos olhos de Shelby.

Verifiquei novamente me debruçando sobre a janela, encarei fixamente a casa, e poderia jurar que vi a silhueta de um corpo correr pelo quarto. Eu não era medrosa como a Shelby, mas aquilo também já era demais para minha sanidade mental. Fechei as cortinas e voltei a minha cama.

– A história é real! É real!

– Pare de besteiras Shelby, vá dormir. Isso é que dar ficar dando ouvido as histórias malucas da Ravenna. É somente nossa imaginação.

– Tem certeza?

– Tenho.

É somente imaginação {...}

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