Kaos - O Encontro Com Eris escrita por PaulaRodrigues


Capítulo 3
Simbad, Simbaaad


Notas iniciais do capítulo

As sereias cantam uma melodia suave chamando por Simbad, mas por que? Sendo que Simbad está morto há anos...



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Elizabeth e Dalma ficaram perdidas enquanto os marujos iam procurando pela doce voz da canção. Notei que vazava água das carrancas dos navios, mas prestei bastante atenção ao caminho.

– Will? - Elizabeth o chamou e ele fez um sinal para que ela se calasse, olhando para o além, como se procurasse de onde vinha aquela voz.

Então pude ver as sereias começarem a rodear o navio e os homens iam acompanhando seu nado, como se nunca tivessem visto uma mulher antes, o pior de tudo era que esse tipo de sereia eu nunca tinha visto antes, elas eram feitas de água e tinham os olhos e o sorriso amarelos. Seus cabelos eram como cascatas de água e eu pude ouvir claramente sua música: Simbad, Simbaaad.... como no meu sonho. Mas por quê estavam chamando meu pai?

– Kaos... eles estão hipnotizados! - Elizabeth gritou.

Então o navio caiu numa corrente mais rápida de água, com rochas pelo caminho.

– Elizabeth! Não deixe que os homens caiam ao mar! - eu gritei. - Rato! - chamei lá em cima mas ele não ouvia. Ele e Kyle tamparam os ouvidos muito bem tampados. - Droga... Dalma! Preciso que vá lá em cima me dizer as coordenadas! - gritei e ela acenou positivamente com a cabeça.

Dalma começou a escalar enquanto eu dava algumas batidas fortes com o navio.

– Kaos, eu não vou conseguir cuidar de todos eles sozinha! - Elizabeth gritou.

– Kyle não te ouve, mas pode te ajudar! E pelos deuses Elizabeth, minha mãe passou por isso sozinha, salvando toda a tripulação. Dê um jeito, somos três.

– Bombordo! - gritou Dalma e eu virei o navio rapidamente, fugindo de uma rocha gigante.

A música continuava a chamar pelo meu pai, qual era o problema dessas sereias idiotas? Meu pai está morto.

– Bombordo! Bombordo!

Girei o timão o mais rápido que pude e assim mesmo batemos a popa em um resto de navio. Enquanto eu fazia a curva, um monte de sereias ficaram acima do navio e depois se jogaram no convés, levando quase Elizabeth junto. Uma sereia parou perto de mim cantando o nome do meu pai. Ela sorriu para mim, mostrando seus dentes afiados e tão amarelos quantos seus olhos. Fiquei um tempo olhando para ela, porque ela cantava pra mim como se eu fosse Simbad? Peguei meu punhal e cortei a cabeça dela que era pura água, mas ela se desfez de qualquer forma. Sereia burra.

– Tudo a estibordo! - Dalma gritou e eu girei o timão o mais rápido que eu podia.

Assim que terminei de virar, uma sereia ficou bem de frente comigo cantando o nome do meu pai. Eu não podia soltar o timão, então eu a olhei bem nos olhos com muita raiva, de maneira que invadisse a sua alma, da maneira que faço com Barbosa, mas não consegui ver a alma dela e assim mesmo não parei de encarar. Ela parou de cantar o nome do meu pai e ficou me olhando nos olhos também, até que ela deu um grito, me mostrando todos os dentes, soltei o timão e passei o punhal em sua cabeça e dessa vez o navio deu uma pequena batida na proa e eu agarrei o timão que girava fora de controle. Fiz um grande esforço para pará-lo. Nesse meio tempo, eu não tinha ideia de como Elizabeth ou Dalma estavam, só sabia as instruções que Dalma me passava.

– Catarata!!! - Dalma gritou e nós três gritamos juntas quando o navio começou a descer de ponta.

– Nós vamos morrer! - Elizabeth gritou.

Quando o navio chegou ao fim da catarata, um ou dois homens caíram para fora do navio. Foi então que eu vi uma catarata ao contrário, ou seja, ela levantava o navio à toda velocidade e ele batia contra uma pedra, se desfazendo em mil pedaços.

– Pelos deuses - eu disse baixinho olhando assustada para a catarata.

– Kaos!!! - Elizabeth gritou em desespero.

Fechei os olhos e tentei me lembrar do que minha mãe fizera naquele momento.

"Havia uma passagem, uma passagem minúscula bem perto da cachoeira invertida, era o único lugar que a mamãe poderia passar e salvar o papai e todos os marujos", ela dizia.

"Que mentira", meu pai dizia.

"Eu tinha acabado de te dar um soco na cara senhor beijoqueiro, você não se lembra de nada"

"Você gostou do meu beijo", ele sorria convencido.

"Não naquele dia", mamãe dizia séria e nós ríamos.

Kaos, volte, pensei comigo mesma abrindo os olhos.

– Kaoooos!!! - Elizabeth e sua voz fina e irritante.

Olhei para o lado esquerdo e vi um pequeno faixo de luz, era aquela passagem, onde não havia água. Virei o navio todo a bombordo.

– Kaos! Não tem água ali! - gritou Dalma e eu a ignorei e foquei naquela passagem, foi o que minha mãe disse, uma única passagem.

– Kaos! Isso é loucura! - Elizabeth gritava.

Sorri determinada, Kyle e Rato ajeitaram as velas para ganharmos mais velocidade e raspando o fundo do navio em cima do resto de navio, nós fomos jogados para fora daquela loucura e paramos no mar aberto, tranquilo, com o sol brilhando do outro lado. Kyle e Rato tiraram os tapões do ouvido.

– É! Isso aí garota! - disse Kyle apontando pra mim.

– Tão boa quanto a Marina - disse Rato feliz ao meu lado.

– Nada, minha mãe ainda é a melhor, ela conseguiu fazer isso tudo sozinha - eu disse sorridente, aceitava perder da minha mãe.

– Isso foi loucura, meu Deus! Estou chocada! - Dizia Elizabeth de olhos arregalados.

– O que aconteceu? - Barbosa perguntou se colocando de pé meio zonzo.

– Só salvei todos nós - eu disse.

– Nós quase morremos! - disse Elizabeth.

– Mas não morremos, sua ingrata - eu disse nervosa.

– Kaos soube conduzir o navio muito bem e eu não sei o que seria de vocês sem mulheres à bordo - disse Dalma. - Realmente você deveria agradecer Elizabeth, foi assustador, mas estamos vivos graças a ela.

Elizabeth me encarou com cara de medo, revirei os olhos e saí de perto dela. Fui para a cabine do Capitão e voltei a analisar o mapa. Um tempo depois Will entrou na cabine.

– O que você quer? - perguntei sem parar de ver o mapa.

– Me desculpar pela Elizabeth...

– Pelos deuses, ela tem idade suficiente para se desculpar sozinha, deixa de ser ridículo.

– Kay, você anda meio nervosa ultimamente...

– Eu? Só eu? Você acha que só eu estou nervosa e só eu estou diferente? - me aproximei dele. - Não sou eu que faço acordos escondidos com Sao Feng. Não sou eu que não compartilho meus planos com todos os envolvidos nele.

– Até parece que com Jack vocês compartilhavam todo o plano.

– Entre nós dois sim... bom, pelo menos a maioria.

– Kay, eu só quero que você entenda, que a razão sentimental não pode prevalecer nesse momento.

– Não há nenhuma razão sentimental aqui.

– Quer mesmo que eu acredite nisso?

– O que você está insinuando?

– Que você ama Jack Sparrow.

– Não - respondi depressa. - Eu não o amo dessa forma.

– Como sabe? Você já amou alguma vez para afirmar isso?

– Sim.

– Quem?

– Peter Kinsley.

– Kinsley? Aquele que se casou com a Meredith Voncher?

– Sim - eu disse com raiva.

– Eu não consigo acreditar nisso. Ele não correspondia?

– Ele ia se casar comigo, mas não deu certo - dei uma pausa e Will esperou. - Eu tinha treze anos quando o conheci. Constance tinha chamado uma amiga para tomar chá e quando ela chama amigas tenho que ser apresentada como filha dela. Então, nesse dia, eu conheci Peter. Com seus cabelos castanhos brilhantes e seus olhos tão claros quanto mel. Eu me apresentei na sala e depois saí porque achava tudo muito patético. Fiquei na varanda observando os pássaros e imaginando o dia em que ia sair de Port Royal, algo que eu fazia constantemente. Até que Peter se aproximou de mim.

"'Olá', ele disse.

"'Oi', eu correspondi meio de mau humor.

"'Não gosta de chá?'

"'Não é isso, é que... esse espartilho aperta demais', eu disse com dificuldade de respirar e ele riu suavemente.

"'Me chamo Peter, qual é o seu nome?'

"'Kaos'.

"Kaos? Que nome interessante. Tem alguma história?'

"'Foi meu pai que escolheu', foi tudo o que eu disse, pois tinha medo que alguém descobrisse que eu era uma pirata. Então nós crescemos e ele sempre vinha me visitar.

– Por isso suas visitas diminuíram... - disse Will.

– Exatamente - respondi. - Nós íamos para uma macieira que ficava um pouco longe da casa de Constance. Apostávamos corrida e eu sei que ele me deixava ganhar, tanto que reclamei com ele disso um dia e ele riu dizendo que sempre ia me deixar correr na frente porque adorava ver meus cabelos voando e balançando quase que como uma dança. Eu dava um soco nele e dizia para ele parar de mentir sobre coisas fofas a meu respeito e então nós subíamos na árvore e ficávamos sentados nos galhos comendo maçã. Até que um dia, quando tínhamos dezessete anos, eu acho, ele chegou em cima de mim num galho e disse:

"'Eu quero fazer uma coisa', ele sorriu olhando em meus olhos.

"'O que é?', perguntei com um sorriso e olhando nos olhos dele.

"Então ele me beijou, pegando na minha nuca. Foi incrível, meu coração disparou num ritmo que eu não consegui controlar e eu não queria parar de beijá-lo e nem abrir os olhos e descobrir que nada daquilo foi real. Mas então tivemos que parar de beijar, abri os olhos e ele estava ali. Fiquei com muita vergonha de demonstrar que havia gostado tanto, mas repetimos algumas outras vezes. Mas infelizmente, um dia, a realidade entrou na nossa história. Eu estava com dezenove anos, arrumando meu cabelo com fitas e tranças bem delicadas. Peter chegou em casa, sua voz agora era de um homem e ele era tão elegante e charmoso que fazia meu coração bombear apenas de tocar minha mão ao final da escada, me levando para fora e então eu corria na frente dele. Cheguei na árvore rindo.

"'Acho que estamos velhos demais para continuar correndo até a macieira', eu disse me apoiando no tronco.

"'Não acho', ele riu, 'essa é a nossa macieira, acredito que todos os momentos marcantes e felizes de nossas vidas aconteceram aqui, como esse momento, por exemplo', ele se ajoelhou e me mostrou um par de alianças, 'Kaos, quer se casar comigo?'"

Parei de contar a história naquele momento, lembrar da dor que senti, do sorriso se desfazendo do rosto de Peter, de depois vê-lo se casar com Meredith e ficar com Meredith, uma lágrima saiu do meu rosto e eu enxuguei.

– O que aconteceu? - Will perguntou.

– Eu disse não. "Não Peter, eu não quero", foi exatamente o que eu disse. Peter se levantou e me olhou confuso, juro que eu pude sentir a dor do coração dele no meu.

"'Por que não Kay? Foi algo que eu fiz? Desculpe se...'

"'Não Peter, a culpa não é sua é que... nós somos muito diferentes'.

"'Não vi a diferença até agora. Nós nos damos bem, nos conhecemos desde pequenos e...'

"'Meu coração está no mar Peter. Eu não quero ficar aqui em Port Royal, aqui não é a minha casa'.

"'Nós podemos viajar se você quiser...'

"'Não Peter... eu... eu sou uma pirata', eu olhei nos olhos dele chorando.

"'O que?' as lágrimas dele brotaram quase ao mesmo tempo que as minhas. 'Não, você é filha do Capitão Bench'.

"'Não Peter. Meu pai foi Simbad, um dos piratas mais famosos dos sete mares e o Capitão Bench o matou. Ele me salvou porque eu fingi que fui capturada pelos piratas'. Peter ficou calado, me olhando atônito. 'Me desculpe Peter', eu o olhei nos olhos, abaixei a cabeça e comecei a chorar. Peter também chorava. Ele se aproximou, pegou em minha nuca e me deu um beijo demorado na testa.

"'Eu te amo Kaos', ele disse e eu o abracei.

"'Eu também te amo Peter. Me desculpe', ele me abraçou e fez carinho em meus cabelos. Pelo abraço dele percebi que ele sentia muita dor e eu sentia também. Passamos aquela tarde ali, abraçados e nos despedimos e depois nunca mais nos falamos, nem nos cumprimentávamos quando passávamos lado a lado, ele me olhava e desviava o olhar quando eu o olhava rapidamente, ou eu fazia o mesmo. Então Will, não diga, nunca, que eu não sei o que é amar alguém."


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