Survival Game: O Começo escrita por Catelyn Everdeen Haddock


Capítulo 28
27 - Anne


Notas iniciais do capítulo

POV da Anne



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Meus dedos tateiam pelo braço de Heinrich, coberto do casaco, mas ainda estava seminu da cintura para cima, a não ser o colar. Que maus-bocados eu passei antes e agora, desde que trágica notícia da morte dos meus pais me atingiu em cheio. Eles estavam voltando do Rio de Janeiro para a Alemanha de navio, quando os mísseis teleguiados lançados pelos aviões-bomba, a mando de Hitler II, explodiram em alto-mar, matando todo mundo. Eu tinha onze anos quando isso aconteceu. Passei a chorar à noite, na cama, falando em bom tom papai, mamãe, cadê vocês? Voltem para mim! Eu era filha única.

Passei a morar com a minha tia Margareth e o meu primo Karl, que era dois anos mais velho que eu. Nunca me sentia à vontade com eles, já que Karl tinha temperamento forte e explosivo e sempre odiava Hitler e os nazistas. Mas a minha tia me criava como se eu fosse sua filha. Eu era bem diferente. Mas tinha os meus amigos ao meu lado na escola, mas fora dela, eu era bem solitária, a não ser com o meu primo e minha tia, que agora passei a me entrosar, com o passar dos anos.

Ele veio e chegou na minha vida. Era aquele garoto que vivia me seguindo na escola, sem que eu percebesse, mas eu já sabia, até o Dia da Seleção, em que ele foi sorteado depois de mim. Tenho pra mim que ele era muito sensato, mas um pouco pessimista, para o meu gosto. Adorei o discurso que ele fez, ele tem um espírito oratório, bem melhor que Hitler, que difamava a nós, judeus. Mas depois do que eu soube do ocorrido dele com o Lorne, passei a protegê-lo, me aliando ao bando de Frieda. Bom, na verdade foi uma encenação, mas foi muita desonestidade da minha parte, mas queria surpreendê-lo, fazer com que ele me entendesse. Mas o meu estratégico alívio durou muito pouco: a Frieda e os espertinhos, principalmente Stella (eu odeio essa garota, por ser esnobe) e o Vampiro (exibido e nojento!) me fizeram de gato e sapato, isto é, me trataram como se eu fosse capacho, do tipo Anne, vá buscar madeira! Anne, vá caçar! Anne, vá fazer isso, vá fazer aquilo, blá blá blá blá... Até que não agüentei e fugi, até encontrar Heinrich observando o corpo da Stella todo deformado. Foi uma discussãozinha difícil, mas deu uma esfriada em geral.

Abro os olhos e vejo Heinrich ainda dormindo. Ele era um pouco menor que eu, mas é tão lindinho. Olho em volta, Otto e Sophia dormindo. E eu, a única acordada. Mas algo me diz que eu devo fazer alguma coisa, pois todo o nosso estoque de comida está acabando. Enfim, passei por cima de Heinrich com todo o cuidado para não acordá-lo e verifiquei o braço machucado dele. Está enrolado com o curativo novo. Sussurrei um Eu te amo e o beijei na bochecha sardenta dele. Me vesti, pus o casaco, peguei a aljava de flechas e o meu arco e sai de fininho, na ponta dos pés para não acordar os outros. Abri a rede da fenda e a rocha da entrada da caverna, sem fazer qualquer barulho e saí. O céu estava limpo e o gramado brilhava através das gotículas da chuva de ontem.

Saí pela floresta à procura de caça. Queria ter chamado Heinrich para caçar comigo, se não fosse pelo tiro que ele levou ontem. Mas eu tinha uma boa pontaria, embora nunca tenha atirado ou caçado, retirando essa época do programa.

No caminho, encontro duas árvores entrepostas uma a outra, porém um pouco separadas. Sento entre elas e fico de tocaia, enquanto nenhum animal aparece, até que ouço um farfalhar na grama e retiro uma flecha da aljava e a engato no arco. Apareceu um castor marrom avermelhado, me olhando com os seus enormes incisivos. Perdi a coragem de abatê-lo, de tão fofinho que ele era. O seu olhar me lembrou a minha gata, a Susan.

Um outro companheiro o chamava para cavar o solo e ele acabou indo, desaparecendo quase que imediatamente. Olhei para cima e vi dois esquilos cinzentos no galho da árvore na frente. Eles pareciam que estavam revezando na coleta e na estocagem de nozes. Sempre gostei de nozes. E de esquilos? Ah, nem se fala! Me deixei levar pelo trabalho deles antes do inverno, período da hibernação deles. Por que eu não nasci esquilo? Queria ser qualquer um, menos judia que está prestes a ser assassinada.

Eu acompanhava todo o procedimento, que vai da coleta, distribuição entre os companheiros de trabalho e casa, até a estocagem dentro da árvore. O que é que os outros não dariam para ver isso, penso, atenta na beleza do companheirismo dos animais.

Alegria deles, porém, é interrompida, quando um ruído de um animal grande correndo vem para o local, fazendo que todos eles se escondessem na árvore, assustados. Era um javali preto, cujos caninos superiores voltados para cima eram proeminentes, apareceu. Ouvi dizer que os javalis eram semelhantes aos porcos, no entanto, são violentos e poderão te estraçalhar em pequenos pedaços, se você arriscar em abatê-lo. Mas tenho que arriscar, para o nosso sustento. Disfarçadamente, escalo na árvore ao lado e fico bem no alto. Engato a flecha no arco e me preparo para atirar, enquanto ele gira em torno de alguma coisa, que suponho ser uma coisa para comer.

Atiro a flecha bem no meio dos seus olhos. Nem acreditei que fiz isso! Ele caiu morto instantaneamente. Desço da árvore e verifico os sinais de vida, os batimentos cardíacos. Nada. Havia cessado o tempo de vida. Resumindo: ele está morto. Tento pegá-lo, até que não é tão pesado assim. Na verdade, era um tipo "adolescente", jovem. Mas com os dentes tão grandes e curvados.

Carrego-o por sobre o ombro e sigo rumando de volta à caverna. Até pensei em pedir emprestado algumas nozes dos esquilos, mas não me dei ao trabalho de intrometê-los, ainda que o javali morto poderá assustá-los. Porém, ouvi um coro de vozes se aproximando. Frieda! Lorne! Arnold! Corri para me esconder em uma rocha, ou um arbusto.

Os ouvi dizer. Era mesmo o bando se aproximando do local onde eu abati o javali.

– Aquilo foi osso duro de roer! - resmungava Lorne.

– Mas foi uma cartilagem mole de roer! - rebateu Frieda. - Porque eu consegui atirar naquele magricela. Pô, pensei que ele estivesse morto! Sacanagem!

Então foi ela! Frieda atirou em Heinrich! Só se ela tiver pego emprestado a pistola de Lorne.

– Eu devia tê-la matado na hora! - Arnold vinha atrás resmungando. Ele estava mancando. - Se não fosse pela pedra que a outra havia me atirado!

Ele se referia "a outra" àquela garota que veio de Colônia, que havia atirado a pedra para distraí-lo para a gente, mas quando ele ia mirando em mim, quando eu fui jogada no chão por ele, a garota entrou na minha frente e ele acabou atirando no seu peito, espirrando todo o sangue. Depois, Arnold correu, me deixando sozinha com a garota. Fiz o possível para que ela sobrevivesse, mas não cheguei a tempo. Ela morria no meu braço. Não tive coragem em deixá-la ali sozinha, até a nave coletá-la.

– Mas isso não é o nosso problema - replicou Lorne, apoiando na árvore dos esquilos. - o nosso problema é que estamos perdendo um de nós. Primeiro, Stella, depois, Ludwig e a Hannah.

– A perda não é o nosso problema! - rebateu Frieda. - O que importa é a vitória! Eu vou sair dessa viva! - bateu com o punho no peito, para mostrar quem era, na verdade.

– Mas e a gente? - indagou Arnold.

– O que é que tem vocês?

– Nós não estamos nessa também?

– Aí, isso já não é um problema! - Frieda garantiu.

Mas vai ser um problema assim que você morrer, sua songamonga! Saí de fininho do meu esconderijo e consegui escapar com êxito. Apesar do peso do javali.


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