Eu me sentia nas nuvens. Não acreditava que esse dia havia chegado. Tudo estava tão mágico... tão perfeito. Minha mãe mexia levemente nos meus cabelos roxos prendendo a franja com um grampo. Quando ela terminou de fazer meu penteado, colocou um arco feito de flores brancas que exalavam um perfume maravilhoso em minha cabeça. Eu virei para o espelho e me observei por alguns segundos.

— Está tão linda... — afirma minha mãe me abraçando — Teodora ficará orgulhosa.

— Eu sei que vai. Não vou decepcionar minha avó.

— Você sabe que ser uma rainha arqueira requer muitas responsabilidades. Não é tão simples quanto imagina. — ela diz olhando para o porta-retrato da Teodora.

— Eu sei mãe. Foi por isso que batalhei duro para chegar até aqui. As noites em claro valeram a pena, afinal. — eu respondo lembrando dos meus treinos e batalhas como arqueira.

— Você merece...e como o tempo passa rápido...minha filhinha já tem 18 anos!

— Filhinha não mãe, menos! E você? Não quis assumir o cargo de rainha arqueira porquê? — pergunto curiosa.

— Eu...desde pequena, sabia que não era a melhor arqueira. Eu nem me preocupava tanto em lutar. Gostava de cuidar dos outros guerreiros, não podia deixar eles feridos. Eu descobri um grande dom como médica, e Teodora sabia que meu futuro seria esse. — ela responde com um leve sorriso no rosto.

— Realmente, o que seria desse povo sem você... — falo levantando da cadeira para pegar o meu arco e flecha.

Segurei o arco relembrando da minha história junto a ele.

— Esse arco vai ser guardado com carinho. — afirma minha mãe percebendo o meu apego a ele.

— É difícil me desfazer dele... meu “velho de guerra”. — falo sentindo as cordas desgastadas dele.

Ouvi as portas se abrirem e um dos gigantes da realeza entrando.

— Quinze minutos, vossa excelência. — ele disse se ajoelhando até mim.

— Vossa excelência?! — eu pergunto espantada.

— Desculpe, pensei que vossa senhoria gostasse desse pronome.

— Não se culpe por nada...eu ainda nem sou rainha. E imprevistos acontecem.

— Não diga isso! Nada de ruim vai acontecer. — afirma minha mãe rapidamente.

— Claro. — ele fala ainda ajoelhado.

— Assim espero. Só que quando eu me tornar rainha, avise aos outros que quero ser chamada apenas de rainha Tainá, ou de “você”. — falo oferecendo a mão para o gigante se levantar.

— Vou avisar. — ele confirma saindo da sala.

E assim eu fiquei na janela para escutar o discurso de Teodora que aconteceu antes da minha entrada.

— Povo de Kethoria! — ela anuncia no microfone ouvindo os gritos e palmas de todos os integrantes da vila — Nosso reino veio desmoronando a alguns tempos atrás. Agora, ele já se reergueu graças à ajuda de cada um de vocês. Que a prosperidade continue reinando, que nada mais abale nossa forte vila! — ela grita já perdendo o fôlego por estar em uma idade avançada.

— Minha avó parece bem feliz, não? — eu pergunto para minha mãe que balança a cabeça e sorri.

— Hoje nós temos uma nova geração. Nossos filhos estão aptos para continuar a fazer com que o reino cresça firme e forte. Eles tão jovens, estão com o conhecimento mais amplo do mundo, estão criando coisas tecnológicas que podem revolucionar esta vila para sempre! — complementa minha avó.

O gigante me chama para eu me direcionar ao palco, pois já ia ser anunciada.

— Estarei na multidão te olhando! — diz minha mãe.

— Há sessenta e cinco anos atrás, eu estava aqui, recebendo a coroa de rainha arqueira, que era de minha mãe. Hoje, estou aqui para fazer o contrário. Vou dar a minha coroa com muito orgulho para minha neta Tainá Anthemia! — ela chama e eu entro no palco, sendo aclamada pela multidão.

Ela me abraça bem forte enquanto todos aplaudem. Eu cumprimento o rei bárbaro, George, e me aproximo novamente da Teodora.

— Tirei a coroa de mim pois meu legado chegou ao fim. Agora é sua vez de usá-la. Agora, segure ela. — Teodora diz enquanto eu toco na coroa dourada reluzente junto a ela — Vamos ao juramento. — ela diz pedindo para que eu repetisse com ela.

— Eu, como rainha arqueira, juro ser fiel a todos e não decepcionar meu povo. Juro proteger a vila a qualquer custo. Não deixarei a ganância tomar conta de mim. Não privilegiarei apenas uma camada social, mas o povo como um todo. Trabalharei em harmonia com o rei bárbaro e nunca farei algo perigoso sem consultá-lo. Eu e os kethorianos seremos um só, um só povo, uma só vida, uma só força. Tudo por Kethoria, hoje e sempre, até o fim do meu legado! — repeti as palavras de minha avó.

Assim que terminamos eu tirei o meu arco de flores, e no mesmo momento que ela estendeu o braço para colocar a coroa em mim, eu estendi o braço para colocar o arco nela.

— Eu, Teodora Anthemia, em nome de toda a família Anthemia, te concedo essa coroa que lhe dará todos os poderes de uma rainha arqueira, e transferirá toda a minha sabedoria a você. — ela diz colocando a coroa em minha cabeça.

Eu rapidamente senti a minha evolução. Minha roupa se transformou, surgiu uma capa verde oliva, e ganhei ao invés do arco, ganhei uma besta, algo mais fácil de manusear e com um dano maior. Depois que voltei a realidade, lembrei de colocar o arco de flores em minha avó.

— Eu, Tainá Anthemia, em nome de toda a família Anthemia, te concedo esse arco florido simbolizando o cumprimento do seu legado sem a quebra de seus juramentos, deixando a paz aqui. — falo colocando o arco em sua cabeça.

A multidão aplaudiu, menos um mago que estava com uma cara ranzinza.

— Tudo isso é pura palhaçada. — reclama o mago ao pai.

— Seja mais respeitoso, Allan! — diz o pai chamando a atenção do filho.

— Um dia eu ainda saio dessa vila e vou morar por contra própria, no meio da selva. — ele sussurra pra si mesmo.

A multidão se acalmou, e então, era minha vez de fazer o discurso.

— Saudações, kethorianos! Esse dia é um dia muito importante para mim. Não por causa do luxo que vou receber, nem por causa das ordens que vou poder dar. Esse dia é importante porque poderei enfim ajudar essa vila a crescer muito mais. Temos que investir no novo, no futuro, pensar além, e para isso preciso da colaboração de vocês! Espero realizar um ótimo trabalho ao lado de George, o rei bárbaro com trinta e dois anos de experiência e dedicação. Obrigado pela atenção de todos.

Teodora pediu para que eu sentasse no trono. Sentei sentindo aquele encosto macio feito de veludo vermelho. E só crescia a minha vontade de revolucionar esta vila, de ficar marcado na história todo meu legado.

Todos saíram para voltar a realizar seus trabalhos na vila. E eu comecei a realizar o meu, finalmente.