Um jeito de ser bom de novo escrita por Sassenach


Capítulo 14
Capítulo 11




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/547118/chapter/14

Tive o ímpeto de olhar para o me lado esquerdo, na parede de frente para minha cama, como se alguma coisa ai merecesse minha atenção. Me arrependi profundamente de virar o rosto pois lá estava ela, apontando o dedo para mim, caso ela tivesse, e me acusando por tudo o que fiz: a pipa azul. A visão daquela pipa, ali na minha frente foi a última gota que faltava pingar no meu balde de amargura. Explodi. Me joguei na cama e chorei copiosamente. Eu soluçava e me afogava nas minhas lágrimas. Coloquei o travesseiro sobre o rosto para abafar os ruídos, mas não me importava se alguém me ouvisse ali. Chorei por minutos incontáveis. Minha cabeça estava latejante quando resolvi levantar da cama. Fui até a janela e encostei o rosto no vidro para olhar lá fora. As gotas de chuva inda corriam por aquela janela, e o céu estava nublado como naquele dia. Uma cena, apenas um cena breve, foi tudo de que precisei para me sentir vivo de novo: Soraya e Sohrab estavam andando de mãos dadas pela alameda. Ele apontava para várias direções e falava com um entusiasmo contagiante. Ele a arrastava para lá e para cá, falando sobre cada lugar. Então ela se deteve no meio da alameda e olhou para cima. Seus olhos encontraram os meus e ela sorriu. Ela acenou e Sohrab repetiu seu gesto. Naquele momento eu me dei conta de que ali em baixo estavam as duas pessoas que eu mais amava no mundo.

Sai do meu quarto, não sem antes pegar o livro. Passei pelo corredor correndo e cheguei às escadas, que desci como um raio. Eu estava deixando tudo àquilo para trás. Coloquei o livro na mesa da sala e fui até a cozinha para pegar uma faca. Depois peguei o livro e abri a porta. Lá fora, abracei Soraya com todo o cuidado para não cortá-la.

— Segure esse livro por enquanto, eu volto logo. — eu disse entregando o livro para Soraya e me virando para Sohrab — Venha Sohrab. — estendi a mão para ele que estava aturdido. Ele parecia assustado e confuso. Lembrei que estava com uma faca na mão e ri — Calma Sohrab, eu só quero te levar num lugar. — peguei a sua mão, mas ele estava hesitante — É um lugar especial para mim e seu pai. — eu disse sorrindo. O último comentário surtiu feito, porque mesmo com medo ele segurou minha mão e me seguiu. Pisquei para Soraya que deu um sorriso amarelo — Está tudo bem. — disse para ambos — Quero que ele conheça o local onde eu e seu pai íamos quando crianças.

Levei ele para norte da propriedade em direção à colina. Ele soltou minha mão e foi subindo na minha frente. Isso me fez pensar que Hassan já deveria ter levado ele ali. Cheguei ao topo da colina ofegante, e me sentei na grama para recobrar o fôlego. Fiquei de pé e pus a faca no chão. Me apoiei na romã e disse para Sohrab para se aproximar. Ele veio, meio sem jeito e tocou também o tronco da árvore. Seus olhos se fixaram em inscrições que uma das ramificações do tronco continha:

— Tem algo escrito aqui? — ele me perguntou

— Sim, tem uma coisa escrita ai. Você consegue ler?

— “Amir e Hassan, sultões de Cabul...” — a frase me atingiu em cheio. Eu queria ouvi-la pronunciada por outros lábios. E a pronúncia através do filho dele era tão impactante quanto eu esperava que fosse. Ele deteve o dedo nos entalhes em que se liam o nome de Hassan. Ele olhou para mim com os olhos cheios de lágrimas e me surpreendeu quando abraçou minha cintura e começou a chorar — Eu... Eu queria que ele estivesse aqui com a gente. — ele cuspiu as palavras e chorou desoladamente. Retribui o abraço e me juntei ao seu coro de lágrimas:

— Eu também queria que ele estivesse aqui. — depois de um bom tempo chorando, me abaixei na sua altura e lhe dei um abraço reparador. Então peguei a faca e me dirigi à romã novamente. Fiz entalhes semelhantes aos anteriores.

— O que esse diz? — Sohrab perguntou. Fiz um sinal com a cabeça como quem diz “Leia”, e foi o que ele fez: — Sohrab, o sultão de Cabul. — ele seu uma risadinha e começou a chorar de novo. Abracei-o e ele retribuiu. Andamos um pouco pela colina e depois voltamos para casa. Soraya estava esperando por nós com baldes cheios de água e produtos de limpeza, além de vassouras e esfregões. Era a nossa primeira missão ali: limpar a casa inteira. Antes que eu chegasse até os baldes, Sohrab me puxou para outra direção. Ele me levou até a porta do casebre em que ele, seu pai e seu avô já viveram.

— Sohrab eu, eu não sei se quero entrar ai, sabe? Eu nunca, não costumava entrar ai... — e realmente não queria entrar. Seria ainda mais doloroso. Mas aquela era a única casa que aquele garoto conhecia. Me esforcei para manter a calma e ele abriu a porta. O casebre continuava exatamente do mesmo jeito que sempre esteve: as duas camas e a mesinha. A tapeçaria que baba dera a eles ainda estava naquela parede. A mesa onde ele fazia seus desenhos estava bem ali. Sentei na cadeira e fiquei observando Sohrab fuçar em baixo de cada pilha de papel a procura de alguma coisa. — O que você está procurando?

— Espere ai, eu vou achar e... — ele puxou um envelope branco em baixo de uma pilha de outros papéis e entregou para mim — Tome. Era pra você, mas... — sua voz embargou — Ele não teve tempo de terminar de escrever.

Era uma carta de Hassan. Hesitante peguei o envelope de suas mãos e abri com cuidado, para não rasgar nada. Pedi a ele que acendesse uma vela ou qualquer outra coisa e foi o que fez. Tirei o papel do envelope e quando ia começar a ler, percebi que ele estava sentado na cama de frente para, provavelmente esperando que eu lesse em voz alta. Comecei:


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Um jeito de ser bom de novo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.