Um Outro Lado da Meia-Noite escrita por Gato Cinza


Capítulo 32
E quando a autora fica com preguiça de digitar...


Notas iniciais do capítulo

Capitulo não revisado por causa do Conde Drácula, do Príncipe Kohl, do Fantasma da Ópera, do Doutor Jekyll, do Lobo Mal e do carinha da sorveteria que disse que não existia sorvete de amendoim – tenho certeza que existe em algum lugar do mundo.



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Havia tempos que ele parara de se importar com as pessoas, lhe interessava apenas proteger a irmã, Valentine, considerava o mundo um lugar perigoso para ela e decidira mantê-la segura mesmo que contra sua vontade. A levara para Ferrara, bem longe das ilhas britânicas onde seu pai não pudesse controlar o destino da filha ou seus familiares sobrenaturais a alcançassem. Então sua inocente e não tão ingênua irmã se apaixonou por Narciso Belaya, um erro irreparável na opinião de Dylan. Como ela podia ter se deixado envolver pelo irmão daquela bruxa que a cegara? O bruxo ameaçou a vida de Narciso e sua irmã abriu mão do romance. Levou muito tempo para que Valentine voltasse a lhe dirigir palavra e mais tempo ainda para voltar a tratá-lo como irmão, mas Dylan já havia passado por brigas como aquelas e sabia que no fim da tristeza e da raiva a irmã o perdoava. Então quando ás coisas estava voltando ao “normal” e ele caminhava distraído durante uma manhã de céu azul, a única pessoa que ele tinha esperança de nunca mais rever cruzou seu caminho. Sabia que Ferrara era uma cidade pequena ainda que estivesse crescendo, as chances de esbarrar em uma pessoa indesejável eram grandes, mas aquela pessoa em questão ele sabia que estava enclausurada em um convento á alguns dias de viagem. Mas naquela manhã o rosto que ele imaginava nos últimos anos e os olhos que ele via em todos os pesadelos estavam ali, reais em sua frente. Morticia Belaya, a bruxa que havia causando dor e sofrimento á sua irmã estava literamente em sua mão – ele havia a segurado quando ela se desequilibrou – os olhos mutáveis que anos antes o olharam com terror agora o olhavam com indiferença, como se nada pudesse afetá-la. Dylan podia ter ignorado e se esquecido como fazia com tudo que não lhe importava, mas não conseguiu, ela estava novamente tão perto, podia se vingar do que ela fizera com sua irmãzinha. A seguira e observara durante alguns dias até que ela ficou completamente sozinha. No inicio queria apenas atormentá-la, deixa-la louca de medo e apavorada com a própria respiração, entretanto ela não reagira como esperava que uma bruxa reagisse diante de um perigo, ela parecia uma criança corajosa em vez de bruxa poderosa, só recorreu á magia quando já não conseguia mais se aguentar em pé. Dylan não pretendia matá-la, queria que ela ficasse frágil demais para se suportar e matar-se a si mesma, então a levou para casa e deixou-a sobre cuidados de Julieta. Ela fugiu dele e quando a encontrou na manhã seguinte ela nem parecia dona de si, como se estivesse enfeitiçada ela caminhava a esmo debaixo de um temporal, de modo nenhum ela parecia um ser frágil, parecia apenas confusa e perturbada.

Quando se encontraram novamente – ele um monstro e ela um alvo – Morticia demonstrou uma indiferença gélida e anormal, estava preocupada com a família e não se dava ao luxo de temer por sua vida, nem parecia a mesma pessoa que lutara contra um monstro usando apenas uma faca, então compreendeu que a fragilidade dela se concentrava ao redor da família. Fizera planos para causar sofrimento, mas ela não saíra mais dos limites de sua casa que era fortemente protegido por magia branca, se conformava em observa-la perturbando a irmã mais nova ou provocando o irmão que geralmente gritava com ela e a mandava para o quarto, Dylan se pegou sorrindo mais de uma vez quando a bruxa provocava os irmãos de modo tão infantil que pareciam crianças inocentes prestes á receber castigo dos pais, e também se pegou extremamente mal humorado quando o amigo bruxo dela, Leonel, aparecia para visitá-la, na companhia dele, ela sorria e agia com a naturalidade de uma bruxa que não precisava se controlar e disfarçar diante das outras pessoas, era como se com ele, ela não usasse as máscaras que usava com os irmãos, mesmo quando se divertia. Um dia ele optou por não observá-la, Morticia tinha demonstrado um incansável interesse por plantas carnívoras o que era estranho – mesmo sendo botânico e gostando muito de plantas exóticas, Dylan achava plantas carnívoras uma extravagância da natureza, mas ele também tinha medo de borboletas então preferia achar os interesses da bruxa algo, comum. E exatamente naquele dia em que decidira por não observá-la, discutiu com Valentine que zangada resolveu ir sozinha á cidade.

Dylan foi atraído pela força do feitiço usado por Morticia, assim como muitos bruxos em Ferrara que sentira o poder sobrenatural da moça em ação. Possuiu o corpo do primeiro animal que alcançou uma lebre, e mandou levar a irmã para casa enquanto ele mesmo levava Morticia para o mundo mágico e se certificava que ela receberia os cuidados necessários para sobreviver, depois retornou ao bosque onde tentou deixar as coisas menos catastróficas do que aparentavam, regenerou os corpos destruídos fazendo que aparentassem um ataque animal, mas os bruxos haviam sentido o poder emanado por Morticia enquanto ela salvava a vida de Valentine e infelizmente para ela o rastro de energia que ela deixara era impossível de ser encoberto. Soube ao acaso sobre marcas nos corpos das vitimas da “assassina”, a marca do clã Izvah destruído séculos antes por um bruxo Belaya. Dylan sabia que não era obra de Morticia e decidiu ajudar a feiticeira, afinal ela havia salvado Valentine, mas as coisas não saíram como ele queria. Descobriu coisas sobre o conselheiro-mor da Ordem dos Magos da região, coisas que eram apenas rumores e mentiras segundo a comunidade bruxa de Risveglio, queria ajudar Morticia, mas se afastou para protegê-la quando ameaçaram a segurança dela. Quando achou que as coisas iam começar a ficar melhores para “sua flor”, recebeu a informação que ela havia fugido. Não ficara surpreso quando se encontrou com ela em situações estranhas depois de sua fuga, ouvira uma vez Narciso dizendo á Valentine que Morticia era atraída para problemas complicados e não podia discordar. Uma noite ela surgiu em sua casa na forma de gato domestico, como se estivesse apenas de passagem e tudo o que Dylan pensava era em mantê-la protegida, mesmo que isso significasse torna-la ainda mais desconfiada em relação á ele ou pior, fazê-la o odiar mais do que já odiava.

...

Ele acordou sentindo uma leveza que á muito tempo não sentia, como se todos seus problemas tivessem desaparecido enquanto dormia e ficara apenas aquela sensação imaculada de que nada de ruim pudesse acontecer ao seu redor, uma sensação falsa que rapidamente perde lugar para á realidade, mas que vale apena sentir. Sentou-se alongando os braços que estavam dormentes, então percebeu a presença dela no quarto, Morticia estava encostada próxima á janela o olhando distraidamente, como fazia quando ele falava com ela, ela apenas ouvia absorvendo informações e lançando olhares indiferentes de quem não se interessa por nada, mas ainda assim se importa. Por longos minutos não disseram nenhuma palavra, estava profundamente irritado com ela por tê-lo deixado inconsciente e estranhamente satisfeito por ela ter o feito. Se levantou e foi até ela, parou quando ela se encolheu, aquele gesto dela lhe doera mais que qualquer feitiço que ela pudesse lançar contra ele. Não precisava nem ter os sentidos apurados dos animais que possuía, o medo que ela sentia era visível, quase palpável.

— Não vou te machucar – garantiu estendendo a mão para ela

Morticia ficou olhando a mão estendida, cruzou os braços e passou por ele evitando tocá-lo e indo sentar-se na cama com uma postura reta, alerta como quem espera um ataque repentino, fitou-o com sua habitual inexpressão.

— Estou confusa, passei as ultimas horas revirando informações e conclui que preciso saber o que o senhor sabe sobre George.

— Não precisa saber de tudo, Morticia.

— Claro que preciso, minha cabeça está uma confusão, tem... falhas que preciso preencher. O senhor me enganou quando decidiu que eu não precisava saber, mas quem decide o que é melhor para mim sou eu.

Valentine havia comentado de modo malicioso que Morticia não falava seu nome, ela o cantava, mesmo quando estava falando mal dele. Dylan procurava alguma diferença no tom com que ela lhe falava e até aquele momento achava que sua irmã ouvia mais do que as pessoas diziam, entretanto o tom dela ao chama-lo de “senhor” era frio, não divertido ou implicante como ela pronunciava com frequência. Ele se sentou no lado contrário da cama evitando o rosto inexpressível da morena.

— Quando procurava o responsável pelas marcas nos corpos dos homens que você matou descobri que o conselheiro da sua ordem era um pirata e que Oods haviam sido responsáveis pela morte do conselheiro anterior, então comecei a fazer perguntas sobre a vida dele e um dia recebi um recado sobre sua vida estar correndo perigo, no dia seguinte após sua irmã ser atacada e ter o marido assassinado.

— O senhor escolheu me proteger, eu sei disso. Quero saber sobre os rumores á respeito de George, o que as pessoas diziam ou dizem.

— São estórias de piratas, a maioria é mentira e o resto são fatos distorcidos.

— Pare de me enrolar.

— Conta-se que o Capitão Linnett era um pirata honrado, ladrão, ganancioso, trapaceiro e assassino, mas nunca fazia mal a quem não merecia ou tirava de quem nada tinha, em geral era um sobrevivente capaz de qualquer coisa boa ou má, até se apaixonar por uma rainha. As histórias dizem que a rainha era uma bruxa das trevas que o corrompeu com sua magia sombria e quando ela o abandonou levou com si o coração do capitão deixando apenas escuridão. Ignorando as histórias de piratas, sabe-se que em algum momento entre quatro e três anos atrás o sanguinário capitão deixou a pirataria, se tornou um bruxo das trevas e assumiu o lugar do pai no conselho de magia...

— O que aconteceu com os tripulantes do Leemyar? – perguntou a bruxa o interrompendo

— Dizem que aqueles que sobreviveram ao Leemyar se redimiram e vivem como homens de bem, mas ninguém sabe onde eles vivem.

— Ele pediu para acompanha-lo uma vez, me tornar uma pirata também – disse Morticia olhando para as unhas que pareciam sujas como sempre – Mas eu me recusei, não queria deixar minha família. Por muitas vezes me perguntei o que teria me acontecido se eu tivesse dito sim para ele.

Dylan mordeu o interior da bochecha, imaginava que os motivos de Morticia querer tanto encontrar esse pirata não fosse apenas para ajuda-lo, havia algo nela que o incomodava quando falavam sobre George, uma tristeza incomum, saudades talvez.

— Se arrepende? De não ter aceitado viver com ele?

— Me arrepender do passado? Por que estupidez me arrependeria de algo que não pode ser mudado? Pensar no passado é como tomar uma decisão difícil, ir para a esquerda e se salvar ou ir para a direita e salvar alguém. Qual é mesmo a palavra para isso? Consistência... Consciência...

— Consequência?

— Consequências, é nisso que penso. As consequências de minhas decisões me perturbam, é como se tudo que eu decidisse fosse errado e afetasse as pessoas do pior modo possível. Não importa quão boa eu tente ser, nunca é o bastante.

Morticia se levantou começando andar em círculos murmurando coisas sem sentido e tão rapidamente que podia estar cantando. O bruxo ficou a observando, ele também tinha seus hábitos incomuns quando ficava nervoso, geralmente ia para o estábulo onde ficava falando com os cavalos enquanto os escovava e alimentava. Dylan estava preocupando-se com Morticia de modo que iam além de sua compreensão, queria poder confortá-la, mas o pouco que conhecia de Morticia era o bastante para saber que ela não o deixaria se aproximar sem lhe causar alguma dor física.

— Nem tudo que há na luz é precisamente bom tão pouco tudo que há nas trevas é inteiramente mal. Alguns nascidos na luz são facilmente corrompidos assim como alguns seres sombrios tem aptidão para o bem, estou certa? – questionou olhando para ele enquanto andava.

Dylan não tinha a menor ideia do que se passava na mente perturbada da morena, mas uma afirmação sobre a dualidade entre luz e escuridão era uma prova de que ela estava buscando uma explicação lógica para o que havia acontecido com o conselheiro George. Ele preferiu concordar com ela, mesmo desconhecendo o caráter verdadeiro de George. Morticia pareceu satisfeita com a resposta e voltou á seus murmúrios concordando e discordando de si mesma – coisa que parecia ser frequente uma vez que variadas vezes ele já tinha a ouvido falando sozinha. De repente parou no meio do quarto, perguntou sem se virar para ele:

— O que você fez comigo?

— Nada – decididamente era impossível acompanhar as mudanças de Morticia, ainda mais quando ela não se explicava.

— Claro que fez, está anoitecendo e ainda sou humana. Margarida me disse algo hoje cedo sobre isso, mas não consigo me lembrar do que era.

— É um feitiço que achei no livro de Rowena. Serve para anular maldições.

— Está anulando a maldição com um feitiço que achou em um livro escrito num idioma que você mal consegue entender? Você me odeia tanto assim ou é apenas insano? E se houver efeitos colaterais? Ao que me consta não existem contra maldição eficaz que não cause danos permanentes.

— Não há efeitos colaterais – informou sem tanta convicção.

— Ou talvez eu crie um par de asas e antenas e saia por ai transformando as pessoas em pedra. Preciso me concentrar – ela resmungou voltando a andar.

— Posso ajuda-la a se concentrar, se me disser o que se passa na sua cabeça.

— Não dá, são muitas coisas. George, é sobre ele que estávamos falando então pensei em Margarida e tudo ficou mais bagunçado, tenho que ficar sozinha penso melhor quando você não está me olhando como se eu fosse maluca.

— Só quero te ajudar – disse quando ela saia pela porta

Morticia voltou e o abraçou. Ficaram ali. Abraçados. Em silêncio. Por muito tempo.

☺ POV Morty ☻

Havia muitas coisas na minha cabeça, precisava me concentrar em uma só, colocar as coisas em ordens, mas como sempre sou tentada á resolver todos os problemas de uma só vez – como se isso fosse possível. Falar sozinha e andar em círculos me ajudam a acalmar, não sei o que me levou a abraçar Dylan, mas estava feliz por ele não se afastar ou questionar minha sanidade. Perdi a noção de tempo enquanto o abraçava e também perdi a capacidade de raciocinar, apenas me desliguei e fiquei ali me deixando ser confortada por Dylan. Tranquila e intocável do resto de minha realidade surreal, e voltei ao meu estado normal de indiferença e cautela.

— Passou – falei me afastando dele

Ele me olhou como se eu fosse maluca, não discordo dele, minhas mudanças de humor ás vezes me incomodam também. Controlar minhas emoções quando recebo tantas informações difíceis de assimilar é complicado e doloroso. Chorar não me ajuda e gritar me causa mais dor, então me contendo em me desligar de tudo e agir como se não me importasse, então consigo aos poucos colocar as coisas em ordem e me concentrar nos problemas. Agora meu problema era George, eu era a bruxa má que ele conheceu – ou talvez ele tenha conhecido outras bruxas das trevas no período de cinco anos atrás antes de pirar e ficar malvado. De qualquer maneira eu descobri o que havia ido buscar naquela casa, o que me levaria á:

— Sou grata pela ajuda e o serei para sempre – disse á Dylan com toda minha sinceridade e senti vontade de chorar.

Devia ter banido as emoções quando Leonel sugeriu. Precisava ir logo embora dali, infelizmente a capacidade das pessoas em me deixarem constrangida é maior que minha capacidade de evitar situações semelhantes, Dylan segurou minhas mãos.

— Não faça isso – pediu-me

— Nem sabe o que vou fazer – respondi com grosseria

— Imagino que agora que descobriu o que aconteceu com seu amigo vá embora desta casa, talvez se arrisque imprudentemente á se encontrar com ele.

Exato.

— Preciso conversar com George, tudo o que você sabe sobre ele são versões de outras pessoas, talvez ele tenha uma explicação diferente para tudo o que aconteceu.

— Tem uma explicação sim, ele gosta do poder que tem e não pense que ir conversar com ele vai muda-lo, caso tenha se esquecido, vocês já se reencontraram e ele mandou te matar.

— Não o reconheci quando o vi, ele também pode não ter me reconhecido, nunca lhe disse meu nome.

De fato a aparência dele não é a mesma que me recordo, é como se o Capitão de cinco anos atrás fosse um homem completamente diferente do conselheiro que conheci no sanatório. Talvez eu esteja certa e o tempo o tenha feito se esquecer de mim ou Dylan tenha razão.

— Se estiver errada e ele ainda te querer mal, o que vai fazer? Fugir de novo? Colocar sua família em perigo ou fazer alguma estupidez do tipo? Aqui você está segura Morticia e esta perto de sua família também. Fique até ter certeza do que vai fazer não cometa erros que podem ser evitados.

Ele estava certo, ia me arriscar á preço de nada.

— Te odeio – informei saindo do quarto dele

— Mentirosa.


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Notas finais do capítulo

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