Era curioso, realmente, como as coisas podiam mudar tão rápido.

Ontem, tudo estava bem. Remus havia acordado com um sorriso no rosto, e lhe deu um beijo ao servir o café da manhã, mesmo depois dos comentários cáusticos de Severus sobre a sua maneira irritante de acordar absurdamente cedo, e ainda com a ousadia de parecer feliz!

De noite, Remus havia se esparramado em seu colo como um gato preguiçoso, o nariz enfiado num livro de romance qualquer. Severus, com seu austero livro sobre a teoria por trás do Veritaserum, havia olhado para ele e zombado pelo gosto adocicado na literatura, até que Remus, um sorriso malicioso nos lábios, começou a recitar uma cena de declaração de amor, continuando mesmo quando Severus tentou tomar o livro dele, o que acabou numa luta em que ambos caíram no chão, Remus rindo estupidamente e Severus o encarando com irritação até que ele o beijasse, daquele modo que conseguia tirar o seu fôlego.

Agora… Bem. Remus havia ido embora, e, subitamente, ele estava vazio.

Lágrimas deslizavam por seu rosto, mas somente duas: Severus era muito bom em usar máscaras, a técnica usada para permanecer em silêncio enquanto Remus chorava, mesmo que estivesse gritando e se despedaçando por dentro. Ele realmente esperava que Remus, que sempre conseguia lhe entender tão bem, tivesse lido o que sentia em seus olhos. Ele podia ter agido como não se importava, mas isto estava longe da verdade.

Quando tinha dezesseis anos, Severus havia finalmente realizado que amava Remus. Naquela hora, soube que, se um dia o grifinório o deixasse, levaria sua essência com ele, que ele nunca mais seria o mesmo, uma sombra do que foi uma vez. Agora sabia que tinha toda a certeza do mundo e, oh, como ele desejava que não tivesse.

Por que a dor era muito grande. Era mais doloroso que o bullying que sofreu na escola, do que ver sua mãe se desvanecer e quebrar em frente ao pai violento. Era pior, até mesmo, do que o dia em que Lily brigou com ele, pior do que ela nunca o perdoar. O fato de que Remus havia lhe deixado com tanto docilidade — um beijo na testa, a promessa de sempre lhe esperar — não tornava nada melhor.

Ele devia ter ficado com raiva. Devia ter quebrado coisas, brigado, talvez até batido nele. Devia ter dito o quão horrível Severus era, o quanto ele o odiava. Por mais egoísta que esse pensamento era, se ele tivesse agido assim, Severus teria algo para culpar, e o remorso esmagador que se abatia sobre ele nunca existiria.

Ele sentia vontade de gritar, de chorar. Por que tinha que se envolver com aquelas pessoas? Por que tinha de atingir um ponto tão fundo que ele não podia recuar mais? Por que ele tinha de ser tão estúpido, e afastar a única pessoa que já o amou em sua vida?

Severus fechou os olhos e fingiu estar mais uma vez no dia de ontem, quando amar era fácil e ele era completo.