— Meninos, atenção, por favor. Faça uma fila quem for chamado.

A sala branca estava lotada de crianças entre oito e dezesseis anos, algumas sentadas no chão e outras amontoadas em bancos longos. Eram todos garotos — uns brancos, outros negros; uns baixos, outros altos. Nenhum deles, entretanto, parecia particularmente animado com o chamado da enfermeira. Sabiam o que estava por vir.

— Klaus.

Um garoto moreno, de aproximadamente doze anos, se levantou de seu lugarzinho no chão. Sua expressão era de dar pena: o rosto pálido, os olhos arregalados num pedido silencioso de ajuda a seus "amigos" sentados no banco. Silenciosamente, Klaus foi até a enfermeira. Era quase como ele estivesse se arrastando até ela. Seu medo era evidente.

Depois que o garoto se colocou ao lado da moça, ela chamou outro nome:

— Mark.

Outro garoto, dessa vez com seus quatorze anos, se levantou e andou até ela. As expressões de Mark e Klaus eram quase iguais: amedrontadas, pedindo pela ajuda que eles sabiam que não viria.

— Trip.

Com este garoto, entretanto, foi diferente. Sua expressão era a mesma que ele usava no dia a dia: séria, dura, com os olhos queimando de ódio por todos ali presentes. Certo, talvez com um pouco mais de ódio que o usual.

Trip, com seus rebeldes cabelos vermelhos, era a típica criança valentona. Não falava com ninguém, não se envolvia com ninguém. O máximo contato que fazia com outras pessoas era quando ia agredi-las. Se alguém puxava briga ou simplesmente irritava Trip de alguma maneira não fazia diferença — o garoto sempre resolvia seus assuntos à base da violência. Sempre fora assim, desde que se lembrava por gente. Apesar de que não fazia tanto tempo, tecnicamente. Nove anos, era isso? Trip nem se lembrava direito, não era de muita importância para ele. Mas, sim, sim, deveriam ser nove anos.

Quando ele se aproximou da enfermeira e se colocou na fila, Klaus se encolheu, apesar da relativamente grande diferença de idade entre os dois. A enfermeira os observou por um instante, com visível desgosto em relação a Trip, e, quando concluiu que o ruivo estava mais concentrado no band-aid em seu nariz do que em qualquer outra coisa, voltou a checar sua lista.

— Virus.

Foi a vez de um garoto louro, de mais ou menos quinze anos e um pouco alto demais para a idade, se levantar. Apesar de sua expressão parecer serena, foi possível notar uma leve tremedeira em suas mãos quando foi ajeitar os óculos sobre o nariz.

Virus era, sem sombra de dúvidas, o completo oposto de Trip. Era um rapaz comportado, sempre seguindo as regras — isso é, fazendo todos pensarem que ele seguia as regras devidamente — e até estudioso, pode-se dizer. E, ninguém sabe por quê, era o único que conseguia "domar a fera" que era Trip.

A relação dos dois era um pouco estranha, quase engraçada. Eles não eram amigos nem parentes. Apenas dois garotos que acabaram por se cruzar naquele enorme laboratório.

Foi algo bastante trivial, verdade seja dita. Trip caminhava distraidamente pelos corredores, com as mãos nos bolsos da calça para esconder uma maçã roubada do refeitório. Virus, por sua vez, andava enquanto lia, concentrado, um livro de ciências. Os dois trombaram um no outro e, antes que pudessem escolher quais xingamentos usar, se encararam. No fim, não foram trocadas hostilidades, mas apresentações.

— Desculpe-me. Qual seu nome?

— Trip — respondeu o ruivo após um instante pensando se valia a pena falar ou não. Levantou o queixo em direção ao outro, num gesto que incitava-o a se apresentar também.

— Sou Virus.

Ninguém disse mais nada, e os dois ficaram a se avaliar com olhos frios.

Depois de alguns poucos minutos, Virus se virou e voltou a andar. Não se assustou ao ouvir passos logo atrás dele. Virando o corpo um pouco para trás enquanto andava, o louro olhou para Trip por através das lentes de seus óculos e disse:

— Dá pra ver que tem coisa no seu bolso, sabia?

Trip arregalou os olhos, com um baixo "hã?", e Virus soltou uma risadinha maldosa.

Foi assim que se conheceram. Mas não vá pensando que se tornaram amigos ou algo do tipo. "Companheiros" seria um bom adjetivo, mas é uma palavra calorosa demais. "Acompanhantes", talvez?

Em todo caso, sua relação não era exatamente profunda. A partir daquele dia, Trip sempre seguia Virus para qualquer lugar que fosse, e o mais velho não se importava. Quando vistos juntos, o que se tornou frequente, Virus sempre estava falando — pelos cotovelos, se permite-me dizer — enquanto Trip apenas ouvia, acenando com a cabeça e grunhindo "uhum" de vez em quando. Mesmo que fossem raras as ocasiões em que Trip iniciava um diálogo ou que propriamente interagia em um, já era grande coisa, visto que muita gente pensava que o garoto fosse mudo.

De qualquer forma, Virus se posicionou na fila logo ao lado de Trip. A enfermeira checou sua lista mais uma vez. Visto que não havia mais nomes para serem chamados, ela endireitou sua postura.

— Muito bem. Sigam-me, por favor. — Se virou e saiu pela porta alta e branca, os quatro rapazes em seu encalço.

Todas as outras crianças observaram-nos partir, taciturnas. Apesar de toda a curiosidade para saber o que aconteceria com os quatro escolhidos, o desejo de ficar na ignorância era maior. Os meninos sabiam que tinham grandes chances de serem escolhidos mais tarde também. Sabiam que não seriam experiências agradáveis.

E, acima de tudo, sabiam que não aguentariam dormir mais uma noite ouvindo os gritos de dor de seus colegas.