Expurgo escrita por Jean Pereira Lourenço


Capítulo 7
T01E06 - O dia esperado


Notas iniciais do capítulo

Episódio 007 da série "Expurgo", de Jean Pereira Lourenço. O mais tenebroso pesadelo e o mais doce dos sonhos: Elisa vive uma manhã decisiva, perdida no limbo entre ambos.

ATENÇÃO: contém cenas fortes!



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Os dedos batucavam contra a mesa freneticamente. Os olhos atentos fitavam a folha escrita como se nada mais existisse no mundo. Elisa sentiu-se grata pela visita súbita de seu subconsciente em carne e osso, pois o acordo havia realmente sido cumprido por ambas as partes. O passeio com Eulírico não havia sido de uma dificuldade tão imensa, afinal, e o resultado estava, agora, em suas mãos. Ela havia conseguido escrever novamente, o conto “O homem na parede” era a prova sólida disso, naquelas cinco páginas que seus dedos longos e finos seguravam com tamanho afinco.

“Você é um parasita, um inquilino que não soube me habitar, um hóspede ingrato”, leu, em voz alta, reclinando-se na cadeira e soltando as folhas.

O conto era exatamente o tipo de escrita de que Elisa mais se orgulha: terror trágico com mensagens relevantes. Ela nunca apreciou o que nomeia “literatura vazia”, aquela que se constrói apenas pelo próprio escapismo. Segundo ela, deve haver uma conexão com a vida das pessoas, com o mundo real. “Esse é o objetivo da literatura”, dizia ela, mas ninguém jamais prestava atenção em seus conceitos. Ao lado dos papéis escritos à mão, uma caríssima caneta esferográfica de cor preta que lhe foi dada pelo antigo parceiro, pouco antes de sua despedida. Elisa cogitou a possibilidade de que a quebra de seu bloqueio teria sido causada simplesmente pelo uso da caneta, mas logo abandonou a ideia. “Nada dele me faria bem.”

Então, levantou-se e olhou para Eulírico, que estava deitado com a cabeça em cima das patinhas, olhando-a com cara de extrema fofura. Ela segurava um cigarro e estava pronta para acendê-lo, mas guardou-o de volta no maço e desistiu da ideia, por enquanto.

“Você quer passear, é?” indagou, pegando o cãozinho no colo e erguendo-o, enquanto olhava diretamente em seus olhinhos.

Como já estava propriamente vestida, trajando um curto vestido cinza com desenhos de cerejeiras em branco, uma jaqueta amarela, sapatilhas douradas e um sorriso aberto no rosto, não viu motivo para deixar de atender ao pedido do pequeno amigo canino. Com Eulírico no colo, aproximou-se da porta, pronta para deixar o apartamento, mas ainda não conseguiu sair. Dessa vez, no entanto, não era o medo do que encontraria lá fora que a fazia hesitar, mas sim o acautelamento sobre como deixaria seu lar ao sair. Elisa sempre levava muito em conta as próprias mensagens que deixava em suas histórias, aproveitando-as como forma de reflexão para a própria vida. No conto “O homem na parede”, uma moça tratava seu apartamento de forma desmazelada, e acabou sofrendo as consequências disso.

“Espera só um pouquinho, Eulírico”, disse, colocando-o no chão, e foi checar o estado de cada parte do apartamento.

As torneiras estavam todas fechadas, não havia nada fora do lugar, e nem qualquer acúmulo de pó nos móveis. Elisa pegou dois copos que estavam na mesa, lavou-os e guardou-os no armário. Recolheu as folhas onde rascunhou o conto antes de sua escrita definitiva, amassou-as e jogou-as no lixo. Os papéis contendo a escrita final, no entanto, deixaria em cima da mesa, debaixo de um peso, pois ainda precisaria olhá-los mais atentamente. Agora, sim, estava pronta para sair.

Lá fora, parada em frente à fachada do prédio, encarava a avenida movimentada e tentava extrair personagens das pessoas, como sempre fazia. Mas não teria tempo para isso, ela soube, pois um ataque de pânico poderia ocorrer a qualquer instante, com tanta gente por perto.

Enquanto caminhava até a padaria para comprar cigarros e pães, Elisa sentiu-se observada, seguida por alguém. Parou próxima a uma banca de jornais, pôs Eulírico no chão e segurou-o pela corda da coleira. Ainda que provavelmente fosse algo de sua cabeça, não poderia deixar de ter cuidado. Fingia ler algo em um dos jornais à mostra, deixando o cãozinho marcar território nas raízes de uma árvore que crescia na calçada; enquanto, na verdade, atentava-se para os arredores, com os olhos ágeis. Procurando disfarçar sua real postura e, ao mesmo tempo, distrair-se para deixar de sentir aquela sensação, Elisa leu um trecho de uma das manchetes, e acabou sentindo-se verdadeiramente interessada no assunto.

“DEUS NÃO QUER QUE O HOMEM EXPLORE O UNIVERSO?” dizia a manchete. No corpo do texto, a notícia de que o lançamento da EXO-GEN3515, um projeto ambicioso de viagem espacial tripulada, havia sido adiado mais uma vez, dessa vez por conta de um furacão que surgiu repentinamente poucos minutos antes da contagem ser iniciada. Segundo os responsáveis pelo projeto, o lançamento já havia sido impedido três vezes: por um terremoto, um vulcão adormecido que entrou em erupção e um incêndio iniciado por um raio.

“É óbvio”, concluiu Elisa, mentalmente, enquanto pegava Eulírico no colo e seguia em seu caminho até a padaria. “Você não pode sair do apartamento sem antes deixá-lo em ordem. Você não pode cuspir no prato que comeu, não é certo usar algo e depois deixá-lo sem dar satisfações, não é certo ser nômade.” A conexão que estabeleceu entre a notícia e o conto que acabara de escrever foi suficiente para distraí-la da sensação de perseguição. “Da mesma forma, você não pode entrar na vida de alguém, bagunçar, sujar, desarrumar, e depois simplesmente ir embora. Não é certo”, pensou, estabelecendo uma terceira ligação, agora com a imagem de seu antigo parceiro na mente.

Seus passos tornaram-se rápidos e fortes, pois despercebidamente foi tomada por uma grande raiva. Era o que sempre ocorria quando lembrava de Esteban, o boliviano; de como ele a conquistou e de como foi embora tão repentinamente, sem explicar bem o porquê. Elisa amarrou Eulírico pela coleira em uma placa em frente à padaria, e entrou.

“Eu quero três maços e cinco pães”, disse para o balconista, apontando para os cigarros, com uma feição séria.

O atendente fechou a cara e estranhou seu comportamento, pois costumava vê-la de bom humor.

“Ô Dona Elisa, tá de mau humor, é?” comentou, enquanto colocava os pães em um saco.

Ela não respondeu, mas apenas concordou com a cabeça, desviando o olhar para a direita e vendo, através de uma prateleira, uma mulher de óculos-escuros que pareceu suspeita. Elisa pôde ver seu rosto pelo pequeno espaço que havia entre um produto e outro, e que imediatamente foi tapado pela mulher, com um pote de chocolate em pó que tinha em mãos. Elisa arregalou os olhos e começou a caminhar naquela direção, contornando a prateleira sorrateiramente, até deparar-se com a suspeita.

“Quem é você?” indagou, agressivamente, com a testa franzida. Suas pupilas estavam levemente dilatadas.

A mulher assustou-se e deu dois passos para trás, segurando a bolsa com força, temendo ser assaltada. O balconista, que colocava os maços de cigarro dentro de uma sacola, notou que algo estranho acontecia, e foi correndo até lá.

“É você que está me seguindo, é?” disse Elisa, aproximando-se da mulher com olhos insanos. “Para de me seguir!” A desconhecida correu até a porta do estabelecimento, desesperada. “Para de querer entrar na minha vida, sua louca! Sua ordinária! Me deixa em paz!” gritou ela, frenética, enquanto já era segurada pelo atendente e a mulher saía disparada pela rua.

Elisa, ofegante, soltou-se dos braços do homem e olhou-o fundo através de seus olhos espantados. “Quanto é?”

Durante a volta para casa, com Eulírico no colo e a sacola segurada por dois dedos, ela se sentiu arrependida pela reação exagerada na padaria, ainda que não se lembrasse tão bem do que havia ocorrido. O céu da manhã estava coberto por nuvens, e a temperatura estava relativamente baixa, pois uma frente fria aproximava-se. “Odeio esses apagões malditos!” pensou, enraivecida consigo mesma. Embora a sensação de estar sendo observada ainda a acompanhasse, já estava mais calma quando a isso, carregando consigo a certeza de que aquilo não passava de uma crise de pânico querendo aflorar. “Não vou deixar meu medo tomar conta de mim”, refletiu para si mesma, enquanto já subia as escadas. “Eu preciso manter o acordo com meu subconsciente, porque preciso continuar escrevendo.”

Elisa subiu ao som de passos que também subiam as escadas atrás dela, mas conteve-se o máximo que pôde para não se acelerar, e continuar agindo de forma natural, pois seria apenas algum outro morador chegando em casa, assim como ela. Ao surgir em seu andar, destrancou a porta de seu apartamento e entrou, em seguida colocando Eulírico e a sacola no chão. Porém, enquanto reerguia-se para fechar a porta, foi segurada por alguém. Uma mão tapava sua boca e a outra segurava uma arma encostada em sua barriga.

“Shhh! Quietinha!” sussurrou uma voz masculina em seu ouvido.

Ela foi sendo empurrada para frente, enquanto era mantida daquela forma, rendida. Outro homem surgiu, um alemão alto e gordo, que pegou a chave de sua mão e trancou a porta. Elisa foi jogada com violência contra o chão, onde caiu de cara, em seguida sendo pisada nas costas com força. Ela mal podia acreditar. O fato de seu pior pesadelo estar tornando-se realidade era algo tão difícil de compreender, que a deixava nula, absolutamente vazia.

“Você vai ficar aí quietinha, não vai?” disse o homem de origem indiana que a pressionava contra o chão com o pé direito, e engatilhou a pistola, apontando-a para sua cabeça.

Eulírico começou a latir freneticamente, rosnando e ameaçando morder a perna do outro, que andava pelo apartamento procurando por algo. Irritado com o cãozinho, o homem deu-lhe um chute no focinho, empurrando-o para longe e calando-o de medo.

“Cachorro filho da puta!”

“Não!” urrou Elisa, chorando. “Não bate no Eulírico!” Seu corpo inteiro tremia em um misto de pânico e raiva extremos. O rosto estava grudado no piso e coberto por fios de cabelo, que se erguiam com a respiração forte.

“Cadê a porra do lugar que você guarda as joias?” perguntou o mais agitado, abrindo e fechando portas e gavetas, e jogando tudo no chão.

“Responde, vadia!” pressionou o comparsa, pisando com ainda mais força nas costas de Elisa. Ela apenas chorava.

“Eu não tenho joias!” clamou, em meio ao pranto.

O homem loiro parou de andar e pôs as mãos na cintura. “Uai, a gente precisa tirar algum proveito dessa visita, né?” Ele veio até perto dela, agachou-se e tirou o cabelo de seu rosto, olhando-a nos olhos. “O que você tem pra gente, belezinha?”

Ela cuspiu no rosto do homem, que se levantou em silêncio e, após dois segundos olhando para o lado, desferiu um forte chute na cara da escritora. Seu nariz começou a sangrar.

“Vadia é vadia, mesmo! Biscate do caralho!” exclamou o alemão, limpando o rosto. “Pode fazer a festa com ela, Claudião, essa puta merece que a gente faça o estrago aqui.”

Enquanto o indiano levantava o vestido com o pé, rindo, o mais gordo aproximou-se da estante de livros e também começou a rir.

“Olha aqui, que merda!” disse, pegando um livro na mão e mostrando-o ao outro, sorrindo. “‘A silhueta do Caos’! Uau, que legal, hein! Eu não sei de onde essa gente idiota tira que essas bostas aqui vão ajudar em alguma merda.” Aproximou-se novamente de Elisa, olhando-a de cima. “Você compra arma e munição por metade do preço disso aqui, sua idiota! E quem está na vantagem agora, hein? Eu ou você? Vadia!” E deu outro chute em sua cara.

A tal ponto, Elisa havia abandonado sua existência física havia vários minutos. Como em um de seus filmes favoritos, ela havia escolhido pular essa parte, deixando-se em piloto automático, para apenas retornar à consciência quando sua situação estivesse suportável novamente. Seus olhos estavam abertos e secos, as pupilas pequenas, mas tudo que enxergava era fruto de sua imaginação, que, propositalmente, bloqueava a realidade. Em seu sonho lúcido, tentáculos surgiam de todos os cantos e massacravam os intrusos. Eulírico ainda estava em um canto, aflito, acanhado, e chorava o tempo todo.

“Olha só isso aqui, Claudião: ‘o Caos, por mais que se manifestasse visualmente, às vezes até fisicamente, jamais passou de uma ilusão. O que existe mesmo é o ódio no coração dos humanos, e, ao despertar em massa desse sentimento rude é que demos o nome de caos. O ser humano é seu próprio arqui-inimigo.’ Tem como não rir?” comentou o alemão, segurando um o livro de Elisa aberto, e gargalhou. “Velho, isso só pode ser falta de rola!” afirmou, arremessando o exemplar pela janela. “Não vai mais precisar disso, princesa, o Claudião tem exatamente o que você precisa!”

O indiano começou a tirar a calcinha de Elisa com a mão direita, agachando-se, enquanto ainda segurava a arma apontada, com a esquerda. Ela parecia um cadáver: apenas um corpo imóvel, de bruços, com o vestido erguido, uma perna esticada e a outra dobrada, olhos estáticos, e a respiração tão leve que dificilmente podia ser notada. Sua pele pálida e corpo magro só acentuavam a morbidez que transparecia. De seus lábios, uma fina corrente de sangue fluía para fora, assim como de um corte no supercílio, causado pelo segundo golpe.

“Não finge que não está gostando, cachorra! Toda mulher adora levar porrada e pica!” disse o homem, enquanto jogava a calcinha longe e desabotoava a própria calça.

Uma lágrima escorreu do olho de Elisa, mas sua feição ainda estava congelada, inexpressiva.

“Merda, lixo, lixo, lixo, merda…” resmungava o outro, enquanto isso, jogando todos os livros da estante para fora do apartamento, “aqui não tem nada além dessas besteiras! Mete bastante, Claudião, que se a gente não encontrar uma grana boa, vai ser a única vantagem de ter seguido essa vadia.”

Nesse exato instante, enquanto o indiano puxava o zíper e o alemão empurrava a estante para o lado, foi que Elisa finalmente acordou, mas não como de costume, e sim despertando-se para uma nova realidade, para algo maior que estaria prestes a ocorrer. Seus olhos arregalaram-se, e parecia que enxergava a cena em câmera lenta. Viu as luzes do quarto piscarem, e todos os aparelhos eletrônicos ligarem e desligarem várias vezes, alguns deles entrando repentinamente em funcionamento: o rádio trocava de estações, a televisão emitia um chiado altíssimo, o celular vibrava, e até mesmo o antigo despertador a pilha começou a tocar. De repente, tudo foi desligado.

“Mas que merda…” disse o gordo, com os lábios, apavorado. Enquanto movia a boca, uma forte brisa abriu as portas da sacada, e trouxe para dentro do quarto aquela densa e inexplicável névoa.

O comparsa rapidamente fechou o zíper, mas, enquanto abotoava a calça, foi tomado por uma necessidade urgente: correu desesperadamente até a cozinha, pegou uma faca e, com um só golpe, decepou o próprio pênis. O outro, que assistia espantado, ensaiou algum protesto, mas logo foi atingido no peito. O tiro foi disparado pelo próprio indiano, que urrava de dor, mas mantinha a postura animalesca e os olhos insanos. Enquanto o alemão caía de joelhos, o comparsa disparou a correr em direção à sacada, e, de lá, saltou, dando tiros aleatórios em pleno ar.

Ajoelhado entre a mesa e a pequena janela aberta, envolto em neblina e presenciando a própria morte de forma inesperada e incompreensível, o homem loiro tinha o mesmo olhar que aquele de Elisa: inerte, inexpressivo e mórbido. Ele voltou os olhos para a mulher, que, a esse ponto, levantava-se em posição de flexão. Eulírico voltou a latir e rosnar, percebendo que o jogo havia, de certa forma, virado.

Naquela mulher que se levantava, não mais era possível identificar a mesma Elisa de uma hora atrás. Havia algo de diferente em sua essência: uma presença forte, uma aura pesada, consistente e impiedosa. Sua feição era ainda mais assustadora que o evento que ocorria, com os olhos bem abertos e as pupilas enormes, cobrindo todo o azul de suas íris, além de um sorriso extenso e insano mostrando os dentes.

“Ora, ora!” exclamou, já de pé, arrumando o vestido e encarando o homem ajoelhado. Ela se aproximou, e, de baixo do peso de papel, puxou as folhas com o conto que havia escrito. “E quem está na vantagem agora, hein?” indagou, agachando-se em frente a ele, com o sorriso sádico estampado no rosto.

O alemão apenas a olhou com espanto, babando sangue e, com uma das mãos, arranhando com força o próprio pescoço.

“Me diz, seu serzinho patético: fazia quanto tempo que vocês vinham me seguindo?” perguntou Elisa, inclinando a cabeça para a esquerda. Ela, agora, parecia uma assassina de filmes de terror, seus olhos não piscavam.

“Bem… que você… gostaria… de saber”, respondeu ele, franzindo o nariz, em meio à tosse ensanguentada, e cravando as unhas no pescoço gordo. “Vadia!” exclamou, rapidamente pegando os papéis da mão de Elisa e arremessando-os pela janela.

Ela pôde apenas acompanhar o movimento brusco com os olhos, mas seus reflexos não permitiram que impedisse a tragédia. Seu querido conto, que não possuía qualquer forma de backup, voava para fora, perdendo-se em meio à névoa. Com o braço ainda esticado, após a tentativa frustrada de alcançar as folhas, Elisa decidiu não mais conter-se quanto à extrema sede de vingança que sentia. Agarrou-o pela nuca e começou a bater seu rosto no chão com toda a força, várias e várias vezes seguidas. Enquanto a face do homem era desfigurada, dissolvendo-se em uma possa de sangue no piso, Eulírico recolheu-se novamente em um canto, agora temendo a própria dona.

Após cerca de um minuto repetindo o movimento incansavelmente, ela olhou uma última vez para o homem, que, agora, não passava de um cadáver sem rosto. Largou-o e ficou de pé, olhando pela janela e vendo que, lá fora, acontecia uma confusão igualmente grande. As folhas escritas ainda caíam, lentamente, separando-se umas das outras pelo ar. Era difícil enxergar com clareza, tamanha era a quantidade de neblina tomando a visão, mas Elisa pôde identificar vários pontos de intensa luz vermelha espalhados pela cidade e arredores. Pôde, também, escutar o som de sofrimento e de veículos chocando-se uns aos outros, na avenida.

Enquanto assistia ao espetáculo, sentia-se poderosa, a mulher mais poderosa do mundo. O motivo era simples: havia decidido, muito tempo atrás, crer no improvável, que seria a escolhida para algo de grandiosidade imensurável, algum dia; havia sido julgada louca por familiares, amigos e antigos parceiros amorosos; mas, finalmente, chegara o dia em que foi recompensada por toda a paciência. “Eu sou a escolhida”, disse, para si mesma, com um sorriso imenso e os olhos cheios de lágrimas. Não haveria como negar: foi esse o momento mais feliz que Elisa viveu em toda sua vida, até então. O momento tão arduamente aguardado, em que a avenida cheia de pessoas fúteis e amedrontadoras transformava-se em um verdadeiro sepulcro ao ar livre, e as verdadeiras qualidades da escritora, que tanto já haviam sido renegadas, adquiriam valor suficiente para fazê-la única: a sobrevivente ao fim do mundo.

“Eulírico…” suspirou, de repente, em tom de pavor, virando-se para trás, “o que aconteceu?” Suas pupilas haviam voltado ao normal.


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Notas finais do capítulo

No próximo episódio: Milton tenta desesperadamente cumprir sua missão de realizar um milagre, antes que o arrebatamento ocorra.

Baixe o PDF em: http://www.4shared.com/office/XMygUu9aba/Expurgo_-_T01E06_-_O_dia_esper.html

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