Silent Hill: The Artifact escrita por Walter


Capítulo 32
Em Busca do Alchemilla


Notas iniciais do capítulo

"Perder-se também é caminho." - Clarice Lispector



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–Cara... Eu tô com muita fome

–Eu também.

Estamos andando a quase uma hora. Depois que atravessamos uma ponte na Stanford Street chegamos a uma área mais urbana da cidade, mas não vimos mais nada ou ninguém além de prédios vazios e trancados. Para piorar, não encontramos nenhum mapa ou sinal do Alchemilla e há uma grande possibilidade de estarmos perdidos. A névoa e as cinzas que caem sobre a cidade também não ajudam nada para que a gente possa enxergar melhor.

–Matt... Não acha que algum desses prédios possa ter alguma coisa que comer?

–Duvido muito. E se tiver, deve estar estragado.

–Melhor do que nada.

–Já não basta tudo isso aqui nessa cidade? E agora mais com você doente.

–Cara, minha fome está... – eu o interrompo ao ouvir passos.

–Xii! – falo colocando o meu dedo indicador na boca dele.

São passos pesados. Parecem um pouco distantes, mas no silêncio total era muito fácil de se ouvir. Adiantamos os nossos passos até chegar à uma esquina que, embora completamente enevoada, permitia uma visualização maior da cidade. Olho pra cima e vejo duas placas que mostram o nome das ruas: Midway Avenue com Canyon street. O que não ajuda muito, pois não adianta saber onde estamos sem um mapa. Os passos começam a se intensificar, como se o seu dono estivesse correndo em nossa direção.

–Mas que merda... – Don fala suspirando.

–Calma... Não dever ser nada...

–Nada? Por favor, Matthew, estamos em Silent...

–Xii!

Ficamos na esquina observando ambos os lados. E é então que vejo a coisa emergindo lentamente em meio à névoa. É grande e tem quatro pernas enormes ligadas por uma massa de carne. Não consigo entender exatamente o que é e a coisa me assusta muito. A coisa se aproxima, agora mais lentamente semelhante a uma aranha.

–Matt... Você não vai ficar aqui pra matar essa coisa também, vai?

–Nem pensar... Vamos correr daqui!

Entramos na Canyon street correndo, e Don é o primeiro que vê, diminuindo a velocidade e me puxando pelo braço. Tento ver o que foi e então vejo mais um daqueles abismos que se abrem estranhamente em Silent Hill. Seria uma queda feia.

–Por aqui não...

–Droga, teremos que voltar.

Voltamos devagar tentando não chamar a atenção da criatura, mas é muito tarde. Ela também avançou pela rua e agora percebe a nossa presença mesmo sem a ajuda de uma cabeça.

–Droga, droga, droga, drogaaa!!

–Fica calmo Don! Vamos nos virar.

A coisa vem em nossa direção agora correndo. Por ser grande, ela é um pouco lenta, mas não lenta o suficiente para desviar no meio do movimento, então corremos para o outro lado da pista enganando a coisa.

–Agora corre!

Voltamos a correr voltando para a esquina em que entramos e tomamos a Midway Avenue novamente. Mais a frente, consigo enxergar algo que parecia um beco estreito, que a criatura daquele tamanho não conseguiria entrar. É por ali que entro, seguido por Don e então paro de correr, ouvindo apenas a minha respiração e a de Don. Encosto-me ao muro de madeira então olho novamente para ele. Parece exausto e preocupado.

–Algum problema Don?

–Não... Nenhum! Exceto por estarmos numa cidade cheia de monstros que perseguem e ter que correr a todo o momento sem contar os abismos que se abrem repentinamente nas ruas...

–É? Vai dizer que não sabia de tudo isso quando decidiu vir pra cá e queimar Anette...

–Não! Eu não sabia! Nem sobre o que fariam à ela eu sabia direito!

Respiro fundo. Não é hora de brigar agora. Temos que achar o bendito hospital o mais rápido possível, ou salvar Anette seria praticamente impossível. Se não tiverem a levado para lá, teríamos que voltar para o Amusement Park e acha-lo sem mapa algum seria muito difícil, se não impossível.

–Temos que ir andando.

Don assente com a cabeça e continuamos andando pelo beco. A criatura começa a grunhir atrás de nós, provavelmente se lamentando por não conseguir nos alcançar. A névoa dificulta um pouco a visão, mas consigo ver a parte de trás de alguns comércios. O lugar cheira mal, como se tivesse muita coisa morta ali. Sinto náuseas. O beco faz uma espécie de “L” e continuamos, provavelmente vai dar na mesma rua que não conseguimos ir por causa do abismo.

–Matt... Ali!

Don aponta para um objeto caído próximo a saída do beco. É um cano de ferro, mas parece muito bom para ser usado no lugar da chave inglesa. O problema é como leva-lo. Com a chave, eu ainda tinha a minha mochila, mas agora isso significava ter uma das minhas mãos ocupadas e talvez isso não fosse lá muito bom ou prático. De qualquer forma, vou até o objeto e o pego com a mão direita.

Finalmente saímos e para nossa sorte, pouco depois do abismo, o que nos permitirá continuar nessa rua. Não consigo ver muita coisa por causa da névoa, mas enxergo o vulto de um prédio não alto, mas grande em tamanho. Talvez fosse o hospital. Continuo caminhando com Don até chegarmos a uma espécie de placa com a palavra “INFORMAÇÃO”. Fico feliz por alguns instantes. Ela mostra um mapa, indicando alguns pontos dessa região da cidade e inclusive, o Alchemilla Hospital, que está bem a nossa frente, sendo exatamente o prédio que eu imaginei. Começo a me perguntar se isso não seria sorte ou destino, mas agora pouco importa.

–Bem... Tem uma entrada pela Kontz Street – disse Don quebrando meus pensamentos – podemos entrar por ali, já que a outra entrada está bloqueada pelo abismo.

–Boa ideia... Temos que entrar mesmo nessa droga de hospital de qualquer jeito, então vamos logo de uma vez. Espero que esteja mais tranquilo aí dentro do que em outros lugares.

–Sinceramente, não acho que vá estar, Matt... Mas pode ser que demos sorte.

Consigo sorrir e me sinto feliz por isso. Pelo menos alguma esperança tinha surgido agora, mas eu ainda estou com muita fome e quero qualquer coisa pra comer. Um hospital não parece ser um lugar onde eu encontrarei isso, então tenho que segurar. Parece que faz dias que estou aqui, que não comi nada... O tempo nessa cidade parece passar de forma diferente do resto do mundo.

A cidade continua vazia e caminhamos tranquilamente pela rua, até encontrarmos a rua seguinte e a prometida entrada do hospital. Passamos por um portão de ferro e subimos uma pequena escadaria, olhando para a placa que repousa já desgastada sobre a porta dupla de madeira. Eu já conheço este lugar. Era esse o hospital que eu vim muitas vezes com minha tia Yana. As enfermeiras eram muito feias, sem contar que era um lugar extremamente abandonado... Como todo o resto da cidade. Provavelmente depois do que aconteceu com Silent Hill, os poucos habitantes, isto é, provavelmente o povo da Ordem passou a usar esse lugar como o único ponto de primeiros socorros da cidade. É bem provável que encontremos uma ou duas pessoas aqui e até mesmo Anette.

Don abre a porta dupla e damos de cara com uma recepção vazia. Pintura desgastada da parede mostra o tempo que esse lugar não passa por uma reforma de verdade, caracterizando o vazio aqui. Há alguns bancos de espera e quadros de aviso à direita e uma bancada à esquerda, onde provavelmente ficava a recepcionista do lugar. Há alguns papeis em cima e decido pegar um deles. Apenas uma luz está acesa no final do corredor, dando uma baixa luz ao lugar, mas não o deixando escuro o suficiente para não ler. Pego o primeiro que vejo e percebo que talvez a vinda a esse lugar possa ser importante. Era um papel sobre Alessa Gillespie, a outra mãe sagrada que Carl havia falado naquela aula onde tudo começou. Olho pra Don e ele assente com a cabeça, como se soubesse de algo. Começo a ler.


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Notas finais do capítulo

Trecho correspondente à história de Chang.

Era inverno, mas pouco alterava as coisas em Silent Hill a não ser pelo frio que estava além do normal. A névoa era seca e mais densa, e a cidade continuava abandonada, não tendo muitas variações no seu aspecto e já fazia muito tempo que as trevas não tocavam a cidade. Tudo isso havia se perdido com a morte dela, Alessa Gillespie. Os dias tinham sido duros desde então, tudo isso porque a única esperança era que deus nascesse e com isso Silent Hill veria os seus dias de glória novamente. Mas Cláudia havia falhado, e tudo tinha ido por água abaixo. Desde então, as trevas foram aos poucos deixando de visitar a cidade e por mais feliz que isso fosse –afinal, não tinham mais que se preocupar em esconder-se – isso era ruim uma vez que mostrava que o poder de deus não estava mais tão forte sobre o lugar. Ele estava morto, e pouca esperança havia nos membros da Ordem. Chang era um deles, uma pequena criança de apenas cinco anos que esperava que Silent Hill voltasse a ser o que era, que mesmo não tendo visto a cidade em seus dias bons, ansiava para que isso acontecesse.

Órfão, morava com a mulher que cuidou dele desde que foi encontrado em no carro de seus pais ao tentarem fugir de Silent Hill. Não se sabe o que aconteceu, mas o carro capotou e os dois morreram, deixando o pequeno Chang de apenas um ano chorando dentro. Elle o encontrou e cuidou do bebê, e agora ele tinha cinco anos e a considerava como uma irmã mais velha. Mas hoje não era um dia qualquer. Segundo o informado, Carl Thomas havia finalmente encontrado outra mãe sagrada, capaz de dar origem ao deus novamente e tudo voltaria ao normal. Reunir-se-iam na Igreja Balkan ao meio dia, onde haveria o pronunciamento. Entretanto, ele não poderia ir já que era uma reunião de adultos.

—Chang, comporte-se! Não vá colocar fogo na casa. – disse Elle sorrindo.

—Pode deixar...

Ele deu uma última olhada para ela antes de sair. Ela era muito bonita. Morena, mas estranhamente loira e parecia feliz. Chang não sabia e se soubesse não a deixaria sair ou teria insistido em ir também. Ele teria feito o que fosse necessário, mas infelizmente nunca poderia imaginar com aquela idade que sua irmã jamais voltaria para casa.



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