Toda aquela andação foi demais pro meu corpo. Acordo sentindo o leve chacoalhar do meu corpo sendo transportado dentro de um carro. Carro não, ambulância.

– Lizzi? Está acordando ? – ouço uma voz familiar.

– Kevin ?

– Acho que isso é um sim.

Abro os olhos e dou de cara com o moreno do parque, ele sorri para mim. Passo os olhos pela ambulância, mas não há mais ninguém.

– Jason ?

– Ele está vindo atrás com a moto.

– Ah.

– Então, como está ?

– Pouco mais de quatro meses, mas pode ser mais, ou pode ser menos, eu não sei... O que aconteceu ?

– Parece que você passou mal, aí o seu... amigo ?

– Conhecido.

– Seu conhecido ligou para nós.

– Nunca me disse que era médico.

– Bom, eu não sou, sou paramédico.

– Ah, bom, nunca me disse que era paramédico.

– Bom, não nos vimos muito não é mesmo !?

– Não, como está o pequeno Tim ?

– Bem, muito bem, na verdade, ele me perguntou sobre você esses dias.

– Ah, adoraria vê-lo.

– Ele está ficando um belo garoto.

– Ah sim, ele já era um belo garoto.

– Sim. Está sentindo dor ?

– Minha cabeça, meu corpo...

– Ah sim, fez muito esforço ultimamente ?

– Você nem faz ideia.

– Ah, está explicado.

Nesse momento a porta da ambulância se abre, eu não tinha percebido que ela estava parada. Kevin e mais outro começam a tirar a maca de onde eu estou, mas eu me levanto com dificuldade, Kevin me ajuda a chegar na recepção e nós seguimos até uma sala. Ignoro o barulho da moto vinda de trás de mim.

– Pode deixar – diz Jason ao chegar ao meu lado.

– Não, tudo bem, eu levo a Lizzi lá – Kevin responde.

– Vocês se conhecem ?

– Sim, nós nos conhecemos – digo um pouco rude.

Jason se cala e Kevin apenas me olha com curiosidade, sou colocada em uma sala sentada em uma maca, Jason e Kevin continuam comigo.

– Paramédicos não costumam ficar, costumam ?

– Não, mas eu posso ficar por uma amiga – Kevin parece se divertir irritando Jason e eu tenho que me segurar para não rir.

Meu pai chega pouco tempo depois que o médico me examina, eu peço para que os dois saiam da sala.

– Parece que você e Kevin se conhecem – diz o médio de meia idade que me atende, Sr. Barnes.

– Ah sim, um dia no parque eu conheci o Tim e conseqüentemente o Kevin.

– Ah, ele sabe sobre...

– Sim, ele sabe.

– O outro pelo visto, não sabe.

– Não, não sabe.

– Bom, ok. Lizzi, você está aparentemente bem, apesar das circunstancias, foi apenas o esforço demasiado.

– Ok.

– Hei, eu sinto muito – o rosto do Dr. Barnes se transforma numa expressão triste.

– Tudo bem.

Ele sai e eu fico sozinha, eu sabia porque tinha desmaiado, não tinha necessidade alguma de me trazerem para um hospital.

– Acho melhor você ir, seu amigo quer me matar – diz Kevin entrando na sala.

– Ok – dou uma risada breve e me lembro de uma coisa – você não contou pra ele não é ?!

– Não contei não.

– Ah, obrigada, por tudo.

– Não foi nada.

Saio da sala e vejo meu pai e Jason sentados lado a lado na sala de espera. Eles se levantam e vem ao meu encontro.

– Então ? – Jason pergunta.

– Estou bem – digo ainda rude – onde está minha bolsa ?

– Ficou no café, Mary vai guardar pra você.

– Podemos ir ? – viro para meu pai.

Ele apenas assente e eu vou para fora.

– Ele apenas disse que você está bem ? – Jason pergunta ao chegar do meu lado.

– Disse.

– Mas você desmaiou.

– Passei muito tempo sem comer.

– Por que acho que não é tão simples assim ?

– Porque você acha demais.

Entro no carro e Jason fica escorado na janela.

– Quando você vai parar com isso ?

– Daqui cinco meses, talvez.

– Ã ?

Então me lembro de que Jason não sabe.

– Nada, pode se afastar por favor.

Jason dá um passo para trás e meu pai parte com o carro.

...

Cheguei a algumas horas em casa. Clary e Jason já vieram aqui várias vezes, agora eles estão na sala conversando com meu pai enquanto eu estou apenas deitada na minha cama olhando pro nada.

– Toc, toc – diz Jason entrando no quarto.

– O que você quer ?

– Lembrei que você não me contou como conheceu o paramédico.

– Não é da sua conta.

– Ah sim, é sim.

Reviro os olhos.

– Um dia eu estava no parque, e eu vi o filho dele sozinho, o Tim, ele tem 8 anos. Ele estava procurando o pai e eu fiquei com ele até que Kevin aparecesse.

– Ele te chamou pra sair ?

– Sim, ele chamou, mas eu não aceitei.

– Por que não ?

Porque eu disse para ele que morreria em alguns meses.

– Por motivos pessoais.

Jason faz uma careta pela falta de informações, e se senta na beira da cama. Recolho meus pés como se o contato com ele fosse me queimar.

– Olha, me desculpa...

Ele começa dizer, mas eu não presto atenção no resto da sua frase, meu peito começa doer e começa a ficar difícil de respirar.

– Ok, ok – eu digo meio sufocada.

Minha visão começa ficar turva e eu começo engasgar, agora meu peito parece estar pegando fogo. Jason está paralisado olhando para mim.

– JOOOOOOOOHN! – ele grita.

Meu pai aparece minutos depois.

– Droga! O que está acontecendo ?

– Ela... eu não sei... parece que está sufocando... – Jason responde.

– Pai... – eu chamo com os olhos cheios de lágrimas por causa da dor.

Porcaria! Ele vai saber a verdade!

Sou levada ao hospital pela segunda vez.

...

– Lizzi, você tem que contar pra ele – diz o Dr. Barnes – eu sei que tentou esconder, mas por mais que isso doa você tem que contar!

– Não posso!

– Não pode contar o que ? – Jason pergunta.

Ele estava dormindo na poltrona ao lado da minha cama, meu pai tinha ido levar Clary no hotel.

– Contar para o pai dela que o câncer de espalhou – Dr. Barnes responde rápido demais.

– O que ? – Jason sussurra.

– Doutor, ele ... hm... não sabia. Lembra?

– Ah, sinto muito.

– Princesa, o que está acontecendo ?

– Basicamente, estou morrendo.

– O que ? – ele sussurra de novo.

– Estou morrendo. Começou como um câncer no estomago, mas depois, ninguém entendeu direito o que aconteceu, numa hora eu estava quase curada, na outra tinha câncer em tudo.

– Em tudo ?

– Em boa parte – eu não percebi quando as lágrimas começaram a rolar – meu pai não sabia, eu pedi para não contarem para ele, ele ainda pensa que está tudo no estomago.

Dr. Barnes saiu sorrateiramente da sala, enquanto eu contava para Jason.

Jason se levanta como se estivesse ficando sem ar e anda de um lado para o outro com a mão no rosto.

– Você mentiu pra mim! – Jason grita.

Ele sai do quarto furiosamente e eu me levanto com dificuldade, arrastando o tripé junto comigo. Saio do quarto e vejo que Jason chuta uma fileira de cadeiras, seu rosto está furioso e magoado, e algumas lágrimas escorrem pelo seu rosto.

– Jason para! – eu grito, mas ele continua.

Chego mais perto de Jason o abraço por trás contendo seus movimentos, ele podia se livrar de mim, mas apenas parou de se mexer.

– Por que não me contou ? – ele sussurra.

– Por medo, talvez.

– Medo ?

– Viu como todos olham pra mim ? Com pena. Eu não preciso disso, principalmente vindo de você.

– E você ainda se achou no direito de ficar brava comigo e com o seu pai depois do que fizemos sendo que escondia coisas também ? – ele se solta do meu abraço e vira de frente para mim – Você, de todas as pessoas, não tinha o direito de tratar John daquela maneira, e de me tratar daquela maneira. E por que ? Por não queria que eu sentisse pena de você, isso foi puro egoísmo!

– Mas eu...

– Mas o que ? – ele para e eu olho para ele apenas – Que droga de pessoa é você ?

Ele está magoado.

Suas palavras me atingem, e eu preferiria que ele tivesse me batido. Jason vai embora e eu fico olhando suas costas sumirem pelo corredor.