Dentro do Espelho escrita por Banshee


Capítulo 17
Sangue, Preço do Perdão


Notas iniciais do capítulo

Para comemorar o aniversário de três meses da fic, aqui está o quarto capitulo da semana :* Bjos do Tio Marco.



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Silêncio. Apenas o silêncio das doces palavras que nunca foram ditas, apenas o silêncio marítimo do oceano. Calma.
“Apenas viver não é o suficiente”, disse a borboleta, “É preciso ter Sol, liberdade e uma pequena flor.”
Silêncio.
Doces melodias não tocadas, e o barulho do mar calmo. “Sinta a Vibe”, disse Diane na semana passada.
O sino da catedral Álamo tocava, indicando meia-noite. Belisquei-me para ter certeza de que não era um sonho. Doeu.
Saltei da cama, pois não conseguiria dormir hoje e peguei o calendário do criado mudo, onde uma data se destacava. Primeiro de março. Meu aniversário.
O que eu esperava? Balões? Uma festa surpresa? Que o céu de abrisse e minha diva Elizabeth Taylor caísse dele? Na verdade sim, eu queria.
Fazia duas semanas que eu não sentia nada além de uma leve dor de cabeça, minha querida amiguinha Alaska não me visitava e eu não me tornava a Meretriz da madrugada, como Raven dizia. Eu deveria sentir a Vibe!
Olhei-me no espelho: Pele pálida, cabelos loiros e um sorriso infantil. Eu era a mesma pessoa que sempre fui até um mês trás, tirando um pequeno detalhe... Olhos verdes. Olhos muito muito verdes. Acordei há dois dias e me deparei com eles, e a casa quase caiu de felicidade. Acabaram-se os rituais. Acabaram-se os gritos. Acabaram-se a mágoa, o ódio e a dor.
Só silêncio.
Convergente estava jogado na minha cômoda, eu mal tinha tempo para lê-lo desde que o inferno começou, mas agora havia mais que isso. Cheguei a tirar A na prova de física, se é que dá pra acreditar.
Peguei o iPad novo que minha mãe me dera para comemorar a expulsão do demônio, naquele dia ela chegou na Igreja dos Últimas Dias esfregando na cara das devassas do santuário que conseguira tirar Lúcifer de mim.
Cliquei na primeira Track e tocou uma música que jamais tinha ouvido.
Um dia no jardim, o mal se levantou trazendo a desarmonia. Ensinos desleais, mentiras mais e mais distanciaram Deus do homem.
As estrelas pintadas a mão no teto do meu corpo começaram a se mover como cometas caindo, formando figuras de desenhos que nunca tinha visto antes. Figuras humanas.
Foi quando o frio apareceu, quando a primeira flor morreu que uma sombra de maldade no coração de Adão nasceu.
As estrelas formaram a figura que parecia ser de uma menina correndo, seus vestidos sendo lançados pelo vento e objetos sendo lançados contra ela. A garotinha se ajoelhou e olhou pro céu, como uma num desenho animado sem palavras. Fez o sinal como se estivesse rezando, e o vento cessou.
Mas haveria um Salvador que morreria por amor. O cordeiro aqueceria toda noite fria pra não mais haver a dor.
Ela continuou caminhando e colhendo o que pareciam ser flores, até chegar num circo. A imagem se dissolveu, formando letras que formavam uma palavra. Azazel, junto à imagem de um homem com chifres sorrindo. Mas o Azazel Circus nunca teve aquele rosto.
A morte e a dor cruel rasgaram o fino véu da consciência do pecado. A natureza má se alastrou então trazendo o sofrimento a todos.
A imagem voltou a ser uma garotinha brincando nas atrações do circo, porém acompanhada de um homem com asas e uma auréola. Vi homens cuspindo fogo e contorcionistas, um mágico e sua assistente e a garotinha batendo palmas, enquanto o homem acariciava sua cabeça, comprando-lhe doces e guloseimas.
Haverá lugar para aquele que aceitar o sacrifício do cordeiro, que deu a vida pra Salvar.
Pisquei para fazer com que as imagens se dissolvessem e tentar me mover, porém algo me impedia. Olhei de canto de olho e juro ter visto alguns pares de olhos.
O homem abriu suas asas majestosas e voou para o além, desaparecendo no brilho de uma supernova. A garotinha ficou sozinha, mas não parecia notar que estava. Agora ela era gorda de tanto comer e de suas nádegas brotava um pequeno rabo de porco.
Nossa vida foi comprada, falta perdoada.
Um palhaço surgiu na cena. Merda, por que sempre palhaços? Ofereceu uma flor a ela, que prontamente a aceitou e comeu. O truão continuou com seus truques, lançando água nela e dando marretadas na própria cabeça enquanto a balofinha ria. Como podem ser tão patéticas?
O palhaço começou a gargalhar e esfregar a barriga, sua boca risonha ficava cada vez maior, e cada vez maior, e cada vez maior. Até que ele a devorou.
Sangue, o preço do perdão.
Minhas mãos se soltaram e meu corpo voltou a seguir minhas ordens. Respirei fundo e olhei-me nos espelho do criado mudo. Um grande sorriso, olhos negros e cabelos vermelhos... O palhaço.
Gritei o mais forte que pude e tentei correr, porém o demônio saiu do reflexo e se jogou contra mim. Suas pernas eram grandes e seu halito fedia à merda velha, seus dentes eram podres.
Não, não. Você não irá fugir de nós de novo., disse ele como se várias pessoas falassem em uníssono.
Como no sonho, ele segurou meu pescoço com força, fazendo-me sufocar. Como no sonho o chutei e como no sonho tentei gritar. E esse teria o mesmo final do sonho, mesmo não sendo um sonho.
Mate o palhaço, Sky; debochou-o, com uma voz tão afeminada que me lembrou da voz de Ele, o vilão das Meninas Super Poderosas. Eu não sou falso?
A porta se abriu com um baque estrondoso e a luz foi acesa, os raios da lâmpada passaram pelo corpo dele como navalhas, deixando um rastro preto sobre o corpo. Ele desapareceu em cinzas.
– SKY! PARE COM ISSO – Gritou Raven.
Eu estava ajoelhada e sentindo minha garganta sangrar, meus olhos ardiam, porém nada iria descer deles naquela noite. Todos os poucos amigos, inclusive minha mãe me encaravam com roupas de festas e aquele maldito chapéu de aniversário.
Minha mão estava massageando meu pescoço quando Raven a deu um tapa.
– Vocês viram! – Eu disse – Todos vocês viram!
Eu não estava louca. Eu não estava e possuía a prova. Meus pulsos doíam e os cacos de espelho estavam no chão, jogados e distribuídos por todo quarto.
– Ele queria me matar, Raven! – Gritei furiosa – Ele queria...
– Sky se acalma e cala a boca! – Ela retrucou no mesmo volume.
– Mas vocês viram ele tentando me matar!
– A única coisa que vimos quando entramos foi você com rosto vermelho e segurando o próprio pescoço como se quisesse...
As palavras ficaram no ar.
– Mas...
Olhei para o chão procurando o resto do espelho, porém ele continuava inteiro em cima do criado mudo.


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