Licantropia: A Reserva escrita por Paulo Carvalho


Capítulo 9
Capitulo 8: 42 dias.


Notas iniciais do capítulo

Boa noite!! Mais um capítulo. Espero que gostem!



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Os dias tornaram-se mais monótonos e tensos com a mudança de guarda. Antes, Samantha ouvia Raniah conversar consigo mesmo quando levava suas refeições ou puxar conversa, algumas vezes, pelo lado de fora, procurando ser convidado a ficar. Com Soren era completamente diferente; desde o dia em que ele declarara estar tentando se redimir, o arqueiro tornara-se taciturno, calado e mal humorado.

Ele se resumia a deixar as bandejas de comida próximas à porta e trazer água quando achava necessário (Samantha se recusava a falar qualquer coisa com Soren, até mesmo para pedir água). De noite, Sam conseguia ouvir seus resmungos e xingamentos. Ela sempre identificava as palavras: garota, idiota, fraca e outras menos lisonjeiras.

Todos os dias, ele repousava a bandeja no chão, oferecia um bom dia ou uma boa noite e se irritava com sua falta de resposta; depois tentava se desculpar de todas as formas: se oferecendo para verificar os ferimentos, dizendo que se arrependia, jurando que ninguém iria machuca-la. E como sempre, Samantha não respondia e Soren batia a porta com força, bufando e rosnando. Aquilo até lhe fazia sorrir um pouco.

–--Por que você falou com Ran? ---ele perguntou uma vez e nos seus olhos dourados, Sam percebeu que Soren estava realmente incomodado. Aquilo lhe deu uma pequena pontada de satisfação. ---Só porque ele não te bateu? Eu juro que se pudesse voltar no tempo, eu nunca teria feito aquilo. Mas, ele não fez nada, deixou que Peter espancasse você. Fui eu que interferi, lembra?

–--E depois ia deixar que os outros três me matassem... ---Sam não conseguiu conter a raiva. ---Foi ele quem me salvou. Peter é um covarde como todos vocês, nunca teria me matado; mas aquelas três bestas... é da natureza deles, assim como é a sua.

–--E não a de Raniah? ---ele ergueu uma sobrancelha. ---Ele também é um licantropo.

–--Ele não me massacrou, ao menos. --- ela murmurou baixo demais e julgou que Soren não tivesse ouvido.

–--Massacrado? ---ele pronunciou a palavra com asco. ---Eu...eu...não massacrei você! ---Soren gritou, mas suas mãos tremiam. Ele fechou a porta e Sam não ouviu sua voz pelo resto do dia.

Depois de algumas horas, Sam notou que Soren usara a palavra licantropo. Não era comum que os próprios se designassem daquela forma, ela sabia. O termo era usado como uma ofensa pelos Puros; uma doença, uma praga, um surto terrível. Muito dos Filhos nem sequer conheciam aquela palavra. Aquilo fez Samantha se perguntar se Soren tivera algum contato com outros Puros. Como se eu fosse uma Pura, Sam pensou amarga.

Nas contas de Samantha, fazia cinco dias desde o surto de Soren. Ela não pronunciara uma palavra nesse período. Sam apenas pensava em como sairia dali e chegaria até a Reserva e então sonhava em voltar com as tropas que aniquilariam os torturadores. Nos seus pensamentos, ela se via sorrindo para o rosto sangrento de Peter ou ouvindo os gritos de Fred. Mas quando fechava os olhos, todos os seus carrascos se transformavam nas feras que realmente eram e a devoravam. Ela estava em um desses sonhos quando acordou e encarou dois olhos amarelos.

O grito que saiu de sua garganta deveria ter feito seus próprios tímpanos sangrarem, mas o único resultado foi uma carranca por parte de Soren. Ele não se afastou dessa vez, apenas continuou a encara-la. Uma pequena parte de sua mente, a que ainda era fascinado pelos lobisomens, notou que as íris eram rajadas de amarelo, dourado e prata. Olhos tão bonitos em um monstro.

–--Você está fedendo. ---ele respondeu simplesmente. ---Nós, licantropos, temos o olfato muito apurado. Está quase uma tortura.

Soren se afastou e deixou a vista dois baldes cheios de água, uma esponja amarelada e um pedaço branco e gorduroso que Sam identificou como sendo sabonete. Na borda do colchão, havia uma pequena pilha de roupas escuras e de aparência antiga. Mesmo assim...devem cheirar melhor do que eu. Ela não se lembrava a quanto tempo estava ali. Uma semana? Um mês? Dois? Seis? Um ano? Ela não sabia a resposta.

–--Quando acabar, bata na porta, ok? ---ele saiu sem esperar por uma resposta.

A água era pouca, mas mesmo na Reserva, os classe D tinham cota diária para água. Foi suficiente, entretanto, para que Samantha conseguisse se limpar e tirasse a maior parte da sujeira que se tornara uma crosta fina e pegajosa em sua pele. A água no balde adquiriu uma coloração marrom avermelhada, devido ao sangue seco. Antes de se banhar, Sam conseguira ver seu reflexo, embora frágil, na água. Os hematomas tinham quase sumido, restava apenas uma amarelado abaixo do queixo. As roupas deixadas para ela eram um pouco largas demais, mas ficavam melhores em seu corpo do que o uniforme tosco de patrulheira.

Ela bateu na porta, algumas horas depois de ter certeza que tinha limpado tudo. Soren pegou os baldes e antes de sair, olhou-a de cima a baixo. Samantha se sentiu estranhamente exposta com aquilo e usou todas as suas forças para não rastejar até seu canto do desespero. O canto esquerdo da boca do arqueiro se moveu levemente.

–--Ficou melhor do que esse uniforme. ---ele respondeu e não esperou por resposta, mas congelou quando ouviu a voz de Sam.

–--Há quanto tempo estou aqui? Quero dizer, desde que fui capturada?

–-- 42 dias. ---ele respondeu sem se virar e sumiu pela porta.

O número foi como um soco em seu estômago. 42 dias? Quantos deles haviam levado para chegar até o acampamento? Cinco, talvez seis? As equipes de busca já a teriam rastreado e teriam tempo de sobra para chegar até lá. Eles não poderiam ter mudado de lugar, poderiam? Sem ela perceber? Não, era impossível. Mesmo desacordada pela tortura, Sam teria percebido alguém a carregando para algum lugar. O acampamento não havia mudado de lugar. Mas, então, por que a Reserva não chegara ainda? Quanto tempo mais demoraria? Talvez o acampamento fosse muito maior do que ela tinha visto e estivessem organizando as tropas.

Ela se convenceu daquilo, mas no fundo de sua mente ela sabia que não era verdade. Alguma coisa estava errada. Mesmo que achassem que ela estava morta, o rastro de lobisomens tão perto atrairia no mínimo um grupo de busca. Uma Impura... você acha que eles se importam se lobisomens a devoraram? Eles devem estar fazendo uma festa para comemorar: O Dia em que uma Impura morreu por ser burra demais.

A respiração de Sam acelerou; seu coração também. Ela conhecia a causa daquilo pelas aulas de Serviço Médico da Reserva: adrenalina. Seu corpo estava liberando adrenalina, transformando a si próprio em uma máquina. Resultado de um ambiente estressante ou assustador. No caso de Sam, os dois. Eles vão chegar aqui. Tenho certeza.

Mais uma vez ela se convenceu daquilo, mas a parte de sua mente que se mantinha racional e sã, pensava: se eles não vierem, morrerei cedo; no momento em que perceberem minha falta de informação, irão arrancar minhas tripas e meus pesadelos se tornarão realidade


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Notas finais do capítulo

Comentários são muito bem vindos. Até semana que vem!



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