Diário de uma Paixão escrita por garotadeontem


Capítulo 4
Capítulo 03




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Nunca tinha ficado de ressaca na vida, foi um pouco mais emocionante do que eu imaginei. Não me lembrava de como tinha ido parar de volta no Campus, jogado de qualquer jeito na cama. Minha cabeça latejava, meu estômago revirava e eu estava morrendo de sede. Depois de um esforço abri os olhos e Eron estava jogado na cama também, o pequeno rádio ligado ao seu lado.

_ Acordou, Niko? – ele me olhou. Parecia que eu tinha dormido o dia todo.

_ Sim. Eu só estou com uma dor de cabeça horrível. Eu cai e bati a cabeça ontem? – ele riu e se sentou na cama, me oferecendo uma garrafa de água.

_ Não. Isso se chama ressaca.

Me sentei e bebi a garrafa toda, tentava me lembrar dos últimos momentos do dia anterior mas nada me vinha a cabeça. Foi então que me lembrei de Félix e da dança e pedi a Deus para que eu não tenha feito nenhuma besteira.

_ Como eu vim parar aqui?

_ É... A gente te trouxe, você já tava meio dormindo quando chegamos, só te deixamos na cama.

_ A gente, quem?

_ Eu e o Félix. – o meu coração disparou no mesmo instante.

_ O Félix? Mas...

_ Relaxa, Niko. Não foi nada, você bebeu muito, entrou na pista e ficou dançando, dançou com uma moça e depois pediu para irmos embora.

_ Eu não me lembro de nada disso. – Eron deu de ombros. – Eron, o Félix... tem um jeito estranho... Você já reparou? – ele riu alto.

_ Claro. Niko, as coisas aqui não são tão simples quanto parece. – ele deu de ombros.

_ Se agora eu vou ficar por aqui, eu preciso saber, não é? Pode me contar?

_ Niko, nesse prédio só moram rapazes, as moças dormem do outro lado do Campus. Ás vezes, acontece de uma delas conseguir entrar aqui, mas é muito difícil, normalmente são pegas pelo vigilante. Então, você pode imaginar que alguns rapazes se envolvam com outros... – ele gesticulou e eu fiquei surpreso.

_ Eu não pensei que... Desculpa, Eron, mas... Eu não sabia que... – comecei a me embaralhar.

_ Tá tudo bem, Niko. Os caras bebem demais e o que acontecem dentro dessas paredes só eles sabem. E alguns vizinhos. – me senti constrangido. – Mas isso acontece aqui as escuras, depois a maioria deles desfilam com as namoradas durante o dia. E não são todos, tá? Não fique tão assustado.

_ Todos que estudam aqui, moram no Campus?

_ Não, só quem veio de longe pra estudar aqui. Como você, eu. Por exemplo, o Félix mora na casa dele, no centro da cidade, ele é filho do prefeito e provavelmente vai suceder o trono. – eu assenti.

_ Por que eu consegui essa vaga? Nós já estamos no meio do semestre. O que aconteceu com o outro que ficava aqui? – os olhos de Eron praticamente ficaram cinza.

_ Lembra quando o Félix soltou o veneno dele e disse sobre você ser minha “nova presa”...

_ Ah... Ah meu Deus... Ele era seu...? – ele sorriu sem graça.

_ É. Os pais dele descobriram e ele foi embora. Por isso, você conseguiu a vaga. – assenti.

_ Eu sinto muito por...

_ Tá tudo bem. Você quer mais água? – ele me ofereceu outra garrafa e eu peguei.

_ Acho que é muita coisa pra absorver. – Eron riu.

Os dias seguintes foram comuns, comecei a correr contra o tempo para alcançar meus colegas de classe nas matérias e não tive tempo para ir para mais bailes ou festas. De vez em quando, eu sentia a curiosidade de conhecer o prédio durante a noite, mas me continha. Tudo que Eron me dizia me atormentava, porque eu não sabia como me sentia em relação a isso.

Félix não me dirigiu mais a palavra, sempre o via de longe com o seu grupo de amigos do curso de Economia e sua noiva Edith andava sempre com ele. Eu me questionava se ela sabia que o futuro marido tinha sentimentos tão confusos, e me perguntava se ele se divertia durante a noite, como os outros que ouvi falar.

Um dia depois da aula, estava indo pra biblioteca quando uma moça muito bonita me parou no corredor. Ela tinha os cabelos castanhos, os olhos um tom mais escuros e parecia uma pessoa simpática.

_ Nicolas, né? Seu nome é Nicolas? – eu assenti.

_ Oi, Nicolas. Eu sou a Paloma, prazer. – ela me estendeu a mão e eu apertei.

_ O prazer é meu, Paloma. Nós somos da mesma sala, não?

_ Sim, é... Desculpa te interromper assim é que eu preciso do nome do livro que o professor pediu para lermos.

_ Ah... – assenti com um sorriso. – Eu anotei, na verdade, estava indo na biblioteca pegar.

_ Se não for te atrapalhar, posso ir junto?

_ Claro, sem problemas.

Paloma era uma menina doce e ficamos amigos de um dia para o outro. Eu adorava conversar com ela e suas amigas pensavam que nós tínhamos algo. Mas era puramente amizade. Até mesmo Eron me questionou se tínhamos um romance, mas não era nada disso. Ele e seu grupo já tinha nos visto caminhando juntos pela faculdade.

Uns dias depois, eu passei a tarde toda dentro da biblioteca e quando sai já estava começando a anoitecer, estava morto de fome e não via a hora de dormir. Eu caminhava até o dormitório quando a voz dele me impediu.

_ Niko? – ele estava encostado em seu carro, o terno preto de última linha e o cigarro, seu fiel amigo, entre os dedos. – A gente pode conversar?

_ Conversar?

_ É, criatura. Podemos?

A principio fiquei com medo de ir, mas ao me aproximar percebi que o assunto parecia sério. Entrei no carro e ele nos levou a um canto escuro do Campus, o que me fez ter me arrependido de ter ido. Ele abriu as janelas do veículo e acendeu outro cigarro.

_ Parece mesmo que está viciado. – eu comentei. Ele deu uma leve risada.

_ Carneirinho, você não sabe como o cigarro tem sido meu aliado. – eu fiquei sem entender.

_ Eu quero te pedir desculpa por aquela noite. Sinto muito por ter te coagido...

_ Você não me coagiu a nada, Félix. Eu já sei de tudo que acontece aqui. – ele assentiu com um sorriso divertido nos lábios.

_ Imagino que aquela lacraia já tenha te contado, quer te levar para o bote também, como fez com Marcelo. – eu me senti ofendido.

_ Quê? Você acha que eu sou tão bobo a esse ponto, Félix? Posso ter cara de burro, mas não sou. É pra isso que me trouxe aqui? Pra me ofender?

_ Não. Não. Não foi minha intenção te ofender. Eu vi que você conheceu minha irmã... – o olhei surpreso. – Paloma. Quero saber quais são suas intenções com ela.

_ O quê? Minhas intenções? Os boatos correm tão rápido?

_ Correm feito lebres por esses prédios, carneirinho. Ela é minha irmã mais nova e nada mais justo que eu venha saber das suas intenções com ela.

_ Eu não tenho que te dar satisfação alguma.

_ Pelas contas do Rosário! Eu devo ter picado salsinha na tábua dos dez mandamentos, Niko! – ele gesticulou. - Custa me responder? Custa, criatura?

_ Nós somos somente amigos, Félix. – suspirei. – É só isso?

O rosto de Félix ficou aliviado e ele tragou o cigarro, soltando a fumaça em seguida.

_ Eu a odeio. – ele disse, simplesmente. E eu fiquei sem reação alguma.

Sua expressão mudara de aliviado para algo obscuro, senti um tom de mágoa em sua voz.

_ Como assim? Por que você a odeia?

_ Você tem irmãos?

_ Não, mas...

_ Então. Ela... Ela é a caçula, a queridinha do papai, meu pai sempre a adorou, a venerou. Sempre a colocou em um pedestal, e eu... ficava de lado, ele nunca me amou como a ama. Sempre me tratou como um bicho... – meu coração apertava mais a cada palavra, ele demonstrava o verdadeiro ódio em seu olhar. – E ela, como uma rainha. Ela teve todo o amor e carinho, e eu? Nada. Eu tento impressionar meu pai, tento ser melhor que ela. Vou me casar com a mulher que ele quer que eu case e nada disso importa. Tudo é a Paloma naquela casa. Tudo. Não importa se escolhi a faculdade que ele fez, não importa. Eu a odeio por isso, odeio por tudo... Eu odeio cada respiração que ela dá. Odeio! – ele deu um soco no volante, a raiva tomando conta de si.

Quando peguei em sua mão, ela tremia e ele me olhou nos olhos.

_ Eu sinto muito por... Félix, eu não sei o que dizer, mas... Não sei o que você passa, eu queria entender, queria poder ajudar, mas... Ela parece ser uma pessoa tão boa, tão doce. Esse sentimento dentro de você...

_ Claro que ela é doce, Niko. Ela é perfeita! Casa com ela! Eu pensei que você ia me ouvir, não concordar com todos!

_ Félix, eu só quero o seu bem... Eu não quero te julgar. Esse ódio dentro de você... – instintivamente coloquei a mão em seu peito e seu coração estava disparado. – Vai acabar te deixando infeliz. Não deixe que isso lhe tome.

Ele colocou a mão sobre a minha no peito, ele parecia surpreso com a minha reação e eu também estava.

_ Ele me odeia, por tudo que eu sou, carneirinho. Eu nunca vou ser feliz.

Meus olhos marejaram por sentir a dor que ele sentia, mas eu nada podia fazer. Queria poder ajudar, queria poder tirar aquele ódio do peito dele, mas eu não sabia do que eu era capaz. Eu estava confuso demais com tudo. Me sentia outra pessoa ao seu lado, mas não era o certo a se fazer. Não podia beija-lo, não posso deixar que nada disso aconteça porque... Porque eu não sei o que seria da minha vida, eu nem sei o que eu quero realmente.

A única coisa que pude fazer foi abraça-lo e ele chorou durante vários minutos no meu ombro, me senti péssimo, me senti o pior amigo que alguém podia ter porque eu não encontrava as palavras certas para lhe dar. Quando ele se acalmou ele disse que teria que voltar e encontrar Edith, não sei por que, mas me senti pior, me senti usado, me senti horrível. Porque eu jamais poderia ser aquele alguém ao seu lado. E lá estava eu me apaixonando por cara tão complicado e complexo, as coisas poderiam ser mais simples.

Aquela noite eu me encontrei com o grupo de alunos no Campus e resolvi beber, bebi muito e a última coisa me lembro era de beijar uma, duas, três mulheres que estavam naquela confusão. E todas as vezes que as beijava me imaginava nos braços dele. Ele jamais seria meu. E estar com elas era o certo a se fazer.

Parei de ler e fechei o livro novamente, Niko me olhava com atenção, mas estava pensativo.

_ Ele estava muito confuso.

_ Sim, mas acho que compreende...

_ Compreendo. – ele assentiu. – Deve ter sido muito difícil pra ele.

_ Eu também acho.


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