Criança Domesticada escrita por AneenaSevla


Capítulo 8
Nossa, Tentáculos!


Notas iniciais do capítulo

"Eu admiro aqueles que conseguem sorrir com os problemas, reunir forças na angústia, e ganhar coragem na reflexão. É coisa de pequenas mentes encolher-se, mas aquele cujo coração é firme, e cuja consciência aprova sua conduta, perseguirá seus princípios até a morte."

Thomas Paine



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Ela não conseguia tirar os olhos daquilo.

Aquelas coisas pretas de um metro e meio cada um, parecendo minhocas lisas e gigantes, brotavam de suas costas, ou melhor, daquelas marcas de nascença. Agora Alicia realmente entendia – e se sentia muito burra por não ter descoberto algo tão óbvio – ele não era apenas uma criatura qualquer.

Thomas, por outro lado, estava mais confuso do que nunca, e apavorado, além do que, pelo jeito que estava encolhido ainda sentia aquela ardência de antes.

Licia… O que tá havendo? O que é isso? Ele estava abraçado a si mesmo, e encarava a garota, que se aproximava.

Ela tratou de se acalmar, para acalmá-lo também. Não se preocupe Thomas, ela disse, você apenas está crescendo…

Crescendo? Então eu tenho de ter isso? Ele encarou os seus mais novos tentáculos, tentando tocar um deles. O tentáculo tremeu quando ele tremeu junto.

– E então? O que houve com ele? – disse uma voz, que fez os dois olharem para a porta. Era Kyle, agora sem o paletó e o chapéu de motorista. O cabelo loiro do homem agora meio bagunçado, e ele parou ao ver Thomas – Uou!

Thomas encarava Kyle enquanto recuava, chiando acuado, arrastando os tentáculos junto, e fazendo-o rosnar de dor em consequência. Alicia o acalmou, dizendo que ele não era perigo. Kyle se aproximou, examinando os tentáculos, mas sem tocá-los. Parecia tão admirado quanto Alicia.

– Nossa então ele realmente é um Slender, daqueles da internet – o homem se ajoelhou perto de Alicia. Era da mesma altura do monstrinho, a pele bronzeada pelo sol e olhos castanhos – olá Thomas, lembra-se de mim? Hoje de manhã eu acenei para você quando estava passando pela cozinha…

Thomas encarou o homem. Lembro sim, mas não confio em você…

– Ele está dizendo que não gosta muito de você – Alicia disse para Kyle.

– Poxa, eu nunca fiz mal a ele… - o homem encolheu os ombros – Eu quem dei as roupas dele pra ele quando criança, ou melhor, quando pequeno.

Thomas se lembrava dele perfeitamente, era raro ele se esquecer do cheiro ou da voz de uma pessoa. Até mesmo do seu rosto. Mas não gostava.

– Bem... o que acontece com você, Thomas, é que você está apenas desenvolvendo partes de seu corpo - Kyle continuou - Está se tornando o que realmente é. Um Slender, e um Slender tem tentáculos.

Entendo… ele agora não sentia mais medo. Tentou movê-los, mas tudo que conseguiu foi fazê-los tremer. Mas como você sabe tanto sobre quem eu sou? Quem é você?

Assim que Alicia traduziu, o homem respondeu, sorrindo:

– Um amigo. - se virou para a garota - Agora, vamos pegar uns sacos de gelo para colocar nessas costas. Thomas me parece ainda estar com febre, e ele como sendo de uma espécie diferente, nossos remédios podem não fazer bem.

E assim, Kyle e Alicia passaram a tarde cuidando do jovem Slender, que aos poucos se acostumava com a presença do homem, porém ele ainda não permitia muita aproximação, a não ser por Alicia. Quase de noite, Kyle foi resolver, segundo Thomas, suas "coisas de humano", e Alicia ficou pesquisando na internet sobre os Slenders, para evitar outras surpresas desagradáveis. Thomas já conseguia se levantar e andar, mas os tentáculos arrastavam no chão, fazendo-o grunhir. Já não era tão dolorido, mas incomodava.

Como se sente agora? Alicia perguntou.

Tá… essas coisas estão formigando... Ele grunhiu mais um pouco, balançando a cabeça e a segurando com as mãos. E agora minha cabeça também começou a doer.

De repente Alicia ouviu um som de estática vindo dos pensamentos dele, e a tela do computador começou a chiar, como numa televisão com interferência de sinal. Ela estranhou, batendo na tela, até que ela começou a sentir também uma dor de cabeça. Os pensamentos com estática dele estavam muito altos, e mesmo para ele não estavam normais.

– Thomas, vá para a cama, você precisa descansar… - ela se levantou e empurrou o monstro pra lá, com cuidado para não pisar naquelas cobras negras.

Quando ele finalmente se deitou, a estática diminuía à medida que ele relaxava. Ela suspirou, sentando-se ao lado dele. Pelo que ela tinha visto a estática vinha de poderosas ondas produzidas pelo sistema nervoso central dele, que permitiam que ele pudesse fazer coisas incríveis, como a telepatia, mas também que danificavam temporariamente aparelhos eletrônicos. Ela pelo menos entendia que ele tinha poderes, e que estes estavam se manifestando…

Só rezava para que nem ela, nem ele não sofressem tanto com essas mudanças…

– São cento e cinquenta euros, senhorita – a mulher no balcão diz, sorrindo.

A cliente era uma belíssima mulher alta, vestida elegantemente num vestido decotado, saltos-agulha e com um casaco de pele de urso. Ela sabia que era um sorriso falso, mas pagou assim mesmo. Tinha belos cabelos negros e delineados olhos castanho-amarelados debaixo dos delicados óculos escuros, e andou para fora da loja, com uma sacola contendo um conjunto de colar e brincos.

Ela olhou para longe, ao norte, meio perdida no pensamento, e seguiu seu caminho, andando pelas ruas. Estava quase de noite, então ela resolveu ir para algum lugar mais seguro. Virou a esquina para um beco escuro, e num piscar de olhos ela não estava mais lá, mas sim rodeada por um monte de vegetação. Árvores e mais árvores ao redor da clareira.

De repente, uma presença hostil tomou conta do local, e um ser de três metros de altura sem rosto e vestindo um terno apareceu nas costas dela, seus tentáculos ondulando, ameaçadores. Ele era altamente silencioso, mas a mulher conseguia ouvi-lo, e sabia quem era.

Oi Sean, disse ela, em telepatia. O monstro parou, saindo de sua postura agressiva, e os tentáculos se abaixam em dúvida.

Hellen? O que está fazendo, vestida de humano? Quase que eu te mato! Ele se aproximou, a altura dela batia com a cintura dele. Sabe que eu odeio quando faz isso… imitando aquela praga…

Eu sei, então quer dizer que meu disfarce está fazendo efeito… ela tira os sapatos de salto, em seguida começa a crescer; os braços se alongam, todos os cabelos se retraem e a face vai desaparecendo, até tomar uma forma quase igual à dele, porém feminina. Ele sabia que ela podia fazer essas coisas, mas ele nunca se acostumava com isso.

Sean, eu o senti… Ela o encarou, e pôs as mãos no peito dele, quase agarrando o colarinho de tanta felicidade. Ele está vivo, ele realmente está.

Ele sobressaltou-se, um pouco mais animado, segurando suas mãos. Oh, essas são boas notícias…

E não é só isso… Os poderes dele estão finalmente se manifestando…

As cobras negras dele se agitam mais entusiasmados. Mesmo? E… E onde ele está?

Ela congela com a pergunta, logo depois treme e abaixa a cabeça. Todas as ondulações dele se abaixaram junto.

Hellen? Ele aproxima a cabeça, encarando o que seria o rosto dela. Onde ele está?

Ela sentia. A estática ainda estava muito fraca, mas ela sentia aumentar a cada ano. Ele não estava distante, mas ela não sabia a direção por onde seguir. Ele podia sentir a tristeza dos pensamentos dela.

Eu… eu não sei… Está tão perto… E tão longe… Eu não sei mais o que fazer.

Ele suspirou. Suas narinas aparecendo por um momento, os ombros dele se abaixam e os braços a envolvem. Calma, ele está vivo, isso é o que importa, certo?

Mas ele deve estar sofrendo tanto… passar por aquelas mudanças nunca foi fácil para ninguém de nossa espécie. Sua voz parecia cheia de interrupções, como num soluçar. E… eu quero ensiná-lo o Andar Esguio…

Eu sei, eu sei. O encontraremos algum dia, temos todo o tempo do mundo e você sabe disso.

Eu sei, mas…

Esperemos; logo você o sentirá melhor, e poderemos buscá-lo. Ele fungou um pouco, e grunhiu com o asco. Agora, vamos para casa, você está fedendo a humano.

Eu sei… Na verdade os humanos não fedem tanto, mas Sean odiava-os, e com toda a razão. Ela o acompanhou pela mata escura, um pouco mais aliviada, mas ainda cheia de preocupação, se perguntando se ia aguentar esperar mais.


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Notas finais do capítulo

Senhores e senhoras, leitores, mais um capítulo postado. Yay!



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