Monomania escrita por nymeria


Capítulo 5
I just want to know you better


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo, espero que gostem. Um pequeno momento Megavi, mas tem bem mais no próximo capítulo. Comentem e digam o que acharam. Bjos!!
PS. Reviews são melhores do que chegar em casa num dia frio e se enfiar debaixo das cobertas.
Música do capítulo:
Everything has changed - Taylor Swift feat. Ed Sheeran



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/510556/chapter/5

(Demônio)

– Megan, pela última vez, ela é só uma criança.

Criança, até parece. Aquela menina era praticamente o demônio reencarnado. Se forças malignas realmente existissem, teriam a escolhido para representá-las no plano terreno.

– Prudence, é ela que tá me provocando, por favor – Megan tentou arrazoar com a amiga. – Só nos últimos dez minutos, ela disse que a maquiagem realça minha cara de vadia, que minhas roupas só encorajam essa teoria e que esses sapatos fazem minhas pernas parecerem mais curtas. Você realmente acha que eu sou a que está implicando com alguém aqui?

– Bom, você poderia ter vestido algo mais discreto – Slut shaming, Prudence. Que coisa feia.

Megan sabia que não deveria ter saído da cama naquele dia. Não mesmo. Prudence tinha aparecido de manhã em sua casa, terrivelmente cedo, implorando para que a loira a acompanhasse em uma visita à uma comunidade carente do Rio de Janeiro. Uma das organizações em que Prudence cooperava queria começar um novo projeto com as crianças do Morro do Saci, e era necessário primeiramente desenvolver alguns dias de atividades a fim de conhecer melhor seus interesses e decidir qual seria o foco de ação escolhido, período este que os voluntários chamavam de “detecção”.

Megan jogou dois saltos Manolo Blahnik em cima de Prudence para que ela a deixasse dormir. Jurou que estava com uma baita ressaca. Soltou baforadas de fumaça de cigarro diretamente no rosto da amiga. Mas não havia maneira de convencer Prudence quando ela estava realmente determinada, e agora, aqui estava Megan, tendo que lidar com uma criança insuportavelmente irritante. Que maneira perfeita de começar o dia.

– Você tá mentindo – disse Alice, disposta a testar ainda mais a paciência da loira. – Eu disse que sua maquiagem e suas roupas fazem com que você pareça uma vadia, e não que você é uma.

– Agora chega, Alice – Prudence acariciou os cachos da menina. – Eu já vou conversar com vocês sobre o resultado da atividade de hoje.

Magnífica atividade, realmente. Megan quase tinha desmaiado de sono e tédio durante a coisa toda, até Alice aparecer e fazer com que ela finalmente tivesse algo interessante em que se focar. Discutir com uma criança de treze anos, obviamente, era melhor do que ouvir a baboseira de Prudence, Gabriel e outros voluntários acerca da importância de acreditar nos seus sonhos, lutar por uma vida melhor e blá-blá-blá. Boring.

– Bom, embora nem todos vocês tenham entendido o conceito de compartilhar suas emoções – começou Prudence, se dirigindo a todos os presentes -, e eu estou falando particularmente com você, Alice...

– Por que eu? - exclamou a menina defensivamente.

– A gente pediu pra vocês escreverem num pedaço de papel o maior sonho em que conseguissem pensar – Prudence tentava conter um sorriso. – A sua resposta foi simplesmente “Quem se importa?”.

– É uma pergunta válida – Megan não sabia por que estava apoiando aquela pentelha.

Quieta, Megan – Prudence, a ditadora ruiva, estava de volta. – Bom, nós lemos as respostas anônimas que foram colocadas na caixa azul...

– Você acabou de revelar o que eu escrevi, anônima coisa nenhuma – interrompeu Alice.

Megan gargalhou, recebendo outro olhar de reprovação da amiga. Ela não queria admitir, mas a menina de pele morena e cabelos negros e cacheados, tão diferente dela na aparência, lhe fazia lembrar de uma outra criança intransigente e teimosa. Talvez aquele dia acabasse não sendo tão insuportável, no final das contas.

****

(Questão de logística)

– Davi, pela última vez, chega desse assunto – Jonas ocupava a cadeira da presidência da empresa. Ela supostamente deveria pertencer ao vencedor do concurso Geração Brasil, mas, naquele período de transição, era impossível impedir Jonas de controlar todas as decisões e rumos tomados pelo corpo de funcionários da Marra. Especialmente Davi Reis.

– Amor, ele tá certo – Manuela Yanes colocou a mão no ombro dele, fazendo um leve carinho. – Você tem que se familiarizar com outros aspectos da Marra antes de iniciar um projeto tão grande, que vai tomar uma parte razoável do seu tempo. Questões logísticas e mais práticas, na verdade.

Davi não conseguia acreditar. Ele tinha trazido Manu naquela reunião para ter alguém que o apoiasse, que o ajudasse na difícil tarefa de convencer Jonas Marra da importância do início imediato do desenvolvimento do projeto Júnior. Aparentemente, a namorada havia sido persuadida pelo idealizador daquele império da tecnologia. Novamente.

Tudo o que Davi Reis sempre quis foi promover a inclusão digital. Ajudar outras pessoas que eram como a criança que ele havia sido. Dar esperança através do teclado de um computador. Ele não se importava com qual era o produto mais desejado pelo mercado tecnológico, ou se o sistema operacional da Marra precisava de uma nova interface gráfica. Ele só queria se dedicar ao projeto com que tinha sonhado durante boa parte de sua vida adulta.

Manu segurava sua mão quando eles saíram da sala da presidência alguns minutos depois. Davi sabia que ela podia ver o quanto ele estava desolado, mas a namorada realmente pensava que aquele era o melhor curso de ação a ser tomado. Manuela Yanes era uma mulher prática e segura de suas opiniões e, mesmo aquelas características se virando contra ele naquele momento, eram elementos que ele amava na personalidade dela.

Tudo iria ficar bem. Tinha de ser assim.

****

(Sobre viver e morrer)

Inspira. Expira. Inspira. Expira.

Megan queria ficar sozinha e fumar seu cigarro em paz. Prudence e seus amigos de faculdade estavam conversando com as crianças dentro da pequena casa reservada para as atividades daquele dia, então Megan finalmente conseguiu se livrar por alguns momentos da atenção indesejada por parte de sua amiga.

Não era que fosse insensível. Pelo menos, não completamente. Ela percebia que aquelas crianças precisavam de carinho e de pessoas que as ajudassem a identificar caminhos alternativos aos que elas conheciam na realidade em que se encontravam. Mas Megan definitivamente não era uma dessas pessoas. Ela não tinha a paciência necessária, e por muitas vezes acabava ela mesma se comportando como se não tivesse saído da infância e da adolescência. As discussões com Alice tinham sido a prova definitiva disso.

– Você vai ter câncer, sabia – Falando no demônio.

– E o que uma pirralha como você entende sobre isso?

– Meu pai fumava também. Ele morreu de câncer nos pulmões quando eu tinha nove anos – Silêncio. – Minha mãe disse que a culpa era dele.

Provavelmente a mãe de Alice estava certa. Todos têm de arcar com as consequências de suas ações, algum dia. Megan também teria.

Mas não tinha medo da morte. Nenhum pouco. Seu maior receio era passar pela vida sem ter deixado uma marca que a fizesse ser recordada. Sem aproveitar cada instante em sua plenitude. Então, continuava com seu cigarro preso entre os dedos, porque ele lhe proporcionava alívio e disposição para encarar cada dia. Não tinha medo da morte.

– Qual que é o seu sonho, afinal?

Não estava curiosa. Pelo menos, queria pensar assim. Era apenas que aquela menina lhe fazia recordar de si mesma há oito anos atrás, e queria saber se elas compartilhavam alguma outra coisa além do mal-humor recorrente e do desejo contínuo de irritar todos a sua volta.

– Não te interessa – a garota ficou quieta por alguns instantes. – Qual é o seu?

Megan pensou em responder da mesma maneira malcriada, mas algo a impediu.

– Ser lembrada.

– Como assim? – Alice se sentou no chão, perto de onde Megan se encontrava.

Tentando não pensar racionalmente, ela imitou a ação da menina.

– Eu não quero morrer e não fazer diferença pra ninguém, sabe – Megan apagou o cigarro no concreto. – Quando eu não estiver mais aqui, eu quero que todos se lembrem e sintam minha falta. Terrivelmente. Porque eu afetei a vida deles de alguma forma.

Elas ficaram em silêncio.

– É um sonho bem egoísta – Megan riu. – Mas eu gostei – Mais silêncio. – Eu quero fazer música. É a coisa mais bonita do mundo, e eu queria poder impressionar todo mundo com algo que fosse feito pelas minhas mãos.

– Eu toco piano – Megan não sabia por que estava compartilhando tantas informações. Não era uma pessoa simpática, for God’s sake.

– Sério? – os olhos da menina brilhavam, embora Alice tentasse esconder a admiração. – É um instrumento tão lindo, né? Pena que eu nunca vou poder aprender.

Algo estalou dentro da mente de Megan e, então, ela sabia o que fazer. Precisava falar com Pamela. E com Prudence. Agora mesmo. Ela já tinha uma ideia de que projeto a amiga poderia desenvolver no Morro do Saci.

****

And all my walls stood tall painted blue

But I'll take them down

Take them down and open up the door for you

And all I feel in my stomach

Is butterflies the beautiful kind

Making up for lost time, taking flight

Making me feel right

Megan observava, através do longo vidro ao lado de sua mesa, as ondas do mar noturno, revoltas em meio à maré alta, chocarem-se com a areia da praia, de novo e de novo e de novo. O movimento parecia tão regular, inevitável e, de alguma forma, planejado, diferentemente de todas as perspectivas da sua vida.

A única coisa de que tinha certeza, no momento, era que Prudence McKinnon iria ouvir algumas verdades mais tarde. Aquela ruiva maldita. Já era a segunda vez naquela semana que a amiga cancelava um compromisso com Megan, sempre de última hora. Culpa daquele desgraçado de novo.

Desde sua chegada ao Rio de Janeiro, Megan tinha visto o namorado de Prudence três vezes e, a cada encontro, seu desprezo pelo garoto só fazia crescer. Gabriel, nos poucos minutos passados perto dela, criticou sua bolsa laranja Hermès – “Qual a necessidade de usar couro em pleno século XXI?” –, distribuiu seu conhecimento acerca dos males da indústria televisiva, com destaque para os programas da Parker TV, e perguntou se Jonas Marra era tão cretino pessoalmente quanto parecia ser através das mídias sociais.

Não, idiota, ele era ainda mais.

Agora Megan estava ali, numa noite de sábado, pateticamente sozinha em uma mesa de restaurante. Ela já havia perdido a conta do número de xícaras de café que tinha pedido desde que adentrara naquele lugar. Só queria poder acender um Marlboro e aproveitar um momento de silêncio. Se todos a sua volta pudessem simplesmente ficar calados.

A loira estava prestes a ligar para o primo e convocá-lo para uma noite em alguma boate carioca, quando percebeu quem adentrava o restaurante naquele exato momento. Golias. E, um milagre, Davi não carregava Mongoela a tiracolo.

Megan não tinha encontrado com o novo presidente da Marra desde aquela fatídica noite em frente à sua casa, na qual ela esperava ter conseguido fazer algum progresso em relação ao relacionamento deles. Era hora de testar até que ponto essa trégua iria.

– O que meu hacker preferido tá fazendo aqui, tão sozinho? - Megan havia apoiado sua mão direita no ombro de Davi enquanto se sentava na cadeira ao lado da dele. Ela sabia que estava sendo abusada. Só um pouquinho.

Davi suspirou e coçou os olhos, parecendo cansado e estranhamente inexpressivo diante da presença dela na sua mesa.

– Eu podia te fazer a mesma pergunta, Megan Marra.

– Eu já te disse que é só Megan, please – Como ele era teimoso. – Se você continuar assim, vou ter de te chamar de Golias. E, respondendo à sua tentativa de ser sarcástico, uma amiga me trocou por uma sessão de cinema com o namorado. E ele ainda comprou ingressos pra um documentário, aquele fucking asshole.

A afirmação finalmente fez com ele esboçasse um sorriso.

– Não sabia que você tinha tanta dificuldade de arranjar companhia pra um sábado à noite.

– Você sabe que eu não tenho – ela lhe deu um sorriso sacana. – Mas, olha só que coisa boa, eu preferi vir até aqui, jantar com você e começar uma nova amizade.

Davi simplesmente ficou lhe observando, olhos tão castanhos e duvidosos. E inexplicavelmente tristes, percebeu Megan.

– Você só tá aqui procurando por amizade, Megan? Tem certeza? - Ele não precisava saber as reais intenções por trás daquele teatrinho. No momento, ela se contentava em permanecer somente como uma amiga. Uma ótima amiga.

– Alguém já te disse o quanto você é desconfiado? – ele riu. – Eu já entendi que você ama a Manuela, a Manuela te ama, e blá-blá-blá, happy ending. Mas eu realmente não tenho muitos amigos aqui no Rio, Davi.

Ela abaixou a cabeça, tentando parecer inocente. Aham.

– Eu tenho só minha família, meu primo e a Prudence. É tão errado querer conhecer mais gente por aqui?

– Por que eu?

Megan realmente desejava um cigarro. Não só para sentir o alívio da nicotina correndo por suas veias, mas também para deixar uma pequena queimadura circular na mão que ele apoiava sobre a mesa. Quem sabe assim Golias deixava de ser tão irritante.

– Eu gosto de você, Davi, mesmo sem entender muito bem o porquê disso – ela disse simplesmente. – Posso te fazer uma proposta? Vamos jantar essa noite, conversar e ver se nos damos bem.

Ela inclinou o corpo em direção a ele.

– Eu te garanto que sou uma boa companhia, e você parece estar precisando de um pouco de diversão – ela fez sinal para que o garçom viesse atendê-los. – A não ser que você esteja esperando por alguém.

Davi parou para pensar durante alguns segundos.

– Isso é só um jantar entre duas pessoas tentando conviver em paz, ok?

Eles fizeram o pedido, e o silêncio se instalou na mesa. Passaram-se um minuto, dois, três...

– Você tá muito quieta – Finalmente ele tinha iniciado uma conversa. Um ponto para Megan Lily. – Você tá silenciosa, e isso me deixa nervoso. Pensando o que essa sua cabeça tá planejando.

Megan riu.

– Você não tá cooperando muito também.

– Mas eu não sou o tagarela da dupla – Ela gostou de ele se referir a eles como uma dupla. Se dependesse dela, eles ficariam juntos por um bom tempo. – Você é sempre a que fala sem parar. Eu só... escuto.

E me rejeita.

Okay, então – Megan apoiou os cotovelos sobre a mesa e o encarou. – Como foi o seu dia?

Ele pareceu desconfortável. Bem desconfortável. Talvez as coisas não fossem um mar de rosas com a sweet Manuela, no final das contas.

– Foi tudo bem – ele ficou calado. De novo.

Ela acenou.

– Agora, seguindo as regras de boa convivência, você me pergunta como foi o meu.

– Você teve mais um dia maravilhoso na sua extraordinária existência, Megan Lily? – Davi gostava de ser sarcástico em relação à ela, Megan percebeu. E de provocá-la.

Definitivamente esse seria um jantar interessante.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Respondendo rapidamente algumas perguntas que recebi sobre Megavi:
Sim, vai demorar um pouco pra eles ficarem juntos (como um casal, mas vai ter cenas com eles em quase todos os capítulos daqui pra frente). Sim, eu gosto de tragédias/crises existenciais e vão rolar momentos tristes no decorrer da história. Mas vai ter também muitos dialógos e pegação e um final bonito, eu prometo. Espero que continuem acompanhando.
REVIEWS PRO PRÓXIMO CAPÍTULO SAIR DO FORNO RS. bjos!