O som era alto, e ela aproveitava ao máximo sua última noite do feriadão. As caixas de som faziam todo o lugar vibrar com a bate-estaca sem letra, e todos pulavam dançando desordenadamente, gritando e sussurrando, dependendo da situação.

Miku se espremeu por entre um casal se agarrando, para chegar até o bar. Tinha um sorriso de quem estava adorando a situação. Diferente de seu irmão, ela havia nascido para as ruas. Não se lembrava da última vez que havia dormido em casa, ou melhor, a última vez que havia dormido.

Sua amiga Rin vinha logo atrás, com o mesmo sorrido. As duas já haviam obstruído de alguns agrados alcoólicos, mas isso não significava que sua sobriedade já havia saído da boate.

- E é assim, minha cara amiga, que se termina um feriado com estilo – Rin sentou em um banco do bar, chamando a atenção do barman com um gesto. – Foi uma ótima ideia vir aqui.

Miku riu e sentou ao lado.

- Percebi. – o barman foi até ela Rin pediu duas margaritas. – Não acho que estamos prontas pra vida de estágios, estudos e homens.

A loira sorriu concordando, mas seu sorriso desapareceu quando seus olhos atravessaram além de Miku e pararam e algo. Ou alguém.

- Por falar em homens. – um sorriso astuto surgiu, e ela virou para pegar sua margarita com o barman. Miku se virou, para ver o que havia chamado a atenção da amiga.

- O que ele está fazendo aqui? – não sabia se a pergunta era retórica ou não.

- Parece que ainda não viu você. – Rin olhou para amiga. – Ainda dá tempo de ir embora.

Miku sentou-se ereta em seu banco, arrumou cabelos e decote.

- Não vou abrir mão de uma noite que promete por um ex estúpido. – engoliu metade de sua margarita, com a cabeça erguida.

A verdade era um pouco mais complexa. O rapaz não era um ex. Era o ex.

A garota deu mais uma espiada com o canto dos olhos. Ele estava diferente. E como. Ela não o via há no mínimo um ano e meio. Mas algumas coisas não mudaram. Suas costas continuavam largas e pareciam talhadas a mão, e ele estava mais alto. Os olhos, mesmo que distantes, continuavam naquele azul monocromático, tempestuoso e nostálgico. Os cabelos do mesmo jeito, só que estavam maiores, azuis e mal cortados. Ele estava com uma garota com cabelo platinado louro, que parecia vezes mais empolgada que ele.

Rin sorria como uma peste.

- Ele ainda cara de quem tá com dor o tempo todo, pelo visto.

Não era assim que Hatsune se lembrava dele.

- Quem liga? – e o resto da sua bebida foi goela abaixo. – Eu não.

- Miku, Kaito foi seu primeiro namorado, não precisa ter raiva de já ter gostado dele. Ele fez você sofrer, faz parte, mas não precisa se arrepender por isso. – Rin soava compreensiva, mas não foi bem assim que aconteceu. Não foi Kaito que machucou Miku. Ela foi quem o machucou. Mas não iria se desmentir agora.

- Certo. Vou dançar. Ver se acho alguém que me dá mole. Casos de uma noite são meu ganha-pão, afinal – e riu, se esgueirando de volta para a pista de dança.

Começava a avaliar seus parceiros disponíveis. Dançava com graça e sensualidade, aproveitando suas curvas e suas roupas, para atrair quem caísse em sua armadilha. Alguns homens a olhavam de cima a baixo com os olhos estreitos, analisando suas próprias chances com a moça. Ela jogava a franja mal cortada para trás, tentando abrir mais seu espaço de contato visual, até que se esbarrou em alguém, pisando no pé da pessoa com seu salto de treze centímetros. Se virou para se desculpar, afinal, ainda tinha educação.

- Desculpe – mesmo que não pararia de dançar para pedir desculpas, se virou para a pessoa. E os olhos azuis a atingiram como um tapa.

- Vejo que ainda sabe dançar. – Kaito falou com uma voz tão calma que fez com que ela se sentisse queimar de dentro pra fora.

Hatsune arqueou as sobrancelhas, sem muito o que dizer.

- E sei usar dessa habilidade para ter o que quero. – respondeu tentando soar áspera, mas com Kaito isso não era muito possível. – Onde está sua acompanhante?

Ele sorriu e gesticulou para que a seguisse. E ela o seguiu. Ainda não era muito boa em dizer não para caras como ele.

- Sabe que não valorizo tanto os casos de uma noite como você.

- Ela parecia empolgada.

- Ela não me empolga. – ele falou, ligando seus olhos.

Miku colocou uma mecha atrás da orelha e cruzou os braços sobre o busto. Era perturbador ver como mesmo depois de todos os anos, o simples olhar dele a fazia se sentir completamente nua.

- Achei que havia se mudado. – ela descolou os olhos, olhando para os lados, certificando-se de que Rin não via os dois conversando. Seria um problema se ela os visse.

- Foi só durante o intercâmbio. – ele se recostou na parede, vendo-a se aproximar com cautela. – Ele acabou, e eu voltei.

- Hum. – queria que aquela conversa constrangedora acabasse e ele voltasse para o fim de mundo que havia vindo.

- Ainda é amiga de Rin, então. – ele sorriu. – Que legal.

- Não seja cínico, você nunca gostou dela.

- E nunca vou gostar. – arqueou. – Mas cinismo é a minha marca.

Revirou os olhos.

- O que quer comigo? – Hatsune foi direto ao ponto, o olhando nos olhos para parecer firme. Foi quando viu que pela primeira vez na história, havia o deixado sem resposta.

- Uma conversa amigável. – não soou muito certo disso.

- Certo, eu até poderia falar com você – pigarreou – amigavelmente, mas estou acompanhada, e já estou em meu horário então, tchau. – até nunca.

Um sorriso de raposa surgiu nos lábios de Kaito, e ele colocou as mãos no bolso.

- Até, Miku. – foi o suficiente pra ela se infiltrar na multidão de novo e procurar pro Rin, para que pudesse fugir daquele lugar o quanto antes possível.