– Os anos passaram depressa, aconteceram tantas coisas novas em minha vida, muitas esperadas, sonhadas e outras não... Eu me envolvi nesse turbilhão de músicas, pessoas, fama, dinheiro, assédio. Fiquei tão ocupado com tudo isso, me envolvi com tudo, tirei proveito de tudo, mergulhei fundo, ganhei muito. – ele sorri – muito dinheiro... E aproveitei tudo o que vem com ele... Os bajuladores, os amigos de ocasião, festas, viagens, programas de TV e muitas, muitas mulheres... É fácil, é só escolher e apontar, fácil assim, fútil, superficial e isso me satisfaz, ou me satisfez. – ele olha para a mãe com um olhar triste e dá de ombros. – Eu já não sei o que pensar – Ele senta próximo dela – no show que fizemos em Portugal – ele fala olhando para a mãe, e se joga no encosto do sofá – Depois do show, quando junta todas aquelas pessoas no camarim, e o pessoal faz planos para sair – ele a olha novamente – Aquilo me perturbou, todo aquele barulho, todos pareciam falar ao mesmo tempo, eu olhei para todos eles e não senti nada, me senti vazio... E continuei assim, me sentindo vazio até o final da turnê. – ele fica calado esperando que a mãe fale alguma coisa para que aquela angústia passe.

A Senhora sorri.

– Por isso você correu até aqui? Mas porque passou esses dois dias calado?

– Mãe. – ele reclama se sentindo desamparado, esperava mais dela, esperava que ela fizesse o que sempre faz, com um gesto, uma palavra e ele se sente melhor. Luca olha para ela desanimado.

A Senhora fica séria. Seu filho é um bom rapaz, bonito, um bomfilho, mas ela não aprovava a vida que ele levava.

– Eu avisei que chegaria o dia em que você se sentiria assim. Ter uma namorada diferente todo mês, não se apegar às pessoas. Meu filho– diz a mãe, paciente. – Você sempre foi romântico, sonhador... Mas o que eu quero saber é o que aconteceu nesses dois dias – ela fala curiosa – Eu sei que você pensou muito sobre isso.

Luca olha desanimado para a mãe.

– Desde o show em Portugal eu penso sobre isso, e me pergunto porque aceitei esse caminho... Ontem, eu sonhei com ela, talvez por causa da língua... – ele abaixa a cabeça.

– Com ela? – a mãe fica em dúvida – Você não me falou de nenhuma paixão.

– A Senhora não a conheceu. Ela foi embora depois que ganhei o festival de San Remo.

– La bambina brasilliana?

– Ana. – ele fala contrariado. O irmão tinha colocado esse apelido nela, mas não gostava.

– Mas filho, já faz um tempo.

– Seis anos...

– Você está contando? Você costuma pensar nela? – a mãe não fazia idéia que essa paixão tivesse marcado ele tanto assim, não tinha conhecido a moça, morava em outra cidade quando ele a conheceu. E seu filho nunca falou nela durante esses anos.

– Algumas vezes. Mas fazia um tempo que não me lembrava. Mas ontem, eu sonhei com ela, foi tão nítido. – ele esboça um sorriso. – Nós dois na cama, conversando e rindo... A gente sempre fazia isso depois de fazer amor... O jeito que ela sorria, que gesticulava – ele puxa o canto da boca – ela não parava quieta ao meu lado eu acabava pulando em cima dela e...

A mãe interrompe.

– Luca!

Ele faz uma cara safada. A mãe sorri do jeito dele.

– Sonhar com ela te deixou mais leve?

– Afastou uma nuvem escura de minha cabeça, mas não o peso em meu coração. Meus sentimentos estão confusos, misturados.

A mãe levanta e senta ao lado dele no sofá. Puxa sua cabeça para seu peito e passa a mão pelos seus cabelos.

– Você deve ter buscado a lembrança do último sentimento sincero que você teve, que foi com essa moça. Esse sentimento pode ser o ponto de partida para você resolver sua angústia, repensar seu modo de vida.

– Eu vou pensar nisso. – ele fecha os olhos aproveitando o carinho da mãe. – Dona Aurora, eu sempre posso contar com a senhora. – Luca levanta. – Eu vou aproveitar minhas férias para pensar nisso. – ele se abaixa e beija a mãe. – Quando voltar, com certeza já vou ter me resolvido.