Podia-se ver uma pequena figura caminhando pela escura e fria rua, pequeno, cabeça baixa, olhos inchados, cabelos negros da cor do petróleo e roupas manchadas no vermelho, sangue, Riki Lee caminhava teus frios passos até a porta de casa...Mais um dia sofrido para o pequeno, mais dor, mais lágrimas, mais um dia perdido, repassava o mesmo em sua mente antes de virar a maçaneta e correr para o banheiro como sempre fizera.

– Oi mãe, oi pai, não estou com fome, vou pro banho, boa noite!

Riki larga a mochila em um canto e sobe as escadas rapidamente, sem dar tempo de sua família perguntar algo sobre o seu dia, mal tiveram tempo de ver seu rosto, seu corpo, marcados pela dor, violentados, de todas as vezes que apanhara, aquela com certeza devia ser uma das piores, tua roupa nunca havia ficado manchada.

O pequeno tira a blusa e analisa seu corpo, branco (como o resto de sua pele), magro, mas levemente sarado, um belo corpo jamais reconhecido por si mesmo, analisa seu rosto, pálido, olhos escuros como a noite, repara com calma em cada parte do seu rosto e passa os dedos em cima de uma nova cicatriz, acima da sobrancelha direita.

–Aaah-Suspira o pequeno.

–Outro dia...uma nova cicatriz, dessa vez no rosto, como vou esconde-la? Mas...Porque eu? O que tenho de tão errado? Por que insistem em vir atrás de mim sempre? Por que me fazem sentir tanta dor? E...Por que não consigo me defender? Sou um inútil! Um completo imbecil! Eu desejo morrer!-

Riki pensava consigo mesmo no box do banheiro, e quando podia perceber, as lágrimas estavam indo ralo abaixo junto da água quente...Mas o que o pequeno poderia fazer com a angustia? Riki sempre teve sua válvula de escape, quando via uma lâmina não exitava em se auto mutilar, e assim o fez novamente, nessas horas, sua navalha de barbear era sua única e mais fiel amiga, assistia consigo de perto o vermelho e o incolor se misturarem e se transformarem em um sangue ralo, que ao sair de seu corpo, levava embora todas as suas tristezas e inseguranças. Ao esperar os cortes estancarem, repassava pela segunda vez o seu dia, desde a madrugada mal-dormida até sua terceira surra semanal, e ir novamente para casa sem contar nada a ninguém, qual o motivo de manter-se calado? O medo, o medo de ser perseguido novamente, de ter "uma lição" novamente, mas dessa vez não só por ser gay, mas por ser gay e por ter aberto o bico, remoía-se nisso até ouvir batidas na porta e ouvir a voz de sua mãe:

–Riki? Está tudo bem? Você está demorando...

–Estou bem mãe-Rebatia ele com uma mentira-

–Já vou sair, não se preocupe

–Tudo bem, não demore

Riki demorava mais alguns minutos para o sangue ser completamente estancado, ao sair do box, tratou seu novo ferimento o melhor que pode e arranjou alguma boa desculpa caso seus pais o perguntassem algo, assim, seguia para o seu quarto, vestia-se e passava alguns minutos olhando por sua janela, Riki adorava o céu a noite, observa-lo era algo que o acalmava e o deixava um pouco mais feliz. Quando se cansava, deitava em sua cama e criava seu próprio mundo, e como queria que tudo fosse, a vida perfeita, repleta de amigos e até mesmo um grande amor, teria um pouco de tudo, menos a morte tão perto de si, Riki seria feliz...Voltava a sua realidade alguns minutos depois, suspirava, segurava as lágrimas, recusava-se a chorar novamente, o pequeno era forte, duro como uma rocha, mas tão pouco reconhecido por sua própria pessoa, não gostava do seu rosto, do seu corpo, via-se como um completo fardo, no final, cedia e chorava baixinho novamente até pegar no sono, com um único pensamento: "Amanhã é outro dia".