A Bella e o Monstro escrita por Leprechaun


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Não sei se tenho que lembrar vocês,mas essa fic é de época, ela se passa em 1812 então....



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Papai não era um modelo de perfeição e eu sabia que ele não podia me manter a salvo. Eu nunca estive a salvo. Tudo tinha sido uma ilusão. Em algum lugar dentro mim, já sabia, mas não queria enxergar. Tinha preferido me esconder até que Edward Cullen roubasse minha ilusão.

— Por quê? — perguntei, olhando para ele, meu coração apertado por ter imaginado uma conexão especial com aquele homem inescrutável e elegante demais para fazer parte daquele vilarejo. — Por que me procurou?

— Para oferecer uma solução ao seu pai.

— Não entendo...

— Não — papai gemeu. — Não tenho dinheiro para pagar a uma garota com as responsabilidades de minha filha. E ela não faz parte disso.

— Sim, ela faz — retrucou.

— Qual é a minha parte nisso? —perguntei, fitando-o, o coração acelerado.

— Seu pai não tem meios de pagar a dívida, o que não lhe dá escolha. Posso exigir que venda a hospedaria.

— Não se pode tomar o lar de um homem por causa de suas dívidas — papai quase gritou.

— Isso nos deixaria sem casa e sem condições de sobreviver — constatei.

— Sim — o tom de voz de Edward era gelado e sem nenhuma simpatia.

Fechei os olhos, tentando me controlar. Ao abri-los, deparei-me com o olhar dele, no qual não havia misericórdia, apenas uma dura resolução.

— Continue — sussurrei.

— Posso mandar seu pai para a prisão.

— Não... — gemi.

O pensamento de meu pai deitado no chão de uma cela fria era horrível demais. Longe da hospedaria, dos seus amigos, da sua cerveja, dos seus contos e do som do mar, ele morreria. Seria minha culpa. Tudo culpa minha. As escolhas erradas que fiz vários anos atrás tinham desencadeado aquele caminho sem volta. Abaixando a cabeça, perguntei:

— O senhor ofereceu uma alternativa?

— Ofereci a seu pai a opção de uma servidão contratada.

Aquelas palavras soaram duras e frias. Ergui a cabeça e olhei para ele, confusa.

— Não entendo. Deseja que meu pai trabalhe nas colônias?

O pensamento era absurdo. Eu não podia imaginar que tal arranjo poderia permitir que nós pagássemos a dívida. Cullen soltou uma gargalhada.

— Não. Não pedi isso a seu pai. Em vez disso, sugeri outra opção, um acordo que permitiria que ele permanecesse exatamente onde está. Um contrato de débito.

Diante daquelas palavras, meu coração ficou mais leve e minha esperança reacendeu. Ele estava sendo gentil. A situação poderia ser salva. Olhei para papai, consciente de que meus olhos estavam brilhando, mas ele manteve a mesma expressão sombria e havia uma veia latejando na sua têmpora.

— O que essa opção impõe? — perguntei, subitamente desconfiada.

— Você se tornará minha escrava. Ficará comprometida por um período de sete anos até que vença o contrato.

Cambaleei, criticando-me por ter pensado que ele estivesse sendo gentil comigo. Minhas mãos gelaram, os dedos formigaram e eu senti como se estivesse sendo presa por correntes. Mordendo o lábio inferior, olhei para Edward Cullen, recordando a breve conversa que tivemos sobre pôneis selvagens e lobos. Eu nunca correria livremente por ter a perna defeituosa. E agora, aquele homem frio e insensível queria me escravizar.

Inquieta, lancei a papai um olhar desesperado, pedindo socorro silenciosamente. Ele permanecia em silêncio, mas, a expressão dele, confirmou a suspeita que já dominava minha mente. Não haveria escolha. Apesar de fingir não acreditar, papai pretendia me vender.

— Se perdermos a hospedaria, não teremos como sobreviver — ele resmungou, desviando o olhar. — Se fôssemos apenas nós dois, Bella, poderíamos encontrar uma saída. Mas pense nos pequenos, pense no dinheiro que eu envio à esposa e filhos do meu irmão. E Esme. O que será dela sem a comida que eu ponho à mesa?

Engoli em seco, lutando contra o desespero que me sufocava. Desejava poder me livrar daquela situação, gritar que não, eu não aceitaria a proposta. Que meu pai, as crianças e Esme, e a funcionária da hospedaria, Jessica, cujo marido bebia mais do que ela ganhava ali, e Mike, o garoto que cuidava do estábulo... Nenhum deles era responsabilidade minha. Mas não podia. Me importava com todos eles. Meu olhar se dirigiu a Edward.

Alguém tinha que pagar a dívida ao demônio.

Eu não conseguia falar nem respirar. Papai estava me condenando a uma vida de escravidão nas mãos de Edward Cullen, um homem aterrorizador e frio, que podia até ser um assassino.

Não, não podia deixar que meus pensamentos chegassem até aquele ponto. Ele era apenas um homem de negócios, que estava cobrando uma dívida. Que escolha havia? Meu destino seria trágico de qualquer maneira. Se papai fosse enviado à prisão, a hospedaria seria fechada e eu ficaria na rua.

— Por que nos odeia? — murmurei, fitando Cullen e vi em seu olhar satisfação e prazer com a vitória. — Não fizemos nenhum mal ao senhor. Nem sequer nos conhecemos.

— Não nos encontramos antes, Charlie Swan? — perguntou ele, comprimindo os lábios. — Tem certeza de que não praticou nenhum mal?

— É você quem está praticando o mal, tirando minha filha dos meus braços quando eu preciso dos cuidados dela. Que tipo de monstro é você? — Meneou a cabeça lentamente. — Deseja dar um golpe no meu coração?

— No seu coração? Acho que está querendo dizer no seu bolso. — Fez uma pausa. — Que tipo de monstro é você, que vai entregar sua filha para mim?

Prendi a respiração, chocada com a pergunta, mas capaz de ver a feia verdade que ela continha.

— Escolha seu caminho — Edward ordenou. — Minha paciência está acabando.

—Isabella... — papai implorou, embora eu não soubesse o que ele queria pedir.

O zunido em meus ouvidos aumentou. Realmente, não havia escolha.

— Eu irei com o senhor — disse depressa, temendo que, se não pronunciasse aquelas palavras logo, perderia a coragem de fazê-lo.

Edward assentiu e lançou um olhar para meu pai.

— Então, temos um acordo. Você não tem meios de saldar sua dívida e, desse modo, faremos uma alteração no modo de pagamento. Uma simples transação comercial...

— A compra de um produto — acrescentei, repetindo as palavras que havia ouvido a pouco, finalmente entendendo o que ele disse anteriormente. — Eu sou o produto.

Ele contraiu a mandíbula e, tirando um documento do bolso do casaco, pediu pena e tinta a papai, que saiu do recinto, me deixando a sós com o homem que me tiraria a liberdade.

Sr. Cullen não me fitou nem falou comigo , me deixando quase agradecida. O que mais haveria para dizer? Apenas quando a vil transação terminou, com nós três tendo assinado o documento, ele se virou para encarar-me com uma expressão distante.

— Tem precisamente dez minutos para arrumar suas coisas. Não me faça esperar — disse bruscamente e se virou para sair da hospedaria.

Por um momento, fiquei olhando para ele, meu coração apertado pela impotência em lidar com a situação. Virei-me para ver que papai me observava, parecendo confuso, como se não soubesse o que dizer ou fazer. Afastei-me dele e subi a escada até meu quarto.

Havia pouco tempo e, com o pulso acelerado, coloquei com rapidez meus pertences em uma maleta. Meus dedos eram desajeitados e seus movimentos esquisitos. Quantos minutos eu ainda tinha? Terminei de colocar as roupas e forcei a tampa da maleta para fechá-la.

Me endireitei, escrutinando cada centímetro do meu quarto, prestando atenção a cada canto e a cada peça da mobília. Tudo me era tão familiar... Comecei a sentir uma dor no peito que irradiava por todo o meu corpo. Eu estava com medo. Muito medo.

Um gemido baixo escapou dos meus lábios. Não! Não podia mergulhar no desespero. Eu sobreviveria. Superaria tudo aquilo. Contendo as lágrimas, peguei a maleta e a carreguei até o corredor, encontrando papai à beira da escada.

— Estou pensando que talvez você encontre um modo de pagá-lo, Bella. Talvez você possa trabalhar lá durante o dia e à noite aqui, talvez...

— Pagar com o quê? — murmurei. — Sangue? — Meneei a cabeça, a garganta doendo pelo esforço de conter as lágrimas e, pegando a alça da maleta, passei por papai, começando a descer a escada com meus passos incertos pelo defeito da perna.

Ele não fez nenhum movimento para me ajudar. Ele apenas me olhava.

Parei no final da escada, aspirando o rico aroma da cerveja que permeava o bar e passei pelas mesas e cadeiras. Cerveja, fumaça e homens. Cresci com aquele cheiro. Lembraria daquilo para sempre. E jurei naquele momento que voltaria um dia.

Quando sai da hospedaria, percebi que a tempestade se transformou em um chuvisco. Hesitei, sentindo meu pai atrás de mim, e olhei para Edward Cullen. Com as pernas afastadas, ele tinha uma expressão distante e impassível, o rosto marcado por um traço de crueldade. O vento agitava seus cabelos e as longas abas do casaco, fazendo com que parecesse maior e mais ameaçador. Mas ainda muito bonito, pensei. Horrorizada ante o pensamento, mordi o lábio. Que beleza podia haver em alguém sem coração e sem misericórdia?

Podia sentir a tensão que emanava de papai quando dei dois passos para frente. Minha perna doente fraquejou e eu percebi, atônita, um leve movimento da mão de Edward, como se ele tivesse pretendido me amparar. Ergui a cabeça, para vê-lo me olhando com... admiração? Eu devia estar enganada. Confusa, franzi a testa e ele desviou o olhar, mascarando qualquer emoção que eu tivesse visto ou imaginado.

— Já esperei o suficiente. Venha. — Cullen pegou a maleta do chão, carregando-a com facilidade até uma carruagem preta parada no pátio.

Abracei papai, que continuou rígido, a respiração ofegante contra os meus cabelos.

— Observe Pattinson. Esta noite — eu disse. — Pendurarei um lençol na janela. Espere por meu sinal. Saberá que tudo está bem.

Embora meu pai não retribuísse, eu lhe dei um último e desesperado abraço antes de, corajosamente, me afastar.

Com passos arrastados, segui Cullen, sem olhar para trás. Minhas pernas tremiam tanto que cada movimento me exigia um enorme esforço. Com o coração pesado, caminhei em direção à carruagem preta puxada por quatro belos cavalos negros que brilhavam devido à umidade da chuva recente.

De onde eles tinham vindo? Ele teria marcado um horário para que a carruagem chegasse ali? Os animais batiam os cascos no chão e o cocheiro os mantinha parados, segurando as rédeas com firmeza. O homem fez menção de se aproximar e me ajudar, mas a um sinal de Cullen, permaneceu no lugar. Ele abriu a porta da carruagem e subiu em um movimento elegante e ágil.

Hesitei, olhando para os inquietos cavalos. Eu não sabia nada a respeito das intenções do meu patrão. Não... Patrão, não. Ele era meu amo e eu uma escrava.

Estremeci, sentindo um aperto no estômago. Agora eu pertencia a ele, por palavra e autorização legal. Continuei parada, incapaz de decidir se seguia meu amo e entrava na carruagem ou se ele queria que eu seguisse a pé até Pattinson.

— Inferno! — ele praguejou, surgindo novamente na porta da carruagem. — Suba — ordenou, impassível.

Mancando até lá, agarrei as laterais da porta e subi. Com um movimento desajeitado, desabei no assento oposto ao de Cullen. Sentindo o olhar dele, endireitei a coluna, não, não demostraria fraqueza maior do aquela que eu estava sentindo.

Ele se inclinou e fechou a porta, olhando pela janela.

Segui a direção do olhar dele e senti meu coração se apertar ao ver meu pai ali, de pé na porta da hospedaria, com ar cansado e ombros caídos. Desejei desesperadamente poder correr até ele para ser protegida como quando eu era criança e tinha medo da tempestade ou de um pesadelo.

Tive um pesadelo, papai. Uma criatura monstruosa veio na noite...

Mas a criatura monstruosa não viera à noite. A criatura tinha vindo sob a luz difusa de um dia de tempestade, usando o disfarce de um anjo caído, o rosto e o corpo tão perfeitos que havia sido confundido com um homem maravilhoso.

Ele veio buscar-me.

E meu pai deixou o pesadelo me levar.


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Notas finais do capítulo

Espero que gostem.
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imagem: http://sprsprsdigitalart.deviantart.com/