The Forest City escrita por Senjougaha


Capítulo 55
Capítulo 55 - Lembrada


Notas iniciais do capítulo

Que saudade de escrever! Que saudade de ter vida social!
Esse é um capítulo que precisei de muitos dias pra escrever. Tá sendo difícil com provas, notas ruins, provas, trabalho... É, tô virando gente grande! Mas quem disse que pra ser gente grande precisa parar de pirar? :p
Aqui vai mais um fruto das minhas piradas.



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– Acorda acorda acorda! - senti um peso pular sobre mim uma, duas, três, quatro vezes…

Usei uma sombra para lançar a dona da voz energética para o chão e ouvi um gemido de protesto.

– Sel! - Yukina choramingou - eu vim aqui com todo amor te acordar e reage assim? Poxa!

– Não me chame de Sel - resmunguei com o rosto entre os travesseiros - e não fale, minha cabeça vai explodir.

Através de uma brecha, pude vê-la franzir o cenho e um flash de preocupação passou por seus olhos, mas tão rápido quanto surgiu, sumiu. Me lembrei do sonho de ontem, me perguntei se deveria contar à ela. Mas logo deixei o pensamento de lado. Me causava arrepios só de lembrar. Era como se eu estivesse mesmo lá...

– Anda, animação! - ela pula, fazendo o piso de madeira ranger - Daniel nos matriculou na faculdade há apenas alguns minutos!

– Como ele fez isso se não tem meus documentos? - perguntei cética, com a voz abafada pelos tecidos.

– O poderoso-dragão-milenar-dourado tem seu jeito próprio de fazer as coisas - ela responde casualmente dando uma pirueta.

Céus. De onde surgia tanta energia? E ela estava mesmo falando de Daniel?

Yukina se espreguiçou feito um gato e depois me assustou ao puxar meus cobertores com força, me levando ao chão junto.

Grunhi e puxei sua perna, trazendo-a comigo. Ela caiu graciosamente, como um gato que cai de pé.

– Malditas habilidades felinas! - revirei os olhos e ela caiu na gargalhada.

– Vamos, se apresse - ela se levantou e me puxou para cima junto sem fazer um pingo de esforço - o treino matinal continua.

– Treino matinal? - repito e pisco.

Ela revira os olhos como se fosse óbvio.

– Mundo dos mortais chamando Selene! - ela estala os dedos na frente do meu rosto - vamos correr.

– Oh. - me lembro de quanto corríamos pela floresta juntas como parte dos treinamentos e faço uma careta em desagrado.

– Vamos desenferrujar essas suas belas perninhas - ela dá um sorriso malvado e sai correndo porta afora.

Me arrastei até o corredor, numa tentativa de ao menos acompanhá-la com os olhos. Sem sucesso. Resmunguei e xinguei a japonesa que me atormentava e ignorei o pensamento de que meus cabelos estariam um ninho de ratos.

– Mas eu nem tomei café.

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Respirava com dificuldade enquanto me sentia irritada com o rabo de cavelo que se prendia na minha nuca devido ao suor.

– Você realmente se enferrujou! - Yukina zombou correndo em câmera lenta dramaticamente ao meu lado.

– Não! - grunhi - você está usando magia pra correr.

Yukina forjou uma expressão de quem fora caluniada e empinou o nariz, fazendo beicinho.

– Vale tudo! - ela deu de ombros e saiu em disparada na minha frente.

– Ah, foda-se! - gritei e me impulsionei com as sombras.

Era incrível me lembrar de como eu me sentia horrorizada em relação à elas. Me assustavam, e esse medo as viravam contra mim.

Mas naquele momento, eu as controlava tão perfeitamente como se fosse uma extensão do meu corpo.

Fazia elas saírem de seus lugares de origem emitindo um som suave, um farfalhar que provavelmente apenas eu ouvia. Como se elas conversassem comigo numa língua que eu não entendia, mas gostava.

As controlava para que fizessem obstáculos saírem do meu caminho, como galhos, árvores tombadas e raminhos nas quais eu pudesse tropeçar.

Pela primeira vez, notei em como elas eram inteligentes. Antes eu precisava dar uma ordem mental específica. Mas naquele momento, eu simplesmente dizia para que tirassem os obstáculos e elas agiam por conta própria.

Notei que eram vivas.

– Na verdade, estão mortas - Yukina surgiu do meu lado com um sorriso de orelha à orelha - que bom que você notou.

– Mortas? - perguntei franzindo o cenho.

– Sim - ela assentiu - em algumas religiões humanas, almas que não são boas nem ruins vão para um lugar de onde só saem em caso de reencarnação ou nunca saem, mas não é um lugar nem bom, nem ruim…

Assenti, em sinal para que ela continuasse.

– [...] mas a verdade é que elas se tornam sombras - ela continou - como se fosse uma segunda chance de ficarem no mundo em que viveram - Yukina deu de ombros e seu rabo de cavalo negro balançou ao vento.

– E por que posso controlá-las? - pergunto curiosa.

Os lábios de Yukina se tornam uma linha fina e ela para de correr, encarando os próprios pés.

– Elfos das sombras são primos dos elfos das trevas - ela disse numa voz baixa e controlada - ambos controlam mortos, Selene, a diferença é que Elfos das Sombras controlam sombras e possuem uma magia própria, enquanto Elfos das Trevas controlam corpos mortos e praticam magia negra.

A informação me atingiu feito um baque. Mais uma vez as perguntas que rondavam minha mente eram: Eu era mesmo assim tão ruim? Então por que minha mãe não me matava? Não era a minha raça uma das que estavam em extinção? Será que Solara só ficava comigo para me vigiar em nome da Rainha dos Elfos? Por que Daniel, Seth, Yukina, Iria e até mesmo Liam - oh, como eu sentia saudade de Liam sem sequer me dar conta… - ficavam sempre ao meu lado, tendo consciência disso tudo…?

Yukina deu de ombros como se soubesse das perguntas que se passavam pela minha cabeça, mas não soubesse as respostas.

– Não sei, Sel - ela disse triste - não sei.

Deixei aqueles pensamentos de lado e foquei em Liam.

Por onde ele andava? Sabia que se perguntasse constantemente sobre ele à Yukina e Daniel, nenhuma resposta digna eu conseguiria. Principalmente se perguntasse à Daniel. Era mais provável que Seth me ajudasse quanto a isso. Ele parecia simpatizar com meu amigo vampiro.

Vampiro.

Ao me lembrar do que ele era e dos motivos que o levaram a ser aquilo, senti um calafrio de culpa me atingir. Me lembrei do bilhete que deixaram ao lado do seu corpo, numa poça de sangue e abracei a mim mesma.

Culpa, frustração, medo e insegurança me atingiram e me repreendi mentalmente por isso.

“Fraca, muito fraca, Sardene”.

Um choramingo escapou dos meus lábios e Yukina assumiu uma expressão preocupada e confusa.

– O que foi, Selene? - ela perguntou pegando minha mão - aconteceu algo? Está com dor?

– Não - respondi num sussurro e dei um sorriso fraco - estou bem.

Ela me analisou com seus olhos felinos, à procura de qualquer sinal de mentira. Parecia incerta de se acreditava ou não e isso era uma surpresa, considerando que ela sempre sabia o que eu sentia ou pensava sem sequer precisar ler minha aura.

Por fim, Yukina suspirou e me puxou em direção à casa de Daniel.

– Você definitivamente não está bem - ela murmurou.

Passamos a metade do caminho sem dizer uma palavra sequer.

Mas aquele silêncio era… Esmagador.

Eu, Selene, a a mante do silêncio estava odiando aquilo.

Puxei meu braço de seu aperto suave e preocupado e parei no meio do caminho.

– Tenho tido sonhos estranhos - confessei - e me lembrado de muitas coisas que ainda não foram resolvidas…

Comprimi os lábios e Yukina assentiu, como se finalmente entendesse.

– Temos uma eternidade pra resolver essas coisas - ela sorriu de forma maternal e me abraçou - somos eternas, Selene, infelizmente os problemas também.

– Mas você está comigo - murmurei, esperando que ela concordasse.

– Estou - ela sorriu com os olhos brilhando - agora vamos, sai dessa depre!

Yukina saiu correndo rumo ao casarão de madeira e respirando com dificuldade devido ao riso que queria sair dos meus lábios, corri atrás.

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– Quer escrever um grimório? - Yukina perguntou, quebrando o silêncio.

– Xeque-mate - Seth sorriu de lado e seu cabelo crescido escondeu um dos seus olhos violetas.

Resmunguei e revirei os olhos diante da expressão vitoriosa de Seth, que acabava de vencer Daniel no xadrez.

– Como assim escrever um grimório? - perguntei, confusa.

– Ninguém nunca escreveu um grimório das sombras antes - ela disse, remexendo na camisa de flanela que vestia - é algo muito… misterioso.

– Então por que eu deveria revelar esse mistério? - arqueei uma sobrancelha, irônica.

– Não sei - ela deu de ombros - mas uma coisa eu digo, Selene: nunca vi um elfo das sombras pessoalmente, mas sei que não foram poderosos assim.

– Não fale como se eu fosse a única existente - resmunguei desanimada.

Ela deu de ombros.

– Talvez seja - ela disse baixinho, mas eu ouvi.

Suspirei exasperada.

– O que é tão difícil de entender? Só controlamos sombras! - ergui o tom de voz, chamando a atenção dos dois irmãos que nos olharam questionadores.

Yukina balançou a cabeça negativamente como se fosse EU que não compreendesse.

– A forma de magia de vocês é completamente diferente da dos elfos comuns - ela tenta explicar - não é branca ou negra, sequer deve ser magia!

– E no que um grimório ajudaria, supostamente? - perguntei franzindo o cenho.

– Ajudaria aos elfos do futuro, Selene - ela amenizou o tom de voz - eles seriam treinados mais rapidamente, não sofreriam TANTO…

Revirei os olhos.

– Eu vou pensar - roí a unha do mindinho - mas não está na minha lista de prioridades.

Disse a ultima frase para apenas eu ouvir, mas pude sentir o olhar de Daniel perfurando minhas costas. Ele tinha ouvido e exigia saber o que é que estava na minha lista de prioridades.

Dei de ombros.

“Não é importante”, disse em sua mente para acalmá-lo.

Daniel bufou e ligou a TV.

Alguém bateu na porta.

– Temos visita - Seth sorriu de forma provocante para o irmão, que trincou o maxilar depois de inalar o ar.

– Quem é? - perguntei para Yukina, que parecia confusa.

– Talvez você deva atender - ela deu de ombros.

Revirei os olhos novamente e abri a porta da sala.

Uma pessoa completamente pálida esperava impacientemente, batendo os pés no tapete de “bem vindo” do saguão de entrada.

– Liam? - chamei, hesitante.

Não sabia se era ele mesmo. Estava… diferente.

Os olhos estavam avermelhados, ameaçadores e inquisitivos, os cabelos estavam num tom marrom quase loiro...

Mas quando um sorriso quase inocente - quase, porque as presas afiadas não eram nada inocentes - se abriu no rosto da criatura, soube que era ele.

Me joguei para um abraço e senti seu corpo ficar tenso.

– Meu sangue deve ter gosto de podre - brinquei ao ver que ele encarava meu pescoço assustado.

Uma risada fraca e tensa saiu das presas de Liam e ele me afastou com sutileza.

– É bom ver você - ele disse e sua voz saiu mais grave.

Sorri, e pude ver seus olhos mais humanos do que antes. Como o antigo Liam, o Liam humano.

– Por que você não… - comecei, mas uma voz rouca e grave, familiar, me interrompeu.

– Entra? - Daniel foi sarcástico - acho que não.

Liam ficou tenso e sua expressão se tornou dura.

– Daniel - o encarei de forma repreensiva.

Ele me puxou para si sem nem considerar deixar de ser possessivo por um momento. Encarou Liam com os olhos dourados como ouro derretido. Derretido de ciúmes.

– Eu não disse que você podia voltar - ele disse, franzindo o cenho, mas ainda enraivecido como abraço anterior.

– Eu só vim ver como ela está - Liam se encolheu.

– Eu te disse que ela está bem - Daniel trincou o maxilar - e vai continuar bem enquanto você estiver longe dela.

Liam se encolheu, quase magoado. Mas tão rápido quanto se encolheu, logo recuperou a postura e um chiado ameaçador de raiva saiu de seus lábios. As presas de repente pareciam maiores.

– Daniel - chamei, calma, porém chateada - eu queria vê-lo também.

É claro que queria. Um aperto surgiu no meu coração quando vi a expressão surpresa de Daniel ser substituída por puro tédio.

– Mas que droga, Selene - ele passou a mão nos cabelos crescidos a ponto de quase serem do tamanho de quando o conheci.

Aquilo fez eu estremecer. Desviei o olhar.

– Deixe Liam estar conosco - eu pedi, me sentindo um cachorrinho.

Ergui meu olhar para encontrar o de Daniel, que ficara sem reação com minha súbita manha.

– Eu prometo ser boazinha - pisquei meus olhos.

Então me lembrei de que não devia parecer um cachorrinho.

Cachorrinhos fofos não possuem um olho negro e outro azul.

Mordi o lábio inferior e desisti de tentar.

Quando olhei de novo para ele, para dizer “deixa pra lá”, me deparei com seus olhos dourados e carinhosos.

– Daniel? - chamei e o cutuquei, surpresa.

– Só se prometer ser boazinha mesmo - ele sussurrou no meu ouvido, me arrancando arrepios.

Não precisava olhar para saber que ele soltava um sorriso convencido. Adorava fazer aquilo comigo.

Engoli em seco.

“Encarne a Selene insensível!”, eu dizia a mim mesma.

– Eu… - tentei dizer e fechei os olhos para tentar de novo - eu vou ser boazinha.

– Muito bem - ele se afastou bruscamente e virou o rosto, mas pude ver o sorriso bobo que exibia - pode entrar, Edward.

– Edward? - Liam bufou e deu um passo hesitante para dentro da casa.

– Você precisa mesmo de permissão para entrar? - perguntei, surpresa e incrédula.

Liam amarrou a cara.

– Sabe, meu corpo não tem mais alma, Selene - ele retrucou, sarcástico - isso significa que sou cada vez menos agraciado com a luz do sol, não posso residir entre os vivos sem consentimento e… realmente não posso amar.

A ultima parte foi dita complementada a um olhar doloroso lançado em minha direção.

Me toquei de que Liam gostava de mim e que até saímos quando ele era… vivo. Era só um palpite, mas se tudo aquilo era gradativo, eu achava que vampiros novos ainda mantinham um pouco de emoção e ver aquela cena de poucos segundos atrás com Daniel devia tê-lo abalado.

Corei.

– Ah. - consegui dizer somente.

Ele exibiu um sorriso completamente falso e eu abracei a mim mesma.

Liam interpretou errado e fechou a porta, pensando ser o frio.

Mas não estava frio, pelo contrário: a noite estava úmida e calorenta.

Me perguntei se ele sentia com mudanças climáticas. Provavelmente não.

– Mas eu consigo manter minhas emoções por mais algum tempo, eu acho - ele colocou minha franja que precisava ser cortada atrás da minha orelha e sorriu amigavelmente.

– Como? - perguntei, confusa.

Liam retirou uma caixa de madeira cheia de símbolos entalhados. De dentro da caixa, retirou um vidro também cheio de símbolos estranhos.

– Yukina prendeu minha alma aqui - ele explicou - assim que me encontraram… morto, ela a aprisionou para que eu não me tornasse um monstro, já que era seu amigo e tal.

Ele torceu o nariz com a ultima parte. Como se o fato de ter a humanidade salva só por ser meu amigo ferisse seu orgulho agora imortal.

– Isso foi… bem legal - franzi o cenho e virei-me em direção à sala de jantar, onde todos se encontravam, inclusive Daniel que parecia ter ouvido tudo.

– Olá Liam - Yukina abriu um sorriso e se jogou num abraço com ele.

Desde quando eram tão amigos?

Franzi o cenho. Ia perguntar algo, mas deixei pra lá. Talvez eu não quisesse saber tanto assim.

Deve ter sido impressão minha, mas vi Liam sussurrar algo no ouvido da japonesa baixinha, ainda abraçada à ele. Ambos assumiram expressões sérias, mas logo voltaram ao normal.

Pisquei, notando que estava com sono e pensando que aquela era a causa do que estava vendo.

– Liam precisa de um pouco de ar fresco… Você sabe, sangue circulando por toda essa sala e tal... E vou verificar se o recipiente de sua alma está devidamente lacrado - ela anunciou - vem!

Ela puxou Liam porta afora e me concentrei em não desviar o olhar de Daniel toda vez que nos olhávamos. Ele sorria vitorioso, mas logo ficava entediado novamente.

Como quando nos conhecemos. Até seus cabelos estavam ficando igual de novo…

Me senti nostálgica.

Uma pergunta surgiu na minha mente, e mesmo quando eu a ignorava, deixando-a de lado, ela cutucava fazendo com que eu entrasse em agonia. Eu precisava saber.

– Quando foi que nos vimos pela primeira vez? - perguntei à Daniel, piscando confusa com minha própria pergunta.

Daniel ficou pálido de repente e o copo em sua mão se estilhaçou.

Minha boca se abriu num “o”. Era só uma pergunta com resposta óbvia....

Aparentemente.


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