The Forest City escrita por Senjougaha


Capítulo 40
Capítulo 40 - Reencontrada


Notas iniciais do capítulo

De volta à narração da nossa sutil Selene. Beijos!



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Suspirei, me sentando pesadamente na cadeira. Encarei o vazio ao meu lado, que insistia em permanecer silencioso mesmo depois de um mês.

Franzi os lábios, me repreendendo. No fundo, eu sabia que um dia eles iriam embora, e até pensava estar preparada. Até Liam se fora.

“Deixe de ser deprimente e patética, Selene”, eu disse à mim mesma. “Você é imortal, supere”. Respirei fundo e revirei os olhos ao me lembrar do bilhete escrito às pressas pela própria Yukina.

“Hey, Selene! Passaremos uma temporada fora, espero que não fique a toa durante esse tempo.

Vá até a garagem de Daniel e remova o piso de madeira que fica ao lado da roda dianteira da moto […]”

Parei de ler. Daniel tinha uma moto? Por algum motivo não aparente, fiquei irritada comigo mesma por não ter notado ou perguntado antes. Estava me tornando bem… obcessiva em relação ao meu suposto namorado.

“[...] e pegue o meu grimório. É específico para bruxas, então eu sequer deveria ficar com ele. Pegue-o e o aceite como uma garantia de que voltarei. É valioso e muito antigo, não o revele à ninguém. Possui alguns feitiços que você pode usar sem problemas e vai ajudar você a abrir a mente para praticar os feitiços élficos complicados. Bom, pelo menos é o que eu espero, considerando que você é uma cabeça dura, HAHAH!

Beijos (meus e do Daniel)”

Estremeci, sentindo que algo aconteceria naquele dia. Eu deveria ter praticado os feitiços conforme Yukina pedira. Praticado a sério, melhor dizendo, pois eu li e decorei vários, mas fazê-los de fato...

– Senhorita Selene - o professor calvo me chamou, e não parecia ser pela primeira vez.

Sem saber o que fazer, fitei seus olhos que me lembravam um cavalo assustado e abri a boca para dizer algo.

– Desculpe, eu não estou muito bem hoje - disse eu tentando soar amigável, mas meu tom saiu sarcástico.

Ele fez uma careta e pediu para que eu me retirasse da sala.

Revirei os olhos. Bons e velhos tempos em que eu era somente uma suposta humana indiferente, com um histórico gigante de suspensões.

Peguei minha mochila e sai a passos lentos e preguiçosos em direção ao estacionamento.

Nem pensar que eu iria olhar para a cara de Coraline novamente e ouvir um sermão sobre responsabilidade. Já fazia isso todos os dias.

Ela tinha se tornado como uma mãe para mim, embora fingisse ter se esquecido prometer que ia me ensinar magia.

Coraline limpava, passava e cozinhava. Mas tratava meu pai com uma acidez incompreensível, apesar de haver afeto por trás de cada gesto seu. Todas as noites, eu a ouvia entrar em meu quarto e conferir se eu estava dormindo mesmo. E ficava lá, me fitando brilhar sob a luz da lua que entrava pela janela aberta.

Basicamente, ela me adorava. Parecia estranho, mas Coraline me adorava, venerava até, apesar das broncas e carrancas.

Joguei minha mochila no banco traseiro da laranja berrante e me sentei no lado do passageiro.

Liguei o rádio e ouvi I See Fire, de Ed Sheeran. Pela milésima vez, tentei imaginar como seria um dragão completamente transformado, já que Daniel se recusara a me mostrar.

Minha maldita rotina era sentir falta, saudades. Eu não tinha notado o quanto amava as frescuras de Yukina até estar longe dela. Não tinha percebido o quanto me animava com Seth por perto até ele estar longe, sem suas gracinhas.

E nunca tinha parado pra notar que eu realmente, REALMENTE amava Daniel mais que tudo. Não até ele partir sem nem se despedir.

Eu me perguntava diariamente se sentiria mais falta caso ele tivesse o feito. Se despedido. Provavelmente sim. Ou não.

Uma batida no vidro me despertou dos meus devaneios e eu coloquei o rádio no mudo antes de abaixar o vidro escuro e dar atenção à quem quer que tivesse batido.

Não tinha ninguém.

Franzi o cenho e abri a porta do carro, me perguntando se fora minha imaginação. Eu andava muito imaginadora/sonhadora/criativa. Bufei, irritada comigo mesma.

Desci e abaixei minha saia de pregas, que de repente parecia curta demais. Senti um vento gelado soprar forte. Meu cabelo bloqueou minha visão e eu o assoprei para cima.

Foi o suficiente para eu ver algo pálido correndo em minha direção e me jogando para fora do estacionamento, em direção à floresta.

Me levantei rapidamente, ignorando a dor em uma das costelas e pensei. Vi A Coisa de mover como um flash e corri de volta para o estacionamento.

Correr em direção à floresta não seria inteligente, já que era para lá que A Coisa estava querendo me levar.

Arfei quando senti algo pressionar meu estômago com força e logo eu já estava chocada contra uma árvore, sem sequer ter reconhecido o que estava me atacando.

– Ah, agora você me irritou - cuspi as palavras, sentindo uma onda de raiva passar pelo meu corpo.

– Perfeito, docinho - uma voz disse e eu sequer me dei ao trabalho de procurar o dono.

Senti meu maxilar se contrair e minha visão ficou turva por um segundo, mas logo depois eu já enxergava tudo mais do que perfeitamente.

Ignorei a voz irritante da razão que dizia “não revide, corra!” e “alguém vai te ver assim, vai se encrencar!”.

– Acho que eu preciso de um pouco de encrenca mesmo - murmurei para mim mesma.

Fechei os olhos e tentei prever o próximo movimento do ser que me perseguia.

Para prever, você não precisa ver”, me lembrei de Daniel sussurrar em meu ouvido em um dos treinamentos árduos.

Desviei de um soco que deveria ter acertado minha clavícula e ouvi um assovio de aprovação.

– É só isso que você quer? Me bater? - perguntei irritada - porque eu tenho mais uma aula pra assistir!

Um borrão passou na minha frente e ouvi uma risada feminina. Seja lá quem ou o quê fosse aquilo, era do sexo feminino.

Finalmente a figura parou em minha frente e pude ver uma garota poucos anos mais velha que eu. Ela era pálida e tinha cabelos marrons, mas tinha desenhos da mesma cor por todo o corpo, como tatuagens. Mas aquilo não parecia ter sido… feito. Parecia algo DELA. Franzi o cenho, confusa.

– Não - a garota respondeu em tom divertido e estalou os lábios - eu só quero saber se é tão tola, iludida e inútil quanto sua irmã.

Sorri de lado e invoquei algumas sombras para formar minha foice.

– E se eu for? - perguntei.

– Terei que dar um jeito nisso - ela sibilou e avançou novamente.

Defendi de seu ataque com minha foice ainda mal-formada e pude ver que ela também tinha garras e dentes afiados. E que podia retraí-los quando quisesse.

– O que diabos você é? - perguntei e desviei de mais um ataque.

– Tsc, tsc - ela estalou os lábios em reprovação - tem tanto a aprender ainda…

Me irritei por ser tratada como uma bebê e fiz com que minha foice se completasse logo, mas fiz algo diferente. Coloquei duas lâminas que formavam duas meia-luas de costas uma para a outra.

Aquilo fez um rasgo na bochecha da garota e a fez silvar.

– Talvez você mereça saber - ela disse mais para si mesma do que para mim.

Franzi o cenho e me perguntei se ela era desvairada.

– Acredita em deuses, garotinha? - ela perguntou em tom debochado.

Soltei uma risada sem ânimo e girei a foice em minha mão, sem jeito.

– Eu realmente estou com pressa - resmunguei e limpei a mão que se sujara de sangue e terra.

Ela silvou, repreensiva e me jogou contra uma, duas, três árvores antes de se controlar e respirar fundo para me olhar no fundo dos olhos.

– Vou te contar uma história - ela disse e limpou o canto das unhas.

Abri a boca para protestar, mas ela me interrompeu.

– Você tem aula de História agora - ela disse, firme - só precisa escolher entre a MINHA ou a da professora rechonchuda que já terminou de fazer a chamada há três segundos.

Parei para pensar no que ela quis dizer e me lembrei de que realmente a próxima aula era história. E que a rechonchuda fazia chamada antes que todos voltassem do intervalo.

Bufei e me encostei na árvore. A garota deu um sorriso feliz e aprovador.

– Era uma vez… Não, deixa eu reformular esse começo - ela pigarreou - É uma vez…

Ela sorriu para si mesma e eu franzi o cenho.

– Uma época onde as florestas poderosas, cheias de poder mítico são usadas como portais para outros mundos… - ela continuou - e por possuírem tal poder e imensidão, houveram muitas guerras por territórios nessas florestas…

“Imortais brigavam entre si, família contra família, irmão contra irmão, filho contra pai… Isso soa familiar? Soa? Enfim. Durante milênios os humanos foram inseridos nessas guerras pela posse das Florestas Desconhecidas, até que um dia, uma garota de uma raça pensou racionalmente e tentou ser porta-voz daquela razão no meio da guerra. Assim como a Natureza não possui um dono, as Florestas Desconhecidas não possuiam. E precisavam permanecer desconhecidas. Era assim que deveria ser.

Várias outras raças ouviram seus argumentos e concordaram. Foram feitas votações, diversas votações para que as raças imortais entrassem em acordo. As principais decisões se tornavam leis. Uma delas protege os humanos de qualquer conflito imortal. Outra, não é só uma lei. É um legado e um mito. Cada floresta deve ser protegida por uma criatura, que após se demonstrar capaz, se torna um deus. Ascende. Ou “upa”, como você gosta de dizer. Enfim. Mas é impossível isso acontecer. As únicas raças, naturalmente divinas são os Angelicais e os Nephilins. E foram extintos há centenas anos, juntamente com a maioria dos Elfos das Sombras e dos Elfos das Trevas, quando a família do seu doce Daniel e a sua calorosa mãe ordenaram que assim fosse feito.

Mas ainda havia uma raça que se rastejava pela escuridão dos mundos. Uma raça imortal nova e desconhecida, que descendia de anjos e demônios. Híbridos. Mais poderosos que seus ancestrais, pois eram uma mistura quase pecaminosa, uma junção de poderes opostos que jamais deveriam se conciliar.

Eles saíram das sombras no momento em que descobriram que seus ancestrais foram aniquilados e mostraram aos mundos do que eram capazes. Muitos, renegaram sua parte demoníaca e foram aceitos de bom grado. Outros, renegaram sua parte angelical e foram… exilados (ela fez uma pausa, deu um sorriso e fez sinal de silêncio com o dedo indicados sobre os lábios). O restante, simplesmente se aceitou como era e foram colocados como Guardiões das Florestas Desconhecidas. Era para ser apenas um emprego provisório. Até que eles se cansassem e houvessem motivos para serem mortos. Mas isso não aconteceu. Eles alcançaram o auge de seus poderes e tomaram posse das Florestas. Mandam nelas. Até mesmo se tornaram parte delas. Ninguém sai ou entra sem a devida permissão. Nenhum humano pode entrar, sequer enxergar os diferentes mundos nela sem que o deus da determinada floresta permita. Sequer usar poderes. As Florestas Desconhecidas são lugares sagrados. Cada uma possui um nome e um Deus Guardião, além de ser conectada à mundos diferentes.

Eu sou Pedrita, a Guardiã da Cidade Floresta, o local sagrado na qual você está pisando agora. A única capaz de ligar o mundo dos humanos à qualquer outro. A principal e mais disputada Floresta Desconhecida.”

– E preciso de um favor seu - ela finalizou jogando os cabelos cor de chocolate para tras.

Saí do transe que a história me envolvia e pisquei, atordoada.

– Favor? - repeti confusa.

– Sim - ela respondeu virando a cabeça de lado - um favor.

– Que tipo de favor? - perguntei desconfiada.

Uma suposta deusa estava pedindo favor à mim. Naturalmente, fiquei muito mais do que desconfiada.

– Que tal sair de perto dela agora? - uma voz rouca e furiosa, muito conhecida soou atras de mim.

Pedrita sorriu ironicamente e mesmo sabendo quem era, me virei com o coração pulando pela boca.

Daniel estava ali, com o semblante de um dragão prestes a soltar fogo.

– Eu disse pra sair de perto dela - ele repetiu.

Sem saber se era comigo ou com Pedrita que ele falava, dei alguns passos para tras e vi seus ombros relaxarem mais um pouco.

Antes que eu pudesse piscar, Daniel já estava do meu lado, puxando meu braço e me arrastando para o estacionamento da escola.

Seu aperto estava me machucando, mas eu não liguei. Não que fosse um reencontro desejável, mas ainda assim ele estava ali. E me salvou de fazer um favor esquisito à uma deusa esquisita.

– Nunca mais entre na floresta sozinha - ele rosnou e me empurrou para dentro da laranja berrante, no lado do passageiro.

– Ei! - berrei, ficando irritada.

Mas ele não me deu atenção. Deu a volta no Audi e assumiu o volante, dando uma arrancada doida e dirigindo pelas ruas da cidade.

– Daniel! - berrei desesperada por atenção e para que ele parasse o carro logo.

Ele me ignorou. Ou melhor, parecia estar com a mente à mil, em outro mundo. Planejando algo que não deveria ser bom.

– Daniel! - repeti e o empurrei com força.

Ele me encarou furioso.

– O que foi agora Selene? Vai me contar em que outras encrencas você se meteu? - ele explodiu.

Me encolhi no banco de couro e não consegui evitar que meu lábio inferior tremesse.

– Não me meti em encrenca - murmurei, mal humorada - ela só queria um favor.

– Você tem uma deusa no seu pé - ele disse, irônico - não faz ideia da encrenca que isso é.

– E você sabe? - perguntei incisiva - sabe como é ter uma deusa no seu pé, Daniel?

Ele pareceu entender o sentido da minha pergunta e seu rosto se contorceu. Ele estava se segurando para não rir.

Corei, cruzei os braços e virei meu rosto em direção à janela.

Séculos de silêncio pareceram se passar dentro do carro.

– Eu senti sua falta - ele disse, quase tímido.

Eu não pretendia responder adequadamente àquilo. Mas meu peito se apertou com a ideia de deixá-lo no vácuo.

– Eu também senti sua falta - eu respondi e lhe dei um meio sorriso.

Ele sorriu de lado e eu me senti aquecida por dentro e por fora.

E se eu achava que era impossível amá-lo mais, estava enganada.

Eu continuaria a amar Daniel gradativamente, de forma crescente todos os dias.


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Notas finais do capítulo

Me desculpem se houverem erros de digitação! E aí? Gostaram? Ou será que eu voltei pior na escrita e sem imaginação alguma? D:



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