The Cruel Beauty escrita por Tsu Keehl


Capítulo 49
Capítulo 49


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas que ainda acreditam e acompanham esta história! Quem é vivo sempre aparece, né non? Estou realmente assustada pelo tempo que demorei para atualziar aqui. Foi praticamente um ano! Eu realmente pensei que não conseguiria voltar para ela...não vou ficar aqui pedindo várias desculpas porque eu sou mesmo uma vergonha (sininho atrás de mim e uma voz falando Shame, shame) e estou com um bloqueio imenso nessa história. Mas diante do carinho de leitores, de ver gente favoritando e acompanhando, me deu forças para ir escrevendo, nem que fosse aos poucos.
Porém, desde o começo deste ano, eu decidi, em prol da minha paz mental mesmo, não me cobrar tanto assim nas coisas que preciso fazer. Mesmo assim ando tendo bastante coisa pra fazer. Além do aumento do fluxo de trabalho (dinheirinho sempre bom, né) estou retomando meus cosplays e ensaios, que tinham ficado parados por conta da pandemia. E também procurando me focar mais na produção das minhas histórias originais que sendo projetos de longo prazo e objetivo, me tomam uma maior dedicação. E como o tempo está passando rápido demais quando eu vejo, já passou demais.
Enfim...esse capítulo me deu um trabalho abismal porque ele ficou parado por meses até eu ir retomando a escrita deles aos poucos. Nesse período me veio um pouco de criatividade para alguns rumos nessa história então pode ser que ainda aconteça mais algumas coisinhas até o final.
Boa leitura e obrigada novamente pela paciência e por não desistirem da história!Sou imensamente grata por isso!



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~*~


— O que acha de cometermos uma loucura?
  Igraine encarou Cruello sem compreender, seu rosto á centímetros do dele.
— Do que está falando?
— Vamos embora daqui. Sumir, sem avisar ninguém. – ele sussurrou, olhando na direção da porta para se certificar que ninguém se aproximava.
— Como assim?!
— Me dê uns cinco dias, para eu acertar tudo. Vou te ligando e informando tudo. É melhor do que mensagens de texto, minimiza chances de rastreio.
— Mas eu não posso..e por que isso agora?
— Para termos um pouco de privacidade! - ele colocou ambas mãos na cintura. – Eu sei qual é o problema no nosso relacionamento. São eles!! Todos eles!
  Cruello apontou freneticamente em direção a porta da cozinha, onde podiam ouvir claramente o falatório vindo da sala.
— Ninguém nos dá um momento de paz nesse carralho! – rosnou o rapaz. – Eu sei que sou Devil lindo, rico, estiloso, popular, talentoso e requisitado, mas não sei como é que pude atrair esse tanto de gente egocêntrica!
  Igraine só o encarou, aturdida, com tamanha atitude de sonsice egocêntrica do rapaz. Preferiu nem retrucar, vai que era algum tipo de doença...
— Precisamos de um tempo para nós. – Cruello começou a dizer, enquanto andava pra lá e pra cá na pequena cozinha. – Não precisam ser muitos dias, alguns até porque não posso me ausentar muito da Devil’s e da vida social que levo...mas posso conseguir alguns dias sim. O problema é com relação ao lugar...um lugar que possamos ficar somente nós, sem interferência de ninguém...
— Cruello...
— Não se preocupe, Igraine. Eu darei um jeito, eu sempre dou um jeito. Só preciso pensar estrategicamente...
  Igraine suspirou, indo pegar um copo de água da garrafa sobre o aparador. Mal tinha enchido seu copo, Cruello arrancou a garrafa de suas mãos. Notou que o rapaz olhava demoradamente para o rótulo da garrafa, muito concentrado.
— ...é isso!
— Isso o quê?
— Deixe tudo comigo. – ele tornou a colocar a garrafa sobre o aparador. – Ainda que seja apenas temporário, farei com que possamos ficar livres de todas as pessoas que nos rodeiam! Não fale nada a ninguém, ninguém mesmo! Eu vou planejar tudo e vou te informando.
  Igraine notou um estranho brilho surgindo nos olhos azuis do rapaz. Cruello parecia confiante e decidido, mas o fato de não estar entendendo nada a deixou intrigada.
— E não pode...me adiantar o que...tem em mente?
— Não! As paredes tem ouvidos e já muita gente aqui, poderão nos ouvir. – ele se aproximou, sussurrando. – Não fale nada sobre essa conversa que tivemos, a ninguém. Tem que prometer!
  Em qualquer outra situação, Igraine acharia aquilo um pouco estranho, mas vindo de Cruello era bem mais estranho. Entretanto, sentia-se tão exausta e irritada, que a possibilidade de se ver livre de todo aquele caos que acontecia na sua vida nos últimos dias por culpa das pessoas que, embora gostasse e amasse, a estavam estressando e cansando demais nos últimos dias, parecia ser uma esperança convidativa.
— Está bem.
  Um sorriso surgiu no rosto de Cruello e Igraine viu o quão bonito ele ficava quando sorria também, ainda que o sorriso dele sempre tivesse um resquício de orgulho. Ele então estendeu a mão para a Igraine.
— Aperte minha mão.
— ...por quê?
— Para assim formalizarmos a promessa.
  Igraine fez uma careta mas aceitou. Pensou, por um momento, que Cruello a puxaria para si, seguraria sua cabeça com uma das mãos e lhe daria um beijo cheio de paixão e luxúria, como naquelas novelas românticas brasileiras que costumava assistir. Mas em vez disso, ele continuou segurando-a pela mão e a induziu a acompanhá-lo de volta para a sala.
  Por um estranho momento, Igraine teve a sensação (e o pensamento) de que o fato de ter apertado a mão de Cruello de uma forma de trato profissional parecia que havia acabado de selar uma espécie de pacto.

“Pacto com um Devil...Irônico.”

— Mas que merda!
  Ouviu Cruello sussurrar entredentes, os olhos fixos em uma parte da sala e, ao seguir o olhar dele, percebeu o que era e sentiu um frio na barriga.
  Ali, próximo a janela, Amber e Braun conversavam de forma enfática, parecendo estarem contando uma de suas muitas aventuras para...Patrick Star.
  Cruello não precisava explicar nada, pois Igraine sabia. E, embora não visse a gravidade daquela situação com a mesma amplitude que Cruello, sabia que ainda assim era uma situação problemática para a imagem pública de ambos.
  Mas o que deveria fazer? Não poderia simplesmente ir até ali de forma agressiva, mandando Patrick Star sair de sua casa e avisando aos seus pais que nada deveriam falar sobre absolutamente nada porque isso seria impossível e...
— Ah, aí estão vocês! – Braun se aproximou, puxando Igraine pelo braço. – Venha até aqui, filha. Vamos dar uma entrevista!
— Esse moço diz ser jornalista e está aqui para recolher depoimentos acerca de nossa luta pela proteção dos recursos naturais, direitos dos animais, povos indígenas e o combate a destruição do meio ambiente!
— Na verdade...
— Estávamos aqui prestes a relatar como decidimos, há mais de vinte anos, focar nosso objetivo de vida pelas causas ambientais e culturais pela qual lutamos e acreditamos e esse jornalista irá fazer uma matéria sobre nós e já cogitamos até dar início a uma série documental...
— ...cogitamos...?!
  Braun e Amber encararam Patrick quando ele fez a pergunta e, por algum motivo que não soube explicar, o jornalista sentiu-se inibido, como em raros momentos já se sentiu em sua vida.
— Bom, evidente que isso pode ser cogitado e marcarmos uma data para nos...reunir a fim de...
— Podemos fazer isso agora! – pediu Amber praticamente empurrando Patrick para o sofá e sentando-se ao lado dele. – Temos tantas histórias para relatar e ideias e conscientizações que gostaríamos de revelar a fim de elucidar as pessoas para aderirem a importância das causas ambientais pelas quais lutamos!
  Enquanto Braun e Amber começavam a relatar mais uma de suas muitas viagens e aventuras nos lugares mais inóspitos e com pessoas de costumes mais excêntricos para um Patrick Star realmente desconfortável.
— Cruello aproximou-se de Igraine, sussurrando em seu ouvido enquanto fingia estar apenas a abraçando.
— Temos que fazer algo imediatamente! Se os malucos dos seus pais começarem a tagarelar as aventuras deles para Patrick Star, não vai demorar nem uma hora para esse jornalista frutriqueiro estampar a página inicial do site e as redes sociais dele com chamadas sensacionalistas para manchar a minha imagem...e a sua, consequentemente.
  Qualquer outra pessoa iria repreender Cruello pela forma como ele se referia aos seus pais, mas não Igraine. Não tinha como negar que seus pais seriam um problema se saíssem nos tabloides. Eles poderiam ser populares no meio dos ativistas, mas as pessoas na internet, como público no geral, iria fazer infindáveis insinuações, comparações, memes e indiretas por conta disso. Já bastava as críticas que havia visto do fandoom de Cruello Devil a respeito de sua aparência ou que ela era “simples demais” para alguém como ele. Agora que isso havia dado uma amenizada quase total, a revelação de que a “namorada de Cruello Devil possui pais ativistas malucos” iria recomeçar todo o furor e atrair holofotes e perseguições debochadas pra cima de si.
Olhou de soslaio para Cruello e pela expressão de cenho franzido no rosto dele (era impressão ou ele parecia estar começando a suar frio?) parecia estar processando possibilidades semelhantes as dela, mas com certeza através de um viés mais trágico e alarmante.
— O que a gente faz?
— Não sei, estou pensando. – Cruello sussurrou entredentes. – Talvez eu deva chegar lá me impondo e acabando de vez com isso. Você tem uma raquete de tênis? Posso expulsá-los ameaçando cometer um crime de ódio.
— Não! – Igraine sussurrou indignada de volta. - São meus pais, apesar de serem do jeito que são! E se você agredir um jornalista pode ser processado por tentar impedir liberdade de imprensa!
— É, faz sentido... – Cruello suspirou e a encarou intrigado. – Como você sabe isso?
— Tendo que me relacionar com você, sabendo como jornalistas fofoqueiros agem, eu acabei pesquisando um pouco melhor sobre isso.
  Igraine voltou a olhar para a cena ocorrendo na sala e não percebeu  o olhar de certa admiração que Cruello lhe lançou.
— Deixe-me lhe contar sobre nossa missão!
  Ao ouvir a voz de Amber, Cruello e Igraine  viram então ela pegar Patrick Star pela mão e literalmente puxá-lo para que se sentasse ao sofá enquanto ela se sentava ao seu lado e Braun sentava-se do outro lado do jornalista, no braço do sofá. E o casal começou a falar de forma envolvente e ininterrupta, com Amber dominando a situação quando Braun começava a falar demais.
— Nós somos ativistas militantes que buscam proteger a natureza e as culturas ancestrais do mundo globalizado e capitalista. – Amber começou a palestrar. – Durante anos dedicamos nossas vidas em nos integrar com povos que vivem em comunidades isoladas de forma pura e ancestral ao mesmo tempo que integrávamos nosso corpo e mente em comunhão com a natureza e todos os seres que nela vivem.
— Nos tempos atuais, com a ganância e comodismo do homem branco, a sociedade está pedindo o respeito pela natureza e a capacidade de se conectar com ela. – Braun emendou. – E durante um importante ritual de imersão e conexão com vidas passadas que fizemos em um...
   Patrick Star era um jornalista habituado em lidar com pessoas, dos mais variados tipos. E, como um jornalista padrão, tinha interesse e certa obsessão moral (embora alguns, como Cruello, chamassem de imoral) em apurar fatos e obter informações, fossem elas quais fossem.
  Mas aqueles dois indivíduos estranhos não paravam de falar. Isso seria algo bom para que Patrick Star obtivesse informações acerca do tipo de ligação deles com a namorada simplória de Cruello Devil. Patrick possuía algumas fortes suspeitas, mas como todo bom jornalista, precisava da prova. “Eu aumento, mas não invento” era seu bordão.
  Porém, o que aquele casal estava contando não era sobre o que Patrick Star queria. Ele desejava obter informações sobre a ligação entre Cruello Devil e o bando de ativistas estranhos e acalorados que estavam na casa da namorada dele até agora há pouco e não desejava saber sobre os rituais sagrados de tribos perdidas nas florestas da Austrália ou a peregrinação pelas montanhas do Tibet ou até mesmo saber como funcionava um ritual de maioridade Masai e os rituais fúnebres do povo Torajan.
  Mas aquele casal malvestido e que exalavam um aroma atordoante de mato, flores, ervas e incenso estavam impedindo que ele sequer conseguisse abrir a boca para tentar controlar a conversa. Pois Braun e principalmente Amber, eram muito eloquentes, incisivos e toda sua narrativa e discurso era tão natural que não dava margem para quem ouvia, poder ser ouvido.
  Então de repente Patrick Star se viu recebendo uma avalanche de ideias propostas pelo casal, acerca da criação de uma série de matérias sobre os trabalhos deles e das ONGS que participavam, suas vivências, experiências e atos. Eram tantas coisas em uma avalanche de informações que Patrick Star se sentia inibido e confuso, como em raras vezes aconteceu em sua vida.
“Eu só vim até essa pocilga para cumprir minha responsabilidade como avô de pet e não para ficar ouvindo as lorotas bizarras desses dois doidos!”

Patrick viu então Cruello e Igraine na entrada da sala e se levantou com um pulo, se aproximando rapidamente deles com o saco de ração bem seguro nas mãos.
— Preciso falar com vocês dois!
— Ah nem vem! – Cruello falou, taxativo. – Você já tentou me prejudicar demais. Isso está passando dos limites, sua obsessão por mim...
— Eu não estou aqui por sua causa! Tá achando que minha vida só se limita a saber da sua?
— Sim!
— Egocêntrico!
— Fofoqueiro!
— Ei, ei! – Igraine afastou os dois antes que as coisas piorassem. - Parem de ficar causando na minha casa! Cruello, desde a primeira vez que você pôs os pés aqui em casa, já chegou causando confusão...
— Ah mas bem que você gostou de me ver surgindo deslumbrante por aquela porta!
  Ela não retrucou. Mas tratou de continuar mesmo assim.
— E você Patrick, pode ir saindo porque eu não quero parar nos holofotes de fofoqueiros que...
— Epa, epa, epa! – o jornalista elevou a voz. -  Não fujam do assunto acerca da paternidade e guarda compartilhada do filhote!
— O quê? Como assim? – Igraine pegou o pacote de ração que ele lhe oferecia.
— Evidentemente que, sendo Romeu o pai do filhote de sua cadela, eu também tenho direitos. – O Fofucho não está para adoção!
— Eu não disse que quero adotá-lo! Mas sou uma pessoa responsável e se meu cachorro é pai, eu tenho que ajudar na criação de seu filhote. Venho aqui garantir que irei ajudar na ração, nos medicamentos e na educação. Mas também quero que Romeu conviva com seu filho, então acho importante que as visitas sejam permitidas e que posteriormente ele passe finais de semana em minha casa.
  Cruello observou, incrédulo, Patrick e Igraine conversarem sobre aquele assunto. Não conseguia compreender como eles tratavam cachorros feito crianças, ainda que ambos fossem realmente meio parecidos na sua opinião. E bem, Igraine era uma verdadeira “mãe de pet” mas tinha que confessar que estava surpreendido pelo fato de Patrick também o ser (e ainda com o agravante de também ser “avô de pet”). Sentiu-se no meio de um fogo cruzado entre duplas que pareciam adorar coisas que ele achava absurdo. De um lado, Igraine e Patrick falavam sobre seus cães como se fossem gente; do outro, os pais malucos de Igraine conversando entre si a respeito do que deveria abordar no documentário de natureza e tribos ancestrais que iriam pedir para que fosse produzido.
  Se Cruella Devil presenciasse ou tivesse conhecimento daquilo, ele sabia que iria ser massacrado, estapeado e talvez até deserdado. Afinal, para a poderosa Cruella Devil ter o único sucessor de seu nome e império se envolvendo com aquele tipo de gente que ela tanto abominava seria uma traição imperdoável.
   Nisso, o som da campainha ecoou no local e em seguida a porta da casa foi aberta, surgindo Alfred. Ele limpou os sapatos no capacho e entrou na casa, mas lembrando-se de fechar a porta atrás de si com a chave pendurada na fechadura.
— Olá.
— Até que enfim você chegou! – ralhou Cruello sentindo-se aliviado por ter alguém que lhe parecia normal, ainda que ele soubesse que Alfred não fosse muito. – Por que demorou tanto?
   Alfred começou a explicar, parecendo não muito convincente em sua narrativa, alegando que estava em um lugar e que demorou para sair no momento em que recebeu a notificação no aparelho porque estava muito ocupado e no caminho de volta através de determinadas ruas e avenidas mas o que importava é que estava ali para honrar seu compromisso de trabalho.
— Peraí. – Cruello pensou por alguns segundos. – Essas ruas e caminho que você falou que passou não são rotas da minha casa até aqui, do seu kitnet até aqui ou da Devil’s até aqui...onde é que você realmente estava?
— Eu...eu...
— Alfred. – Cruello estreitou os olhos. – Onde você estava durante o seu horário de trabalho? Não me diga que estava na zo...
  - Desde quando você entra na minha casa como se fosse sua?
  Alfred agradeceu mentalmente por Igraine ter aparecido entre os dois e já lançado a pergunta.
— Cruello disse que eu poderia entrar sem esperar que abrissem a porta para mim. Mas eu toquei a campainha antes. – Alfred explicou com naturalidade.
— Espere um pouco, senhorita. – Patrick cutucou o ombro de Igraine. – Não terminamos nosso assunto. Acho de vital importância que deixemos bem claro acerca da guarda compartilhada. Eu já redigi um contrato para nós dois assinarmos onde...
— Igraine, não assine nada que esse traíra lhe entregar! Ele pode muito bem usar sua assinatura para fins escusos e tentar roubar seu patrimônio, não que você tenha muito mas futuramente irá herdar muita coisa, mas...ele também pode falsificar sua assinatura para fazer empréstimos em seu nome!
— Você está achando que eu sou um golpista sem caráter?
— Sem caráter você é. – Cruello rebateu a indignação de Patrick. – Não me surpreenderia que fosse um golpista e estelionatário também.
— Ora esse, que desaforo! Eu não vou ficar aqui ouvindo suas pataquadas! Não hoje! Mas pode ter certeza de que haverá uma nota sobre o péssimo comportamento de Cruello Devil e isso vai ser algo bem retweetado e compartilhado nas redes sociais! Não é mesmo, Romeu? – olhou ao redor. – Romeu? Onde está o meu cachorro?
— E eu sei lá!
— Foi você, Devil! – Patrick o encarou. – Você deu sumiço no meu Romeu!
— Tá maluco? Eu não dei sumiço em nada e muito menos nesse seu animal!
— Você é um Devil! Tem índole maléfica como a de Cruella, pode estar querendo cumprir o desejo não realizado dela de fazer uma linha de roupas de grife usando pelagem de cães dálmatas!
— A pelagem do seu cachorro é muito opaca e malcuidada, não serve nem para fazer um par de polainas!
   Igraine conteve um suspiro. Estava tão exausta e aquele falatório na sua sala não cessava nunca. E agora iria piorar quando Cruello e Patrick começassem suas trocas de ofensas e provocações em níveis decibéis realmente altos. E como se não bastasse, seus pais também conversavam de forma empolgada para uma Nanny que definitivamente não queria ficar ouvindo (mas disfarçava bem com um risinho de forçada simpatia) sobre ideias mirabolantes para apresentarem em uma agora série documental que estavam crentes de que iriam conseguir que alguém se dispusesse a fazer e precisariam fornecer material e relatos que eles tinham coletado durante anos.
   Igraine fechou os olhos, sentindo por um momento tanto sono que seu corpo pareceu momentaneamente começar a flutuar e toda aquela falação ir se distanciando cada vez mais...
— Opa, firme aí! Gente, alguém ajuda!
   Todos pararam de falar ao ouvir a voz alta de Scarlet. Ela estava ainda no último degrau da escada, segurando Igraine pelas costas, que parecia zonza. Prontamente todos a rodearam, mas foi Cruello que tomou a frente e a segurou nos braços.
— Ei, você está bem?
— Óbvio que ela não está bem, seu insensível! – ralhou Patrick.
— Coloquem ela no sofá e deem espaço!
  E assim, a ordem de Nanny, foi feito. Porém, enquanto Igraine estava deitada no sofá, mantendo os olhos fechados mas ouvia as várias vozes perguntando “o que está sentindo?”
— Eu estou bem! – Igraine resmungou. – Eu só estou cansada de toda essa barulheira e confusão que está acontecendo á horas na minha casa! Quero que todos vão embora. Agora!
— Espere, senhorita Radcliffe. – Patrick começou. -
— Mas filha,você não pode... – Amber começou.
— Mandar vocês embora? Vocês vão mesmo sem se despedir!
  Silêncio constrangedor. Tanto Amber como Braun pareceram, por alguns segundos, ficarem sem saber o que dizer. Mas, sabendo que era o momento. Cruello resolveu cumprir seu papel de líder e tratar de dar ordens sem qualquer remorso.
— Acho que todos nós ouvimos a dona da casa. – ele bateu palmas. – Muito bem, circulando todo mundo!
— Mas...
— Nada de “mas”! Já teve gente demais aqui por tempo demais! Fora, fora! Todo mundo pra fora! Xô!
  Mesmo diante dos protestos de Amber e Braun ( - Não podemos ir embora ainda, estamos com nossas mochilas aí e precisamos de suprimentos antes de partir! Mas iremos nos reunir com nossos irmãos de alma que já saíram para arrumarmos tudo para então partirmos para a Amazônia!),os resmungos de Scarlet (- Não ouse me enxotar Cruello, ou vou te dar uma bicuda na cara! Mas vou embora porque não aguento mais ficar nesse lugar!), a indignação de Nanny ( - Ei, eu moro aqui! Tá maluco?!), o comentário aleatório de Alfred (- Eu acho que as pessoas precisam cuidar de suas próprias vidas...) e, obviamente...
— Você é um entojo, Devil! Eu ainda vou escancarar uma matéria sobre esse seu comportamento soberbo e tóxico! – ralhou Patrick. – E eu até posso ir embora e deixar para resolver o assunto acerca da paternidade do pequeno Fofucho e a guarda compartilhada dele, mas não vou sair daqui sem o meu Romeu! ROMEU!
  Patrick assoviou tão alto que Cruello trincou, já que o jornalista fez questão de assoviar bem perto dele. Não demorou para que Romeu surgisse no alto da escada, saindo do quarto de Igraine e acompanhado por DoisTons.
— Romeu, vamos embora! – Patrick falou.
   O dálmata latiu e abanou a  cauda, como se perguntasse.
— Estamos sendo enxotados por esse humano que tenta imitar no cabelo dele, a belíssima pelagem de sua raça!
— O quê? – Cruello ralhou. – Como ousa comparar meu cabelo, seu...
  Mas Romeu já vinha descendo as escadas e passando pela porta.
— Guarde seus impropérios para o momento em que eu estiver com o meu gravador do celular ativado, Cruello. – Patrick falou, pomposo. – E diga a Igraine que nosso assunto acerca da guarda compartilhada do filhote não acabou! Irei redigir um documento que deverá ser assinado!
— Ah, tá faça o que quiser, agora caí fora!
  Após se despedir rapidamente de Alfred e Scarlet (- Trate de não demorar muito aí porque amanhã temos muito trabalho e questões na Devil’s para resolver!), Cruello bateu a porta com um pouco mais de força que o necessário e esperou que Nanny terminasse de falar com Igraine e se encaminhasse para cozinha.
— Todos foram embora? – a garota perguntou, sentando-se no sofá.
— Sim, mas seus pais é por pouco tempo. Eu acho... – ele verificou se não havia qualquer tipo de sujeira no sofá e sentou-se ao lado dela.
— Você está bem?
— Sim..eu confesso que...exagerei na “cena” para ver se o pessoal se tocava que tinha de ir embora. Mas não sei se deu muito certo.  Obrigada por ter conseguido tirar todos daqui.
— Estou acostumado a me livrar de gente que fica aporrinhando. Respeitam autoridade quando impomos ela.
   Ficaram um tempo em silêncio, até que Cruello olhou a tela do celular.
— Preciso ir.
— Já? Pensei que...
— Gostaria que eu ficasse?
  Igraine sentiu o rosto corar quando seus olhos se encontraram e rapidamente baixou o rosto. Já estava namorando com Cruello á meses, porque ainda sentia esse tipo de coisa diante dele como se fosse uma garota apaixonada?
  Cruello roçou os lábios no pescoço dela, passando um dos braços em volta de seus ombros.
— Eu até gostaria de ficar. – ele sussurrou. – Mas logo a Nanny solta seus bichos que estão lá no quintal e aquele rato em forma de cão vai querer trepar na minha perna!
— O Golias é um Chiuahua. – ela resmungou com um sorriso.
— E o gato vai encher minha roupa de pelos!
— Mas você bem que gosta de fazer carinho no Mimo.
— E aquele vira-latas vai causar um fuzuê nessa sala e querer pular em cima de mim!
— Furacão precisa extravasar a enorme quantidade de energia que ele sempre tem.
— E pra terminar, a sua cadela agora teve um filhote do cachorro do Patrick Star! Com tanto cachorro no mundo, ela vai engravidar justo do cachorro daquele cara?!
— Aconteceu, não hã o que fazer... só é preciso deixarmos que Fofucho cresça de forma saudável. E... – ela suspirou. – Patrick ter contato com ele, mas sob minha supervisão.
— Isso tudo é loucura... – Cruello coçou a cabeça. – Mas enfim, eu preciso mesmo ir agora.  Tenho muitas coisas para resolver... – ele abaixou a voz. – Inclusive para garantir que nossa “loucura” dê certo.
— Essa ideia é real mesmo? O que você está pensando?
— Claro que é! Todas as minhas fabulosas ideias são colocadas em prática! E não vou revelar por enquanto.
— Cruello...não é nada ilegal né? Ou...você não tá querendo me sequestrar para fazer maldades comigo...né?
— Sério mesmo que você acha que eu sou algum tipo de louco criminoso?
— N-não, é que..bem..eu...desculpa...
  Silêncio constrangedor.
Então Cruello afagou a cabeça de Igraine e falou, de um jeito visivelmente carinhoso que Igraine nunca o ouvira falar antes.
— Eu gosto de você raposinha. Muito e de verdade.
  Cruello virou o rosto de Igraine em sua direção, percebendo que ela estava um pouco corada e a beijou, sendo imediatamente retribuído.
— Relaxa que eu estou esquematizando tudo. – ele falou após alguns minutos. – Vou te mantendo informada. Mas acho bom já começar a arrumar sua mochila, leve apenas o  essencial, pois não poderemos ficar muitos dias. E você não pode recusar, invente uma desculpa na ONG, se vire!
  Dizendo isso, ele se levantou e, com passos firmes e elegantes, se dirigiu até a porta, dando uma piscadela antes de sair.
  Igraine então se viu sozinha em sua sala, só o barulho meio distante de Nanny na cozinha. Mas fora isso, havia o silêncio. Abençoado silêncio.
  A bem da verdade, havia muito que precisava pensar. Primeiro essa situação com Cruello, com ele fazendo proposta misteriosa e pedindo para que ela se preparasse para ir com ele sabe-se lá para onde. Depois, logo seus pais voltariam e teria de aturar a presença e o falatório incessante deles acerca de suas “maravilhosas expedições”. E ainda tinha Patrick Star inventando guarda compartilhada com relação a Fofucho...
   Igfraine suspirou, deitando-se novamente no sofá. Havia tanta coisa para resolver e nem sabia por qual começar. Por enquanto, só queria dormir um pouco.
   E foi isso o que ela fez.

~*~

   Silêncio. Vazio. Abençoado silêncio.
   Cruello trancou a porta do seu apartamento e começou a se despir, deixando as roupas pela casa enquanto seguia para o quarto. Sentia-se exausto, como se todas as suas energias houvessem sido esgotadas. Entrou no chuveiro e deixou que a água quente o ajudasse a relaxar.
   Sua vida sempre fora agitada, mas ultimamente o fato de estar com Igraine, parecia que atraía situações caóticas. Era por causa daquele febre do rato do Patrick Star, por causa dos surtos de Scarlet, dos pais amalucados de Igraine, das atitudes imprevisíveis de Nanny (não esquecera das vassouradas que ela lhe dera tempos atrás) e ainda de gente obcecada por ele que tentavam se aproveitar de seu corpo e status utilizando os meios mais vis possíveis (embora Javier fosse talarico, ele ainda havia sido menos pior do que a insana da finada Charlene).
   E devido a isso e tudo o mais que era parte do cotidiano de um legítimo Devil que gozava do status de ser herdeiro do império de Cruella Devil,
  Ainda bem que Scarlet exigira que Alfred a levasse para a própria casa. Se os dois tivessem vindo para seu apartamento, não teria sossego.
  Após sair do banho demorado e vestir um roupão, Cruello  parou por alguns segundos no meio do quarto pensando no que deveria fazer. Na verdade, em tudo que deveria e precisava fazer. Pegou o celular que havia colocado sobre a cama e o largou novamente sobre a mesa assim que o objeto começou a vibrar de forma frenética, anunciando toda a avalanche de mensagens e notificações que estava recebendo.

  “Por onde começar?”

  Enquanto pensava sobre essa pergunta, foi até a cozinha e abriu a geladeira. Deveria pedir delivery de alguma coisa, mas estava com preguiça e fome demais para isso. Então, apenas pegou um congelado do freezer e colocou no microondas. Enquanto esperava a comida esquentar, tratou de  arrumar a mesa da sala com o que julgou ser necessário para resolver o que precisava. Notebook, celulares, gravador, agenda, pastas, papéis...
  Parou por um momento para buscar a lasanha congelada e uma coca-cola. Sentou-se no sofá e comeu em silêncio, a mente trabalhando freneticamente para organizar e programar tudo que precisava fazer.
  Recostou-se no sofá enquanto bebia a coca direto do gargalo da garrafa e observou toda a sala. Á quanto tempo não fazia isso? Sozinho em um apartamento, comendo lasanha de microondas e refrigerante, usando apenas camiseta e bermuda velhas. Uma outra época, uma outra vida.
  Permitiu-se, por poucos minutos, enquanto comia aquela lasanha de qualidade duvidosa, relembrar o passado que agora já parecia muito mais distante do que realmente era. A época em que vivia em um apartamento antigo e decadente nos subúrbios de Londres, vivendo da pensão de seus falecidos pais enquanto fazia alguns cursos aleatórios e passava finais de semana inteiros em rolês de cenas alternativas, costurando e customizando seus próprios visuais punks.
  Bons tempos. E que não voltam mais.
   Cruello terminou de comer, bebeu um último gole do refrigerante e esticou-se no sofá. E isso o fez perceber o quanto estava cansado. Fechou os olhos, se permitindo só cinco minutos de descanso antes de começar a organizar tudo para o plano que tinha em mente envolvendo Igraine. E também começar a manhã já seguindo toda a lista de tarefas que precisa cumprir na Devil’s no dia seguinte.

“ Deixar tudo pronto e direcionado. Iniciar as ideias para o desfile, começar a planejar a decoração, organizar tudo o que for ser feito por empresas terceirizadas, reunir com a contabilidade para os custos, reunir a equipe de marketing, começar a fazer os rascunhos dos trajes, pesquisar sobre as tendências e...”

Apesar do cansaço e do sono, Cruello estava decidido a não descansar enquanto não concluísse de forma satisfatória tudo o que tinha em mente. Afinal, fazendo isso, poderia desfrutar da companhia de Igraine em um local isolado da perseguição e aporrinhação de qualquer um, ainda que só por alguns dias.
E com esse pensamento e disposição para varar a madrugada, se pôs a trabalhar.

~*~


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Notas finais do capítulo

E chegamos ao final deste capítulo que demorou tanto para ser feito (to quase me sentindo o George Martin com Game of Thrones com essa fic do cruello, chessuiiiis hahah)! Nossa, nem acredito que finalmente consegui fazer depois de ter abandonado a fic por tanto tempo...foram tantas coisas acontecendo, tantos outros focos (na vida social, virtual, hobbies e outros projetos de criação de histórias) que eu pensei que nunca iria retomá-la. Só tenho a agradecer infinitamente aos leitores que continuaram acompanhando, surgindo e incentivando. Obrigada gente, de coração! A medida que ia escrevendo o capítulo, ele se tornava mais longo, então acabou que parte dele eu transferi já para o próximo capítulo. Quem sabe assim eu torne a atualizar a fic mais rápido na próxima vez?
Por fim, gostaria de convidar você, leitor(a/e) da fic do Cruello, a conhecer minha história original ambientada no universo pokémon mas com uma abordagem e profundidade que certamente você sequer imaginou ver! Inclusive essa história me serve de treino para a construção de enredo, personagens, narrativa, complexidade e escrita para os meus originais!
Enfim, é isso. Muito obrigada por acompanhar essa história! É o fato de você gostar que me motiva a continuar escrevendo-a para finalizá-la!
Até o próximo capítulo!



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