Filho da Mentira escrita por Sirena


Capítulo 24
Shattered


Notas iniciais do capítulo

#Repostado (com algumas mudanças)
Aviso: Este capitulo contém reviravoltas extremas e drama excessivo
Assistam os AMV´s abaixo...(para aumentar a quantidade de drama ;)
https://www.youtube.com/watch?v=FxtpAeCIbJU
https://www.youtube.com/watch?v=QNCKPa24L6w



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CAPITULO VINTE E QUATRO

SHATTERED

ODIN

–Deixem a pobre mãe sozinha com seu pesar- Ordenei, olhando para o machado de Jack, cinza e vermelho com fragmentos de pele e ossos na lamina- Ela tem que estar pronta para a melhor parte... Quando fomos nos livrar do cadáver do garoto...

–E você?- Indagou um soldado de longos cabelos negros e olhos rasgados, dando a expressão continua de estarem semicerrados- Ficara com ela?

–Sim- Afirmei. Apenas ele havia permanecido, atiçado pela sua inoportuna e irritante curiosidade- Alguém precisa ficar de olho no cachorro para que ele não fuja.- Conclui.

San sorriu brevemente, fechando a porta e deixando-nos novamente sozinhos.

Apenas eu e ela.

–Você... Fez... - Ela estava em choque. Claro, Hrethel não estava acostumada com cenas de violência, ainda mais uma demonstração tão brutal.

–Eu disse para você, querida que iria fazer o que for preciso... Sacrifícios... - A frase ficou inacabada, perdida em meus próprios pensamentos. Estava de prontidão onde o crânio do garoto, ainda coberto com o pano negro havia permanecido.

Ela acompanhou com o olhar mórbido enquanto segurava a cabeça do menino com uma das mãos. Ela implorava com palavras gesticuladas para que não fizesse o que estava planejando. Para que não aumentasse ainda mais seu sofrimento espiritual.

Mas eu estava pronto para aquilo. Pronto para retirar o pano. Para que ela olhasse para ele.

–Sacrifícios para que seu filho continue vivo- Conclui a frase anterior com um ligeiro sorriso. O garoto vitimado pela fúria do soldado não havia sido Beowulf, mas outro, com idade e características semelhantes, embora este possuir o cabelo um tom mais claro e pequenas sardas circulares envolta do nariz.

–Não é...- Ela não tinha palavras.

–Não. È apenas um garoto. Um garoto que já estava destinado a morte pela Praga- Olhei os sinais em seu rosto, as marcas características, embora sutis da doença.- Ele não ia viver muito tempo. Não que ele merecesse isso... Apenas não encontrei outro jeito...

–Você...

–Eu disse que faria o que fosse possível para que ele sobrevivesse. Mesmo não sendo um homem honrado, gosto de cumprir minhas promessas.- Um pequeno sorriso finalmente desabrochou, como uma rosa selvagem nas colinas verdejantes do sul. Delicado e pequeno, mas era só o que precisava.

–Obrigada. Eu nem sei como te agradecer o que você fez.

–Apenas torça para que tudo de certo daqui para frente.

–Como assim?

–Não precisa se preocupar com isso.- Eu me aproximei lentamente de sua face. Mesmo suja de sangue e com os cabelos desalinhados, Hrethel continuava linda, muito mais bonita do que qualquer outra mulher que tinha visto.

Inconscientemente, não usando a razão, mas um impulso; encostei meus lábios nos seus, sentindo o gosto doce e suave da sua boca viajando pela minha, levando-me por um curto período para o paraíso. Um lugar além da imaginação.

Um lugar que não queria voltar.

Eu amava Hrethel. Ela era um dos motivos para ir visitar o mundo dos elfos negros. Ela e meu filho. Eram como uma ancora que me prendia a vida. Era ali que estava feliz. Não ao lado da minha falsa e cretina esposa que não amava e dos meus... Filhos. O mundo que precisava viver. Não o que eu queria viver.

–Eu queria... Se pudesse... - Falei entre o intervalo dos beijos e suspiros- Ficar com você. Fugir de tudo isso e te salvar...

–Mas você não pode- Disse, afastando-me com uma das mãos, nossos olhos se encontrando, afogando-me naquele oceano azul.

–Não sem um preço alto a se pagar. Sem que isso custasse à vida de Beowulf- Obviamente havia excluído outras partes, outras consequências ,narrando apenas a principal naquele momento.

–Contanto que meu filho esteja a salvo nada mais importa. - Concluiu.

–Mas você não merece morrer- Encostei minha testa na sua, os olhos fechados impedindo que as lagrimas caíssem- Você devia permanecer viva!

–Não estaria feliz sabendo do preço que minha vida iria custar.

–Você não devia ter voltado. Devia ter tentado ser feliz em outro lugar. Mesmo que as chances fossem quase nulas. - Acho que quase não era a palavra correta. Ela não devia e jamais existiu naquela sentença- Não... Eles jamais iriam deixar vocês vivos...

–Eles?

–Como eu lhe disse outrora, tudo que está acontecendo neste e em outros mundos é algo maior do que pode você pode imaginar. Tem muitas pessoas corrompendo esse reino, matando inocentes, causando guerras... E estou fazendo parte de tudo isso. Dessa destruição. Sendo usado como um deus da guerra.

–Mas você é o rei! Não pode fazer algo para mudar tudo isso?

–Eu possuo um titulo fantasma. Eu nunca fui o rei de fato. Sou apenas o “porta voz” da destruição, aquele que rege a sentença. Mas a voz, o grito que ecoa não me pertence.

–Quem é o verdadeiro rei?

Senti as palavras se formando na minha boca, mas fui incapaz de proferi-las. Se fossem condenar Hrethel a ultima coisa que ela merecia era morrer com esse conhecimento mórbido corroendo seus sinais sinápticos.

–Não pense nisso, por favor. Se acontecer alguma coisa com você hoje, quero que esteja com sua mente voltada para seu filho. – Passei a mão sob seus cabelos negros- No futuro, o garoto forte e inteligente que você sabe que ele se transformara- Minha mente se voltou por um momento para meu próprio filho. Um sentimento tão forte que não pude impedir que uma lagrima escorresse pela face.

–Odin...

–Eu perdi quem eu sou, mas mesmo sendo uma casca vazia, não sei como... Ainda posso te amar- Confessei, selando meus lábios brevemente nos seus, uma ultima vez. -Quem sabe se Hoder fazer o que lhe foi mandado eles libertem você- Estava milhares de vezes mais otimista do que aparentava.

–Qual era a missão de Balder?

–Eu não sei. Não me falaram- Balbuciei, sincero.- Eles não me contam tudo aqui.- Balancei a cabeça uma vez. O sigilo embora for extremamente enfadonho, fazia parte de algumas situações – Só espero que o que quer que seja, ele possa cumprir para o seu bem- Fechei os olhos. Eu não estava pronto para perdê-la para sempre.

Escutei passos no corredor. Botas de couro escuras martelando o solo, quebrando minha felicidade momentânea.

–Eles estão vindo- Exclamei, levantando-me- Você consegue agir como uma mãe em luto?

–Somos todos filhos da mentira aqui. - Uma mecha de cabelo caiu sobre seus olhos e tive que controlar a vontade de ajeita-la atrás do lóbulo de sua orelha.

–Eu espero poder vê-la novamente.

–Eu também- Ela sorriu.

A porta se abriu.

Quando eles entraram estava encostado na parede, os braços cruzados, acentuando minha “cara de mal” natural, aperfeiçoada após anos e anos de prática diária.

–Não estava mais aguentando ver à maldita chorando- Rugi finalizando com um meio sorriso, afastando a imagem do beijo confortante e cálido.

–Ele não tinha nada a ver com isso- Lamentou. Hrethel era uma atriz nata. Desde o tom vocal as lagrimas forçadas que escorriam dos olhos.

Ninguém suspeitaria que ela estivesse mentindo.

–Acha que isso é o suficiente?

–Não. Ela merece mais que isso somente pelo fato de acabar com minha paciência- Estava quase hipnotizado pelos seus olhos azuis. Suspirei. Concentração... Tenho que me concentrar – Irritante e manhosa... Alguém tão desprezível merece uma punição muito pior...

“O que você está fazendo?” Sua expressão facial parecia murmurar.

“Confie em mim” Retribui, igualmente sem palavras.

–De o garoto aos cães enquanto ela assiste seus restos desaparecendo. Não existe nada pior para uma mãe do que ser condenada a além de ver seu filho morrer... Não poder dar um enterro digno.

Claro esse não era o motivo. Isso era mais do que obvio. Era apenas uma desculpa para me livrar do cadáver antes que outras pessoas possam começar a duvidar, a fazer perguntas.

E para que isso ocorresse, não deveria, não poderia... Existir provas.

–Não faça isso!- Gritou Hrethel – Por favor...·.

–Ousa questionar as ordens do seu rei?-Que frase irônica, principalmente pela ultima palavra. Chegava a ser risível- Guardas levem- a imediatamente para a sua punição. Estou cansado da sua presença desprezível.

“Como se eu me cansasse de olhar para seu rosto... Para seus lábios vermelhos e grossos, como as pétalas de uma flor rara e singular de um lugar distante e utópico”

–Imediatamente, majestade- Falou um dos soldados.

Eles a agarraram pelo braço bom, arrastando-a para fora. Ainda nos encontramos por um momento, agradecimento e algo mais... (Felicidade?...Amor, talvez...?) fluíram como uma cascata de emoções que me fizeram revirar o estomago, deixando-me com calafrios e uma vontade enorme de agarrar seu braço e mantê-la aqui ao invés de somente observar sua sombra se tornar mais distante.

Não. Eu tinha coisas mais importantes para fazer... Por mais importante que fosse sua vida estava fadado a cumprir uma promessa.

Uma promessa de sangue.

Naquele minuto a vida daquele garoto era mais importante que tudo.

Estava fadado, obrigado à salva-la.

***

–Onde ele está?

Rin estava parado diante de mim, suas vestes ainda as mesmas da guarda real. Não havia sangue ou lacerações pelo se corpo, o que indicava- se de fato havia cumprido o trabalho- havia sido realizado sem problemas.

–Está um pouco atrasado. - Reclamou.

–Houve algumas pequenas complicações no caminho...

–Pensei que reis não tinham esse problema- Zombou.

–Somos comandados pela mesma pessoa. Pensei que já soubesse disso, Rin- Ele sorriu entredentes. Rin deveria estar quatro ou cinco invernos a mais da terceira década, o rosto pintado pela cor do sol, olhos e cabelos da mesma cor castanha, o porte e o modo de agir de um guerreiro imbatível do deserto.

–E é por isso que não estou de pleno acordo com essa missão.

–Isso quer dizer que está com o garoto?- Um pouco de paz invadiu minha consciência.

–Você não teria me pagado a quantia que pagou se não tivesse certeza que cumpriria o serviço. – Justificou, cruzando os braços.

–Foi difícil?

–Não como eu imaginava. Estava esperando algo bem mais complicado.- Mesmo a frase sendo egocêntrica, Rin se comportava com naturalidade. Um pouco de nervosismo talvez, como se estivesse realmente impressionado com o feito- Foi... Tudo bem a parte um?

–A troca?

–È... A troca! O que mais seria?

–Um perfeito sucesso. Claro que seria impossível sem a sua ajuda e de outras pessoas-Não era necessário dizer nomes para ele ou detalhes mais precisos, além do fato de minha confiança ser um pouco frágil com este individuo peculiar com quem me dirigia à palavra.

–Ótimo.

–Onde está o menino?

–Está ali- Ele apontou para um carvalho torto e degastado- Não queria que ele ficasse muito... Exposto. – Declarou sabiamente, enquanto íamos ao seu encontro.

Beowulf estava ali, uma figura pequena e encolhida, subjacente por um cobertor marrom que envolvia o contorno dos seus ombros finos e esqueléticos. Quando ele levantou a cabeça e finalmente consegui ver o seu rosto, pude perceber o quanto ele parecia com sua mãe. Agora que de alguma forma ela havia mudado a cor de suas madeixas a semelhança era tão alta que chegava a ser gritante. O garoto tinha os fios tingidos da mesma cor negra, como um fragmento vivido da noite, cortados de maneira desigual na altura dos ombros. A pele era pálida e forte como dos seus antepassados élficos, as sobrancelhas grossas e os lábios pequenos. Mas, o que mais impressionava eram seus olhos azuis, a cor suave, pura e inocente como o céu no verão, límpido e sem nuvens, assim como Hrethel. Ao mesmo tempo eram tristes, duros e selvagens como de seu pai.

–Oi- Cumprimentei, tentando disfarçar a felicidade que sentia ao ver seu rosto.

Ele não respondeu.

–Nós nos vimos antes, não se lembra?- Não houve resposta- Provavelmente não. Foi tão rápido. - Dialoguei, esperando uma resposta.

–Quem é você?

–Sou um amigo. - Respondi. Contente pela sua reação.

–Onde está minha mãe?

–Ela está bem- Menti. Eu era conhecido como um ótimo mentiroso, mas pela primeira vez não estava seguro sobre isso.

–Quando ela vai vir? Quando vou ver ela novamente?

–Em breve- Prometi, encarando-o- Mas eu tenho que te levar para um lugar seguro primeiro, tudo bem?

Ele acenou positivamente.

–Vamos sair daqui logo, Rin.- Peguei o garoto no colo. Estava fraco demais para andar sozinho, cambaleando pelas ruas escuras sem necessidade. Ajeitei-o sobre meus braços, sua cabeça tombada em meu ombro, o olhar fixo no horizonte-Já perdemos muito tempo- Ordenei.

Ele pareceu me ignorar, os olhos vagando para os lados como um feroz predador.

Antes que tivesse uma reação, Rin retirou a lança das costas, um objeto fino e mortal, atirando-o em direção de um vigia escondido em meio as arvores.

–Não sabia que agora tinha admiradores te seguindo- Grunhiu, enquanto observava o homem atingido caindo numa pilha do próprio sangue no chão.

–Não acredito que mandaram alguém atrás de mim!

–E ele não está sozinho. São mandadas sempre duplas para o serviço. - Ele disse, ríspido.

–Como você tem certeza?

Sua resposta foi dada sem palavras. Atirando sua segunda e ultima lança, Rin acertou o homem escondido entre as arvores, rasgando seu peito com uma velocidade e uma intensidade que dificilmente seria encontrada numa espada ou mesmo uma flecha. Mais eficiente que qualquer outra arma.

–Isso é prova bastante para você?- Ele cuspiu no chão, sua respiração descompassada pelo nervosismo e a adrenalina.

–Somente eles?

–Sim. Conheço a guarda e o modo como eles agem- Afirmou, distanciando-se.

–Onde pensa que está indo?- Falei, sentindo o calor da respiração do garoto sobre a minha pele. Se ele de alguma maneira arriscasse a vida de Beowulf eu juro que mataria o desgraçado com minhas próprias mãos.

–Vou pegar minhas lanças de volta. Seria um desperdiçou gasta-las pela morte de um par de imbecis completos- Respondeu. Ele estava longe demais para que pudesse falar algo. Seria apenas desperdício de saliva e energia, fútil e inútil.

–Nós já vamos sair daqui, garoto- Prometi, passando a mão em seus cabelos, os fios úmidos pelo suor frio.

–Sim nós vamos!- Interrompeu Rin, um minuto depois. Uma lança em cada mão- Quero concluir logo essa missão. Pelo menos antes que a noite acabe.- Ele passou por mim com passos largos, um rápido olhar em direção ao menino em meus braços.

–Então somos dois- Rosnei, seguindo-o como um cão segue seu dono.

Foi uma caminhada longa e forçada. Não gostava da companhia de Rin, porém por questões obvias estava o acompanhando. Ele era uma das poucas pessoas que confiava, por mais frio e impiedoso que parecesse.

O silencio foi obviamente a consequência da nossa trajetória. Mesmo que fosse outra pessoa ali, não teria conversado. Estava muito absorto no meu objetivo para pensar em qualquer outra coisa.

–Para onde estamos indo?- Perguntou o menino tremulo e febril.

Por um segundo pensei em ignora-lo, mas ele não merecia isso. Mesmo a resposta não sendo a que ele desejava, tinha que responder alguma coisa.

–Para um lugar seguro- Respondi, ajeitando o cobertor, tentando aquecê-lo da melhor forma possível.

–Não sei quanto essa ultima parte, mas estamos bem próximos do nosso destino- Intrometeu-se Rin, com um sorriso forçado.

No horizonte já era possível ver o porto, uma estrutura velha e partida de madeira, cuja estrutura indicava tudo, menos um lugar seguro. Naquela hora da noite e nesse período do ano, quando a pesca era fraca, com poucos peixes ousando cruzar aquela parte do oceano, apenas um navio estava atracado ali.

Um navio imponente, nobre, feita com a mais fina madeira negra de Asgard, restaurado recentemente, provavelmente graças à profissão infame do seu dono.

–Vejo que o Kraken já está nos esperando...- Mencionou o soldado, olhando para o navio.

Kraken, o monstro que segundo as lendas vagava pelo oceano, atacando embarcações e devorando a carne dos tripulantes. Mesmo sendo apenas uma lenda antiga, ela impedia que muitos barcos cruzassem o oceano, todos possuído pelo medo. Provavelmente era esse o objetivo daquele navio pirata, apossar todos que ousassem cruzar o seu caminho com medo da morte iminente.

–Tem certeza que você pode confiar nele?- Inquiriu Rin, segurando a lança com mais veemência.

–Estou sendo obrigado a confiar em muitas pessoas- Falei, dirigindo-me a ele.

Um sentimento que obviamente não era reciproco. Confiar não era uma palavra associada a minha personalidade graças às escolhas que fui obrigado a tomar durante toda a vida.

–Somos obrigados em determinadas situações, tomar medidas extremas. São elas determinam quem vive e quem morre. Você aprende isso no exercito.

–Já estive em batalhas antes- Levantei uma sobrancelha- Há muito tempo. Sei sobre os sacrifícios necessários para estar em uma.

Sacrifícios. Não como aqueles cantados nas antigas lendas, mas sacrifícios diários. Uma batalha interna e externa que era obrigado a travar dia após dia, muito mais árdua do que se estivesse em uma guerra, lutando com uma espada.

Eu não tinha uma arma. Nada com que pudesse lutar. Minha única saída era apenas suportar os golpes.

Suspirei profundamente, afastando estes pensamentos conturbados da minha mente confusa, focando-me no que estava por vim.

Meu contato já estava me esperando no porto, sua forma imprecisa moldada pelas sombras da noite chuvosa.

–Você está atrasado, Odin- Falou o homem, cruzando os braços.

–È a segunda pessoa que me fala isso hoje- Respondi, lembrando-me das palavras de Rin naquela noite.- A proposito pensei que era Njord que fazia os tratos.- Disse, observando a aparência física do jovem que mesmo sem clareza, era mais do que obvio que não se tratava do dono daquele navio.

–O capitão está ocupado- Justificou.

–E quem é você?

–Sou Cloud, filho mais velho de Njord. Digno o bastante para fazer negócios em seu lugar- Respondeu o jovem. Era possível notar a semelhança nos traços físicos em comparação ao seu pai. A pele morena e desértica, os olhos verdes de um brilho inigualável como as aguas do oceano. Era como ver Njord aos vinte e cinco anos- Esse é o menino?

–Sim, este é Beowulf. O garoto que seu pai prometeu levar para um lugar seguro longe de Asgard.

–Eu sei do trato, caro Odin.

–E espero que irá cumprir.

Ele sorriu, apertando os olhos, as sobrancelhas franzidas.

–Não iremos traí-lo se é isso que está pensando. Você nos pagou muito por isso e meu pai lhe deu em troca sua promessa. E mesmo sendo um pirata mentiroso, ele não costuma quebrar as suas promessas- Admitiu seu filho.

Eu olhei para o garoto.

–Você pode andar?

Ele acenou brevemente.

Coloquei-o no chão com cuidado. Seus pés vacilaram estáveis, como se a terra não estivesse firme, móvel e partida. Alguns segundos depois, finalmente, ele conseguiu se firmar, a respiração baixa.

–Você está bem, pequeno?

–Sim.

–Vou ter que deixar você aqui agora. - Meu coração estava destruído, partido. Dizer aquelas palavras foi como esmagar o pedaço que restava da minha alma, exterminasse minha existência.

–Por que não posso ir junto com você?

–È perigoso. Tem pessoas querendo machuca-lo. Pessoas cruéis...

–Mas eu não quero ficar sozinho- Balbuciou, lágrimas cristalinas escorriam de seus olhos injetados, se misturando com a chuva que caia em seu rosto.

–Você não vai estar sozinho- Prometi, abraçando-o. Mesmo usando toda minha força era impossível segurar as lágrimas naquele momento, impedir que elas escorressem pelo meu rosto.

–Mas como minha mãe vai me encontrar? Como ela ira me achar?

–De um jeito ou de outra ela irá te encontrar. Não importa o que aconteça- Murmurei, perguntando-me internamente qual seria o destino de sua mãe. O que o futuro aguardava.

–Eu ainda vou te ver?

–Um dia ainda iremos nos encontrar. Eu prometo- Falei, levantando-me. Se permanecesse ali por mais um momento não sei se conseguiria abandona-lo.

–Vamos, garoto- Cloud ofereceu sua mão, convidativo- Você conhece um navio por dentro?

Ele negou, ainda fitando-me.

–Você vai gostar- Ele insistiu, a palma ainda estendida.

Ao invés de simplesmente pegar a mão do homem e seguir seu caminho para diminuir meu sofrimento, Beowulf correu em minha direção, envolvendo seus braços em minha cintura, deixando o manto que o aquecia cair dramaticamente no chão.

–Traga ela de volta- Ele implorou, palavras sem vida que ecoavam pelos meus ouvidos- Por favor. Não quero morrer sem poder ver o rosto da minha mãe. Não posso morrer sem ver ela- Lagrimas caiam de seus olhos, manchando minhas vestes; algumas caindo tortas no chão.

–Eu prometo, Beowulf que a trarei de volta- Não sabia o certo o que estava dizendo, se isso seria possível.

Mas eu queria que fosse. Por mim, mas principalmente por ele.

–Você ainda fara coisas grandiosas garoto. Você tem uma força, um poder único. Terá um grande futuro.

–Foi minha mãe que disse isso?- Ele levantou os olhos, as lagrimas caindo em menor volume.

–Eu sei disso e ela também sabe- Confirmei, observando um brilho se formando em seus olhos. -Agora você precisa ir com ele- Pedi, sentindo seus braços se afrouxarem, conforme dava passos estreitos para trás.

Fiquei parado, sem sentir meus músculos, apenas o observando a distancia, vendo-o seguindo seu destino, cada vez mais distante de mim e de todos. Caminhando para um futuro incerto.

Um futuro que desejava ardentemente que existisse um sol, uma luz que pudesse tocar a parte destruída do seu coração e transformasse em esperança. Transformasse em algo que não existia mais em mim.

Por que eu estava perdido. Não existia mais nada que pudesse ser salvo.

–Vamos Odin. Já ficamos tempo demais aqui- A voz de Rin era um eco, nada que pudesse entender, uma língua que não queria traduzir.

Por que eu não estava mais ali. O físico sim, mas não a mente.

Tudo que via agora eram imagens do meu passado. A imagem da pessoa que arruinou a minha vida e de milhares de pessoas. O responsável por matar famílias e deixar crianças sozinhas e órfãs.

O verdadeiro rei.

O homem que iria encontrar aquela noite.


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Notas finais do capítulo

E então, gostaram?
Suas opiniões são essenciais para a continuidade da fic. Quero saber o que vocês estão pensando.