O Menino com Cabelos de Vela escrita por The Dark Passenger


Capítulo 6
As Cores da Alma de Max Vandenburg


Notas iniciais do capítulo

Ok, não resisti e postei. Mas é sério, o próximo só com três reviews. Ai pessoas, eu amo vocês



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A guerra estava me sobrecarregando. Alguns dizem que a guerra é a melhor amiga da morte, mas não é verdade. Ela é mais como um chefe exigente, sempre pedindo mais de você. Ela nunca está satisfeita, mesmo com todo o meu trabalho. Naquela noite, entretanto, foi diferente. Mais sofrido. Não queria levar aquela pessoas, mas a minha vontade é uma coisa insignificante. O chefe requisita meus serviços, e eu nada posso fazer a não ser prestá-los.

Naquela noite, o céu estava vermelho. Parecia uma sopa, borbulhando e se mexendo. Queimando em alguns lugares. Havia migalhas pretas e pimenta riscando a vermelhidão.

Antes, houvera crianças pulando amarelinha ali, na rua que lembrava páginas manchadas de gordura. Quando cheguei, ainda era possível ouvir seu eco. Os pés batendo no chão. As vozes infantis, e os sorrisos feito sal, mas se estragando depressa.

Depois, bombas.

Dessa vez, foi tudo tarde demais.

As sirenes. Os gritos malucos no rádio. Tudo muito tarde.

Em minutos, montes de concreto se sobrepuseram em pilhas. As ruas eram veias rompidas. O sangue escorreu até secar no chão e os cadáveres ficaram presos ali, feito madeira boiando depois da enxurrada.

Estavam colados no chão,até o último deles. Um pacote de almas.

Seria o destino?

O azar?

Foi isso que os grudou assim?

É claro que não.

Não sejamos burros.

Provavelmente, deveu-se mais às bombas atiradas, lançadas por seres humanos escondidos nas nuvens.

Sim, agora o céu era de uma vermelho devastador, desses feitos em casa. A cidadezinha alemã fora rasgada com violência, mais uma vez.

Por favor, mais uma vez, peço-lhe que acredite em mim.

Tive vontade de parar. Agachar-me. Mas não é permitido. Não parei. Não me agachei. Andei até as ruas.

*Chamada Nominal das Ruas*

Munique, Ellenberg, Johannson, Himmel.

A rua principal, e mais três, na zona mais pobre da cidade.

No espaço de minutos, todas desapareceram.

Uma igreja foi deitada abaixo.

Max Vandenburg assistia à tudo com olhos aterrorizados.

Na casa dos Steiner, deslizei os dedos pelos cabelos encantadora-mente penteados de Barbara, tirei o ar de seriedade do sério rosto adormecido de Kurt e, uma a uma, dei um beijo de boa noite nas menorezinhas.

Estavam todos lá, menos Rudy. Agradeci por isso. Carreguei-os com delicadeza pela rua destroçada, com sal nos olhos e o coração mortalmente pesado.

No número 31 da rua Himmel, Frau Holtzapfel parecia estar à minha espera. Seu rosto parecia perguntar por que diabos eu tinha demorado tanto.

Em contraste, Frau Diller formia à sono alto. Sua loja fora obliterada, com o balcão lançado para o outro lado da rua, e sua fotografia de Hitler fora arrancada da parede e jogada no chão. Decididamente,o homem tinha sido agredido e espancado até se transformar numa pasta de vidro moído. Pisei nele ao sair.

Os Fiedler eram bem-organizados, todos na cama, todos cobertos. Pfiffikus estava escondido até o nariz. Levei-os todos.

Max observava aquilo tudo, e sentia-se como um cadáver. Pela primeira vez em todos os meus longos anos nesse trabalho vi um corpo vivo sem alma. A de Max Vandenburg flutuava acima dele. Quis ajudar. Quis lhe contar que Liesel estava no bosque, esperando por ele. Novamente, não o fiz. Não era permitido. Simplesmente o observei, só por alguns segundos. Com curiosidade espiei o conteúdo de sua alma. Vi sofrimento, as notas de um acordeão, previsões do tempo, um boneco de neve em um porão. Vi desenhos e livros, vi paredes repletas de palavras, vi lutas frenéticas com o Führer, vi 13 presentes. Vi a Sacudidora de Palavras. Vi o Vigiador. Mas, acima de tudo, vi uma menina loira com olhos castanhos. Olhos perigosos na Alemanha Nazista. Vi, sobretudo, Liesel Meminger.

Nesse momento, soube que devia interferir. Não era certo que tudo acabasse daquele jeito. Quebraria as regras. Faria gestos obscenos para meu chefe. Estava cansada dele. Estava cansada de ver vidas humanas acabarem sempre do mesmo jeito: vazias. Aquela história não podia terminar como todas as outras. Eu não permitiria.

Aproximei-me do lutador judeu. Seus pulsos estavam atados por cordas. Surpreendi-me com o desleixo dos guardas alemães, e me aproveitei dele. Sem que o homem percebesse, afrouxei-lhe as amarras e praticamente soutei-as. Os soldado estavam atordoados com o bombardeio, e olhavam atordoados para o céu. Os prisioneiro estavam esquecidos, alheios à tudo. Nenhum deles tentava fugir. Só viam a cena sem realmente ver. Estavam trancados em si mesmos, e um encontro comigo seria para eles como um presente. Tive a impressão de que alguns olhavam diretamente para mim. Era como se vissem a liberdade.

Estava prestes a fazer uma coisa que nunca fizera antes. A minha função sempre fora ceifar almas. Agora, eu devolveria uma. Em vez de acolher sua alma em meus braços, forcei-a para baixo, em direção ao corpo. Ela lutou desesperadamente, mas no final prevaleci. Antes de ver a alma retornar, notei que ela possuía cores. Era a primeira vez que via algo assim.

*As Cores da Alma de Max*

Azul, branco, amarelo, laranja.

Desde o negro mais profundo ao branco mais ofuscante.

Uma infinidade de cores, todas as matizes unidas em uma grande orquestra.

Eram todas presentes vindos de previsões do tempo.

Liesel Meminger dera a Max as cores.

O rapaz pareceu levar um choque ao recobrar a conciência. Ele olhou ao redor, viu o que acontecia, e um sentimento o dominou. O mais pré-histórico tipo de medo. O instinto de sobrevivência o tomou, e o vigiador correu até as árvores destruídas em busca de proteção. Não pude mais observar. Tinha muito trabalho à fazer. Voltei para recolher as almas de Hans e Rosa Hubermann.


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