O último dia foi exaustivo, com despedidas. Saímos de noite, entrando num trem que chegaria em poucas horas na velocidade em que nos encontrávamos.

No vagão-restaurante, Viktor está conversando com Rowenna. Ficaremos sob sua tutelas nas próximas semanas, e espero que ela seja eficaz. A conversa parece interessante, pois Viktor está vidrado e focado nela. Catlee ajeita a peruca prata e retoca a maquiagem, afinal, já estamos chegando.

– Bom dia... - digo.

– Bom dia, dorminhoca. - Brinca Viktor. - Estávamos falando de você mesmo, e de como sobreviver.

Isso foi um grande choque para mim. Apenas um pode viver, e somos amigos. Olho por alguns instantes Viktor, imaginando um meio de cortar sua garganta, ou mata-lo da melhor forma indolor. As chances são grandes.

– Charlotte? - chama Rowenna. Volto a si.

– Ah, desculpe, vou comer apenas uma torrada. - Eu disse.

– É melhor se apressar, já estamos pertíssimos. - Ela diz. - E vocês já têm fãs, afinal, Distrito Um chama muito a atenção.

Me sentei na banqueta vermelha que confortou muito as minhas nádegas. Já era de se esperar este luxo.

– Do que estavam falando? - quebro o gelo enquanto passo a geleia sabor framboesa na torrada.

– De como acabar com os tributos - ela disse, fria. - A cornucópia é o melhor lugar para entrar em vantagem e acabar logo com isso, embora não seja recomendado. Ou seja, deem um espetáculo para eles. Vocês são carreiristas, levam vantagem.

– Tem os tributos do Distrito Onze, lar do assassino do meu pai. - Diz Viktor.

– Então você já tem um alvo. Mate-o, mas não como a primeira caça. Mate o mínimo na cornucópia, tire todos do seu caminho e já poderá vencer - ela diz.

– Então só temos de agir feito carreiristas, tanto para as câmeras quanto longe delas - digo. Destrincho a torrada, o sabor doce acaricia meu paladar.

– Vocês não tem de agir feito carreiristas. Vocês são carreiristas - disse a mentora.

O trem reduz gradualmente a velocidade. Ouço gritos e mais gritos e Viktor e eu corremos para a janela. Espremidos, com bochechas quase juntas, vemos várias pessoas da Capital, câmeras como os da colheita. Eles estão lá pare me receber.

Eles acenam, mandam beijos. Eu ajeito minhas madeixas loiras para trás enquanto sorrio da forma mais esbelta possível.

– Estes são seus fãs - diz Catlee. - Vão se trocar, vão, vão!

Vamos até o quarto e dispo o pijama, substituindo-o por um vestido típico do nosso Distrito. Algo parecido com magenta, cor de goma. Meu cabelo é ajeitado em tranças, como na colheita. Estou mais bela do que pareço.

Viktor também trocou seu pijama por algo parecido com lá em casa. Camisa leve de algodão branco deixam a vista seu físico musculoso. Seu cabelo despenteado combina com seus olhos amendoados e castanhos. Estamos perfeitos.

Catlee e Rowenna nos esperam.

– Sorriam, sorriam - nos lembra Catlee. E então saímos do trem.

Somos bombardeados por flashes, gritos e jornalistas. As perguntas chovem.

– O que você acha dos demais carreiristas? - pergunta um deles.

Os carreiristas deste ano parecem bem fortes. Tirando o menino do 2 que não parecia querer ir aos Jogos. A garota do 4 também não me parece lá grande coisa, mas é voluntária e isso me preocupa. Sei que farei aliança com eles, mas me questiono quando e como os matarei. Apenas consigo responder:

– Tributos de extrema competência. Eles parecem bem fortes, competitivos e vorazes - solto um riso -, talvez façamos a melhor aliança carreirista das últimas edições. - Isso foi ótimo. Consegui arrancar mais gritos e ignorei as demais perguntas, alegando cansaço.

Ficaremos no primeiro andar do hotel, mas serei preparada para o desfile, a melhor oportunidade de mostrar a honra do meu Distrito.

No elevador, fiquei observando de soslaio Viktor enquanto Catlee falava. Talvez ele fosse a única pessoa que eu poderia confiar, e se eu tiver misericórdia, deixarei-o pro final.