Minha felicidade some quando piso no quarto e começo a ver o noticiário da televisão.
"Katniss Everdeen, irmã da tributo do distrito 12 que morreu na 74º Edição dos Jogos Vorazes, agora passa pela turnê da vitória, acompanhando ninguém menos que Peeta Mellark! O jovem vencedor dos Jogos fez diversas declarações amorosas para Katniss, e agora, finalmente, eles estão namorando. É isso mesmo, temos o casal mais esperado de todos os tempos!"
Até essa parte, tudo bem, não imaginava nada diferente disso com Caesar contando os fatos.
"Hoje, essa tarde, os dois chegarão em uma visita ao Distrito 11, de onde os tributos Thresh e Rue vieram. Os dois tiveram uma morte dolorosa e triste."
Rue, é claro. Rue, a pequena Rue. Da idade de Prim, foram amigas e eu não faria nada diferente de Prim, faria aliança com Rue, ela era tão doce... Me lembro de quando vi sua morte. Por mais que eu quisesse Prim de volta, eu não queria que Rue morresse, realmente não queria. Eu a via como se fosse minha irmã, da mesma idade, de uma pobreza ainda maior que a nossa.
Me sento na cama para terminar de ouvir.
"Agora, vamos fazer uma reprodução dos melhores momentos dos Jogos Vorazes. Se você não pôde ver, agora vai poder."
"E no fim, uma cobertura especial da chegada de Peeta Mellark e Katniss Everdeen!"
Meu coração murcha, eu preciso desligar essa televisão agora mesmo...Quando chego lá, aparece minha irmã na cornucópia. Continuo ali, parada, olhando minha irmã que deveria estar viva hoje, estaríamos na vila dos vitoriosos, mas isso não era o que mais importava. Estaríamos juntas. Estaríamos em família. Poderia ver ela crescer, ter um futuro melhor do que o meu. Ela poderia até ir para uma escola melhor e quem sabe, se tornar a médica que ela sempre quis ser... Futuro, como seria o futuro se ela estivesse aqui? Como seria minha vida se ela estivesse aqui? Como seria se... se ela nunca tivesse ido para esse bendito Jogos Vorazes? Eu não sei, não sei de nada disso, porque não aconteceu e nunca vai acontecer. Eu nunca vou ter Prim ao meu lado novamente.
Desligo a televisão, como deveria ter feito a muito tempo, não sem antes ver minha irmã por uma última vez.
–Adeus, Prim. - digo e abraço o travesseiro, me encolhendo o máximo que posso.
As lágrimas descem por minha face. Nunca me senti tão sozinha, sem minha mãe, sem minha irmã. Eu não tinha me conformado com a morte dela, ainda estou de luto, mas o que eu menos precisava era de uma imagem da minha irmã nos Jogos, de novo. Eu não precisava ter visto aquilo mais uma vez. Eu não precisava ter me lembrado de todo o sofrimento. Eu não precisava.
–Posso entrar? - ouço a voz de Cinna.
Eu quero gritar que não, que eu estava pouco me lixando para a festa no 11, mas eu preciso ser forte, ou pelo menos fingir isso para as câmeras. Além do mais, Cinna não tem que ficar me aturando.
–Só um minuto.
Vou até o banheiro e lavo o rosto, isso diminui o vermelho dos meus olhos. Abro a porta.
–Oi Cinna, eu estava tirando um cochilo. - minto.
Ele parece não acreditar, mas não faz perguntas.
–Pronta para se arrumar?
–Para falar a verdade...não, mas não tenho opção. - resmungo.
Cinna vem até mim e faz sinal para que eu me sente na cadeira.
–Katniss, deve estar sendo difícil para você e eu entendo que esteja brava. Não precisa fingir estar feliz para mim. Estou aqui, acima de tudo, para te fazer melhor e não só para deixar você com boa aparência.
Assinto com a cabeça.
–Sei que esse vestido laranja não mostra como você está por dentro, mas você precisa fingir que está tudo bem, ficar com a cabeça erguida, ser a melhor namorada que o Peeta poderia ter.
Entendo o que ele diz, é para eu fingir estar apaixonada ou vão pensar que só me importo com o dinheiro.
–E também é preciso que você se mostre forte, entende? Mostrar para Snow que ele não te abala.
–É, mas ele me abala, ele tirou minha irmã de mim. - falo.
–Eu sei Katniss, mas não deixe ele saber do seu descontentamento, por favor, pode ser perigoso para você.
Faço que sim com a cabeça, mas eu não ia mesmo mostrar para Snow que eu queria matá-lo.
–E Cinna, e se...se me perguntarem sobre a morte da minha irmã? Eu não vou conseguir fingir que está tudo bem, simplesmente não vou. - digo.
Cinna se levanta.
–Sabe, você é humana, você perdeu sua irmã e será muito difícil falar sobre isso, mas tenho certeza que será questionada sobre isso. Mas eu não sei como você pode responder. Você pode tentar desviar as respostas para outros assuntos, o que acha?
–Acho que é uma ótima opção, não quero me abrir para a Capital.
–Eu sei. - ele fala colocando a mão no meu ombro. -Agora, é melhor eu te arrumar para você ficar deslumbrante.
Dou um sorriso e respiro fundo.