Correntes: Atados pelo Sofrimento escrita por Jacqueline Sampaio


Capítulo 7
Capítulo 6: O outro




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Eu pensei que acordaria em uma maca do pronto socorro ou em uma clinica de reabilitação (só Deus sabe o que Billy pensaria a me ver com sangramento nasal, certamente que eu era usuária de drogas), mas não foi nada disso que encontrei. Eu estava na minha cama, meu edredom cobrindo-me e as cortinas da janela esvoaçando-se com o vento da manhã. Sentei-me na cama desnorteada. Uma leve batida soou na porta.

-Bells, ta acordada? –Era Jacob. Eu iria responder, mas outra voz soou do outro lado da porta.

-Deixe-a dormir Jake. Bella deve estar cansada pelo passeio de ontem. –Era Billy.

-Mas eu queria chamá-la parar sair hoje de novo com o pessoal. Hoje vamos ao cinema. -Jacob respondeu ao pai.

-Outro dia. Deixe-a descansar. Deixe o cinema para outro dia. –Os dois se afastaram, pude notar pelos seus passos e vozes soando longe. Eu me espreguicei gostosamente e então as lembranças da noite anterior me assaltaram. Por que eu estava na cama e não no meu banheiro? Por que meu rosto e pijama estavam limpos e não sujos de sangue? Teria eu imaginado tudo o que aconteceu? Bastou olhar para a cesta de roupa suja e ver lá o pijama que usei noite passada, sujo de sangue. Não, tudo havia sido real. Eu só consegui pensar em uma pessoa que me ajudou: Edward. Eu sorri. Levantei-me na cama para um novo dia já sabendo o que eu faria na ausência de Jacob e Billy.

...

Banho tomado, roupas vestidas, café tomado, casa arrumada e limpa. Tudo estava pronto e antes da hora do almoço. Liguei para a oficina de Billy dizendo a ele que não precisava mandar comida para mim, eu mesma iria preparar a comida. Preparei uma torta de maçã, agradeci por naquela cozinha ter tudo o que iria precisar. Sai ao meio dia da casa seguindo a pista que me levaria à praia, era o caminho mais seguro para ir até ele.

...

Toquei a campainha do portão e esperei. É claro que eu poderia entrar sem cerimônia, mas quis bancar a educada pelo menos uma vez. O portão se abriu com algum dispositivo eletrônico que permitia ao dono da propriedade abri-lo sem necessariamente sair da casa. Segui para o interior da mansão e notei que a porta que dava acesso a casa já estava aberta. Entrei e vi de imediato Edward sentado em um dos sofás de couro sofisticados de frente para a porta em que eu passava, seu rosto estava insondável.

-Oi. Bom dia. –Murmurei.

-Bom dia. –Ele falou olhando-me intensamente. –A que devo a honra de sua visita? –Falou levantando-se e caminhando lentamente até mim. Eu estendi a torta de maçã que fiz para ele. Edward olhou para a torta intrigado, mas então sua expressão surpresa se modificou para algo como diversão.

-Torta de maçã. Por que se deu ao trabalho de vir aqui com essa torta? –Ele disse fechando a porta atrás de mim e pegando a torta de minhas mãos. Ele caminhou para a cozinha, eu o segui.

-Como forma de agradecer. Você me salvou três vezes.

-De acordo com minha com minha contagem, Isabella, foram apenas duas vezes.

-Três com ontem. –Ele parou quando chegamos à cozinha. Colocou a torta em uma bancada de mármore preto. Sua cozinha era sofisticada com preto, vermelho como cores predominantes. Eu me sentei em um banco de frente para a bancada onde estava à torta e o assisti pegar dois pratinhos e dois garfos dos armários.

-Não me lembro de ter salvado você ontem. –Ele falou enquanto nos servia com minha torta. Eu não conseguia tirar os olhos dele. Notei que vestia um moletom colado ao corpo com gola rulê de cor vermelha, calça jeans preta.

-Mas salvou. Não sei o que aconteceria a mim se Billy ou Jacob me vissem naquele estado. Provavelmente estaria em um hospital.

-E isso não é bom? Eu não diria que salvei você. Teria salvado se tivesse levado você ao pronto socorro.

-Fico feliz que não tenha levado.

-Por que fica feliz? E afinal por que o sangramento de ontem? –Edward deu-me um pratinho preto de porcelana com um pedaço de minha torta. Eu o aceitei e passei a comer sem nem responder o seu questionamento. O que eu diria? Que tinha uma doença grave? Essa eu iria guardar para mim. Após ter terminado o pedaço de torta que me foi ofertado notei que Edward não comeu sua fatia. Estava sentado do outro lado da bancada, seus olhos em mim e as mãos cruzadas no peito em sinal claro de aborrecimento. Ele queria que eu respondesse a sua pergunta. Suspirei e usei a desculpa mais esfarrapada que consegui pensar.

-Tenho sinusite. –Eu dei de ombros e vi a incredulidade nos olhos de Edward.

-Não imaginei que sinusite provocava um sangramento tão intenso. –Ele falou desconfiado.

-Hei, não vai comer a sua fatia da torta? –Disse olhando sugestivamente para o pedaço que ele havia servido para ele. Edward olhou cientificamente para o doce e então passou a comer. Ele não parecia apreciar o doce, eu havia gostado. Perguntei-me do que ele gostava de comer... Retrai-me. Eu sabia do que ele gostava: sangue.

-E ai como está à torta?- Perguntei sem nada melhor para fazer, ou talvez para conter o nervosismo quando pensei na dieta que Edward preferia.

-Está bom, apesar de não comer coisas do tipo.

-Você só alimenta de sangue?

-O que você acha? –Edward lançou um sorriso zombeteiro. Eu me calei olhando para a sobremesa.

-Bom eu acho que preciso ir. Desculpe se o incomodei.

-Sua presença não foi um incomodo. –Edward disse calmo.

-Mais uma vez agradeço por tudo o que tem feito por mim. Um dia irei lhe recompensar por tudo isso, atenderei a um pedido seu. –Eu disse isso me levantando do banco. Edward caminhou ao meu lado sem dizer nada. Lembrei-me do quase beijo que aconteceu na noite anterior. Maldisse o sangramento que fez com que Edward se afastasse de mim. Eu não queria ir, queria passar mais tempo em sua companhia, por mais estranho que fosse, mas eu não poderia obrigá-lo a me ter ali. Quando cheguei à porta fazendo menção de abri-la Edward colocou sua mão macia e fria sobre a minha.

-Qualquer coisa você disse? Espero que mantenha sua memória viva quanto ao que me foi dito na cozinha, humana. –Ele sussurrou e eu fiquei paralisada, incapaz de responder com palavras ou de olhá-lo, com medo que as pequenas chamas daquele ato se transformassem em fogaréu caso virasse. Assenti fracamente sem deixar a razão me guiar, não era uma boa idéia concordar com qualquer pedido feito por ele. Sai sem olhá-lo seguindo a rota mais segura, a rota da praia. Amaldiçoei-me por bancar a covarde, eu não disse a ele que gostava do perigo? Então por que fugia a chance de tê-lo por perto?

...

-Amanhã nós vamos sair Bells. Iríamos sair hoje, mas o velho me arrastou para a oficina. –Jacob disse com pesar, eu sorri. Billy cutucou o filho.

-Olha como fala de mim rapaz ou amanhã ficará o dia todo na oficina! –Ameaçou e vi Jacob engolir seco. Por algum motivo eu estava de bom humor e isso pareceu surpreender os dois ocupantes da mesa de jantar. Fiquei em companhia deles por um tempo demasiado longo ouvindo seus relatos minuciosos de como fora o dia. Apesar de estar ali, rir no momento que deveria e ficar séria no momento propício, minha cabeça estava longe. Eu me recolhi às dez e meia, tomei um demorado banho e vesti um pijama. Meu pijama sujo de sangue já estava limpo e não restou nenhum vestígio do incidente daquela noite no banheiro.

Quando cheguei ao quarto senti a vontade de visitar Edward crescer. Seria tão bom poder vê-lo novamente! Mas eu já o tinha visto, não queria que Edward ficasse aborrecido com minhas constantes visitas ou ficasse assustado com a estranha necessidade que pareci desenvolver. Por fim me recolhi lendo as Fábulas de Esopo apenas para me fazer sentir sono. Dormi rapidamente.

...

-É por isso que odeio hospitais públicos! Por que, ao invés de pegarmos os exames de Bella no hospital de nossa cidade, temos que ir para o hospital da cidade vizinha? – Minha mãe? O que era isso? Eu estava sonhando?

-Já deveria estar acostumada com isso, Renée. Ao menos conseguimos com que Bella fizesse o exame. Saberemos o porquê de suas constantes dores de cabeça. –Era meu pai desta vez. Fui transportada para o dia em que eu sofri o acidente que culminou na morte dos meus pais. Eu olhava a tudo, o interior do nosso carro, a música brega tocando no som do carro, a chuva torrencial do outro lado. Mesmo sabendo que era um sonho e que isso não os traria de volta, eu tentei. Tentei gritar para meu pai manter a atenção na pista, para ter cuidado com o caminhão que viria para cima de nós. Minha voz não saiu e mais pais não me notaram lá atrás. Foi então que o carro perdeu o controle, mas notei pela primeira que vez não foi um caminhão a perder a direção e vir para cima de nós, foi o meu pai que se voltou para a outra pista abruptamente. Por que ele fez isso? Por que foi na contramão? Por que ele se desviou de um rapaz que estava parado na rua. A conseqüência de sua tentativa em salvar o jovem foi jogar nosso carro de encontro ao caminhão que, após bater na lateral do nosso carro, nos jogou para um pequeno precipício da curva.

Eu acordei com os olhos transbordando em lágrimas, um soluço preso a garganta. O que foi tudo aquilo? Eu não deveria ter me lembrado daquele dia, havia tido amnésia pela lesão na cabeça que sofri. No entanto parecia que as lembranças tinham vindo para me atormentar. Levantei-me tremula, julguei que teria de tomar algum calmante e assim desci para a sala. A casa estava escura, todos dormiam. Após ligar a luz da sala vi em um relógio de parede que era três da manhã. Ótimo! Provavelmente eu não voltaria a dormir. Tomei dois comprimidos de um calmante qualquer e fiquei bebendo por mais tempo que o necessário água. Foi naquele momento que vi pela vidraça da janela da sala, que não estava coberta pela cortina, que a porta da caminhonete de Billy, a Chevy 53 vermelha desbotada, estava aberta. Estranhei. Billy tinha se esquecido de fechar ou algo assim? Com um suspiro eu deixei o copo na pia e abri a porta da sala para poder fechar a porta do carro. Ainda experimentei chamar Billy, talvez ele tivesse saído de casa para procurar algo no carro. Quando me aproximei do veiculo vi que não tinha ninguém. Felizmente tudo estava no carro então ele não tinha sido roubado ou algo assim. Fechei a porta e então senti algo atrás de mim. Virei-me bruscamente para não encontrar nada. Afastei-me do carro e olhei em todas as direções com a nítida impressão de que estava sendo observada. Comecei a caminhar lentamente para a porta. Foi rápido. Eu senti algo me atingir como um carro e jogar-me a alguns metros de distancia da casa de Billy. Eu fiquei tão desorientada que fiquei parada como morta no gramado enquanto o ar entrava dolorosamente pelos meus pulmões. Fechei rapidamente meus olhos e quando os abri eu estaquei. Diante de mim estava uma feição pálida, olhava-me com fascínio e doença, os olhos rubros em minha direção. Ele não era o Edward, era alguém desconhecido, mas estranhamente familiar. Com os olhos atemorizados, eu o encarei enquanto o corpo do rapaz inclinava-se mais para mim, ainda de pé, apenas o tronco abaixado. Ele tocou levemente minha bochecha com uma de suas mãos frias e falou:

-Achei enfim a minha menininha.

Enquanto sentia aquele toque e meu coração pulsava dolorosamente no peito eu soube quem era aquele desconhecido. Era o rapaz que estava no meio da estrada, o rapaz que meu pai tentou poupar ao custo de sua vida e da vida de minha mãe, o rapaz que, sem querer, matou meus pais. Mas o pior de tudo foi perceber quase de imediato que eu não estava diante de um humano, eu estava diante de um vampiro.

 


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Notas finais do capítulo

Deixem 10 reviews que posto mais hoje. o/