Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 177
E assim começa o dia...


Notas iniciais do capítulo

Agradeço de coração a Tsubakiy e ao seu noivo pela ajuda com meu computador. Foram super carinhosos e atenciosos ao me ajudarem a escolher as peças certas e até a economizar na compra, indicando-me uma loja. E detalhe gente, foi ela que ofereceu ajuda e isso foi especial para mim. E é por isso que eu dedico este capítulo de retorno a ela.



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# 06/04 #

Era sábado. O celular de Nathaniel despertou cedinho, como todos os sábados. Ele esquecera de desativar a função “despertar”.

Apesar do desânimo, ele levantou, foi ao banheiro, higienizou-se e foi para a cozinha. Foi a primeira vez que ele ficou feliz por não ver Clara naquele cômodo da casa. Ele não queria falar sobre sua tentativa frustrada de se declarar para Emília.

Ir se deitar sem jantar fez seu estômago reclamar de fome logo nas primeiras horas da manhã; mas mesmo o pão de iogurte que Clara se preocupou em assar antes de sair nauqela manhã, bem cedinho, pensando no desjejum dele, o fez esquecer, por um segundo que fosse, o que vira. Se Clara não errou no preparo da massa, o paladar daquele desiludido estava falho, pois o pão lhe pareceu sem sabor. Uma única fatia foi o que comeu, forçando-se; o suco ele acabou virando na pia, tendo bebido apenas metade do que havia no copo.

Depois que lavou a pouca louça que sujou, voltou para seu quarto e aninhou-se na cama. A única coisa que o reconfortou naquela manhã foi o fato de não ter que ir a escola. Ele não ia conseguir encarar aqueles dois, não naquele dia.

Não demorou muito seus olhos já estavam pestanejando. Dormir não o permitiria lembrar, então cedeu ao cochilo.

 

***

 

— Nathaniel. — chamou-o carinhosamente, sentando ao lado dele na cama. — Acorde filho. Já são 8h00. Temos que ir ao clube.

Nathaniel despertou com o mesmo desânimo, dizendo a mãe que estava apenas cansado.

— Eu o deixaria descansar, filho, porém nosso evento é no próximo sábado e ainda temos muito a fazer. Mas prometo que não vou deixar as “meninas” te explorarem hoje. Agora me fala, o que você quer para o déjeuner?

— Já tomei o café da manhã, mãe. Eu acordei cedo, mas depois de comer voltei pra cama. — contou enquanto abria a gaveta da cômoda, em busca de algo para vestir, pois ainda estava com a roupa da noite anterior.

— Então tome um banho rápido e apronte-se que logo sairemos. E não esqueça de ligar para seu colega. — Nathaniel havia, por um momento, esquecido que Castiel e ele teriam que trabalhar juntos até o dia do evento, como castigo por terem trocado socos na escola.

“Tomara que aquele idiota não me provoque hoje.” Pensou o rapaz enquanto via a mãe sair do seu quarto. Ele não seria tão paciente.

Ao ver o nome do colega de turma no visor do celular, Castiel torceu os lábios com cara de poucos amigos e atendeu a ligação. Ele sabia do que se tratava e até mesmo por isso levantou cedo. Nathaniel disse que eles o pegariam em casa, mas este recusou, dizendo que os encontraria lá. Depois de desligar ele foi atrás do tio.

— Porra, moleque. Você tem ideia da hora que eu fui dormir? Sacanagem tu me acordar agora só pra te dar uma carona. — reclamou Kage, irritado e sonolento. Ele havia passado boa parte da madrugada dedilhando seu violão, compondo. — Tua bicicleta é enfeite de parede por acaso?

— Se não quer me levar não leva, mas não vem falar merda pra mim! — retrucou Cast, saindo do quarto. Ele já odiava pedir favor, então levar recusa acompanhada de alguma ironia era como lhe dar uma bordoada.

Antes dele sair da escada e pisar na sala, o tio saiu do quarto, ainda nu. Cast já estava acostumado com ele andando pelado pela casa em alguns momentos. Desde que fosse só em alguns minutos do dia, não se incomodava, pois apesar dele mesmo apreciar deixar o "pequeno Cas" livre enquanto dormia ou noutros momentos do dia - vantagens de morar sozinho -, ficar olhando para o tio pelado a toda hora não era nada interessante.

— Espera, Cast. Eu te levo.

— Esquece. Não precisa. Vou de bike! — respondeu grosseiramente. — Vá dormir!

— Não banca o boca dura comigo, moleque. Você me acordou porque queria carona, então não vem com graça. — rebateu o metaleiro, indo para o banheiro do corredor.

— Eu, com graça? Você se recusou a me levar porque quer dormir, então vá dormir que eu posso me virar sozinho! — continuou retrucando, sentado no sofá, a espera da sua carona, com um sorriso querendo se formar no canto da boca. Kage não respondeu; estava ocupado com seus dentes e seu cabelo. Mas ao sair do banheiro, do alto da escada, fez sua exigência.

— É bom você fazer o meu déjeuner, pois se pensa que vou te levar para algum lugar sem comer antes, pode tirar o cavalinho da chuva!

— Vai ter que se contentar com torradas e leitinho! — respondeu Cast, para provocar, indo para a cozinha.

— Se você se contentar em pedalar, por mim, tudo bem! — o tio rebateu.

Castiel apenas riu. No final, ele havia conseguido sua carona.

Depois de vestir um jeans preto surrado, uma camiseta do Jimi Hendrix e seu velho All Star cano médio, Kage foi fazer o seu desjejum. Ele imaginou que Cast ia fazer apenas umas torradinhas básicas e passar um café, mas o garoto resolveu fazer um agrado.

— Opa. Torradinhas, cream cheese, vitamina e ainda tá fazendo uma omelete com cebola e tomate picado. — comentou, sentando-se. — Se servir no meu prato te levo e ainda te busco!

Castiel não disse nada, apenas desligou o fogão, pegou a frigideira e levou para a mesa, colocando metade da omelete no seu prato e a outra no do tio, jogando-a na pia, de onde estava, e sentando para comer. Kage não resistiu.

— Tu é muito chien[1] mesmo, em moleque. — zoou-o, querendo dizer que ele estava se prostituindo por uma carona de moto.

Cast espetou o garfo na omelete do tio, com cara de pouco caso, na intenção de pegar de volta, mas Kage segurou a mão dele e rosnou, mostrando os dentes. Cast não aguentou e riu.

Depois de comerem eles saíram, pois Castiel não queria chegar atrasado. Ele não queria dar motivo para a mãe do CDF lhe chamar a atenção.  Enquanto guiava a moto o celular do Kage tocou e ele pediu ao sobrinho para atender.

— É a Marg. — disse ele ao tio enquanto ouvia o recado que a vocalista da Broken Mirror lhe passava. — Ela está dizendo que o ensaio vai ser na casa dela e não na do Jordan, como combinado.

Kage apenas deu um joinha e Cast encerrou a ligação, reclamando assim que desligou o aparelho.

— Porra, Kage! Você tem ensaio hoje e nem me falou nada. — guardando o aparelho no bolso da sua jaqueta, pois era mais fácil que encaixá-lo de volta no bolso traseiro da calça do tio.

Castiel adorava ver o tio tocar, fosse num ensaio ou apresentação. Ele sentia que ali era o seu lugar. Assim como Kage adorava compartilhar aqueles momentos com ele. Quando pequeno, os avós, ou o pai sempre que podia, o levava em algumas apresentações abertas, como em parques e praças. Porém, ele só pisou pela primeira vez num Rock Bar com o tio no verão pós-formatura, quando viajou com ele para Mônaco; e mesmo assim, uma única vez, pois quando os pais souberam que ele estava na garupa do tio, proibiram este de levá-lo naquele tipo de lugar. Como já tinham ido, não dava para desfazer a experiência, mas Kage acatou a ordem da cunhada e não pisou mais nos bares durante a viagem, tocando nas ruas e praças para conseguir os frics - que chegava fácil na case dele. Mas assim que se emancipou uma das primeiras coisas que o rapaz fez foi ir a um Rock Bar ver uma apresentação oficial da Broken Mirror.

— Foi mal, Cassy. Com tudo o que aconteceu com seu amigo eu esqueci de te falar. — justificou-se. — Mas não quer dizer que não vou te levar comigo. Além do mais, a Isa esta doidinha pra te ver de novo. — comentou, rindo.

Cast apenas deu um sorrisinho malicioso e não falou nada, terminando aquele percurso em silêncio. Isa, filha mais velha de Marguerite, de 19 anos, gostava de dar uma atenção especial ao sobrinho do líder, guitarrista e 2º vocal da BM, que por sinal, adorava a atenção que recebia. Tanto Kage quanto os outros membros, inclusive Marguerite, gostavam de perturbá-lo quando ela não estava com eles.

Minutos depois Kage o deixou na frente da sede do Valst Club e depois de pedir para ele ligar quando fosse para ir buscá-lo, foi embora.

O clube já estava aberto, de certo Nathaniel já estaria lá dentro, assim como sua mãe, aquelas senhoras assanhadas e possivelmente, Ambre.

— Ninguém merece... — resmungou, colocando a mão embaixo da blusa, pegando sua latinha metálica azul, cheinha do seu cigarro favorito e que escondeu no cós da calça.

Estando o tio longe, ia aproveitar para relaxar antes de entrar naquele lugar. Como ele havia prometido ao metaleiro que ia parar de fumar, fazê-lo perto dele estava fora de cogitação, até porque este dava fim nos seus cigarros. Logo na segunda tragada ele sentiu os ombros ficarem mais leves e um meio sorriso ganhou seus lábios. Ele sabia que era psicológico, mas já que o humor era uma reação mental, estava valendo. Na terceira tragada ele fechou os olhos e curtiu o momento, rindo ao pensar no que o tio faria se o visse.

Na visão do Cast, Kage não conseguia entender que ele não fumava mais como antes, acabando com uma caixinha em menos de uma semana, já havia um tempo que ele era apenas um fumante ocasional e que fumava coisa de 1 ou 2 cigarros por dia, no máximo, e às vezes ele até conseguia ficar sem fumar nenhum, bastava o dia ser perfeitamente tranquilo - o que raramente acontecia em se tratando do Castiel, claro.

Para Cast o cigarro era só algo que ele usava para dar uma relaxadinha básica, geralmente no final do dia, antes de dormir. Claro que quando ele passava por situações que o deixavam preocupado ou estressado, acabava ficando ansioso demais e isso o levava a fumar 1 ou 2, por vezes até 3 cigarros a mais que seu normal, num curto intervalo de tempo e por vezes, seguidos, acendendo um na bituca do outro. Mas naquele momento não era o caso, pois seu amigo já estava de volta e socá-lo, embora tenha sido um exagero de sua parte, o ajudou a desestressar; sendo assim, ele só precisava relaxar, pois sabia que aquela manhã seria difícil, principalmente se Ambre também resolvesse "ajudar".

É como dizem... Alegria de pobre dura pouco. Enquanto, totalmente relaxado e encostado no poste, dava mais uma tragada no seu Dankill, levou um tremendo susto ao ouvir aquela voz melodiosa no seu cangote dizendo:

— Joga essa merda fora! — num tom calmo.

Cast nem viu quando o tio chegou de sorrateiro e parou atrás dele.

Achando que o garoto já estava dentro da sede do Valst Club Kage estacionou há uma quadra dali, pois apenas membros do clube podiam estacionar na frente do local.

— Cof cof. Porra, Ka-age!— reclamou, engasgado com a fumaça que acabou engolindo. — Você saiu de onde? — afastando-se, ressabiado. — E o que você quer? Por que voltou aqui?

— Você ficou com meu celular, seu noob. — contou, — Passa ele pra cá! — indo na direção dele, que se afastou um pouco mais, levando o cigarro a boca. Fazia alguns dias que Cast não fumava, ele precisava daquelas tragadas. Ele até apagaria, mas sabendo que a possibilidade dele conseguir fumar outro no decorrer daquele dia era mínima, não ia jogá-lo fora sem desfrutar o máximo que pudesse. Ele já ia levar uns cascudos mesmo, então que valesse cada croque.

— Você que o esqueceu comigo e eu que sou o idiota? — retrucou soltando a fumaça, pegando o celular do bolso da jaqueta, sem desviar o olhar do tio, pois sabia que era uma piscadela e ele lhe dava o bote. Ele o soltou no chão e chutou na direção do metaleiro, porém, o pequeno aparelho parou no meio do caminho por conta da irregularidade de alguns pisos da calçada.

— Você tá achando que meu celular é aquela merda que você carrega no bolso? Se danificar esta porra eu te quebro! — ameaçou, pois além de todos os seus contatos estarem apenas na agenda do celular, sua agenda de compromissos também estava, mas Cast apenas riu. — Pega essa porra do chão e dá na minha mão!

— Eu tenho cara de caneton[2] agora? — ironizou Cast levando o cigarro a boca. Cada tragada que ele dava Kage contabilizava em sua mente para saber quantos cascudos o moleque levaria, — Pega você! — em dobro, só pela petulância. — E pra mim, meu celular está ótimo! — até parece — Mas se te incomoda tanto, me compra outro.

— É claro que pra você aquela porcaria que vive descarregado ou sem sinal está ótima.  — disse Kage, indo até o aparelho para pegá-lo, levando Cast a se afastar rápido, quase engasgando com a tragada novamente, mas por rir, pois tendo o celular na mão, ou Kage iria embora ou o pegaria, desta forma, era melhor não se arriscar. — Ainda está dando pra tirar self de uma belle milf. — tirou onda, com um sorriso malicioso nos lábios, abaixando para pegar o celular. Mas ao voltar os olhos para o sobrinho viu que a brincadeira havia perdido a graça. A expressão no rosto dele deixou-lhe claro que este não havia gostado daquele comentário, pior, que o incomodara muito.

— Foi mal, Cassy.  Falei demais. — desculpou-se, mas Castiel não rebateu, apenas deu uma tragada mais longa no cigarro e jogou o que sobrara no chão, pisando em cima, soltando a fumaça ao passar pelo tio para voltar à frente do clube.  O melhor que ele tinha a fazer é entrar e trabalhar.

Kage odiava que soltassem fumaça de cigarro ou de outras porcarias na cara dele, e Castiel sabia disso, fazendo aquilo apenas porque estava possesso. Ao sentir o tio pegar no seu braço ele pensou que ia tomar um sacode ali mesmo, sentindo uma pequena palpitação, pois seria uma situação vergonhosa para ele tomar um esporro do tio e quem sabe, uns cascudos justamente no momento em que algumas senhoras do clube haviam chegado ao local. Bom, pelo menos o CDF e a mãe dele não estavam ali. Porém, para sua surpresa, não foi isso que aconteceu.

— Porra, Cassy. Está com raiva, então briga, xinga, mas não manda mais uma dessa pra cima de mim não, porque da próxima vez eu não vou deixar passar! — repreendeu-o, sem se alterar, pois embora não entendesse o motivo do sobrinho ter se irritado tanto com o que dissera, percebeu que o havia chateado de alguma forma, então relevou a falta de respeito.

Cast puxou o braço pra se soltar, ainda de costas para o tio, pois não queria papo com ele naquele momento, mas este não o soltou e se aproximou, soltando enquanto passava o outro no pescoço dele, num abraço.

— Liga quando for pra eu vir te buscar. E esquece o que eu falei. Ok!?

Kage era desbocado, debochado, irônico e até sarcástico, assim como o sobrinho; por vezes não media as palavras e falava algo que magoava, pois como ele não se magoava por qualquer coisa, esquecia que os outros não eram como ele. Mas diferente do sobrinho ele não protelava para se desculpar, principalmente se a pessoa que ele chateou fosse justamente o Castiel, única pessoa que ele não queria magoar, decepcionar, chatear ou ferir de alguma forma, nunca.  Aquele garoto era sua motivação de vida.

— Bom dia, rapaz. — cumprimentou-o uma das senhoras que chegara naquele instante.  Era Graziela, avó do Nathaniel. Rapidamente ele se afastou do tio, que após cumprimentar aquela senhora, foi em direção a sua moto. Em casa ele conversaria com o sobrinho.

— Bom dia, Sra. Chevalier. — cumprimentou Castiel, sem muito entusiasmo.

— Que bom encontrá-lo aqui fora, rapaz. Preciso que me ajude com umas caixas. — disse, entregando-lhe as chaves do carro, dizendo-lhe onde este estava estacionado e que modelo era.

Cast sentiu que, novamente, ele seria o burro de carga daquelas senhoras, enquanto o CDF faria coisas mais leves, por ser o "queridinho".

— Vou entrar e pedir ao meu neto que o ajude, para não ter que fazer duas viagens.

— Não se preocupe, meu tio me ajuda. — disse. — Não é, tio Breno? — elevando um pouco a voz para o tio o ouvir, pois este já estava a poucos passos da moto. Este apenas olhou para trás e gesticulou, sem saber o que Castiel queria.

Cast gesticulou com a mão, chamando-o, e Kage foi até ele.

— Que bom. São as caixas brancas, no porta malas. Quando as trouxerem para a sede, coloque-as sobre uma das mesas de trabalho. Depois verei o que faço. — orientou-o, entrando em seguida na sede.

Ao se aproximar, Kage perguntou o que o sobrinho queria.

— Tenho que carregar umas caixas lá pra dentro e você vai me ajudar! — contou, sem perguntar se ele queria ajudá-lo, indo em direção ao estacionamento privativo da outra rua. — Anda logo, Breno!

Kage apenas riu e o seguiu. Pelo menos já estava falando com ele, que é claro, carregou duas caixa, enquanto o sobrinho, uma, e estas não eram leves. Para "melhorar", Cast andou rápido para a sede, deixando o tio para trás, com o peso dobrado nos braços.

Ao colocar a caixa sobre uma das mesas a avó do Nathaniel agradeceu e ao mesmo tempo, desculpou-se, pois sua nora ainda não havia chegado e Castiel teria que pegar as máquinas de costura sozinho, pois elas não podiam esperar Nicole chegar com o filho para iniciarem o trabalho. Mas ao invés de se irritar, Cast apenas sorriu.

— Não se preocupe. Meu tio "Breno" vai ficar para ajudar. — disse a ela, levando Kage, que entrava na sala a olhar para ele com cara de interrogação. — Quando contei que apenas seus netos e eu estávamos ajudando ele se ofereceu e por isso veio comigo.

— Que maravilha! — alegrou-se aquela senhora, pois quanto mais voluntários de braços fortes, mais o trabalho rendeira.

Depois de colocar suas caixas sobre uma das mesas, Kage se aproximou do sobrinho pensando no quão filho da puta aquele moleque era, por saber que ele ia voltar para cama ao chegar em casa, pois tinha dormido pouco e à tardezinha eles iriam para Mougins. Graziela agradeceu sua boa vontade em ajudar, chamando-o de Breno, para sua aflição e alegria do sobrinho, que não escondia o ar de satisfação.

— Você me paga, moleque! — sussurrou Kage no ouvido do sobrinho, enquanto iam pegar as máquinas de costura para arrumar sobre as mesas destinadas a este trabalho. Ele não se importaria em ajudar se o tivessem avisado antes, pois ele não teria virado a madrugada acordado sabendo que trabalharia durante o dia e à noite teria ensaio. Cast apenas o olhou com desdenho e adiantou o passo.

Enquanto eles pegavam não apenas as máquinas, mas as caixas com aviamentos, tecidos e retalhos, Nicole chegou com os filhos e sua cara não era das melhores. Ela odiava se atrasar, ainda mais quando a sogra estava presente, pois sabia que esta não ia deixar passar batido, mesmo ela tendo ligado para a mãe avisando do atraso. Nathaniel foi direto caçar o que fazer, sem ninguém mandar, indo ajudar Castiel e Kage.

Assim que Nicole cruzou com Graziela esta não se calou e a repreendeu, pois sendo ela a responsável pela organização daquele evento, não podia se dar ao luxo de chegar depois de todo mundo.

— Não é pra tanto, Graziela. Sabe que minha filha teve um contratempo antes de sair. — justificou Adélia, olhando para Ambre, que nem se manifestou. Por ter comido todos os seus maracons antes de dormir e ainda ter comido alguns do irmão no café da manhã, teve uma dor de barriga, obrigando a mãe e o irmão a esperar ela se "aliviar", tomar outro banho e escolher outra roupa.

— Não justifica, Adélia! Sua filha podia ter vindo com o Nathaniel e deixado Ambre em casa. As responsabilidades vêm na frente de um probleminha... tão banal! — quando se tratava da nora, aquela senhora não dava trégua. Este era o preço que Nicole pagava por ter se casado com o filho dela. — Por sorte todo mundo aqui já sabe o que tem que fazer, do contrário, estaríamos ociosas até o presente momento.

— A senhora não precisa me lembrar das minhas responsabilidades, minha sogra. Eu cuido dos eventos desta unidade do Valst há muito tempo e sei bem como conduzir as coisas, tanto que não precisou eu estar presente para que vocês se organizassem. Todas sabem o que fazer porque foram bem orientadas quando começamos a trabalhar.

— Por favor, Nicole. Não seja indelicada com sua sogra. — repreendeu-a sutilmente. Adélia fazia de tudo para evitar um confronto entre aquelas duas, pois toda vez que elas brigavam o genro se estressava e acabava se aborrecendo com a esposa. Ele também brigava com a mãe, mas não mudava o fato dele brigar com Nicole.

Ambre olhou para a mãe, prevendo o que vinha a seguir. Aquelas duas não conseguiam dividir o mesmo espaço por muito tempo sem brigar.

— Então mãe, o que eu vou fazer hoje? — perguntou, querendo evitar uma discussão entre sua avó e sua mãe, pois o atraso tinha sido culpa dela e se elas brigassem, seu pai iria saber e ia acabar sobrando para ela. O pai podia até ser um amor com ela, mas quando algo que ela fazia gerava conflito entre aquelas duas mulheres, não tinha biquinho, ele a castigava. Claro que sempre era um castigo leve, como ficar sem celular ou não poder sair com as amigas num final de semana, mas como sua mãe já estava meio virada com ela, era melhor não arriscar.

Nicole respirou fundo e pediu à filha que ajudasse com os chocolates.

— Mas eu não sei fazer chocolates, mãe.

— Venha, querida. Ajude a vovó na costura.

Nicole odiava quando a sogra passava por cima dela, mas antes de reclamar e fazer a filha ir para a cozinha, Adélia endossou o pedido da outra avó e mandou Ambre para a costura.

— Ótimo, leve-a para a costura, Graziela. Do jeito que essa mocinha é, tê-la na cozinha só atrapalharia o trabalho.

Ambre nem pensou, pegou na mão da avó e foi para a sala usada para a costura, pois sabia que Cast estaria lá com seu irmão, montando as máquinas.

Nicole estava uma pilha de nervos, mas seguiu o conselho da mãe e deixou a sogra de lado, indo ajudar as mulheres que estavam recheando as pelúcias com manta acrílica.

Enquanto isso, Cast carregava a última máquina de costura e Kage carregava as caixas brancas que haviam pego no carro mais cedo, para as mulheres que faziam as embalagens.

— Que merda! — reclamou Kage, irritando-se com o próprio cabelo que não parava de incomodar. Como estava com as 3 caixas nos braços pediu ao Cast para trançá-lo.

— Ah, tá de sacanagem comigo. Trança você mesmo! — reclamou, achando folga o tio querer que fizesse aquilo, sendo que ele mesmo podia fazê-lo.

— Porra, moleque! Custa você fazer isso pra mim? Estou com as mãos ocupadas se não reparou?

— Também estou! Então, se eu posso colocar a minha caixa no chão pra amarrar o seu cabelo, você também pode fazê-lo.

— Se você não sabe, essa porra é muito mais pesada que essa maquinazinha do século passado que está carregando. Não vou foder minha coluna abaixando para pegá-las de novo. — irritou-se , contendo-se para não bradar, pois havia senhoras na sala ao lado, aproximando-se dele para falar baixinho. — Trança logo essa porra pra mim ou a hora que estivermos em casa vou te dar um sacode, fils de chienne. 

Cast olhou para a cara fechada do tio, com uma expressão igualmente fechada, como se fosse peitá-lo, passando por ele. Kage pensou que ele ia deixá-lo ali, mas ao invés disso sentiu um puxão no cabelo.

— Você é chato pra caralho, sabia Breno. — reclamou enquanto trançava o cabelo do tio, puxando-o - como se o tio se incomodasse com alguns puxões de cabelo.

— Pois as mulheres me acham adorável.  — falou o metaleiro com um sorriso jocoso, para o seu sobrinho marrento. — E lindo, e sexy...

— Isso porque você não dá tempo delas te conhecerem melhor. — rebateu o ruivo, prendendo a trança com o elástico de cabelo que tinha no pulso.

— E quem conhece alguém tão bem nessa vida, moleque? O que importa é que o que elas conhecem de mim, elas amam...

— Amam porque tu é vira-lata e dificilmente uma mulher resiste a um vira-lata sem dona, perdido pela rua, limpinho e cheirosinho com cara de "faminto". — rebateu novamente, pegando a máquina do chão.

— É isso ai, vira-latinha do titio. Não me colocando uma coleira eu até abano o rabinho. — brincou, balançando a trança.

Cast segurou o riso, pois não queria dar ponto para o tio, deixando-o com sua graça. Kage sentiu-se mais leve. Enfim, ao que parecia, os dois estavam de boa novamente. Pelo menos até a próxima mancada de um dos dois.

 

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Notas finais do capítulo

[1] Chien - Cão. Na gíria tem peso pejorativo, como puto, prostituto, cachorro. O feminino é chienne (cadela - puta, prostituta)

[2] Caneton: Pato/ patinho. Em ESB vamos usar como giría para pato no sentido de otário.

[3] Sacode - na gíria quer dizer tomar um chacolhão ou apanhar.



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