Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 176
Coração ferido


Notas iniciais do capítulo

Foi difícil entrar no coração do Nath...
Capítulo todo escrito ouvindo as músicas da Annie Villeneuve, cantora que o loirinho curte muito e que me inspira e senti-lo. O toque do celular dele é uma musica dela.
Quer sentir o capítulo como eu senti? Leia ouvindo a playlist do spotify: https://open.spotify.com/artist/4UIM7xyslKU8ufDGXcRDpa



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# 05/04 # 

 20 minutos era o tempo de caminhada da casa de Nathaniel para o prédio que Emília morava. Mas ele preferiu caminhar devagar, buscando coragem e calma, levando quase 10 minutos a mais. E a cada passo ele lembrou dos momentos que a teve pertinho dele. O dia em que a conheceu e recebeu dela seu primeiro abraço, apenas por prometer que iria deixá-la trocar a foto antes de mandar fazer seu cartão de aluna do S.A. Se alguém lhe dissesse naquele dia que aquela novata iria ocupar seus pensamentos e seu coração, de certo não acreditaria. O dia na arquibancada, quando a abraçou e sentiu o coração bater de forma diferente simplesmente por vê-la chorar, sem nem perceber que algo estava mudando dentro dele; o dia na sacada daquele apartamento quando sentiu pela primeira vez o desejo de beijá-la, terminando por carregar aquele ruivo idiota nas costas. E a cada lembrança, mais ele tinha certeza que precisava dizer a ela o que sentia.

Assim que parou na frente da entrada para a Chemin du Fort Thaon e que ficava de frete para a Corniche André de Joly, Nath sentiu um frio na espinha e o pensamento que veio a sua mente foi que os próximos passos que daria definiriam sua vida, não toda ela, mas os dias, semanas e quem sabe meses a seguir.

Ele desceu os degraus que davam acesso ao corredor de pedestres da Chenin e seguiu em direção ao prédio em que morava aquela que por mais que tentasse não conseguia tirar do pensamento. E foi a lembrança do dia do concurso que o fez sorrir. Apesar do ruivo, novamente, tê-lo atrapalhado, ele conseguiu sentir o doce gosto de morango que os lábios dela tinham, mesmo que num selinho roubado. Desde aquele dia que o que ele mais queria era sentir, por um tempo longo, o sabor daqueles lábios; lábios estes que adocicavam a boca de certo poeta.

O coração de Nathaniel só batia daquela forma quando, por algum motivo, sentia que havia desapontado o pai. Ele estava, de certa forma, preparado para não encontrá-la e até para ser rejeitado; mas ele não estava preparado para o que viu. A garota que adornava seus pensamentos envolta nos braços de outro, de lábios colados. Sua respiração ficou mais rápida, tomado por uma sensação que lhe era nova e desagradável. Ele não queria ser visto, então se virou e saiu dali, deixando a sacola com o coelhinho feito por sua avó pendurada num dos galhos dos tantos arbustos que enfeitavam os muros daquele lugar.

Enquanto, no desejo de encontrar Emília, ele caminhou devagar, buscando em suas lembranças a coragem necessária para dizer o que sentia, alimentando sua esperança, querendo acreditar que ela também sentia algo por ele, naquele instante ele caminhava rápido, no desejo de desaparecer, louco para esquecer o que vira e que matara suas esperanças, sentindo cada batida do seu coração como murros em seu peito. Ele sabia que ia sofrer caso Emília o rejeitasse, pois só a ideia disso acontecer já o machucava; mas não imaginou que lhe causaria aquela sensação.  Ela apenas estava beijando Lysandre, mas foi como se tivesse apertado o coração dele, causando-lhe uma dor que ele não conhecia.

A cada passo ele ficava mais angustiado, sentindo cada vez mais que não conseguiria segurar aquela dor. Ele queria e precisava chorar, mas segurou, travando o maxilar, buscando o ar para alimentar seus pulmões apenas com suas narinas. Ele queria dizer a si mesmo: “Não seja fraco, Nathaniel. Ela não tinha nada com você.” em voz alta, pois apenas pensar não estava funcionando, mas se verbalizasse tal afirmação fraquejaria e não conseguiria mais se controlar.

Rejeição. Este era o sentimento que estava corroendo o coração daquele jovem de madeixas douradas e que fazia o âmbar de seus olhos se apagarem em meio ao vermelho que o envolveu.

Ao chegar na esquina da rua onde morava, Nathaniel parou e olhou de longe para sua morada. Ele sabia que assim que colocasse os pés em casa fraquejaria, ainda mais se a mãe o abordasse. Ele seguiu caminho para o Clube Náutico da cidade, há poucas quadras dali, podendo entrar na área restrita por sua família ser sócia. Seu avô materno tinha uma pequena lancha, pois adorava pescar com os amigos. Não era nenhuma Prestige, mas servia a seus propósitos.

Sentindo o ar vindo de sobre as águas daquele vasto mar preencher seus pulmões, sentado no píer, a poucos passos da lancha do avô, Nathaniel deixou, enfim, as lágrimas rolarem. Por sorte o lugar estava vazio; ele não queria mais segurar, ele queria e ia colocar aquilo pra fora antes de voltar para casa. O que a mãe diria se o visse chorando? De certo iria ligar sua tristeza a tal garota da escola que ela desconfiava que ele estava interessado, transformando aquilo em mais um motivo para pegar no pé dele. O que diria sua irmã? Ele não aguentaria as piadinhas e ofensas, e perder a cabeça com a Ambre seria motivo de desavença com seu pai.

Seu pai. Quando ele achou que as coisas estavam começando a melhorar entre os dois, acontece aquilo. O que este pensaria ao vê-lo chorando por conta de uma garota? Pior, o que este pensaria ao saber que ele a perdeu, provavelmente, por ter demorado para entender o que estava sentindo por ela? Ele não queria parecer fraco e inseguro aos olhos do pai, não mais; não no momento em que ele o sentia mais próximo.

Quanto mais ele pensava, mais chorava, angustiado, sentado naquele píer, a poucos passos do mar e suas embarcações ancoradas lado a lado. A raiva que ele estava dele mesmo por ter sido tão inseguro era muito maior que o ciúme que estava sentindo do Lysandre.

“Se eu tivesse me decidido antes... Talvez..” pensou, cobrando-se, chegando a se perguntar se aquilo era castigo por ter magoado a Melody da forma que magoou, principalmente depois de ter tirado dela algo tão precioso aos olhos dele e da grande maioria das garotas.

Enfim, ele conseguiu, verdadeiramente, entender a dor que Melody sentia por amar alguém que não sentia o mesmo por ela, e mais, por saber que este alguém gostava de outra pessoa. Nada justificava a insistência dela, mas ainda assim, ele a compreendeu.

 

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Quase três horas depois...

— Não mexa nisso, Ambre. É do seu irmão! — ralhou Nicole ao ver a filha, pelo retrovisor interno do carro, pegando a caixa da confeitaria que fornece doces especiais para alguns restaurantes da região.

 — Eu só quero um, mãe. O cheiro me deixou com vontade.

— Você tem os seus. Estes maracons são do seu irmão!

— Ah, mãe, por favor. O Nath nem gosta de doces. — disse para a mãe, apoiando-se entre os dois bancos da frente do carro, com cara de garotinha aguada e a caixa com os maracons do irmão na mão.

— Não seja assim, filha. Você tem os seus e foi você mesma quem escolheu. Deixe os do seu irmão.

— Mas os meus são tradicionais e estes são da linha especial, papi. E é só um. Eu troco por um dos meus. — Ambre sabia que se o pai dissesse “tudo bem”, a mãe não ia mais negar.

— Nada disso! Você escolheu os seus e não pegou da linha especial porque não quis. Além do mais, você sabe que maracons tropicais de sabor cítrico são uns dos poucos doces que eu irmão gosta, por não serem adocicados. — mas Nicole nem deu tempo do marido responder. Ela ainda não tinha conseguido esquecer o que a ouviu dizer sobre Lysandre e do que ouviu sobre ela, do Coordenador Pedagógico da escola. — E você se esbaldou de sobremesa no “La Provence” para estar com vontade de comer alguma coisa. Isso não é vontade, é gula!

Jonathan ficou surpreso com a esposa por ela falar daquele jeito e ainda tomar a caixa das mãos da filha, mas não contestou. Ele perguntaria o que estava acontecendo quando estivessem a sós.

— Sua mãe está certa, filha. Depois, em casa, se ainda estiver com vontade, peça um ao seu irmão.

Ambre apenas fez cara de chateada, recostou-se novamente no banco traseiro do carro, atrás do banco da mãe, e voltou os olhos para a janela. Era melhor ela não testar a paciência da mãe, pois a balança não estava mais pendendo tanto para o seu lado. Se pelo menos tivesse seu celular poderia visitar seu instagram enquanto o pai dirigia para casa.

— Espera, papi! Aquele não é o Nath? — disse ao ver o irmão sentado num dos bancos do pequeno canteiro do parc Venier.

— Nathaniel? Onde? — faltavam poucos minutos para a meia noite e Nicole não gostava dos filhos na rua tarde da noite, ainda mais quando ela não sabia o destino deles. Nathaniel não tinha o hábito de sair sem se despedir dela e dizer onde iria. Ele ter feito isso despertou sua desconfiança. 

— Ali, sentado sozinho. — apontou. — Com cara de enterro.

Ouvir que o filho estava sozinho teria feito Jonathan ficar aliviado, pois se ele estivesse acompanhado de uma garota Nicole não aceitaria de bom grado e de certo, acabaria sobrando para ele que deu a autorização para o rapaz sair, mas ouvir que este estava com cara de “enterro” o fez sentir uma pontadinha no peito. Será que seu garoto havia se desentendido com a “namorada”? Pensou, mas antes de formular mais algum pensamento Nicole o fez dar ré.

Nathaniel levou um tremendo susto e levantou rapidamente ao ouvir a voz da mãe o chamando. Ele estava tão distraído com seus pensamentos que nem percebeu quando o carro do pai parou bem de frente ao banco em que estava sentado. Por sorte ele não estava mais chorando, tendo apenas os olhos vermelhos para denunciá-lo e a forte dor de cabeça para usar como desculpa.

— O-Oi, mãe. O que faz aqui? — perguntou, receoso.

— Eu que te pergunto. Por que ainda está na rua? Sabe que não gosto que passe a noite fora.

— E-Eu não ia passar a noite fora, mãe. Eu só estava caminhando pelo píer e perdi a noção da hora. Já estava voltando pra casa.

Já que mentir para os pais não era uma opção segura para Nathaniel, visto que ele sempre se denunciava quando fazia isso, sua alternativa mais viável foi contar apenas um pedacinho da verdade, torcendo para que a mãe não desconfiasse e fizesse mais perguntas.

Nicole conhecia as expressões do filho. Ele estava com os olhos vermelhos, um olhar pesado e uma expressão de desapontamento. Ela sabia que ele não estava com aquela cara por causa do pai, então só podia ser por conta da “talzinha” da escola.

— Que cara é essa, filho? Você está bem? Aconteceu alguma coisa?

O coração dele apertou com o tom preocupado na voz da mãe. Seria tão reconfortante sentir o abraço dela, mas ele não podia lhe contar sobre Emília, tampouco sobre o que havia acontecido. Mas também não podia mentir.

— Eu estou bem, mãe. Só estou com dor de cabeça. Não precisa se preocupar.

Nicole apenas olhou para ele, tocou seu rosto e disse para irem para casa.

Nathaniel entrou no carro, sentando atrás do banco do motorista, sem coragem de olhar para o pai, pois este sabia que ele tinha ido encontrar Emília. Ele tinha certeza que o pai sacaria na hora, só de olhar para a cara dele, que o problema era dor de cotovelo. Jhonatan o olhou pelo retrovisor, mas não perguntou nada.

— Chegando em casa trate de tomar seu remédio para dor de cabeça e ir dormir. — ordenou Nicole, ao entrar no carro. — É nisso que dá você sair pra bater perna ao invés de descansar. Seu dia foi puxado e você ainda não esta tão bem quanto quer me convencer.

Nathaniel não disse nada, apenas recostou-se no banco de forma a ficar confortável e fechou os olhos. 5 minutos depois já estavam em casa.  Ainda na garagem ele disse boa noite aos pais e se recolheu, querendo voltar a ficar sozinho. Nicole quis ir atrás dele, intrigada, querendo saber o que o incomodava, mas Jhonatan não deixou.

— Como você pode não se preocupar, Jhonatan? Está visível que ele não está bem. — falou, enquanto entravam na casa. Ambre foi direto para o quarto. Ela até queria sondar o irmão, mas sabia que este não abriria a porta para ela.

— Quando você vai parar de tratar o Nathaniel como um bebê, Nicole? Deixe de mimos.

— Mas ele está tão abatido.

— Nada que uma boa noite de sono não resolva, então deixe-o descansar.

Nicole conhecia o marido e sabia que não era comum dele não repreender o filho por ter passado das 22h00 na rua, mesmo tendo permitido sua saída. A não ser que ele soubesse onde e com quem o filho estava até àquela hora. É claro! Ele sabia e por isso estava tão tranquilo. Mas como podia ser? Assim como ela, Jhonatan não queria que o filho descuidasse dos estudos por causa de namoradinhas. Ele não podia ter mudado de opinião.

— Pare de me olhar com este ar interrogativo, Nicole! Estes seus excessos de cuidado com o Nathaniel já me incomodam o suficiente para ainda ter que aguentar este olhar de mãe desconfiada. — reclamou, querendo evitar que ela fizesse as perguntas que de certo estavam em sua mente. Ele seria obrigado a contar sobre o encontro do garoto e tudo o que ele menos queria era iniciar uma discussão sem sentido àquela hora da noite. — E além do mais, já está tarde e eu preciso dormir. Então, vamos para cama. — ele sabia que se a deixasse sozinha ela iria atrás do filho e uma noite estressante não estava nos seus planos.

— Agora não, Jhonatan. Vou ver se o Nathaniel está com fome. É bem provável que ele não tenha jantado e por isso está com dor de cabeça. — comunicou-o, dando-lhe as costas e indo atrás do filho antes que ele a impedisse.

Jhonatan meneou a cabeça e bufou, já prevendo a dor de cabeça que ele teria quando a esposa descobrisse que o primogênito estava enrolado com alguma garota. E lembrar que a mãe dele já sabia só o fez querer ir mais rápido para sua cama.  Nathaniel que se virasse com a mãe; afinal, ele já era um homem e tinha que aprender a lidar com o ciúme dela. Para ele, já bastava a própria mãe, que vivia em pé de guerra com Nicole, que para sorte dele encontrou o filho dormindo. Ela deixou a caixa de maracons sobre o criado mudo, beijou-lhe a face e foi se deitar. Assim que a porta se fechou atrás dela, ele abriu os olhos e se virou, dando as costas para a porta, fitando a janela, cuja luz que vinha de fora iluminava um cantinho daquele quarto. Ele podia levantar e fechar a cortina, mas faltou-lhe ânimo. Ele queria dormir, mas o sono não o abraçava. Os únicos braços que o envolviam naquela noite eram os da tristeza. Seu travesseiro já estava acostumado em aparar suas lágrimas silenciosas, mas aquelas foram as primeiras não motivadas por algum membro da sua família.

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Notas finais do capítulo

Será que nosso loirinho vai superar isso? Será que ele vai desistir? O que Nicole vai aprontar? Será que Jhonatan vai dizer-lhe alguma coisa?...
"La Provence" é ficcional. Se existir algum em Nice, é mera coincidência...rs.




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