s.m.a

Mais tarde, desci do meu apartamento para ver Sophie cantando no cabaré. Como de costume, os homens gritavam enlouquecidos, provavelmente pela bebida, antes de cada apresentação.

_Oi, lindo.

E mais uma vez, como era de costume, uma das prostitutas que já me perseguiam desde o dia que pus os pés naquela vila, continuava a vigiar meus passos. Olhei para ela. Fedia à cerveja. Mas também cheirava à sangue.

Quase que não pude controlar minha sede no meio da rua. Sorte minha que havia descoberto um dia atrás aquela casa abandonada. Seria o lugar perfeito pra qualquer vítima que eu fizesse.

_Oi..._ disse, fingindo tirar dinheiro da minha carteira.

Ela sorriu, um tanto quanto bêbada. Levei-a para a tal casa cheia de ratos e baratas, com força.

_Hum_ ela ria inconscientemente, e o cheiro de cerveja cobria ainda mais minha visão.

08 Sophie

Eu estava ajudando Teresa_ uma das moças do cabaré_ a passar as roupas das meninas que se apresentariam mais tarde. Nesse momento, já havia aquela bagunça, típica dos homens que iam lá.

_Eu vi como você olha para ele, Sophie.

_E-ele quem? Teresa, não invente. Se isso chegar nos ouvidos do..._ nesse momento, minha mente involuntariamente invadiu a de Evan. Ele estava levando uma prostituta para a casa abandonada, e eu podia ter quase certeza pelos seus pensamentos_... É, Teresa, fique aqui, eu vou um pouco ali fora_ e saí andando.

Saí, ainda com minha roupa normal, sem estar vestida para a apresentação. Podia sentir seu cheiro vagando pela longa rua, o que me fazia sentir também o cheiro da tal mulher.

08 Evan

Descemos até o pátio. Era tudo tão escuro, a atmosfera era tão densa, que me lembrava meus novíssimos anos como vampiro.

Agarrei-a pelo pescoço, sem muitas delongas. Cravei meus dentes rapidamente, para que não doesse e ela não fizesse escândalo. Podia sentir o álcool subindo pelas minhas veias, mas não em grande quantidade_ não tanto quanto ela talvez tenha bebido.

_Esse é meu amigo_ ela sorria_ ele queria ter sua companhia por hoje.

Sophie aparece, de mãos dadas a uma outra prostituta.

_Mas enquanto ele se... diverte com a sua amiga_ Sophie me olhava de um jeito sedento, como se soubesse que eu estava somente à procura do sangue daquela prostituta, e que de fato aquela mulher já estava desmaiando, mas que ao mesmo tempo daria tudo para estar no lugar dela_ eu posso dar conta de você._ ela fingiu que iria dar um beijo na outra prostituta, mas logo se voltou a seu pescoço e cravou seus dentes nela também.

O sangue acabou em poucos momentos antes da mulher cair morta no chão. Meu corpo fervia a sangue, eu por inteiro sentia aquela dose inteira de sangue novo correndo pelas minhas seculares veias. Sophie sugou rapidamente o sangue da prostituta que ela tinha trago, ao ver que ela poderia tentar fugir, ao ficar assustada com sua "colega de trabalho" caindo no chão tão fria e duramente. Eu podia ver que naqueles delicados traços, surgia uma imensa vontade sendo sucumbida, algo como êxtase invadia os olhos negros de Sophie, e ambos estavam com a respiração acelerada, talvez pelo esforço para que as duas mulheres não fizessem barulho.

_Bom trabalho, Evan_ ela sorria, ainda ofegante.

Nós dois rimos. Quanto tempo teria se passado desde que eu pudesse repetir essas cenas novamente?

_Agora eu tenho certeza que você sabe ler mentes._ continuei rindo.

s.m.a

Agora havia três meninas no palco, duas dançando e uma outra cantando, obviamente não tão bem quanto uma outra que tinha séculos de prática.

E só nesse momento que eu reparei que Sophie agora era mais clara que nunca: seu mistério pairava sobre mim justamente por ela ser da mesma espécie. Eu jamais teria sentido a Sarah nos contrastes dela caso ela não fosse uma de nós, assim como também não teria visto seu encanto se fosse apenas uma mulher qualquer.

Uma coisa que eu havia esquecido de perguntar a ela: quantos anos ela tinha quando foi transformada. Sim, porque Sophie parecia ter 18 anos, e nesse caso ela ainda seria nova demais, e o vampiro que a transformou teria então cometido um crime. Porém se ela já tinha toda essa experiência quando foi transformada, creio que já sabia o que estava por vir.

s.m.a

_Bom, e como não poderia ser diferente_ a apresentadora sorria_, agora teremos a incrível apresentação de Sophie!

Todos aplaudiam e a apresentadora se retirou rapidamente. Ela era sempre a última a entrar no palco. Nem todos os dias, até porque havia outras cantoras trabalhando lá, mas quando era ela, sempre enchia mais.

Ela entrou no palco, dessa vez nem um pouco misteriosa. Não que ela havia mudado, mas meus olhos de vampiro viam as coisas do jeito que elas realmente eram dessa vez.

Um vestido preto, brilhante e curto era o que ela usava. Tinha seus cabelos dourados presos num coque, com uma rosa prendendo-o. Usava batom vermelho forte, assim como ainda usava seu mesmo colar. Andava pacientemente até o meio do palco, enquanto as pessoas aplaudiam-na de pé. Passeava por ali como se ninguém a observasse, e que ela teve tempo o suficiente para treinar. Mas ainda assim, esse argumento não invalidava sua beleza. A beleza de um vampiro que eu não soube ter.

_"Please don't talk about love tonight... please don't talk about sweet love."

E de repente, eu me lembro que ela poderia estar lendo a mente de qualquer um que estivesse ali. Inclusive a minha. Éramos presas fáceis, ingênuas, incrédulas.

Ela fazia sempre o mesmo todas as noites que se apresentava: cantava até o primeiro refrão no palco, depois saía para rodear o salão. E como continuei na mesma mesa dos fundos a qual me encontrei pela primeira vez, a cena quase que se repetiu por completo.

_"Please don't talk about love tonight... Your sweet talking won't make it right"_ ela vinha em minha direção_ "Love and lies just bring me down"_ parou em minha frente e se curvou, como quem quisesse que eu tivesse a atenção, sorrindo_ "when you've got women all over town"!_ saiu e foi em direção aos demais.

s.m.a

Encontrei-me com ela depois do show, quando as luzes já estavam apagadas.

_E aí, como me saí hoje?

_Linda. Q-quer dizer, cantou muito bem.

Não conseguia mais fingir que além de sua beleza presa em seus olhos negros, Sophie era cada vez ainda mais apaixonante. Tirando o fato de acreditar que eu realmente não tenho dom nenhum_ que por sua vez é realmente o dom de manipular as emoções das pessoas_, Sophie realmente sabia tudo de mim. Tinha-me na palma de sua mão.

Ela sorriu.

_Então quer dizer que seu dom é fingir que não tem dom?

_Então quer dizer que seu dom serve pra ficar me vigiando toda vez que estamos juntos?

Uma pausa. Ao fundo dava para ouvir os bêbados rindo com as dançarinas como uma forma de uma festa particular.

08 Sophie

Senti-me um tanto quanto culpada quando Evan disse tais palavras. Eu realmente não havia percebido que inquietava até mesmo seu passado longínquo dentro de sua cabeça, e que uma hora ou outra, todas essas memórias acordariam dentro dele e se transformariam em pesadelos durante suas noites mal dormidas.

_Ah, Evan, me desculpe... eu não quis te dar essa impressão, eu...

Fui interrompida com um beijo. Talvez tenha sido o beijo mais puro e angelical que havia recebido desde séculos. Mas não podia me entregar daquele jeito, mesmo que quisesse; era melhor para Evan e para mim.

_Evan!..._ disse, um pouco confusa e trêmula_ Eu, eu... tenho que ir.