Priston Tale escrita por Yokichan


Capítulo 18
Capítulo 17


Notas iniciais do capítulo

Um cap com musiquinha. q



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Obs: Os trechos abaixo são da música Paranoid Android, da banda Radiohead. Quem quiser ler escutando a música, aqui está o link: http://www.youtube.com/watch?v=fHiGbolFFGw&feature=fvst

 

 

 

Mystic POV On.

 

 

- Please could you stop the noise. I'm trying to get some rest... - cantava, perdida naqueles pensamentos enquanto o sol invadia meus olhos

 

"Por favor, dá pra você parar com esse barulho. Eu estou tentando descansar..."

 

 

         Caminhando quase sem rumo, como uma eterna forasteira, eu lembrava o quanto era nostálgica aquela vida. Aquele meu passado.

 

 

(Flashback On)

 

 

         "Vagando, perambulando pelos desertos sem fim, como se aquele meu trajeto fosse um círculo sem saída. Era daquele modo que eu vivera, desde que meu povoado fora destruído por chamas quando ainda criança. Ainda lembro-me do horror, afinal aquele pesadelo jamais me abandonou, mesmo quando eu acordava pelas manhãs, era como se eu ainda estivesse sonhando. Abandonada à um esmo remoto, eu sobrevivi nas piores condições humanas. Mendigando de um lado para o outro, atravessando planícies na esperança de um dia chegar no horizonte montanhoso onde o sol nascia todos os dias, eu aprendi a vencer. Aprendi a vencer a vida, aprendi a vencer a morte. A fome se tornou apenas uma companhia desagradável, o frio um amigo distante, o calor um amante inseparável. Eu havia suportado todas as calamidades do mundo, todos os horrores que me atormentavam enquanto sob o relento eu tentava fechar os olhos e imaginar que ainda era criança e que ainda estava em minha cama confortável aos cuidados de meus pais. Mas quando o vento frio assoviava aos meus ouvidos, uivando na companhia de uma lua que de bonita passou a ser assustadora, eu percebia que jamais seria capaz de sonhar coisas boas. A esperança se apagava de mim, assim como a cor dos maltrapilhos que um dia eu chamei de roupas. O mundo fora cruel comigo, por isso eu também seria cruel com ele, da mesma maneira. Com garras de uma águia, eu me segurei ferozmente à todas as minhas oportunidades, quase estrangulando-as como um animal voraz abate sua presa. Sozinha, imensamente sozinha. Durante longos e difíceis anos, eu vaguei por terras desconhecidas buscando um recanto, um abrigo onde eu pudesse fincar minhas raízes, mas por onde quer que eu passasse, haviam olhos estreitos sobre mim. 'Ela é uma andarilha, deve ser uma ladra! Vamos tirá-la daqui!', era o que eu ouvia pelas minhas costas. 'Vá embora, não há espaço para uma desconhecida em nosso povoado!'. Eu era expulsa, sem ao menos saber por que. Árduos anos, em que eu aprendi que a melhor companhia para mim era somente minha sombra, a única que não me abandonava, a que não me olhava com medo e receio. Como uma Fênix, eu vaguei levada pelo ar, tornando-me uma solitária forasteira. Imagino se ainda naquela vida, eu teria morrido, cansado de me agarrar à luz e me deixado abater. Teria sido mortal, se num fim de tarde eu não tivesse cruzado com um velho sábio nas sombras de uma floresta agradável. Ele olhou-me com seus olhos profundos, e ao contrário de todos os outros, não teve medo de minha presença. Não teve asco de minha aparência imunda, não teve receio de me acolher em sua cidade. Ele sorriu, como se não conhecesse pesadelos, e confortavelmente recebeu-me. 'Venha, minha pequena. Acho que temos um lugar aqui para você', foram as palavras que incrustaram em minha memória, aquecendo o pouco de esperança que eu tivera guardado para aquele momento. Verkan era seu nome."

 

 

(Flashback Off)

 

 

- I may be paranoid, but not an android. - cantarolava, de olhos fechados e o rosto inclinado para os raios quentes de sol; cantarolava, em uma nostálgica melodia

 

 

"Eu posso até ser paranóico, mas não um andróide."

 

 

         Era como se eu tivesse voltado a ser uma forasteira, sendo levada pelo vento desértico, pisando sobre as terras quentes de uma cidade desconhecida, arrastada por meus próprios instintos. O que mudava era o fato de que eu agora vestia belas roupas, carregava um grandioso arco e portava em meu coração um caloroso poder. Eu poderia voltar ao deserto remoto quantas vezes fossem necessárias, mas minha mente me lembraria de que então eu era alguém com um nome, com uma vida agradável. Eu era uma Archer de elite, e tinha uma cidade a qual eu pertencia, um lugar chamado Priston que eu aprendera a proteger. Ninguém além de mim conhecia melhor todos os caminhos e peripécias daquela continente, pois não havia lugar naquele mundo pelo qual eu não tivesse vagado. Um sorriso, agora satisfeito, preenchia meu rosto iluminado.

 

- You don't remember, you don't remember... Why don't you remember my name? - e minha voz saía embalada, talvez por minhas memórias, talvez pelo sol que inebriava-me docemente

 

 

"Você não se lembra, você não se lembra... Por que você não se lembra do meu nome?"

 

 

         Naquela melancolia - a mesma com que se vê pela décima vez um álbum de velhas fotografias - eu havia até mesmo me esquecido de que Hakuna estava ao meu lado, ou em qualquer lugar perto de mim. Talvez ela estivesse gostando da canção.

 

 

Mystic POV Off. Hakuna POV On.

 

 

         Era a primeira vez que eu presenciava Mystic cantando. Na verdade, era a primeira vez que eu presenciava qualquer pessoa cantando. Parecia algo bonito, mas triste. Imaginei no que Mystic estaria pensando, em que lembranças ela estaria recordando enquanto palavras embaladas fluíam de seus lábios com tamanho sentimento. Era algo sem nexo, ao meu ver, mas eu não poderia entender o que se passava no coração de outra pessoa. Cada um, sabe o que lhe dói e o que lhe agrada, então decidi não interromper aquele momento reflexivo. Porém, em alguma parte de nosso caminho, minha companheira Archer se virou para mim e me encarou sorridente, como se zombasse de qualquer coisa em mim. Eu sabia que aquele sorriso era o disfarce de uma tristeza.

 

- Yo, Hakuna. - ela chamou-me, um pouco na minha frente - Deixe de ser palerma. - ela riu divertida, correndo até mim

 

- Ahn, você estava tão distraída que resolvi não me meter. - argumentei com um doce sorriso enquanto a via se aproximar; meus pés flutuavam por efeito da magia que eu usava, a Ghost Angel, cuja eu invocava o espírito de um anjo alado que me permitia voar; era como eu "caminhava" junto de Mystic naquela viagem de um dia inteiro

 

- Ah, que nada. Só estava pensando no passado. - ela disse risonha ao postar-se ao meu lado para que prosseguíssemos - Hum, você está bem? - ela perguntou apontando para minha barriga

 

- Sim, não se preocupe. - amenizei graciosamente - Graças ao Ghost Angel não estou me cansando nem um pouco. - assenti

 

- Melhor assim. Não quero que você tenha ataques na minha frente. - ela gesticulou assombrosamente com as mãos

 

- Ataques? - repeti intrigada, imaginando ao que ela afinal se referia

 

- É, aquelas coisas de grávida. - disse ela, retorcendo a boca em uma careta receosa - Você sabe. - sorriu

 

- Acho que sim. - murmurei pensativa, com uma mão no queixo - Mas não precisa ter medo, não terei ataques. - ri divertida

 

- Então, o que vai ser? - perguntou ela, encarando curiosamente minha barriga, como se seus olhos possuíssem uma visão de raio-x

 

- O quê? - sondei com a mesma curiosidade, pousando minhas mãos sobre o ventre, receosa

 

- Seu filho, oras. Menino ou menina? - ela explicou-se, arrumando os cabelos azuis com as mãos

 

- Hum, ainda não sei. É cedo demais. - ergui uma sobrancelha, imaginando se Mystic não sabia nada mesmo sobre crianças

 

- Aff, que chato, não? - ela murmurou em um suspiro, olhando para o alto

 

- Err... Hum. - sibilei, achando graça do modo estranho como a Archer agia; no final das costas, ela parecia meio esquisita

 

        

         No final da tarde, como previsto, chegando na entrada assombrosa de Iron. Um caminho que mais parecia um enorme esqueleto com costelas gigantescas provocava-me arrepios enquanto eu seguia Mystic, que caminhava à minha frente. Ela não parecia temer o que viesse a nos atormentar, e meus arrepios estranhamente se destinaram à ela. Uma garota forte, eu pensei.

         Iron era um lugar sombrio, realmente. Não havia sol naquele lugar, jamais. Os céus tinham uma cor avermelhada como a ferrugem do metal, como se nenhuma vida pudesse sobreviver naquela terra inerte. Quando o estreito caminho terminava, havia uma grande arena terrosa, sem árvores, sem rochas, sem nada. Uma plataforma de metal, como um bloco de aço imundo, permanecia repleto de monstros de aço, como eram todas as criaturas daquele vilarejo abandonado pelos humanos desde que a primeira guerra se iniciara. No entanto, Mystic não tinha medo de andar tranquilamente pelos arredores de Iron. Imaginei quantas vezes ela já estivera naquele catastrófico cenário.

 

- Mystic, vamos achar um lugar para passar a noite. - propus, olhando cautelosamente para os lados - Não teremos vantagem em fazer nada com essa escuridão. - argumentei, receosa

 

- Aff, deixe de ser medrosa. Vamos salgar alguns titãs. - ela festejou animada, tirando o arco das costas enquanto sorria cruelmente

 

- Mystic. - pousei minha mão sobre seu arco, encarando-a - Podemos fazer isso amanhã, tudo bem? - sorri gentilmente

 

- Hum, certo. Só porque você é uma senhora grávida. - ela deu de ombros, seguindo a caminhar na minha frente

 

- "Senhora?" - bufei internamente; eu na verdade estava na flor da idade

 

         Encontramos um lugar seguro para montarmos nosso sutil acampamento até que a noite passasse. No alto de uma montanha, entre duas grandes rochas, parecíamos estar abrigadas de eventuais monstros que pudessem atrapalhar nosso repouso. Tudo naquele lugar tinha um cheiro insuportável de metal chamuscado, o que era enjoativo e repugnante. Iron, o covil das criaturas metálicas, podia ser um local bem perigoso até mesmo para guerreiras de elite.

         Antes de fechar os olhos e dormir, pedi em meus pensamentos para que Mizu estivesse bem, onde quer que fosse. E então, a escuridão tortuosa de Iron tomou conta de minha mente, até que aquela noite tivesse seu precioso fim.


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